O Concílio disse que o Filho é Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado não criado, é da mesma substância do Pai.
Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.
O ano 2025 lembra os 1700 anos de Nicéia realizado em 325 em
um grande Concílio, convocado pelo Imperador Constantino, onde foi reafirmada a
divindade do Filho, diante da negação ariana que o Filho não fosse Deus. O
Concílio disse que o Filho é Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado não
criado, é da mesma substância do Pai. A doutrina ariana foi condenada pelos 300
bispos reunidos provenientes das diversas partes do Império, mas, sobretudo do
Oriente, tendo presentes a unidade do Pai com o Filho e do Filho com o Pai e o
Espírito Santo. Vejamos a seguir a visão em Santo Agostinho, bispo dos séculos
IV e V em Hipona no Norte da África, a forma como ele desenvolveu a unidade
entre as duas Pessoas divinas que reflete a unidade com o Concílio de Nicéia em
325.
O Pai mostra ao Filho as coisas feitas
O Bispo de Hipona teve como ponto fundamental o capítulo
5,19-26 de São João onde fala que o Pai mostra ao Filho tudo o que o Pai
faz(cfr. Jo 5,19). A verdade é que o Pai faz tudo pelo Filho, por meio dele.
Isto significa que o Pai mostra as suas obras ao Filho, antes de fazê-las.
Desta forma, o Pai não faz nada sem o Filho, visto que o Filho de Deus é o
Verbo de Deus e que “tudo foi feito por Ele (cfr. Jo 1,3)[1].
O Pai irá mostrar obras maiores
O Evangelista São João diz em seguida pela boca de Jesus que
o Pai mostrar-lhe-á obras maiores do que estas (cfr. Jo 5,20). O texto está em
unidade do milagre, sinal do Senhor, daquela pessoa que foi curada por Jesus,
de uma doença havia trinta oito anos de sofrimento. Sem dúvida tratava-se das
curas de doenças corporais e outras maiores. O Pai mostrará as obras para que
as pessoas fiquem na admiração. É um linguajar que exige fé na Palavra de
Jesus, como o Pai mostra, por assim dizer, temporalmente, certas obras ao Filho
que é coeterno a Ele e sabe tudo o que é que está no Pai[2].
O Pai ressuscita mortos: O Filho também ressuscita mortos
Jesus disse “Como o Pai ressuscita mortos e dá-lhes a vida,
assim também o Filho dá a vida aos que quer” (Jo 5,21). A obra maior é
ressuscitar os mortos, feita pelo Pai e também feita pelo Filho. O fato é que o
Filho dá a vida aquelas mesmas pessoas a quem o Pai a dá, lhes concede, visto
que não faz obras diferentes do Pai, de modo que o Filho faz as mesmas obras
que o Pai faz[3].
Dar a vida
Para Santo Agostinho, dado que provem do Evangelho do
Senhor, o Filho dá a vida aos que quer, assim como o Pai dá a vida aos que quer
(cfr. Jo 5,21). Nestas afirmações entendem-se que tanto o poder do Filho como a
vontade do Pai são os mesmos. Em seguida vem a afirmação do Filho que “O Pai
não julga ninguém, mas entregou o julgamento ao Filho, para que todos honrem o
Filho como honram ao Pai” (Jo 5, 22-23)[4]. Santo Agostinho também afirmou que
é impossível alguma pessoa honrar o Pai sem o Filho, porque o Pai está no Filho
e o Filho está no Pai, e também pelo fato de que o Pai é assim chamado porque
tem o Filho e o Filho é assim chamado porque tem o Pai[5]. A honra dada ao
Filho não é menor daquela dada ao Pai, porque as duas Pessoas divinas merecem o
mesmo louvor e glória de modo que o julgamento dado ao Pai é concedido ao
Filho. Este argumento era visível no arianismo, pela negação divina do Filho,
mas foi condenado em Nicéia, de modo que para Santo Agostinho que estava a
favor do Concílio, o Filho está na mesma linha de eternidade do Pai e do
Espírito Santo.
