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terça-feira, 28 de abril de 2020

5 Santos que lutaram contra o demônio

O Triunfo do Gênio da Destruição (1878), de Mihály Zichy.

O mundo espiritual é real e nele ocorrem verdadeiros combates. Em algumas partes da bíblia são mencionadas as lutas que existem contra o demônio e a carne, porque quanto mais próxima a Deus a pessoa, mais será tentada.
Queremos mostrar alguns casos reais vivenciados por alguns santos, o objetivo destas histórias não e gerar medo, mas serve como advertência de que Satanás e as tentações ao pecado são reais, embora geralmente não sejam visíveis.
Antes queremos deixar duas passagens bíblicas para entender melhor o contexto: “Revesti-vos da armadura de Deus, para que possais resistir às ciladas do demônio. Pois não é contra homens de carne e sangue que temos de lutar, mas contra os principados e potestades, contra os príncipes deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal (espalhadas) nos ares. (Efesios.6, 11-12)
“Sede sóbrios e vigiai. Vosso adversário, o demônio, anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a quem devorar”. (1 Pedro 8)
 1) Santo Antão ‘o Grande’: “O leão rugia, desejando atacar”
Santo Antão exemplo de obediência e pobreza

Este santo viveu durante os séculos III e IV. Foi um dos primeiros monges a retirar-se ao deserto para viver entregue ao jejum e à oração. A Igreja conhece sua história graças ao seu biógrafo Santo Atanásio.
“Quando visitávamos Santo Antão nas ruínas onde vivia escutava tumulto, muitas vozes e o choque de armas. Também viam que durante a noite apareciam bestas selvagens e o santo combatia contra elas através da oração”, conta Atanásio.
Numa certa ocasião, aos seus 35 anos, Santo Antão decidiu passar a noite sozinho numa tumba abandonada. Então apareceu ali um grupo de demônios e o feriram. Os arranhões do demônio lhe impediram de levantar-se do chão. O ermitão comentava que a dor causada por essa tortura demoníaca não podia ser comparada com nenhuma ferida causada pelo homem.
No dia seguinte, um amigo seu o encontrou e o levou ao povoado mais próximo para curá-lo. Entretanto, quando o santo recuperou os sentidos pediu ao seu amigo que o levasse de volta à tumba. Ao deixá-lo, Santo Antão gritou: “Sou Antão e aqui estou. Não fugirei de suas chicotadas e nenhuma dor ou tortura me separará do amor de Cristo”. Santo Atanásio relata que os demônios retornaram e ocorreu o seguinte:
Escutou-se uma trovoada, parecia o barulho de um terremoto, que sacudiu o lugar inteiro e os demônios saíram das quatro paredes em formas monstruosas de animais e répteis. O lugar desta maneira ficou cheio de leões, ursos, leopardos, touros, serpentes, víboras, escorpiões e lobos. O leão rugia, querendo atacar; o touro se preparava para atacar com seus chifres; a serpente se arrastava procurando um lugar de ataque e o lobo rosnava ao redor dele. Todos estes sons eram assustadores.
Embora Santo Antão arquejasse de dor, enfrentou os demônios dizendo: “se vocês tivessem algum poder, bastava que somente um de vocês viesse, mas como Deus os criou fracos, vocês querem me assustar com a quantidade de demônios: e o que comprova a sua debilidade é que adotaram a forma de animais irracionais”.
“Se forem capazes, e se tiverem recebido um poder de ir contra mim, ataquem-me de uma vez. Mas se não são capazes, porque me perturbam em vão? Porque minha fé em Deus é meu refúgio e a muralha que me salva de vocês”.
De repente, o teto do lugar foi aberto e uma luz brilhante iluminou a tumba. Os demônios desapareceram e as dores pararam. Quando percebeu que Deus o salvou, ele rezou: “Onde estavas? Por que não apareceste desde o começo e me liberaste das dores? ”.
Deus respondeu-lhe: “Antão, eu estava ali, mas esperei para ver-te brigar. Vi como perseveraste na luta, e não caíste, sempre estarei disposto socorrer-te e o teu nome será conhecido em todas partes”.
Depois de escutar as palavras do Senhor, o monge se levantou e orou. Então recebeu tanta força que sentiu que no seu corpo tinha mais poder do que antes.
2) São Padre Pio: “Estes demônios nunca deixam de golpear-me”
São Pio de Pietrelcina, alívio para os sofrimentos de seus fiéis

