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quinta-feira, 17 de julho de 2025

DENTRO DO VATICANO: Dicastério para as Causas dos Santos

O arquivo do Dicastério para as Causas dos Santos que contém a documentação das causas de beatificação e canonização  (Vatican Media)

Tem a função de acompanhar o processo de beatificação e canonização dos Servos de Deus, auxiliando os bispos das dioceses às quais pertencem na investigação sobre o martírio ou virtudes heroicas ou na oferta de vida e milagres de um fiel católico. O prefeito do Dicastério apresenta então os decretos de aprovação das causas ao Papa, para que este possa indicar o candidato à veneração de todos os fiéis.

Alessandro Di Bussolo – Cidade do Vaticano

Este é o Dicastério Vaticano responsável por examinar a vida dos candidatos aos altares: buscar em suas características aquelas do Evangelho, para que todo cristão possa vê-los como testemunhas credíveis e, sobretudo, imitáveis. Por trás da proclamação de um Santo, existe um esforço coletivo escrupuloso, que pode durar décadas. O prefeito do Dicastério para as Causas dos Santos é o cardeal Marcello Semeraro, enquanto o secretário é o arcebispo Fabio Fabene.

Notas históricas

Em 1969, São Paulo VI, com a Constituição Apostólica Sacra Rituum Congregatio, criou as Congregações para o Culto Divino e para as Causas dos Santos, dividindo entre elas as tarefas da Sagrada Congregação dos Ritos. A mesma Constituição articula a estrutura da nova Congregação em três Ofícios: o Judicial, aquele do Promotor Geral da Fé e o Histórico-Hagiográfico.

Com a Constituição Apostólica Divinus perfectionis Magister de 1983, São João Paulo II providenciou uma profunda reforma no procedimento para as Causas de Canonização (que devem ser instruídas pelos bispos diocesanos iure proprio) e na reestruturação da Congregação, que foi dotada, entre outras coisas, de um Colégio de Relatores, com a tarefa de supervisionar a preparação das Positiones super Martyrio ou super VitaVirtutibus et Fama Sanctitatis dos Servos de Deus.

Posteriormente, com a Constituição Apostólica Pastor Bonus de 1988, mudou seu nome para Congregação para as Causas dos Santos. Em 2022, com a Constituição Apostólica Praedicate Evangelium, o Papa Francisco mudou o nome para Dicastério para as Causas dos Santos.

Em vista do Jubileu de 2025, Francisco instituiu, no âmbito do Dicastério, a "Comissão dos Novos Mártires - Testemunhas da Fé", para elaborar um Catálogo de todos aqueles, inclusive aqueles de outras confissões cristãs, que derramaram seu sangue para confessar Cristo e testemunhar seu Evangelho.

As competências

É responsabilidade deste Dicastério, conforme recordado na Constituição Apostólica "Praedicate Evangelium", acompanhar o processo de beatificação e canonização dos Servos de Deus, auxiliando os bispos na investigação do martírio ou das virtudes heroicas ou na oferta da vida e dos milagres de um fiel católico. Uma vez iniciada a causa, ele é chamado de Servo de Deus, e para o qual é sempre necessária uma autêntica, difundida e duradoura "fama de santidade", isto é, a opinião comum segundo a qual sua vida foi íntegra, rica em virtudes cristãs e fecunda para a comunidade cristã.

Os novos regulamentos nas Causas dos Santos, introduzidos em 1983, reduziram significativamente o tempo necessário para os processos de beatificação e canonização. A duração das Causas, no entanto, depende de muitos fatores: do número de testemunhas e especialistas a serem ouvidos na fase diocesana - que pode chegar a várias dezenas - ao tempo necessário de redação das Positiones até o exame pelos consultores teológicos e históricos.

Há depois os tempos dos peritos médicos, quando se trata de examinar um possível milagre de cura. Se essas etapas forem positivas, a causa passa então para a sessão ordinária dos membros do Dicastério, os cardeais e os bispos. A palavra final cabe ao Papa, para cuja aprovação o prefeito submete as diversas causas.

O balanço espiritual e pastoral desses 56 anos desde a instituição da Congregação para as Causas dos Santos testemunhou, até 2020, 3.003 beatificações e 1.479 canonizações. Anualmente, como normalmente há duas sessões ordinárias por mês e em cada sessão são examinados três ou quatro casos, o número de casos concluídos em um ano é de 70-80.

O prefeito do Dicastério, Cardeal Marcello Semeraro, em sua mesa (Vatican Media)   (Vatican Media)

Partindo da “fama de santidade e dos sinais” entre o povo de Deus, a investigação tem uma primeira fase na diocese. Uma vez trazida a Roma, recebe a designação de um relator para orientar o postulador na preparação do volume onde são sintetizadas as provas coletadas na diocese, com o objetivo de reconstruir a vida e demonstrar as virtudes ou o martírio, bem como a relativa fama de santidade e os sinais do Servo de Deus. Esta é a Positio, que é estudada por um grupo de teólogos e, no caso de uma “Causa antiga”, sobre um candidato que viveu muito antes, também por uma comissão de historiadores. Se o parecer for favorável, o dossiê é submetido a um novo julgamento dos cardeais e bispos do Dicastério. Em caso de aprovação, o Papa pode autorizar a promulgação do Decreto sobre o heroísmo das virtudes cristãs ou sobre o martírio ou sobre a oferta da vida do Servo de Deus, que assim se torna venerável.

A beatificação é a etapa intermediária em vista da canonização. Se o candidato é declarado mártir, ele imediatamente se torna Beato; caso contrário, é necessário que um milagre seja reconhecido, devido à sua intercessão: uma cura considerada cientificamente inexplicável por uma Comissão Médica composta por especialistas, tanto crentes quanto não crentes. Também sobre o milagre, os consultores teológicos e, em seguida, os cardeais e bispos do Dicastério se pronunciam primeiro e o Papa autoriza o relativo decreto.

Para que o Beato possa ser declarado Santo, deve-se atribuir a ele intercessão efetiva em um segundo milagre, que, no entanto, tenha ocorrido após a beatificação. O Dicastério estabelece o procedimento canônico a ser seguido para verificar e declarar a autenticidade das relíquias dos santos e garantir sua conservação. Ele julga à concessão do título de Doutor da Igreja a ser atribuído a um Santo, após ter obtido o voto do Dicastério para a Doutrina da Fé sobre sua eminente doutrina.

O trabalho administrativo e despesas

A causa de beatificação e canonização é um trabalho complexo e articulado, com despesas ligadas ao trabalho das comissões, à impressão de documentos e às reuniões de especialistas. O Dicastério sempre se preocupa com a contenção de custos e com as normas administrativas aprovadas pelo Papa Francisco em 2016, que garantem a transparência e a regularidade administrativa. Alimentado de diversas maneiras, um "Fundo de Solidariedade" também foi criado na Congregação para as Causas com menos recursos.

A fama de santidade

A causa de beatificação e canonização diz respeito a um fiel católico que, em vida, na morte e após a morte, gozou de fama de santidade, martírio ou oferta da vida. Para o início de um processo de beatificação, é sempre necessária uma certa "fama de santidade" da pessoa, ou seja, a opinião comum do povo de que sua vida foi íntegra, rica em virtudes cristãs. Essa fama deve perdurar e pode crescer. Aqueles que conheceram a pessoa falam da natureza exemplar de sua vida, de sua influência positiva, de sua fecundidade apostólica, de sua morte edificante.

A fase diocesana

A canonização é apenas o último degrau de uma escada que pressupõe outros: o candidato, para se tornar oficialmente santo, deve primeiro ser servo de Deus, depois venerável e, por fim, beato.

É chamado servo de Deus o fiel católico que teve iniciada a causa de beatificação e canonização. A primeira fase deve, portanto, ser a abertura oficial do processo. A pessoa é definida como Servo(a) de Deus e o postulador, nomeado especificamente para esse fim pelo bispo, reúne documentos e testemunhos que podem ajudar a reconstruir a vida e a santidade do sujeito.

O objetivo é, muitas vezes, verificar o heroísmo das virtudes, ou a disposição habitual de fazer o bem com determinação, continuidade e sem hesitação. Em outras palavras, é necessário demonstrar que o candidato as praticou em um nível muito elevado, fora do comum. Em outros casos, o objeto da verificação diz respeito aos requisitos do martírio cristão.