A unidade do Pai e do Filho
O bispo de Hipona afirmou a unidade do Pai e do Filho. “Quem
escuta a palavra de Jesus e crê n’Aquele que o enviou, possui a vida eterna e
não vai a julgamento, mas passou da morte para a vida” (cfr. Jo 5,24). A
unidade é perfeita, é eterna entre o Pai e o Filho de modo que a pessoa que
escuta a palavra de Jesus está em comunhão com a palavra do Pai, não existindo
entre as duas Pessoas divinas nenhuma separação, mas somente unidade. O ponto
fundamental é dado neste sentido de que crer n’Aquele que o enviou, o Pai, crê
no Filho, pois o Filho é a Palavra, o Verbo do Pai (cfr. Jo 1,1)[6].
A ressurreição para a vida eterna
Jesus na sua condição de ser humano e divino afirmou que vem
a hora e é agora (cfr, Jo 5,25) de que os mortos passarão da morte para a vida
eterna. O poder de Jesus que é o mesmo do Pai fará a ressurreição dos mortos,
das pessoas que viverem em unidade com o Senhor, com a Igreja, com as pessoas,
ressuscitarem no fim do mundo[7]. A afirmação de Jesus de que vem a hora e é
agora se referia à ressurreição dos mortos em que os ressuscitados viverão
eternamente, ponto que se há de realizar na última hora[8], sendo o mesmo dom,
a ressurreição que o Senhor dará aos seus seguidores e seguidoras,
missionários, missionárias.
A vida em si mesmo do Pai também concedida ao Filho
A vida, o grande dom de Deus dado à humanidade, proveniente
do Pai é concedida também ao Filho. “Com efeito, como o Pai possui a vida em Si
mesmo, assim também Ele dá ao Filho ter a vida em Si mesmo” (Jo 5,26). O Filho
não tem a vida proveniente de fora, mas em Si mesmo: seu ato de viver reside no
Pai, não sendo alheio a Ele, não possuindo a vida por empréstimo, nem recebe
como participação da vida, e de uma vida que não fosse o que Ele mesmo é, mas
Ele possui a vida em Si mesmo, de modo que Ele mesmo é, para Si, a própria
vida[9]. Para Santo Agostinho a prova máxima da igualdade do Pai para com o
Filho e do Filho para com o Pai, está na afirmação de “Como o Pai possui a vida
em Si mesmo, assim Ele deu ao Filho ter a vida em Si mesmo” (Jo 5,26), de modo
que a vida é dada nas duas Pessoas divinas de o Pai ter a vida em Si mesmo, sem
que ninguém Lha tenha dado, e o Filho ter em Si mesmo a vida que o Pai Lhe
deu[10], não existindo nenhuma subordinação mas a sua plena igualdade entre as
duas Pessoas divinas.
Santo Agostinho foi um fiel seguidor do Concílio de Nicéia
colocando a comunhão das Pessoas divinas sobre o mesmo plano, afirmando a
Unidade e a Trindade, não sendo três deuses, mas um único Deus em três Pessoas.
Como o arianismo negava a divindade do Filho na eternidade, era preciso afirmar
a sua plena comunhão de substância com o Pai, sendo Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado não criado. Nós professamos a nossa fé em Deus Uno e Trino.
Pelos sacramentos da Iniciação à vida Cristã, somos nós chamados a viver em
comunhão em nossas comunidades, famílias, paróquias, Dioceses, para que o
mistério de Deus Uno Trino seja louvado e amado através das obras boas que
fizermos, sobretudo aos mais necessitados a fim de que um dia vivamos na plena
comunhão com a comunidade dos santos e das santas e com o Deus Uno e Trino.
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[1] Cfr. Comentários a São João I Evangelho, Homilia
19,3. São Paulo: Paulus, 2022, pg. 441.
[2] Cfr. Idem, 19,4, pgs. 442-443.
[3] Cfr. Ibidem, 19,5, pg. 443.
[4] Cfr. Ibidem, 19,6, pg. 445.
[5] Cfr. Ibidem.
[6] Cfr. Ibidem, 19,7, pgs. 446-447.
[7] Cfr. Ibidem, 19,9, pg 448.
[8] Cfr. Ibidem, pg. 449.
[9] Cfr. Ibidem, 19,11, pg. 451.
[10] Cfr. Ibidem, 19,11, pg. 453.
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