Foi um sacerdote italiano que nasceu no final do século XIX e morreu em 1968. Embora realizasse muitos milagres e recebesse os estigmas, Padre Pio também sofreu ataques frequentes do demônio.
Segundo o Pe. Gabriele Amorth, famoso exorcista da diocese de Roma, “a grande e constante luta na vida do santo foi contra os inimigos de Deus e as almas, pois tratou de capturar sua alma”. Desde sua juventude o Padre Pio teve visões celestes, mas também sofreu ataques infernais. O Pe. Amorth explica:
“O demônio aparecia algumas vezes em forma de um gato negro e selvagem, ou de animais repugnantes: era clara a intenção de incutir o terror. Outras vezes aparecia na forma de jovens moças nuas e provocativas, que dançavam de modo obsceno; era clara a intenção de tentar o jovem sacerdote na sua castidade. Entretanto, o pior perigo era quando Satanás tentava enganar Padre Pio aparecendo como se fosse seu diretor espiritual ou aparecendo em forma de Jesus, da Virgem ou de São Francisco”.
Esta última estratégia, quando o diabo aparecia em forma de alguém bom e santo, era um problema. Isso aconteceu quando o Padre Pio percebeu que as visões eram falsas: notou certa timidez quando a Virgem e o Senhor lhe apareceram, seguida de uma sensação de paz quando a visão terminou. Além disso, disfarçado de uma forma sagrada, o diabo lhe provocou um sentimento de alegria e atração, mas quando ia embora, ele ficava triste e arrependido.
Satanás também buscava feri-lo fisicamente. O sacerdote descreveu estas dores em uma carta à um irmão, quem era seu confidente:
“Estes demônios nunca deixam de atacar-me, inclusive fazem com que eu caia da cama. Também rasgam minhas vestimentas para açoitar-me! Mas já não me assustam porque Jesus me ama e ele sempre me levanta e me coloca novamente na minha cama”.
O Padre Pio é testemunho de que se uma pessoa estiver perto de Deus não terá que temer a presença do demônio.
3) Santa Gema Galgani: “Suas garras brutais”
Santa Gemma Galgani, a Santa dos estigmas – Diocese de Santo André

Esta Santa italiana foi uma mística que teve experiências espirituais maravilhosas.
Numa carta dirigida a um sacerdote escreveu: “Durante dois dias, depois de receber a Santa Comunhão, Jesus me disse: “minha filha, em breve o diabo começará uma guerra contra ti”. Estas palavras são repetidas constantemente no meu coração. Reze por mim por favor”.
Ela percebeu que a oração era a melhor maneira de defender-se contra os ataques do demônio. Em vingança, Satanás lhe atacava com fortes dores de cabeça para impedir que durma. Entretanto, apesar das fadigas Gema perseverou na oração:
“Quantos esforços este miserável faz para que eu não reze. Ontem tentou me matar, e quase conseguiu, mas Jesus veio e me salvou. Estava assustada e mantive a imagem de Cristo na minha mente”.
Uma vez, enquanto a Santa escrevia uma carta, o diabo agarrou a caneta das suas mãos, rasgou o papel e tirou a santa da cadeira onde estava sentada, agarrando-a pelos cabelos com a violência das suas “garras ferozes”.
Ela descreve outro ataque em um dos seus escritos: “O demônio se apresentou diante de mim como um gigante e me dizia: ‘Para ti já não existe esperança de salvação. Estás nas minhas mãos! ’ Eu lhe respondi que Deus é misericordioso e, portanto, nada temo. Então me bateu na cabeça e me disse: ‘Maldita seja! ’, e logo desapareceu”.
“Quando voltei para minha habitação para descansar, encontrei novamente o demônio e começou a golpear-me com uma corda com vários nós, e queria que eu gritasse que era fraca. Disse-lhe que não, e me bateu tão forte, que caí de cabeça no chão. Naquele momento pensei em invocar a Jesus: Pai eterno, em nome do preciosíssimo sangue de Jesus, livrai-me! ”.
“Não me lembro bem o que aconteceu. A besta me arrastou da minha cama e bateu na minha cabeça com tanta força que ainda estou dolorida. Perdi os sentidos e caí no chão, logo despertei. Graças a Deus! ”
Apesar dos ataques, Santa Gemma sempre teve fé em Jesus. Inclusive utilizava o humor contra Satanás. Uma vez escreveu a um sacerdote: “Tinha que ver, quando satanás fugia fazendo caretas, você morreria de rir! É tão feio! Mas Jesus me disse que não deveria temer”.
4) São João Maria Batista Vianney: “Faz porque eu converto muitas almas para o bom Deus”
São João Maria Vianney, padroeiro dos sacerdotes

O Santo Padre de Ars nasceu na França no ano 1786. Foi um grande pregador, fazia muitas mortificações, foi um homem de oração e caridade. Tinha um dom especial para a confissão. Por isso, vinham pessoas de diferentes lugares para confessar-se com ele e escutar seus santos conselhos. Devido a seu frutífero trabalho pastoral foi nomeado padroeiro dos sacerdotes. Também combateu contra o maligno em várias ocasiões.
Uma vez, sua irmã passou a noite na sua casa, localizada ao lado da igreja. Durante a noite ela escutou raspões na parede. Foi ver o seu irmão Vianney, que estava confessando, e lhe explicou:
“Minha filha, não temas: é o resmungão. Ele não pode machucar-te. Ele me procura da maneira mais atormentadora possível. As vezes agarra os meus pés e me arrasta pelo quarto. Ele faz isto, porque eu converto muitas almas para o bom Deus”.
O demônio fazia ruídos durante horas, parecidos aos cristais, assobios e relinchos. Inclusive ficava sob a janela do santo de Ars e gritava. Seu propósito era não deixar que o sacerdote dormisse, para ficar cansado e não ficar horas no confessionário, onde salvava muitas almas das garras do maligno.
Em outra ocasião, enquanto o sacerdote de Ars se preparava para celebrar a missa, um homem lhe disse que seu dormitório estava pegando fogo. Qual foi sua resposta? “O Resmungão está furioso. Quando não consegue pegar o pássaro, ele queima a sua gaiola”. Entregou a chave para aqueles que iam ajudar a apagar o fogo. Sabia que Satanás queria impedir a missa e não o permitiu.
Deus premiou sua perseverança diante das provações com um poder extraordinário que lhe permitia expulsar demônios das pessoas possuídas.
5) Santa Teresa de Jesus: “Seus chifres estavam ao redor do pescoço do sacerdote enquanto celebrava missa”
Duas cartas manuscritas de Santa Teresa de Jesus são recuperadas ...

Esta reconhecida doutora da Igreja e mística teve muitas visões espirituais. Durante suas orações e meditações, o demônio lhe aparecia.
“Uma forma abominável”, escrevia, “sua boca era horrorosa”. “Não tinha sombra, mas estava coberto pelas chamas de fogo”.
O demônio lhe causava também fortes dores corporais. Numa ocasião a atormentou durante cinco horas enquanto estava em oração com suas irmãs. A Santa permaneceu firme para não assustá-las.
Um dia “viu com os olhos da alma dois diabos que tinham seus chifres ao redor do pescoço do sacerdote enquanto celebrava missa”.
Inclusive para ela, estas visões eram estranhas. “Poucas vezes vi o demônio em forma corporal, frequentemente não vejo sua aparência física, mas sei que está presente.
Quais eram suas armas contra as forças do mal?
A oração, a humildade e a água bendita. Santa Teresa dizia que esta última era uma arma eficaz.
Uma vez estava num oratório e o demônio apareceu ao meu lado esquerdo. Ele me disse que agora me livrei das suas mãos, mas que ele me capturaria novamente. Ela se assustou e se benzeu. Entretanto, Satanás continuou perturbando-a e Teresa tomou um frasco de água benta e derramou a água sobre ele. Depois desse dia ele nunca mais voltou.
Fonte: ChurchPOP
Bíblia Católica News

Carta do Papa Francisco aos fiéis pelo mês de maio

O Papa Francisco. Foto: Vatican Media
Vaticano, 27 Abr. 20 / 09:30 am (ACI).- O Papa Francisco publicou neste sábado, 25 de abril, uma carta dirigida a todos os fiéis por ocasião do mês de maio, mês especialmente dedicado a Nossa Senhora, na qual convida as famílias a rezarem o Terço em casa durante a atual pandemia de coronavírus.
A seguir, a carta completa do Papa Francisco: 
Queridos irmãos e irmãs!
Já está próximo o Mês de Maio, no qual o povo de Deus manifesta de forma particularmente intensa o seu amor e devoção à Virgem Maria. Neste mês, é tradição rezar o Terço em casa, com a família; dimensão esta – a doméstica –, que as restrições da pandemia nos «forçaram» a valorizar, inclusive do ponto de vista espiritual.
Por isso, pensei propor-vos a todos que volteis a descobrir a beleza de rezar o Terço em casa, no mês de maio. Podeis fazê-lo juntos ou individualmente: decidi vós de acordo com as situações, valorizando ambas as possibilidades. Seja como for, há um segredo para bem o fazer: a simplicidade; e é fácil encontrar, mesmo na internet, bons esquemas para seguir na sua recitação.
Além disso, ofereço-vos os textos de duas orações a Nossa Senhora, que podereis rezar no fim do Terço; eu mesmo as rezarei no Mês de Maio, unido espiritualmente convosco. Junto-as a esta Carta, para que assim fiquem à disposição de todos.
Queridos irmãos e irmãs, a contemplação do rosto de Cristo, juntamente com o coração de Maria, nossa Mãe, tornar-nos-á ainda mais unidos como família espiritual e ajudar-nos-á a superar esta prova. Eu rezarei por vós, especialmente pelos que mais sofrem, e vós, por favor, rezai por mim. Agradeço-vos e de coração vos abençoo.
Roma, São João de Latrão, na Festa de São Marcos Evangelista, 25 de abril de 2020.
 Francisco
ACI Digital

Filioque: Pais da Igreja, Papas e Concílios (Parte I)


Apologética

Esta postagem é uma resposta aos três questionamentos seguintes do parágrafo quinto do livro “Mystagogy”, de Fócio o Grande:
  • “Quem de nossos sagrados e renomados Pais disse que o Espírito procede do Filho? Algum sínodo, reconhecido como ecumênico, proclamou-o? Qual assembleia de sacerdotes e bispos, inspirada por Deus, firmou esse entendimento?”.
1. FÓCIO E A TRADIÇÃO DOS PAIS DA IGREJA
Os Padres latinos, de modo unânime, ensinam o Filioque no sentido de uma processão hipostática; o ensinamento deles não se restringe, como sustenta Perry Robinson, a uma processão energética. Como os Padres gregos poderiam ter sustentado um entendimento sobre a processão do Espírito Santo antitético ao entendimento unânime dos Padres latinos que abertamente professavam o Filioque, com quem eles estiveram em comunhão por séculos e a quem a Ortodoxia venera como santos? O ensinamento da Igreja Católica, diverso do da Igreja Ortodoxa oriental, faz justiça aos Padres gregos e latinos. Deveríamos esperar algo diferente de uma Igreja que segue o ensino de Fócio, que, apesar de suas grandes virtudes e erudição, não compreendia o ocidente, desconhecia o latim e falhou em expressar a tradição verdadeiramente católica, pois não incluiu os latinos, São João de Damasco e santos antenicenos entre os Padres da Igreja? Aquilo a que vamos nos referir como monopatrismo fociano aparece, primeiramente, não em algum escritor ortodoxo, mas na obra do bispo nestoriano Teodoro de Mopsuéstia, um arqui-herético da escola antioquena, cujos escritos e cuja pessoa foram condenados pelo quinto Concílio Ecumênico (Segundo Concílio de Constantinopla) em 553.
2. DANDO SENTIDO À “PROCESSÃO HIPOSTÁTICA”
Os ortodoxos não têm preservado o verdadeiro entendimento sobre a processão do Espírito Santo desde que o que iniciou como uma disputa acerca da má compreensão de palavras se tornou uma teologia rígida e incompatível com o sagrado dogma católico de que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho; o ortodoxo, agora, no máximo concederá, seguindo o Patriarca Gregório II, o Cipriota de Constantinopla, que a υπόστασις (hypostasis) manifesta-se, eternamente, energeticamente através da υπόστασις do Filho. Os ortodoxos mantêm a posição patristicamente impossível de que o Pai e o Filho, juntos, não infundem a hypostasis do Espírito Santo. O filioque é necessário para fins de explicar inteiramente a distinção entre a pessoa do Filho e a pessoa do Espírito Santo, para preservar a correta τάξις (ordem). As Pessoas da Trindade distinguem-se pelas relações de origem, como o Patriarca São Gregório Nazianzo, o grande teólogo de Constantinopla, e o bispo São Gregório de Nissa ensinam. Já que o Espírito Santo é υπόστασις e dado que Ele de algum modo procede do Pai, Ele deve proceder como υπόστασις do Filho, ou seja, Sua υπόστασις é do Filho. Em outras palavras, a υπόστασις procede (é) do Filho eternamente, mas a fonte primordial/não gerada de Sua hypostasis divina é o Pai somente, pois o Pai somente é a πηγή (fonte) e a αἰτία (causa) da divindade (não gerada). O Espírito Santo recebe do Filho o ser e a oυσία (ousia = essência) do Pai, o que o Filho recebe como Unigênito.
3. OS DIFERENTES SENTIDOS DE “PROCESSÃO”
Os ortodoxos interpretam erroneamente as declarações acerca da μοναρχία (monarquia) do Pai, única πηγαία Θεότης (fonte da Divindade), para excluir o filioque. O Conselho Pontifício para Promoção da Unidade dos Cristãos salienta que o filioque não lida com a εκπόρευσις (ekporeusis) do Espírito Santo do Pai como o único ἀρχὴ-ἄναρχος (archê-anarchos = princípio sem princípio) e πηγή (peghe = fonte) da Divindade, mas revela a processão (em grego, το προείναι = proienai; em latim, processio) do Espírito Santo em comunhão consubstancial do Pai e do Filho, isto é, a comunicação da divindade consubstancial do Pai para o Filho e do Pai διά (através) e σύν (com) o Filho para o Espírito Santo. Essa processão não está contida na declaração dos Padres gregos – e.g., São Gregório, o Taumaturgo de Neocesareia, e o monge São João Damasceno – de que o Espírito Santo é a Imagem do Filho? Como pode uma pessoa divina compartilhar a essência de uma pessoa divina que (1) não tem existência Dele ou (2) que não é de Quem Ele tem existência?
4. COMPLEMENTO ÀS FÓRMULAS GREGAS E LATINAS
“A partir do Filho” e “Através do Filho” são diferentes modos de expressar a verdadeira doutrina da processão do Espírito Santo. Poucos Padres utilizaram as fórmulas de maneira intercambiável (e.g., Santo Hilário de Poitiers e São Cirilo de Alexandria). De acordo com o Catecismo da Igreja Católica, §248, a fórmula grega expressa diretamente a ordem de acordo com a qual o Pai e o Filho são o único princípio do Espírito Santo e indica Sua igualdade enquanto princípio. A fórmula latina expressa diretamente a igualdade do Pai e do Filho enquanto princípio e indica a ordem. Os grandes Doutores e Padres bizantinos não tinham reservas a estarem em comunhão com os Doutores e Padres latinos que aberta e dogmaticamente professavam o filioque. As fórmulas, portanto, são complementares, não contraditórias.
Veritatis Splendor

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Nova datação do Novo Testamento (Parte 8/11): a Epístola aos Hebreus


Bíblia - Tradição - Magistério

8. A EPÍSTOLA AOS HEBREUS
Apresentarei agora o Capítulo 8 (“A Epístola aos Hebreus”):
  • “Fora as profecias da queda de Jerusalém nos Evangelhos Sinóticos, não há nenhuma outra peça da literatura do Novo Testamento que relvele tão agudamente sua relação com os eventos do ano 70 quanto a Epístola aos Hebreus (…) Todo a temática de Hebreus é a superação final, por Cristo, do sistema levítico, seu sacerdócio e seus sacrifícios. A destruição do Santuário, que levou este sistema fisicamente ao seu fim, deveria seguramente – se tivesse ocorrido – ter deixado a sua marca em algum lugar. É geralmente aceito que não há tal referência ou alusão e, no entanto, a Epístola aos Hebreus está entre aqueles livros do Novo Testamento regularmente redigidos (…) ‘sob Domiciano'” (p.200).
Robinson aponta ironicamente que muitos exegetas apontam a composição dos Evangelhos Sinóticos para depois do ano 70, explicando assim suas profecias sobre a queda de Jerusalém, enquanto que, no caso de Hebreus, fazem o mesmo ao explicar seu silêncio sobre essa queda. “Se der cara, eu ganho; se der coroa, você perde”
Em relação a este ponto, consideremos apenas um texto de Hebreus:
  • “Com efeito, a Lei – ao não ser nada mais que a sombra dos bens futuros, não a própria realidade das coisas – com os sacrifícios repetidos ano após ano, de forma ininterrupta, é incapaz de tornar perfeitos aqueles que se aproximam de Deus; do contrário, não teriam mais oferecido esses sacrifícios, porque os que participam deles, ao ficarem purificados de uma vez para sempre, já não teriam consciência de nenhum pecado. Pelo contrário, estes sacrifícios renovam a cada ano a recordação do pecado, porque é impossível que o sangue de touros e bodes apague os pecados” (Hebreus 10,1-4).
Se os sacrifícios do Templo de Jerusalém tivessem cessado antes destas palavras terem sido escritas, elas mui dificilmente teriam ficado assim como estão, sem modificação ou comentário, porque o fim do antigo culto teria evidenciado tudo aquilo que o autor de Hebreus tenta provar. Ao contrário, a Epístola de Barnabé (16,4), também focada no tema da relação entre o Cristianismo e os ritos judeus, afirma explicitamente que o Templo foi destruído pelos romanos como consequência da rebelião judaica.
Diferentemente de outros estudiosos, Robinson se pronuncia a favor da integridade da Epístola aos Hebreus:
  • “No caso de Hebreus 13, não há o mínimo sinal na tradição manuscrita de que originalmente não pertencesse ao resto. E ainda que o nível do escrito seja, naturalmente, diferente ao se mover de um sermão para uma correspondência, não há evidência de mudança de estilo. Kümmel disse sumariamente: ‘Nada sugere a adição de uma conclusão por outra mão'” (pp.205-206).
Hebreus 13,24 oferece a chave da localização dos destinatários da epístola: “Os da Itália vos saúdam”. Alguns interpretam isto como uma saudação feita a partir da Itália, mas Robinson rejeita esta interpretação:
  • “Em uma carta, digamos, de Londres para uma congregação no exterior, dificilmente seria natural escrevermos ‘os da Inglaterra’ (isto é, todos os ingleses) enviam suas saudações. Seria mais natural que, em uma carta dirigida a Londres, os ingleses que estão com o escritor se unissem para expressar o seu amor àqueles que permanecem na pátria” (p.206).
Esta é uma das razões que fazem Robinson pensar que a epístola foi dirigida a um grupo de judeus-cristãos dentro da Igreja de Roma, no final dos anos 60. Seriam pessoas ricas (cf. Hebreus 10,34) e com forte sentido empresarial. Provavelmente por isso, Hebreus emprega amplamente metáforas extraídas da linguagem comercial.
A grande severidade de certas passagens (como 6,4-6; 10,26-31; 12,15-29) é somente explicável em circunstâncias de perseguição, que envolviam traição ou apostasia dos cristãos. Segundo Robinson, a única situação anterior ao ano 70 que se encaixa com esta evidência é a perseguição de Nero aos cristãos de Roma. Hebreus 13,7 (“Lembrai-vos daqueles que vos dirigiam, porque eles vos anunciaram a Palavra de Deus; considerai como terminaram sua vida e imitai sua fé”) pode ser uma referência aos martírios de São Pedro e São Paulo sob o reinado de Nero.
Hebreus 12,4 (“Depois de tudo, na luta contra o pecado, não resististes ainda a ponto de derramar sangue”) leva a pensar que o grupo a quem se dirige a carta ainda não gerou mártires. Provavelmente esse grupo se manteve à margem enquanto outros cristãos eram perseguidos. Por isso, o autor de Hebreus lhes recorda o dever de solidariedade: “Recordai-vos daqueles que estão presos, como se vós estivésseis com eles; e dos que são maltratados, como se vós estivésseis num mesmo corpo” (13,3).
Quanto a Hebreus 10,32-34 (“Recordai dos primeiros tempos: mal tinham sido iluminados e já precisaram suportar um rude e doloroso combate, algumas vezes expostos publicamente a injúrias e abusos, e outros, solidarizando-se com os que eram assim tratados. Vós compartilhastes então dos sofrimentos dos que estavam no cárcere e aceitaram com alegria que lhes despojassem dos bens, sabendo que possuíam uma riqueza melhor e permanente”), Robinson pensa que poderia muito bem descrever a expulsão dos judeus de Roma no ano 49.
Por outro lado, Robinson pensa que Hebreus 6,6 (“e apesar de tudo recaíram, sendo impossível renová-los novamente, elevando-os à conversão, já que eles deliberadamente voltam a crucificar o Filho de Deus e o expõem à ironia de todos”), da mesma forma que João 13,36 e 21,18, poderia refletir a conhecida tradição do “Quo Vadis?”
Como, segundo Robinson, Hebreus reflete as mortes de Pedro e Paulo, mas não o alívio trazido pelo suicídio de Nero, em junho do ano 68, ele tenta fixar a data de composição de Hebreus no ano 67.
Sobre a questão da autoria, Robinson se inclina a dar crédito a Tertuliano, que atribuiu a Barnabé a Epístola aos Hebreus. Esta hipótese tem muitos pontos a favor: Barnabé pertenceu ao círculo paulino; era um Apóstolo suficientemente conhecido pelos judeus-cristãos de Roma, a ponto de não precisar de uma apresentação pessoal; não era um dos Doze Apóstolos, mas pertencia à mesma geração, tendo convivido com eles e deles recebido seus ensinamentos; e se destacou no gênero da exortação moral, a que corresponde a Epístola aos Hebreus: em 13,22, o hagiógrafo se refere à sua Epístola como “estas palavras de exortação”, enquanto que em Atos 4,36 nos diz que “Barnabé” (que significa “filho da exortação”) foi o sobrenome dado pelos Apóstolos a José, um levita nascido no Chipre. Como quer que seja, a data e a ocasião da Epístola aos Hebreus são independentes das hipóteses sobre a sua autoria.
Veritatis Splendor

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF