“Não temas, pequeno rebanho”. Evangelizar em uma época de
mudanças (1)
É hora de mudar o olhar, de passar da nostalgia à audácia, de uma fé em posição defensiva a uma fé que propõe com confiança uma visão do mundo e da vida.
23/10/2025
Uma fé que procura mil modos de ser anunciada
E então? Então é a hora de ter outro olhar, de passar da
nostalgia à audácia, de uma fé defensiva a uma fé que propõe com confiança uma
visão do mundo e da vida. Diante deste mundo tão prometedor, mas aparentemente
cheio de gigantes – tecnológicos, financeiros, culturais,
mediáticos – somos chamados a confiar em Deus e a tomar uma decisão. Podemos
idealizar com nostalgia os “bons tempos passados”: é tão fácil pensar, agora,
que antes tudo era mais fácil... No entanto, além de que não era bem assim, nem
sequer em toda parte, tal olhar bloqueia o apóstolo que observa com apreensão
este mundo pós-cristão, e espera que melhore sozinho. A
confiança em Deus, pelo contrário, leva-nos a olhar à frente e a enfrentar com
assombro juvenil um mundo que tem às vezes muito mais de pré-cristão, porque
deve descobrir, quase outra vez, a novidade de Cristo.
“Quem é esta que surge como a aurora, bela como a lua,
brilhante como o sol?” (Ct. 6, 10). Nesta passagem bíblica, São Gregório Magno
descobre a Igreja como o verdadeiro amanhecer do mundo, embora este amanhecer
esteja a caminho até o final dos tempos. O novo dia não está atrás de nós, e
sim na frente: “Nós, que nesta vida vamos seguindo a verdade somos como o
alvorecer ou o amanhecer, porque já atuamos em parte segundo a luz, mas, em
parte conservamos também restos de trevas (...). A santa Igreja dos eleitos
será pleno dia quando já não tiver mistura alguma da sombra do pecado”[8].
Este olhar, que não é simplesmente um bonito ponto de vista,
permite que nos enchamos de esperança e aceitemos o desafio que São João Paulo
II lançou-nos quando começou a falar de uma “nova evangelização”[9]:
uma renovada ação apostólica que requer cada vez mais iniciativa e criatividade
pessoal. Se é verdade que hoje a Igreja já não pode contar com o vento a favor
da cultura dominante, do “espírito dos tempos”, continua tendo, no entanto, um
vento muito mais poderoso, o Espírito da verdade que, também nesta nova era de
missão apostólica nos ensinará e nos recordará tudo (cfr. Jo 14, 26), para que
possamos levar a todas as partes a vitalidade renovadora do Evangelho.
Hoje podemos reconhecer novamente em nossa própria pele –
por nossa fragilidade, tanto numérica como pessoal – essa experiência de São
Paulo: “Levamos um tesouro em vasos de barro” (2 Cor 4, 7). E talvez,
precisamente agora, neste tempo que nos põe à prova, Deus nos convide a uma
atitude mais missionária, criativa, pessoal, como a dos apóstolos e dos
primeiros discípulos. Com uma fé que não se limita a defender-se, mas que
procura mil modos de ser anunciada. “Impelidos pela força da esperança, (...)
redescobriremos o mundo numa perspectiva feliz, porque o mundo saiu belo e
limpo das mãos de Deus, e é assim, com essa beleza, que o havemos de restituir
a Ele”[10].
“Não temais, pequeno rebanho, porque foi do agrado de vosso
Pai dar-vos o Reino” (Lc 12, 32). Assim confortava Jesus o pequeno grupo de
discípulos desorientados e cheios de dúvidas que o rodeava. E Ele o repete hoje
a nós. Quando a fé é viva, é contagiosa. E essa vitalidade a torna perdurável.
Os primeiros cristãos não tinham poder, nem estruturas, nem números. No
entanto, um a um, com o fogo de Cristo que levavam no coração[11],
transformaram o coração de muitos. Nós, cristãos de hoje, somos chamados a
viver mais uma vez a parábola de Jesus que também descreve a Igreja das
primeiras gerações: o levedo é pouco, mas fermenta toda a massa (cfr. Mt 13,
33).
[8] São
Gregório Magno, Tratados morais sobre Jó 29, 2-4 (PL 76,
478-480).
[9] São
João Paulo II usou pela primeira vez esta expressão em uma homilia na Polônia,
no dia 9/06/1979 e repetiu de um modo jamais programático no Haiti no dia
9-03-1983; nessa ocasião falou de “uma evangelização nova. Nova em seu ardor,
em seus métodos, em sua expressão”. Cfr. também Christifideles laici (1988),
nn. 34-35, Redemptoris Missio (1990) nn. 33-34 e Novo
Millennio ineunte (2001) n. 40.
[10] São
Josemaria, Amigos de Deus, n. 219.
[11] Cfr.
Caminho, n. 1.

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