A reconstrução é feita seguindo dois caminhos: ouvindo os testemunhos orais de pessoas que conheceram o Servo de Deus e podem relatar com precisão fatos, eventos e palavras; coletando os documentos e os escritos concernentes ao Servo de Deus. Se as condições preliminares parecerem estar de acordo, o bispo pode introduzir a causa em vista da canonização.

O processo de beatificação, salvo uma particular dispensa papal, não pode começar antes de decorridos pelo menos 5 anos da morte do candidato. O bispo diocesano nomeia um tribunal composto por seu delegado, um Promotor de Justiça (em nível de Congregação, haverá então um Promotor Geral da Fé) e um tabelião atuário. Uma comissão histórica especial coleta todos os documentos relativos ao Servo de Deus e seus escritos. Por fim, dois censores teológicos devem avaliar os mesmos escritos para verificar se há algo contrário à fé ou à moral. Todas as informações são coletadas e então seladas durante uma sessão de encerramento, presidida pelo bispo.

A fase romana

Terminado esse trabalho, a fase diocesana do processo é concluída e todo o material é entregue em Roma à Congregação para as Causas dos Santos que, por meio de seu relator, orientará o postulador na preparação da Positio, ou seja, o volume que resume as provas coletadas na diocese; inicia-se assim a chamada fase romana do processo.

Positio deve demonstrar com segurança a vida, as virtudes ou o martírio e a relativa fama do Servo de Deus. Esta será estudada por um grupo de teólogos e, no caso de uma “Causa Histórica” (aquela que diz respeito a um candidato que viveu há muito tempo e da qual não há testemunhas oculares), também por uma Comissão de historiadores. Se esses votos forem favoráveis ​​(pelo menos por maioria qualificada), o dossiê será submetido a um novo julgamento pelos bispos e cardeais da Congregação. Se o juízo deste último for igualmente favorável, o Santo Padre pode autorizar a promulgação do Decreto sobre a heroicidade das virtudes ou sobre o martírio do Servo de Deus, que assim se torna venerável: isto é, é-lhe reconhecido ter vivido as três virtudes teologais (fé, esperança e caridade) e as quatro virtudes cardeais (prudência, justiça, fortaleza e temperança) em grau "heroico", ou ter sofrido um verdadeiro martírio.

Os candidatos à santidade podem, de fato, ser: os mártires, aqueles que aceitaram de forma cristã a morte por ódio à fé; os chamados confessores, isto é, aqueles que foram testemunhas da fé, mas sem o supremo sacrifício da vida.

Além disso, a partir de 2017, também é possível chegar à canonização por uma terceira via: a oferta da vida, sem morte por ódio à fé e sem o exercício prolongado das virtudes heroicas. Trata-se de pessoas que voluntária e livremente ofereceram suas vidas pelos outros, perseverando "até a morte neste propósito, em um ato supremo de caridade".

A beatificação

A beatificação é a etapa intermediária em vista da canonização. Se o candidato é declarado mártir, torna-se imediatamente Beato; caso contrário, é necessário que um milagre seja reconhecido, devido à sua intercessão. Este evento milagroso, no geral, é uma cura considerada cientificamente inexplicável, julgada como tal por uma comissão médica convocada pela Congregação para as Causas dos Santos e composta por especialistas quer crentes como não crentes. Importante, para fins de reconhecimento, é que a cura seja completa e duradoura, em muitos casos mesmo instantânea.

Após esta aprovação, os bispos e cardeais da Congregação também se pronunciam sobre o milagre e o Santo Padre autoriza o respectivo decreto. Assim, o Venerável pode ser Beatificado.

Após esta proclamação, o Beato é inscrito no calendário litúrgico da sua diocese ou da sua família religiosa, no aniversário da sua morte ou em um dia considerado particularmente significativo.

A canonização

Para chegar à canonização, ou seja, para que possa ser declarado santo, é necessário atribuir ao Beato um segundo milagre, que, no entanto, deve ter ocorrido após a beatificação.

Para estabelecer quem é santo, portanto, a Igreja sempre utiliza uma avaliação canônica: se antigamente alguém podia se tornar santo simplesmente por aclamação popular, é pelo menos a partir do século XVI que a Igreja começou a se dotar de normas específicas, para evitar confusões e abusos.

Como em todos os processos, também neste caso há uma espécie de acusação e de defesa. O advogado de defesa, se quisermos usar este termo, é o postulador, encarregado de demonstrar a santidade do candidato. Aquele que é encarregado de olhar para os testemunhos e documentos com senso crítico é, em vez disso, o promotor da fé (comumente conhecido como "advogado do diabo"). O primeiro é nomeado por quem fez a proposta para instruir a causa, o segundo está a serviço da Congregação.

Casos especiais

O Papa pode tomar decisões especiais. O Papa Francisco o fez em relação a João XXIII, que foi proclamado Santo por sua fama de santidade, difundida no mundo inteiro durante décadas, sem que um segundo milagre fosse reconhecido. E um procedimento extraordinário que também foi seguido por Bento XVI em relação a João Paulo II, cuja causa de beatificação foi aberta poucas semanas após sua morte, sem esperar os cinco anos exigidos.

Além disso, há casos que procedem por equipolência, aplicada tanto à beatificação quanto à canonização, como no caso de São José de Anchieta. Este é um procedimento usado pela Igreja, por meio do qual o Papa, após a devida verificação, aprova um culto que já existe há algum tempo, sem esperar que um milagre seja comprovado.. É diferente das beatificações e canonizações formais, para as quais a Igreja prevê um processo regular e o respectivo milagre.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Manifesto

Ecologia Integral (CNBB)

MANIFESTO 

15/07/2025

Dom Geraldo dos Reis Maia
Bispo de Araçuaí (MG)

Foi lançado, recentemente, o Manifesto “Ecologia Integral: uma narrativa para entender a crise socioambiental planetária”, confeccionado pela Comissão Especial para a Ecologia Integral e Mineração (CEEM) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Trata-se de um texto bastante lúcido, em meio a tantas nuvens tóxicas produzidas pelas atividades extrativistas. O grande alerta do Manifesto é “o tempo de salvar o mundo da vida é agora” (p. 5). A intenção do texto é clara: “Nem tudo é consenso, mas há pontos chave que nos conduzem e que queremos, com este Manifesto, compartilhar” (p. 7). 

O Manifesto observa que “o modelo econômico atual acentua a distinção entre pessoas com direito à sobrevivência e aquelas consideradas descartáveis” (p. 9). É essa a crítica que lançamos sobre as atividades minerárias em geral e, no Vale do Jequitinhonha, em especial. Um caso típico a considerar é o município de Araçuaí e região, no epicentro de atividades minerárias. Reconhecemos que essas atividades têm trazido certo desenvolvimento para a região. Podemos ressaltar o crescimento na oferta de empregos, com a consequente redução do desemprego. Outra consideração é o aumento da demanda pelos serviços de hotelaria e aquecimento do mercado. Em contrapartida, constatamos uma série de impactos sociais que massacram o nosso povo: saúde, moradia, transporte, urbanismo, ecologia integral, dentre outros. 

Foi publicado recentemente que houve um aumento da demanda no Hospital de Araçuaí em 30% nesses últimos tempos, sendo que o último censo constatou retração do número de habitantes nas cidades que são atendidas por esse mesmo hospital. Isso denota que os habitantes estão sofrendo mais com enfermidades, certamente afetados pelos impactos da mineração. A poeira, os explosivos e o estresse afetam as condições de saúde, no campo e na cidade, especialmente nas regiões onde acontecem atividades minerárias. Eu mesmo visitei famílias em comunidades afetadas por essas atividades e vi como sofrem com esses impactos. É lamentável que somente uma empresa mineradora vem assumindo suas responsabilidades para com o único Hospital da cidade. 

É notório o aumento no preço de aluguéis, especialmente na cidade de Araçuaí. Não se consegue um barraco para morar a preço acessível. Os preços de aluguéis vêm tornando-se exorbitantes. Isso se deve, em parte, ao êxodo rural, pois muitas pessoas se mudam para a cidade a fim de garantir as vagas de empregos, assim como tantas outas que vêm de diferentes cidades para assumir postos de serviços. Há empresas que promovem o retorno de habitantes que haviam se mudado à procura de oferta de emprego, o que é muito louvável, mas também colabora para o aumento no preço de aluguéis. A especulação imobiliária vai se agravando ainda mais. 

