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sábado, 26 de julho de 2025

EDITORIAL: O Estado da Palestina e a responsabilidade da comunidade internacional

Assembleia Geral das Nações Unidas  (ANSA)

Há 25 anos, a Santa Sé assinou um primeiro acordo básico com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP). Dez anos depois, assinou um Acordo Global com o Estado da Palestina, que entrou em vigor em janeiro de 2016.

Andrea Tornielli

O presidente Emmanuel Macron anunciou que a França reconhecerá o Estado da Palestina e que o anúncio solene será feito durante a Assembleia Geral das Nações Unidas em setembro próximo. Enquanto isso, trabalha-se na organização da “Conferência Internacional de Alto Nível para a Solução Pacífica da Questão Palestina e a Implementação da Solução de Dois Estados”, que deveria ter sido realizada na sede da ONU em Nova York em junho passado, sob a direção dos governos da França e da Arábia Saudita, mas foi adiada devido ao ataque israelense ao Irã.

O drama que se vive em Gaza, os repetidos massacres de dezenas de milhares de civis inocentes que perderam a vida sob as bombas e que agora morrem de fome e de privações, ou são atingidos enquanto tentam obter um pouco de comida, deveria tornar evidente aos olhos de todos como é urgente parar os ataques militares que provocam uma carnificina e, ao mesmo tempo, como se tornou imprescindível uma solução para a questão palestina. Solução que a Santa Sé invoca constantemente há décadas e que nunca poderá acontecer sem a contribuição efetiva da comunidade internacional, além dos países diretamente envolvidos.

É útil recordar, a este respeito, que a Santa Sé já havia assinado, há 25 anos, um primeiro acordo básico com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP). Dez anos depois, assinou um Acordo Global com o Estado da Palestina, que entrou em vigor em janeiro de 2016. Uma decisão e um reconhecimento em linha com a preocupação expressa pelos Pontífices desde 1948 pela situação dos Lugares Santos e pelo destino dos palestinos. Paulo VI foi o primeiro Papa a afirmar explicitamente que eles eram e são um povo, e não apenas um grupo de refugiados de guerra. Na mensagem de Natal de 1975, o Papa Montini pedia aos filhos do povo judeu, que viam agora consolidado o seu Estado soberano de Israel, que “reconhecessem os direitos e as legítimas aspirações de outro povo que também sofreu durante muito tempo, o povo palestino”.

No início dos anos 90, João Paulo II estabeleceu relações tanto com o Estado de Israel (1993) quanto com a OLP (1994), num momento em que parecia que as partes estavam próximas de um acordo e do reconhecimento dos dois Estados. Em fevereiro de 2000, alguns meses antes da entrada do primeiro-ministro israelense Ariel Sharon na Esplanada das Mesquitas, que deu início à segunda Intifada, a Santa Sé assinou o já mencionado acordo básico com a OLP. Ao chegar a Belém, em março de 2000, João Paulo II disse: “a Santa Sé sempre reconheceu que o povo palestino tem o direito natural de ter uma pátria e o direito de viver em paz e tranquilidade com os outros povos desta região. Em nível internacional, os meus predecessores e eu proclamámos repetidamente que não seria possível pôr fim ao triste conflito na Terra Santa sem garantias sólidas dos direitos de todos os povos envolvidos, com base no direito internacional e nas importantes resoluções e declarações das Nações Unidas”.

Nove anos depois, Bento XVI, durante sua visita à Terra Santa, reiterou: “que seja universalmente reconhecido que o Estado de Israel tem o direito de existir e de gozar de paz e segurança dentro de fronteiras internacionalmente reconhecidas. Que seja igualmente reconhecido que o povo palestino tem direito a uma pátria independente e soberana, a viver com dignidade e a viajar livremente. Que a “solução de dois Estados” se torne realidade e não permaneça um sonho”. Em 2012, a Santa Sé deu seu apoio à admissão do “Estado da Palestina” como membro observador nas Nações Unidas.

O Papa Francisco, durante a viagem à Terra Santa em maio de 2014, repetiu diante do presidente palestino Mahmoud Abbas: “chegou o momento de todos terem a coragem da generosidade e da criatividade a serviço do bem, a coragem da paz, que se baseia no reconhecimento por parte de todos do direito de dois Estados a existirem e a gozarem de paz e segurança dentro de fronteiras internacionalmente reconhecidas”. E, pela primeira vez, referiu-se ao país que o acolhia como “Estado da Palestina”.

Assim se chegou ao Acordo Global entre a Santa Sé e o Estado da Palestina, de junho de 2015, que insiste na solução de dois Estados já contemplada na resolução 181 da ONU de novembro de 1947. O preâmbulo do Acordo, através de uma referência ao direito internacional, enquadra alguns pontos-chave, entre os quais: a autodeterminação do povo palestino, o objetivo da solução de dois Estados, o significado não apenas simbólico de Jerusalém e seu caráter sagrado para judeus, cristãos e muçulmanos, seu valor religioso e cultural universal como tesouro para toda a humanidade. No preâmbulo, é reafirmado o direito do povo palestino “à liberdade, à segurança e à dignidade num Estado independente próprio”, um “Estado da Palestina independente, soberano, democrático e viável, com base nas fronteiras anteriores a 1967, na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, e na Faixa de Gaza, que viva lado a lado em paz e segurança com todos os seus vizinhos”.

Recordando o Acordo Básico com a OLP de 2000, o Acordo Global renovava o pedido de uma “solução justa para a questão de Jerusalém, baseada nas resoluções internacionais”, afirmando que “decisões e ações unilaterais que alteram o caráter e o status específicos de Jerusalém são moral e legalmente inaceitáveis” e que “qualquer medida unilateral ilegal, de qualquer tipo, é nula e sem efeito” e “constitui um obstáculo à busca da paz”.

Este breve "excursus" atesta a linearidade e o realismo da posição contida nos apelos dos últimos Pontífices, nas declarações da Santa Sé às Nações Unidas e nos acordos assinados até hoje. Imediatamente após o ataque terrorista desumano perpetrado pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, o Papa Francisco condenou o massacre e pediu publicamente, por várias vezes, a libertação de todos os reféns. Ao mesmo tempo, reconhecendo o direito de Israel de se defender, a Santa Sé pediu repetidamente – em vão –, que não fosse atingido indiscriminadamente todo o povo palestino presente na Faixa, assim como pediu que fossem interrompidos os ataques dos colonos contra a população palestina que vive nos territórios do Estado da Palestina, comumente indicados como Cisjordânia. Infelizmente, isso não aconteceu: em Gaza, e não apenas em Gaza, assistimos a ataques que não podem ter qualquer justificação e representam um massacre que pesa na consciência de todos.

Como disse de forma clara e inequívoca Leão XIV no Angelus de domingo, 20 de julho, é urgente e necessário “observar o direito humanitário” e “respeitar a obrigação de proteger os civis, bem como a proibição da punição coletiva, do uso indiscriminado da força e do deslocamento forçado da população”. A comunidade internacional não pode continuar assistindo passivamente ao massacre em curso. Esperamos que a Conferência Internacional de Alto Nível para a Solução Pacífica da Questão Palestina e a Implementação da Solução de Dois Estados, compreendendo a urgência de uma resposta comum ao drama dos palestinos, prossiga com determinação em busca de uma solução que garanta finalmente a esse povo um Estado com fronteiras seguras, respeitadas e reconhecidas.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

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