Outra dificuldade é acarretada pelo aumento do transporte. Vias públicas, especialmente na zona rural, são redirecionadas sem consulta prévia a comunidades tradicionais, dificultando a mobilidade de muitas pessoas que vivem em suas povoações. Aumenta a poeira nas estradas e nem sempre as empresas prestam a manutenção devida para a conservação dessas estradas. As rodovias pavimentadas não suportam tanto movimento de veículos pesados. Frequentemente, são abertas crateras no asfalto, gerando constantes perdas de pneus, amortecedores e outros equipamentos nos automóveis. Onde está a responsabilidade da iniciativa privada para firmar parcerias com o setor público para a conservação dessas vias? 

Já na entrada da cidade de Araçuaí, percebe-se o desgaste urbanístico, clamando por investimentos. Ao entrar na cidade, nota-se que as vias públicas carecem de mais cuidado. A parte antiga da cidade está um verdadeiro caos, entregue às intempéries naturais. Quase sempre se retarda na manutenção da iluminação pública, do fornecimento de água tratada e de tantos outros benefícios que poderiam gerar melhores condições de vida para a população, como garantem a Constituição Federal e a Lei Orgânica do Município. 

O descuido com a ecologia é evidente: poeira gerada pelas atividades minerárias, fontes de água e riachos estão secando e o assoreamento de rios é gritante. Como é triste passar sobre pontes, sob as quais só há abismos, onde a água não corre mais! É de se lamentar que vegetações sejam devastadas em nome de um lucro fácil, fazendo com que as pessoas passam a sentir os efeitos do descuido com a Casa Comum. Comunidades que vivem da generosidade das matas já sentem suas fontes de sobrevivência diminuírem. Essa realidade ilustra bem o que diz o Manifesto: “A crítica fundamental ao conceito de ‘desenvolvimento’ é sua insustentabilidade e, consequentemente, sua contribuição para a injustiça socioambiental” (p. 12). 

Há um “canto de sereia” no ar, fascinando muita gente sobre o possível desenvolvimento da região, até mesmo propondo a mudança de nome do reconhecido Vale do Jequitinhonha. Não, não é ele o “Vale da miséria”, como se falava tanto há décadas. Não, muito menos é o “Vale do Lítio”. O nosso Vale do Jequitinhonha é história, é arte, é cultura, é resistência. Não podemos trocar essas riquezas naturais e humanas por um pretenso progresso que nunca vem! Não podemos nos calar enquanto retiram as riquezas do Vale e nos deixam migalhas e crateras! Exigimos responsabilidade social! 

Parte das riquezas que são tiradas precisam ser revertidas em políticas públicas, não só em empregos que passam. O Hospital São Vicente de Paulo é estratégico para atender as sete cidades da região e precisa ser ampliado e melhor equipado para prestar serviços de qualidade à população. É vergonhoso visitar enfermos nos corredores dos quartos porque os leitos são insuficientes. É vergonhoso ainda não ter um serviço local de hemodiálise para atender os pacientes que precisam dessa terapia. É vergonhoso ter que percorrer cerca de 300 quilômetros para submeter-se a um exame especializado ou para conseguir uma vaga de UTI. Onde está a responsabilidade dessas empresas que levam as riquezas do Vale? Esforços têm sido realizados neste sentido, mas é necessário contar com a responsabilidade do setor privado, firmando parcerias com as políticas públicas e entidades beneficentes.  

Como essas empresas podem investir em moradias, revitalizar o centro antigo da cidade e projetar um novo urbanismo? Como podem investir mais nas rodovias e estradas para facilitar a mobilidade humana na região? Quais seriam as melhores contribuições para o respeito à ecologia integral, com a revitalização de nascentes, riachos, fauna e flora? E o que pode ser feito em relação aos povos originais? Antes de dizimá-los, é preciso aprender com eles, na sua perspectiva do “bem viver”, entendendo que “os estilos de vida e as sociedades deveriam se basear e respeitar a interrelação entre os seres humanos e não humanos, vivendo de forma integrada”, como nos recorda o Manifesto (p. 13).  

“Que este manifesto abra clareiras, não somente a partir da confiança nas forças humanas: a vida é um dom muito largo e Deus manifesta seu amor na misteriosa engenharia universal, sempre em transformação. Aliás, só é possível a borboleta voar livre, depois de ter passado pela paciente metamorfose do casulo” (p. 27). Por fim, o documento nos adverte para não nos esquecermos “de pedir, em nossas súplicas feitas com os olhos fechados, para o Criador nos ajudar a abri-los, ainda mais, diante do que está acontecendo com o planeta. E que não nos falte criatividade para desenhar, com sonhos e trabalhos, novos céus e boa terra (2Pd 3,13)” (p. 27). 

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS: E então saímos para ver as estrelas e as listas (Parte 4/4)

As imagens são de Sandow Birk, extraídas de Dante, Inferno, San Francisco, Chronicle Books. Imagem do inferno dantesco, detalhe | 30Giorni

Arquivo 30Dias nº 05 - 2006

E então saímos para ver as estrelas e as listas

O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma docente da James Madison University da Virgínia.

de Giuliana Fazzion

O século XX

No século XX, Dante “is still alive and well”. A “Dante Society”, a partir de 1954, transformou-se na sociedade por ações “Dante Society of America Inc.”, e seu Annual Report já era um dos mais importantes instrumentos de consulta: lá se comenta a bibliografia dos estudos dantescos, lá se publicam ensaios, notas, conferências muitas vezes de notável interesse. A Sociedade tem uma rica biblioteca de literatura dantesca na Harvard University, que, na América, só fica atrás da que a Cornell University veio a herdar do estudioso e bibliófilo Daniel Willard Fiske. A sociedade desenvolve também atividades promocionais, e gerencia um “Dante Prize” destinado a teses de graduação e pesquisas sobre temas dantescos.

O estudo americano de Dante já chegou a dar contribuições extremamente notáveis. Por exemplo, o número de poetas do século XX influenciados por Dante é relevante. Há alguns anos, saiu um livro intitulado The Poets’ Dante, uma coletânea de ensaios escritos por famosos poetas do século XX. Os organizadores, Peter Hawkins (professor de Estudos Religiosos na Universidade de Boston) e Rachel Jacoff (professora de Literatura Comparada e de Estudos Italianos no Wellesley College), contam na introdução que, como a maior parte dos leitores de Dante, eles entraram em contato com o poeta florentino por intermédio de Ezra Pound e Thomas S. Eliot. Em seus estudos em nível de mestrado na faculdade de Inglês, o italiano se tornou a língua a ser aprendida para estudar Dante. Para eles, Dante era realmente “o altíssimo poeta”, e justamente por isso liam em particular James Merrill, Gjertrud Schnackenberg, Charles Wright, Seamus Heaney, poetas que tinham uma afinidade com Dante e para com o qual se sentiam endividados, pela inspiração que dele haviam recebido. Daqui surgiu a ideia de reunir ensaios escritos por poetas contemporâneos que contam como “encontraram” Dante pela primeira vez, o que os atraiu para ele, o que os manteve à distância do poeta, e se os escritos dele tiveram uma influência direta sobre seus trabalhos. Há ensaios de Ezra Pound, Thomas S. Eliot, Osip Mandelstam, Robert Duncan, Howard Nemerov, Seamus Heaney, Jacqueline Osherow, Robert Pinsky, Rosanna Warren, Daniel Halpern, Mark Doty, o belíssimo ensaio de Jorge Luis Borges, entre outros.

Traduções americanas da Divina Comédia

Atualmente existem mais traduções de Dante em inglês que em qualquer outra língua, e os Estados Unidos produzem mais traduções de Dante que qualquer outro país. O poeta Eliot, em 1929, disse que Dante e Shakespeare dividem o mundo moderno entre si: a parte do mundo que “pertence” a Dante aumenta a cada ano. Em 1989, cerca de sessenta anos depois de Eliot, o escritor Stuart McDougal disse que o impacto de Dante sobre os maiores escritores do mundo moderno superou grandemente o de Shakespeare. De fato, Dante virou o jogo. “Migrou” do campo literário, cultural e acadêmico para o mundo externo e teve um impacto tanto sobre o público instruído quanto sobre o não instruído.

O século XX é o período das grandes traduções. E por isso começou no século XX um debate que em certo sentido continua ainda hoje: tradução em prosa ou poesia? Alguns são contrários à tradução inglesa usando o terceto, e estas são as razões: 1) o inglês é pobre em rimas; 2) esse “uso do terceto” não se presta à língua; 3) o verso em inglês não se adapta à formação constante da rima.

Traduttore traditore. Todo tradutor de Dante sabe o quanto isso é verdade. Dizendo isso se reconhece com humildade a extrema dificuldade de fazer justiça a Dante, considerado por Byron “o mais intraduzível dos poetas”. De fato, qualquer tradutor reconhece que, procurando conservar certos aspectos da poesia, outros são perdidos na tradução. E muitos desses tradutores concordam com Dorothy Sayers, segundo a qual o maior elogio que sua tradução possa receber é que seja um impulso, um estímulo aos leitores a que leiam Dante na língua original.

O que se espera de uma tradução? Que comunique o sentimento e o sentido do trabalho original. No caso da Divina Comédia, a opinião está dividida entre aqueles que afirmam que o espírito e o sentido dessa obra se comunica melhor ao leitor por meio de uma tradução em verso e aqueles que preferem uma tradução em prosa. Muitos críticos concordam, de qualquer forma, que tanto a tradução em prosa quanto a tradução em verso apresentam suas vantagens. A tradução em prosa comunica melhor o sentido literal, ao passo que a tradução em verso pode comunicar o sentido do movimento e do ritmo da poesia de Dante. No ensino da obra-prima de Dante nos Estados Unidos são usadas edições bilíngues, nas quais o texto original se encontra na página à esquerda e a tradução na da direita. O poeta Thomas S. Eliot e outros afirmaram ter aprendido a ler italiano com essas edições.

As traduções mais usadas nas universidades americanas

John D. Sinclair (prosa, edição bilíngüe). Esta é ainda a edição mais popular. Sinclair escolheu a prosa para alcançar seu objetivo, que era combinar uma tradução literal, ou quase, do texto italiano a uma boa forma da língua inglesa.

Essa tradução é renomada por ser cuidadosa e expressa num inglês elegante. Notas explicativas, consideradas por muitos professores “uma pequena jóia”, se encontram no final de cada canto. Elas contêm o resumo do canto, no qual o tradutor trata do aspecto histórico, das qualidades estéticas e fornece elementos de crítica. Ainda no final de cada canto há breves notas numeradas que chamam a atenção para alguns termos do texto.

Charles S. Singleton (prosa, edição bilíngüe). É uma tradução clara e acurada. Cada cantiga é publicada em dois volumes; um contém o texto e a tradução e o outro os comentários de teologia e mitologia, análises linguística, histórica e biográfica. Faltam os resumos dos cantos.

John Ciardi (poesia). Popular, mas tem suscitado também controvérsias. Ciardi usou o dummy, ou “terceto defeituoso”, para empregar um inglês idiomático e ao mesmo tempo para comunicar as sensações do poema. A crítica contesta seu uso de algumas “licenças poéticas” não necessárias.

Mark Musa (Inferno, poesia). Sua versão é muito usada nos college. Escolheu uma forma poética sem rima para obter uma tradução acurada.

A Universidade de Harvard usa a tradução de Jean e Robert Hollander para o ensino do Inferno e do Purgatório, e a de Mandelbaum para o Paraíso.

Conclusão

No verão de 1999, a seção “Bookend” do New York Times foi inteiramente dedicada ao criador de histórias em quadrinhos Seymour Chwast, que escolheu para essa edição o mundo da Divina Comédia. A página foi intitulada: A Divina Comédia de Dante: O Diagrama. Essa divertida representação dos três reinos ofereceu ao leitor dominical da seção dedicada à resenha de livros uma visão esquemática da Comédia dantesca. Uma pergunta que se pode fazer é: por que os quadrinhos apareceram lá, sem explicações particulares, num dos jornais mais famosos e talvez mais vendidos do mundo? E por que o New York presumia que um leitor normal conhecesse o poema?

O fato é que Dante é conhecido não apenas por aqueles que leram o poema ao menos uma vez, mas também por um número ainda maior de pessoas que nunca leram sequer uma página dele. Dante é uma figura popular da cultura contemporânea americana. Por exemplo, diversos filmes americanos - O Balconista (Clerks, 1994), Seven (1995), O Inferno de Dante (Dante’s Peak, 1997) - fazem alusões ao poema ou o tomam como ponto de partida. Existe até um conjunto de rock que adotou o nome “Divine Comedy” com a intenção de ser facilmente lembrado. Os Estados Unidos têm muitos restaurantes e bares chamados “Dante’s Inferno”. Esta última expressão é comumente usada por jornalistas para descrever situações sociais e políticas particularmente críticas.

Como se viu, a fortuna de Dante nunca declinou em setecentos anos, e nunca declinará, pois sua mensagem é universal e sempre atual.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Arcebispo Jacques Mourad: Jesus quer que Sua Igreja permaneça na Síria

Ícone de Jesus danificado no ataque contra Igreja Mar Elias em Damasco, em 22 de junho  (AFP or licensors)

"E nós, os discípulos de Cristo, e aqueles que exercem responsabilidades em seu nome, temos o dever de proteger os nossos fiéis e fazer todo o possível para garantir o futuro da Igreja na Síria."

Por Gianni Valente*

O arcebispo Jacques Mourad retornou há poucos dias após participar do Sínodo dos Bispos da Igreja Católica Siríaca em Roma. Ele imediatamente se envolveu nas muitas coisas que o aguardavam em Homs. "Nestes dias, estou celebrando as Primeiras Comunhões de meninos e meninas nas paróquias das aldeias. É uma alegria que toca o coração. Agradecemos ao Senhor por todos esses sinais de esperança que Ele nos oferece, em nossa pobreza."

Jacques Mourad pondera cada palavra ao falar dos tempos que sua Pátria e seu povo estão vivendo.

O monge da comunidade Deir Mar Musa, que se tornou arcebispo católico siríaco de Homs, Hama e Nabek, também carrega no coração a comoção causada pelo massacre de cristãos em Damasco em 22 de junho, enquanto estavam reunidos com seus irmãos e irmãs para participar da celebração dominical na Igreja de Santo Elias.

As palavras do bispo Jacques, nascido em Aleppo e membro da comunidade monástica fundada pelo jesuíta italiano Paolo Dall'Oglio, são por vezes cortantes ao descrever a situação atual da Síria.

Ele repete que "hoje, a Síria acabou como país". Mas também vê que, em meio a este naufrágio, a Igreja na Síria continua o seu caminho e seu trabalho, para o bem de todos. E isso acontece apenas "porque esta é a vontade de Jesus. Jesus quer que Sua Igreja permaneça na Síria. E essa ideia de esvaziar a Síria dos cristãos, certamente não é a vontade de Deus".

Padre Jacques Mourad no lançamento de seu livro em janeiro de 2023 (Vatican News)

A tragédia dos cristãos

O novo poder que governa de Damasco busca palavras reconfortantes. Mesmo após o massacre na Igreja de Santo Elias, autoridades governamentais repetem que os cristãos são um componente inalienável do povo sírio. "E eu quero dizer - enfatiza o Arcebispo Mourad - que o governo tem responsabilidade direta por tudo o que aconteceu. Porque todo governo é responsável pela segurança do povo. E não estou falando apenas dos cristãos. Também muitos sunitas, muitos alauítas foram mortos, muitos desapareceram. Se uma equipe enviada por alguma organização internacional inspecionasse as prisões, encontraria muitas pessoas que não têm nada a ver com os crimes do regime anterior. Acho justo dizer que este governo está perseguindo o povo. Todo o povo."

O arcebispo católico-siríaco de Homs também percebe hostilidade nas fórmulas tranquilizadoras usadas pelo novo regime sírio em relação aos batizados: "Toda vez que ouço falar em 'proteção' dos cristãos, sinto que estamos sendo acusados. E ameaçados. São fórmulas usadas não para demonstrar benevolência, mas para incriminar. O que tenho a dizer é que este governo está fazendo as mesmas coisas que o regime de Assad fez contra o povo. Ambos os regimes, o de Assad e o atual, não têm respeito pelo povo sírio e por sua história."

A Síria acabou

A Síria, reconhece o arcebispo Jacques, tem um grande legado e tem o presente de sua população jovem. "Mas os governos mais recentes parecem querer aniquilar, destruir esta civilização, a civilização deste povo. É um crime mundial, não diz respeito somente a nós."

"A UNESCO declara muitos lugares na Síria Patrimônios da Humanidade. Depois, ninguém os protege. E agora devemos proteger nosso patrimônio vivo, não apenas os monumentos."

Primeiro os megafones, depois o terror

As narrativas do terror mudam frequentemente a sua "griffe". Fontes do governo sírio culparam militantes não especificados do Daesh, o "Estado Islâmico", pelo ataque à igreja em Damasco. Mas o massacre de cristãos foi reivindicado por um grupo jihadista recém-formado, Saraya Ansar al-Sunna, talvez criado por desertores de Tahrir al-Sham. Estratégias de marketing, gestão "profissional" de comunicações e propaganda.

Os cristãos ortodoxos da Igreja de Santo Elias em Damasco — como reiterado por diversas fontes e testemunhas — foram massacrados "como punição", após alguns deles se desentenderem com militantes islâmicos que passavam continuamente pela igreja com alto-falantes instalados em seus carros, entoando versículos do Alcorão e convocando os batizados à conversão e à adoção do islamismo. A mesma coisa — confirma o arcebispo Jacques — está acontecendo em Homs e em toda a Síria: "Eles circulam em veículos de segurança do governo e, por alto-falantes, convocam os cristãos à conversão. Se perguntarmos às forças de segurança por que estão agindo dessa maneira, eles nos dizem que se trata de iniciativas individuais. No entanto, continuam a usar veículos de segurança... as pessoas não acreditam mais neste governo."

Patrocinadores ocidentais

Enquanto isso, aqueles que atualmente detêm o poder na Síria continuam buscando a aprovação de círculos e potências externas. Representantes do governo disseram estar prontos para renovar o armistício de 1974 com Israel.

"Eu - reconhece o arcebispo Mourad - não sou um político. E vejo que quase todo o povo sírio deseja a paz. Deseja também chegar a um acordo de paz com Israel, para todos os países do Oriente Médio. Depois de todos esses anos, todos estão realmente cansados desta guerra e de considerar os judeus como inimigos. Mas se chegássemos a um acordo com Israel agora, seria apenas porque agora a Síria está enfraquecida. E tal acordo, em um momento como este, seria simplesmente mais um ato de humilhação para o povo.

Portanto, antes que o presidente chegue a assinar tal acordo, seria necessário pelo menos falar claramente ao povo, explicar o que este acordo significa e o que está incluído nele. Quais são as condições para Israel e para os sírios."

O exército israelense, prossegue o arcebispo católico-siríaco de Homs, "ocupou muitos territórios sírios após o fim do regime de Assad. Isso significa que talvez devamos esquecer as Colinas de Golã para sempre. E isso significa que o povo sírio, especialmente em Damasco, poderá ser sempre ameaçado pelo instrumento da sede, porque a água em Damasco vem das Colinas de Golã. E se permanecermos sob o poder israelense pela água, imaginem o que acontece com outras coisas..."

Hoje, constata, "a Síria está acabada como país. Continuamos a repetir que é o primeiro país do mundo, que Damasco e Aleppo são as cidades mais antigas do mundo, mas isso não significa mais nada no presente. Acabou, grande parte da população vive abaixo da linha da pobreza, somos massacrados, humilhados, estamos cansados. Não temos forças para recuperar nossa dignidade por conta própria. Se não houver apoio político sincero em favor do povo, e não do governo, estamos perdidos." E "ninguém pode condenar o povo sírio por emigrar e buscar salvação fora da Síria. Ninguém tem o direito de julgar." Em uma situação em que toda a economia, o sistema educacional e até mesmo o sistema de saúde estão em colapso.

Por onde recomeçar?

É possível encontrar caminhos para seguir em frente, quando o horizonte é assim tão escuro e parece impossível respirar?

O arcebispo escolhe palavras fortes e desafiadoras para delinear a condição e a missão das Igrejas e dos cristãos sírios hoje.

"A meu ver - diz ele - a Igreja é a única referência de esperança para todo o povo sírio. Para todos, não apenas para os cristãos. Porque nós fazemos tudo para apoiar o nosso povo, de todas as maneiras que podemos."

"Após a queda de Assad, muitos em nossas comunidades e paróquias entraram em uma crise de medo. Um desespero terrível. Eu também visitei todas as paróquias, em cada povoado, para encorajar os cristãos, para falar sobre o futuro. Graças a Deus, sempre me sinto acompanhado pelo Senhor, nas palavras, no discurso que faço ao povo. E assim, nesta situação, estamos ocupados organizando encontros regulares para jovens, crianças e grupos envolvidos na Igreja de várias maneiras."

Mesmo em uma situação para muitos trágica em muitos aspectos, a vida cotidiana das comunidades eclesiais prossegue em seu caminho.

E precisamente as comunidades eclesiais buscam promover o diálogo pela coexistência entre todos os grupos e componentes, em um contexto dilacerado, impregnado de dor e ressentimento.

"Em Aleppo e também em Damasco, eles são realmente muito bons. Os bispos também deram espaço aos leigos para refletir e tomar a iniciativa.

Em Homs, procuramos nos encontrar com todas as outras comunidades: alauítas, ismaelitas, sunitas, cristãos. As pessoas que encontramos estão todas preocupadas com as políticas do governo, até mesmo os muçulmanos. Estamos unidos, porque estamos todos no mesmo barco, como reiterou o Papa Francisco".

O Encontro com o Papa Leão

Foi o Papa Leão quem pediu aos bispos católico-siríacos que fossem a Roma para realizar seu Sínodo Ordinário na Cidade Eterna, realizado de 3 a 6 de julho. "Foi uma oportunidade maravilhosa para encontrá-lo, conhecê-lo e receber sua bênção. Acompanhei atentamente seus discursos, falando sobre as Igrejas Orientais e o Oriente Cristão. Aproveitei este encontro para agradecê-lo e pedir-lhe que encorajasse toda a Igreja Católica a tomar a iniciativa, especialmente para apoiar o povo sírio em suas necessidades primárias."

A esperança transparece em ações concretas

"Para mim - enfatiza Jacques Mourad - é importante que a Igreja se envolva intensamente na reconstrução das escolas e de todo o tecido educacional na Síria. E também na construção de hospitais decentes para o nosso povo. Já temos escolas em funcionamento em Aleppo e Damasco, mas não são suficientes. Em Homs, não há nada. Precisamos trabalhar nisso, porque também pode ajudar a conter a emigração cristã. Todos os pais pensam no futuro dos seus filhos. E se não lhes podem garantir escolas para estudar e hospitais em funcionamento, a única opção que lhes resta é partir."

Temos necessidade de tudo. Precisamos também revitalizar centros pastorais e culturais que possam apoiar o crescimento humano e cultural dos nossos jovens. E também casas para jovens que desejam se casar. Dessa forma, podemos encorajar todos os jovens a permanecer no país, e não a sair.

Assim, o presente e o futuro do arcebispo Jacques estão repletos de coisas boas para fazer. Faltam recursos, mas o horizonte é claro: "Desta forma - diz ele - podemos avançar no caminho da nossa Igreja na Síria. Porque esta é certamente a vontade de Jesus. Jesus quer que a Sua Igreja permaneça na Síria. Essa ideia de esvaziar a Síria de cristãos certamente não é a vontade de Deus."

"E nós, os discípulos de Cristo, e aqueles que exercem responsabilidades em seu nome, temos o dever de proteger os nossos fiéis e fazer todo o possível para garantir o futuro da Igreja na Síria." 

*Gianni Valente é diretor da Agência Fides

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

quarta-feira, 16 de julho de 2025

O Papa Leão nos implora a fazer uma coisa para realmente ouvir Deus

strelka | Shutterstock

Cerith Gardiner - publicado em 15/07/25

Em uma mensagem impactante aos jovens peregrinos em Roma, o Papa Leão XIV destacou algo simples, mas profundo: a fé cresce no silêncio — e ouvir Deus começa ao desligar as distrações.

Em nosso mundo acelerado, cheio de ruído e notificações, é fácil esquecer que Deus ainda fala — e geralmente, o faz na voz suave e silenciosa dentro de nossos corações. O Papa recordou que cada um de nós foi criado “com um propósito e uma missão nesta vida”, e que Deus nos chama de dentro para fora.

“Tantas vezes perdemos a capacidade de ouvir, de ouvir de verdade.”

Vivemos de alarme em alarme, de reunião virtual a redes sociais, com os fones nos ouvidos e a mente saturada de estímulos digitais. No meio dessa confusão, perdemos a voz de Deus — e até o som do nosso próprio coração.


O caminho da escuta

“Aquietai-vos e sabei que Eu sou Deus” (Salmo 46,10)

O Papa não pede que todos entrem num mosteiro, mas que aprendamos a pausar, a encontrar momentos de silêncio real.

Como explicou a jornalista Francesca Pollio Fenton: “No silêncio, reconhecemos a presença de Deus e damos a Ele a chance de responder às nossas orações.” Quando cessam os ruídos externos, percebemos os sussurros do Espírito Santo.

Até o Catecismo da Igreja Católica observa que as distrações na oração revelam a que estamos apegados — um lembrete útil de que, se a tela do celular brilha mais do que o Coração de Jesus, algo precisa mudar.


Silêncio como raiz da fé

Inspirado pela carta de São Paulo aos Colossenses (2,7), o Papa Leão comparou a fé a uma árvore: sem raízes profundas, ela não se sustenta. E o silêncio é a água e a luz que alimentam essas raízes.

“Ao escutarmos em oração, permitimos que a graça de Deus fortaleça nossa fé em Jesus, para que possamos partilhar esse dom com os outros.”

Isso pode se traduzir em pequenas escolhas diárias:

– Uma manhã sem celular

– Uma caminhada de oração sem fones

– Um “agora não” para a Alexa ou o Google Assistente

– Um tempo para simplesmente estar com Deus

Até Jesus disse a seus discípulos:

“Vinde comigo para um lugar deserto e descansai um pouco” (Mc 6,31)


O silêncio que acende

“Desligar não é se desconectar da vida, mas se conectar com a presença de Deus.”

O Papa lembrou aos peregrinos que a viagem até Roma não termina no aeroporto — ela deve continuar como uma “peregrinação diária de discipulado”.

Ou seja, a rotina também pode ser sagrada, se nela soubermos escutar o Senhor no silêncio. Quando a vida parecer um canteiro de obras barulhento, lembre-se: Deus ainda fala — e fala ao seu coração. Basta a coragem de desligar, silenciar e escutar.


Do discurso do Papa Leão XIV

“Lembrem-se de que Deus criou cada um de vocês com um propósito e uma missão nesta vida.

Aproveitem esta oportunidade para escutar, para rezar, para que possam ouvir mais claramente a voz de Deus que os chama, lá no fundo do coração.

Às vezes esquecemos de escutar o nosso próprio coração — e é nele que Deus fala, que Ele nos chama e nos convida a conhecê-Lo melhor e a viver em Seu amor.

E através dessa escuta, vocês poderão se abrir para que a graça de Deus fortaleça sua fé em Jesus, para então partilharem esse dom com os outros.”

Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/07/15/o-papa-leao-nos-implora-a-fazer-uma-coisa-para-realmente-ouvir-deus/

Santa Sé pede regulamentação mais ampla da inteligência artificial

A secretária-geral do Governatorato do Estado da Cidade do Vaticano, irmã Raffaella Petrini, lidera a delegação da Santa Sé no Evento de Alto Nível WSIS+20 2025. | Evento de Alto Nível WSIS+20 2025

Por Victoria Cardiel

16 de julho de 2025

A secretária-geral do Governatorato do Estado da Cidade do Vaticano, irmã Raffaella Petrini, que lidera a delegação da Santa Sé no Evento de Alto Nível WSIS+20 2025, pediu uma “regulamentação mais ampla” da inteligência artificial (IA).

"Essa delegação está convencida de que iniciativas como essa podem ajudar a enfrentar alguns dos desafios inevitáveis impostos pela IA e pede uma regulamentação mais ampla e compartilhada que possa ajudar a proteger os aspectos éticos do uso da inteligência artificial internacionalmente", disse ontem a freira.

Seu apelo coincide com a mensagem enviada por Leão XIV por meio do secretário de Estado da Santa Sé, cardeal Pietro Parolin, para pedir uma regulamentação ética global da Inteligência Artificial nesse mesmo fórum.

O encontro na Suíça, organizado pela União Internacional de Telecomunicações (UIT) em Genebra, Suíça, que terminou na última sexta-feira (11), analisou tendências emergentes, como inteligência artificial e governança de dados, além de abordar as persistentes desigualdades no acesso à tecnologia.

O evento marcou o 20º aniversário da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI), plataforma patrocinada pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Em seu discurso, irmã Petrini falou sobre os riscos do uso indevido das tecnologias digitais e defendeu a necessidade de usá-las para o bem comum.

"O extraordinário potencial das tecnologias digitais pode trazer valor significativo em muitas áreas e se tornar uma ferramenta poderosa para promover a igualdade e a justiça", disse a freira.

No entanto, se mal utilizadas, "elas também podem fomentar conflitos e aumentar a desigualdade, especialmente em detrimento dos mais vulneráveis", disse a freira.

Assim, ela falou sobre a necessidade de avaliar os benefícios e riscos da IA conforme "elevados padrões éticos" que levem em conta "não só o bem-estar material, mas também as dimensões intelectual e espiritual da pessoa", salvaguardando sua dignidade.

Em seu discurso, a freira detalhou algumas das iniciativas empreendidas pela Santa Sé para orientar o uso dessa tecnologia em seu território, com cursos de educação continuada e a promulgação das Diretrizes sobre Inteligência Artificial da Santa Sé, em vigor a partir de 1º de janeiro de 2025.

Essas diretrizes, diz a freira, "promovem medidas concretas para garantir o desenvolvimento ético e o uso da inteligência artificial dentro do Estado da Cidade do Vaticano" e "fornecem uma estrutura que garante uma distribuição justa e sustentável dos frutos da IA, orientada para o bem comum".

A delegação da Santa Sé também tem o engenheiro Antonino Intersimone, diretor da diretoria de Telecomunicações e Sistemas de Informação do Governatorato; e Davide Giordano, membro da mesma diretoria e representante na Comissão da Santa Sé sobre Inteligência Artificial.

As conclusões dessa cúpula serão apresentadas à assembleia geral da ONU em Nova York em dezembro, com o objetivo de renovar o compromisso internacional com uma transformação digital a serviço do bem comum.

Desde sua primeira edição em Genebra, Suíça, em 2003, com foco no acesso à informação, e sua continuação em Túnis, Tunísia, em 2005, sobre governança da Internet e redução da exclusão digital, a CMSI tem refletido sobre a direção da era digital.

Um dos temas centrais do evento foi a iniciativa IA para o Bem, que destaca o papel da inteligência artificial como ferramenta fundamental para alcançar os objetivos da CMSI. A iniciativa promove padrões globais de IA e fomenta o diálogo entre as principais partes interessadas nos setores de tecnologia e política, com vistas a uma transformação digital ética e sustentável.

*Victoria Cardiel é jornalista especializada em temas de informação social e religiosa. Desde 2013, ela cobre o Vaticano para vários veículos, como a agência de noticias espanhola Europa Press, e o semanário Alfa y Omega, da arquidiocese de Madri (Espanha).

Fonte: https://www.acidigital.com/noticia/63649/santa-se-pede-regulamentacao-mais-ampla-da-inteligencia-artificial

DENTRO DO VATICANO: Dicastério para a Cultura e a Educação

Dicastério para a Cultura e a Educação: a missão é permear o mundo educativo e escolar com espírito evangélico (Vatican News)

O objetivo é evangelizar por meio do desenvolvimento de valores humanos e cristãos. Sua estrutura é dividida nas Seções "Cultura" e "Educação". Esses dois departamentos trabalham, dentro de suas respectivas competências, de forma integrada e coordenada.

Amedeo Lomonaco - Cidade do Vaticano

Que o mundo educativo e escolar seja permeado pelo espírito do Evangelho. Esta é a missão do Dicastério para a Cultura e a Educação que, como afirma a Constituição Apostólica Praedicate Evangelium, contribui "para a plena realização do seguimento de Jesus Cristo, opera em prol do desenvolvimento dos valores humanos nas pessoas no horizonte da antropologia cristã". As suas competências, portanto, giram em torno de duas áreas, um binômio crucial: cultura e educação.

O Dicastério é composto pela Seção para a Cultura, dedicada, entre outras coisas, “à animação pastoral e à valorização do patrimônio cultural”, e pela Seção para a Educação, “que desenvolve os princípios fundamentais da educação em relação às escolas, aos Institutos de estudos superiores e investigação católicos e eclesiásticos e é competente para tratar os recursos hierárquicos em tais matérias”. O prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação é o cardeal José Tolentino de Mendonça. Os secretários são monsenhor Paul Desmond Tighe e monsenhor Carlo Maria Polvani.

Notas históricas

O Dicastério para a Cultura e a Educação incorpora a anterior Congregação para a Educação Católica e o Pontifício Conselho para a Cultura.

Os primórdios da Congregação para a Educação Católica estão ligados à Idade Média. Com a Constituição Immensa Sixtus V, instituiu-se, em 1588, a Congregatio pro universitate studii romani para presidir os estudos da Universidade de Roma e de outras universidades de destaque. Leão XII, com a Constituição Quod divina sapientia de 1824, criou a Congregatio studiorum para as escolas do Estado Pontifício.

A origem do Pontifício Conselho para a Cultura remonta ao Concílio Vaticano II, que, entre tantas ênfases, indicou uma relevância sempre presente: a importância fundamental da cultura para o pleno desenvolvimento do homem.

Cultura

A Seção de Cultura promove e apoia as relações entre a Santa Sé e o mundo da cultura, atendendo às múltiplas demandas emergentes e incentivando o diálogo intercultural como ferramenta essencial para o encontro, a interação e o enriquecimento, para que aqueles que trabalham nas artes, na literatura, na ciência, na tecnologia e no esporte possam se reconhecer e, ao mesmo tempo, sentir-se reconhecidos pela Igreja como servidores da busca sincera da verdade, do bem e da beleza.

A Seção Cultura apoia, além disso, os processos de proteção, conservação e uso público do patrimônio histórico, artístico e cultural das realidades eclesiais, bem como a valorização e a proteção das culturas locais. Coordena a atividade das Academias Pontifícias, que incluem algumas das principais personalidades internacionais das ciências teológicas e humanísticas, escolhidas entre fiéis e não fiéis.

Educação

A Seção Educação promove a implementação dos princípios fundamentais da Educação Católica, a identidade católica das escolas e dos institutos de estudos superiores e o ensino da religião católica em escolas de todos os níveis e graus, e salvaguarda a integridade da fé católica no ensino doutrinal. Além disso, apoia e regula a criação e a colaboração de escolas e institutos de ensino superior católicos e eclesiásticos e suas associações, para o aprofundamento, segundo a verdade cristã, das disciplinas sagradas, dos estudos humanísticos e científicos.

A Seção de Educação também é responsável pela formação acadêmica de clérigos, membros de Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, leigos que se preparam para o serviço na Igreja, e é igualmente responsável pelos procedimentos necessários para o reconhecimento pelos Estados dos graus acadêmicos concedidos em nome da Santa Sé e pela emissão da nulla osta, exigida aos professores para o acesso ao ensino das disciplinas teológicas.

Uma Mostra promovida pelo Dicastério para a Cultura e a Educação (Vatican Media)

Entre espaços e projetos

Quer no campo da cultura como no da educação, o Dicastério acompanha os programas de ação das instituições nacionais e supranacionais competentes, por meio da participação em organizações e eventos internacionais e da organização de conferências especializadas. A missão do Dicastério também se traduz em garantir, por meio de pavilhões e espaços especiais, a presença da Santa Sé em exposições internacionais, como a Bienal de Veneza.

O Dicastério também é responsável pela promoção de diversos projetos. O "Global Compact on Education", em particular, é o convite lançado pelo Papa Francisco para uma aliança entre todos aqueles que trabalham no campo da educação e da cultura, a fim de mudar o mundo por meio da educação, da arte, do entretenimento, do esporte, etc., com um único horizonte: formar todos, especialmente as novas gerações, na fraternidade universal. Cultura e educação são, portanto, "os dois olhos" deste Dicastério. E são também duas lupas fundamentais com as quais a Igreja vê o mundo.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS: E então saímos para ver as estrelas e as listas (Parte 3/4)

Às portas da cidade de Dite | 30Giorni

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS

Arquivo 30Dias nº 05 - 2006

E então saímos para ver as estrelas e as listas

O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma docente da James Madison University da Virgínia.

de Giuliana Fazzion

Houve outras traduções melhores, como as de Cary e de Wright, mas eram traduções britânicas. A tradução de Longfellow era um tributo da América à genialidade do imortal florentino.

James Russell Lowell (1819-1891) herdou o lugar de Longfellow em 1855. Não ficou famoso por ter traduzido a Divina Comédia, mas é lembrado por ter escrito um ensaio muito importante sobre Dante. Em Harvard, era popular por seu curso sobre o poeta florentino. Em 1877, tornou-se ministro das Relações Exteriores e foi enviado à Espanha. Deixou o cargo de professor a outro colega e amigo, Charles Norton.

Norton (1827-1908), editor, professor de história da arte e grande amigo e admirador de Longfellow, tornou-se o novo professor de Dante em Harvard.

Sua paixão por Alighieri levou-o a entender intimamente o grande poeta e seu mundo. Sua grande sensibilidade à beleza artística, seu entusiasmo, que conseguia comunicar aos outros, lhe conquistaram muitos amigos e admiradores, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Inglaterra e na Itália, e seu nome se tornou familiar aos estudiosos de Dante europeus.

Norton trabalhou muito na fundação da “Dante Society” em Cambridge. No mês de fevereiro de 1881, houve uma reunião na casa de Longfellow, onde já se formara, em 1865, o círculo para a tradução de Dante. Lá se decidiu formar a sociedade da qual Longfellow foi eleito presidente. Mas, dois meses depois, em maio de 1882, Longfellow morreu e a presidência passou a Lowell. Em 1891, com a morte de Lowell, a presidência da sociedade passou a Norton, que a manteve até sua morte, em 1908.

Em 1887 a “Dante Society” de Cambridge instituiu o prêmio que seria entregue todos os anos “a estudantes ou recém-formados de Harvard para o me­lhor ensaio sobre temas dantescos”. Essa tradição existe até hoje.

As aspirações americanas a aprender tudo o que dizia respeito à Itália, à sua arte, à sua literatura, como dissemos, derivavam da Inglaterra. Mas, a partir de 1830, os americanos começaram a viajar e a descobrir a Itália. Nos consulados americanos das maiores cidades italianas não havia muito o que fazer, e por isso os cônsules passavam o tempo aprendendo a língua, a literatura, a arte, a história, e todas essas experiências eram reunidas em livros, diários, que depois o público americano lia com grande interesse.

Na Europa ocorria outro fenômeno, que contribuiu para o enriquecimento do conhecimento da literatura italiana nos Estados Unidos. Na época pós-napoleônica, o fracasso de diversos movimentos revolucionários impeliu muitos italianos de uma certa cultura a buscarem asilo nos Estados Unidos, onde sobreviviam ensinando a língua e a literatura italianas. Foi por meio desses canais que o povo americano conheceu a Itália, apreciou suas belezas naturais e artísticas e aprendeu sua grande história.

Florença e Roma eram cidades irresistíveis para os americanos. Jovens artistas americanos chegavam a Florença e alguns passavam lá o resto de suas vidas. O nome de Florença era inevitavelmente associado a Dante, e aqueles que estudavam seriamente a Divina Comédia estavam convencidos de que não poderiam entendê-la se não visitassem Florença.

Em todo o século XIX aparecem constantemente ensaios sobre Dante em revistas literárias americanas. Não fazem, porém, nenhuma referência à alegoria ou ao simbolismo, mas à história de sua cidade, ao itinerário romântico de seu amor, a suas aventuras políticas, ao seu exílio.

O interesse por Dante recebeu um grande impulso no período entre 1880 e 1890, que corresponde a um momento de grande avanço na cultura geral dos Estados Unidos. Isso se nota pelo grande número de publicações sobre Dante produzidas nesses dez anos. Mas duas coisas em particular são muito importantes: uma é que essas publicações vêm de centros como Chicago, St. Louis, St. Paul e Denver, e também do Sul e do Far West; a outra é a contribuição das escritoras americanas, que sempre tiveram um lugar importante na história cultural local, mas dessa vez colaboraram de modo bastante relevante para a fortuna do poeta florentino. E isso porque, antes de todos os outros estudiosos, elas encararam a filosofia de Dante. Merece ser lembrada a escritora Susan E. Blow, cujos artigos foram reunidos e publicados num livro intitulado A Study on Dante. Esse livro representa a primeira tentativa feita por um estudioso de Dante americano de analisar a estrutura da Divina Comédia com o propósito de descobrir detalhadamente o significado filosófico e espiritual da sua alegoria.

Com a aproximação do final do século XIX e do Romantismo, e com a vida americana influenciada pelas descobertas científicas, mudanças ocorreram também na literatura e nas artes. A nova tendência era o Realismo, e Dante, o herói do Romantismo, parecia fadado a perder inevitavelmente sua grande força de atração entre o grande público. Em vez disso, o estudo de Dante ganhou em intensidade e profundidade nos círculos intelectuais e nos institutos universitários de todo o país. Novos livros, escritos não mais por diletantes, mas por estudiosos de grande reputação, encontraram um público entusiasmado entre as classes intelectuais. Portanto, apesar das mudanças nas idéias e no gosto, Dante permaneceu em seu alto pedestal americano, no qual havia sido posto pelos três grandes de Cambridge e por seus sucessores.

Fonte: https://www.30giorni.it/

O exemplo de Santo Agostinho em relação à hospitalidade

Foto/Crédito: Vatican News.

"O bispo de Hipona dizia que seria um verdadeiro cristão quem reconhece o fato de ser estrangeiro também na sua casa e na sua pátria. A nossa pátria é lá no alto, porque lá não mais seremos hóspedes. O fato é que cada um de nós é hospede nesta terra também em sua própria casa. Sendo hóspede a pessoa irá embora algum dia deste mundo, de modo que vive a condição de hóspede. Se o deseja ou não, o fato é que a pessoa é um hóspede "

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá (PA)

Santo Agostinho viveu no Norte da África e atuou como Bispo de Hipona de 396 a 430. Foram mais de trinta anos na direção da Igreja de sua Diocese e também em toda a região, juntamente com outros bispos, sacerdotes e povo de Deus. Foi um dos grandes bispos na vida eclesial e social deixando para a Tradição uma série de obras muitos importantes, de muito valor seja para a Filosofia, seja para a Teologia. Vejamos a seguir o exemplo dele em relação à hospitalidade na qual acolheu com amor muitas pessoas em sua Diocese e casas de formação.

As pessoas que pedem alguma coisa

Santo Agostinho fez uma descrição das pessoas que pedem aos outros, coisas para melhor viver a sua vida. Quem são as pessoas que pedem? São seres humanos, pessoas frágeis, são pobres, iguais a nós. Eles são pessoas iguais daquelas que tem mais condições de vida que eles. Neles está presente o Senhor Jesus que se fez igual a nós em tudo, menos o pecado (cfr. Hb 4,15). As pessoas não levarão nada consigo de riquezas de modo que só a superação do orgulho contra o pobre e a caridade como dons, permanecem para sempre[1].

Estrangeiros neste mundo

Santo Agostinho afirmou que todas as pessoas neste mundo são estrangeiras as quais passam de uma forma rápida. É preciso reconhecer o valor da hospitalidade, graças a este caminho que leva as pessoas a alcançar a Deus. É fundamental acolher um hóspede do qual a pessoa é também companheiro de viagem ao longo do caminho pelo fato de que neste mundo todos são estrangeiros (cfr. 1 Pd 2,11)[2].

Verdadeiro cristão

 O bispo de Hipona dizia que seria um verdadeiro cristão quem reconhece o fato de ser estrangeiro também na sua casa e na sua pátria. A nossa pátria é lá no alto, porque lá não mais seremos hóspedes. O fato é que cada um de nós é hospede nesta terra também em sua própria casa. Sendo hóspede a pessoa irá embora algum dia deste mundo, de modo que vive a condição de hóspede. Se o deseja ou não, o fato é que a pessoa é um hóspede[3].

 A esperança de ver Cristo nas pessoas

 Santo Agostinho afirmou a importância de ver Cristo Jesus nas pessoas. Ele teve presente os dois discípulos de Emaús que tinham perdido a esperança em Cristo porque o tinham visto morto(cfr. Lc 24,13-24). Desta forma Ele teve que abrir para eles na suas mentes, o sentido das Escrituras para que Ele fosse reconhecido como o eterno vivente mas Ele deveria passar pela morte. Assim Ele teve que explicar desde Moisés, os profetas a afirmação que era necessário que Ele passasse na morte para Ele entrar na sua glória (cfr. Lc 24,26)[4].

Ao partir do pão

Jesus ressuscitado falou para os dois discípulos a respeito das Escrituras mas Ele ainda não tinha sido reconhecido no caminho, senão, no partir do pão. Desta forma é importante acolher os hóspedes, pois nestes acolhe-se Cristo Jesus. Será que não se acolhe Jesus nestas pessoas? É o próprio Senhor que diz: “Eu era estrangeiro e me acolheste” (Mt 25,35). Os justos dirão ao Senhor naquele momento quando é que eles o acolheram, o hospedaram? Ele, o Filho do Homem dirá: “Todas as vezes que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,38-40). O bispo de Hipona afirmou também que quando um cristão acolhe outro cristão, uma outra pessoa, acolhe-se a Cristo Jesus[5].

Nesta terra alimenta-se Jesus

Para Santo Agostinho o fato de alimentar alguma pessoa mais necessitada que a pessoa que tem mais condições, diz respeito a Jesus mesmo. A pessoa alimenta nesta terra Jesus. É também quando a pessoa dá de beber a Ele, o veste, quando está nu, o acolhe quando está estrangeiro, Ele é visitado quando está doente[6]. Desta forma percebemos nesta viagem Cristo Jesus na necessidade. Enquanto nós estivermos neste mundo, haverá os necessitados, e nestes, Ele chama a si todos os necessitados. Na outra vida não terá mais fome, sede, nudez, nem doença, nem migração, nem sofrimento[7].

O valor da misericórdia

Santo Agostinho falou do valor da misericórdia na vida do seguidor e da seguidora de Jesus Cristo e de sua Igreja. O que é a misericórdia? O bispo de Hipona disse que não é outra virtude senão que diz respeito à parte do coração tocada pela miséria. Ela é dita misericórdia por motivo do sofrimento provado diante de uma pessoa em estado de dificuldade, de miséria: ambos gritam a miséria e o coração. O fato é que quando a miséria dos outros toca o nosso coração, se fala de misericórdia[8].

 As boas obras

Santo Agostinho afirmava que todas as boas obras feitas neste mundo diziam respeito com a misericórdia. Quando por exemplo a pessoa ajuda com um pão ao faminto; ela ofereceu com amor aquele gesto, porque era um ser humano semelhante a pessoa. Quando a pessoa faz este gesto de oferecer o pão, a pessoa sofre com quem tem fome; se a pessoa der água, sofre com quem tem sede; se a pessoa ajuda com a roupa, vestido, sofre com quem é nu; se a pessoa acolhe um hóspede, sofre com o estrangeiro; se a pessoa visita o doente, sofre com ele; se a pessoa sepulta um morto, a pessoa chora sobre ele; se a pessoa reconduz à paz quem ama os conflitos, a pessoa sofre com quem é conflituoso. Estas obras se realizam pelo fato de que nós somos chamados a amar a Deus, ao próximo como a si mesmo. Estas boas obras tornam-nos bons cristãos, cristãs e um dia participantes do Reino dos céus[9].

Nós percebemos Santo Agostinho, bispo dos séculos IV e V, uma pessoa que seguiu a Jesus com fé, esperança e com caridade. Ele atuou em favor de todas as pessoas mas sobretudo com as pessoas mais necessitadas na família, na comunidade e na sociedade. Ele aludiu ao valor da hospitalidade, dom de Deus e responsabilidade humana para que a pessoa fosse acolhida neste mundo e um dia na eternidade.
____________

[1] Cfr. Discorsi 61,5-8 di Agostinho di Ippona. In: “Non dimenticate L´ospitalità”. Antologia dai Padri della Chiesa. Milano, Paoline, 2022, pgs. 181-183
[2] Cfr. Discorsi 111,4. In: Idem, pg. 184.
[3] Cfr. Idem, pg. 184.
[4] Cfr. Ibidem, pg. 184.
[5] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[6] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[7] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[8] Cfr. Il bene della misericordia di Santo Agostino. In: Ibidem, pg. 188.
[9] Cfr. Idem, pg. 188.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF