Fatos e Fotos - Comunidade I

domingo, 5 de outubro de 2025

Vinte e cinco anos atrás, a canonização de irmã Faustina, apóstola da Divina Misericórdia

Santa Faustina Kowalska e a imagem de Jesus Misericordioso (Vatican News)

Em 30 de abril do ano 2000, II Domingo de Páscoa, no coração do Jubileu, quando João Paulo II proclamou santa a religiosa polonesa Faustina Kowalska. Quantas almas, disse o Papa Wojtyla, foram consoladas pela invocação “Jesus, eu confio em vós” que o próprio Cristo sugeriu à religiosa!

Alessandro Di Bussolo/Mariangela Jaguraba – Cidade do Vaticano

Uma canonização com “uma eloquência particular”, fortemente desejada por João Paulo II para transmitir ao mundo do novo milênio a mensagem de misericórdia do Senhor, “que não apenas perdoa os pecados, mas também atende a todas as necessidades dos homens”, inclinando-se “sobre toda miséria humana, material e espiritual”. Karol Wojtyla, em meio ao Grande Jubileu do ano 2000, explica aos fiéis a proclamação da santidade da bem-aventurada Faustina Kowalska, uma pequena religiosa polonesa a quem Jesus confiou, através de numerosas visões, entre 1926 e 1938, a sua mensagem de misericórdia.

Karol e Faustina, o primeiro encontro depois da morte da mística

Era 30 de abril do ano 2000, domingo seguinte à Solenidade de Páscoa. Poucos dias depois, o Papa cruzaria o limiar dos 80 anos, os últimos anos marcados pela doença. Ele recordou aqueles anos, entre a primeira e a segunda guerra mundial, durante a ocupação nazista da Polônia, em que, de 1940 a 1944, mesmo como seminarista clandestino, trabalhava na fábrica de soda da Solvay, não muito distante do convento das Irmãs da Bem-aventurada Virgem Maria da Misericórdia em Lagiewniki, um subúrbio de Cracóvia, onde a irmã Maria Faustina Kowalska morreu aos 33 anos em 5 de outubro de 1938.

“A humanidade sem paz, se não invocar a Divina Misericórdia”

Naquela homilia, o Papa recordou os “eventos daqueles anos e o sofrimento horrível de milhões de homens”. Lembrou também que amigos e familiares se chamavam “Lolek” e que de 1929 a 1941 perdeu primeiro a mãe, depois o irmão médico (com escarlatina, infectado por um paciente) e, por fim, o pai. Naquele momento, “a mensagem de misericórdia era necessária”. De fato, sublinhou João Paulo II, Jesus disse à irmã Faustina: “A humanidade não encontrará paz até que se volte com confiança à Misericórdia Divina.”

Convento de Łagiewniki, em Cracóvia, hoje santuário, onde morreu e descansa o corpo de Santa Faustina Kowalska (Vatican News)

Um jovem com sapatos de madeira rezando em Łagiewniki

Aquele rapaz de 20 anos com sapatos de madeira que parava para rezar no túmulo da irmã Faustina, teria lembrado em 17 de agosto de 2002, a última peregrinação à sua Cracóvia. “Como seria possível imaginar”, teria dito no final da celebração, “que aquele homem com calçados de madeira um dia consagraria a Basílica da Divina Misericórdia de Łagiewniki, em Cracóvia?”

Uma mensagem entregue ao mundo graças à irmã Faustina

Por isso, já como bispo auxiliar de Cracóvia, desde 1958, e depois como sucessor de Pedro, desde 1978, ele sempre seguiu a causa da apóstola da Divina Misericórdia, até ser proclamada beata em 18 de abril de 1993, II Domingo de Páscoa. O que foi transmitido por uma pequena religiosa rejeitada por muitos conventos, antes de ser aceita pelas Irmãs da Bem-aventurada Virgem Maria da Misericórdia, em Varsóvia, e iniciar o noviciado em 30 de abril de 1926, “não é uma mensagem nova”, lembrou o Papa Wojtyla, mas “um presente de iluminação especial”, que o Senhor “quase quis devolver ao mundo através do carisma da irmã Faustina”, e que agora “iluminará o caminho dos homens do Terceiro Milênio”.

Domingo da Divina Misericórdia

Ele proclama que de agora em diante em toda a Igreja “o II Domingo de Páscoa será chamado de 'Domingo da Divina Misericórdia', obedecendo, assim, a um pedido feito por Jesus à irmã Faustina, como recordou o Papa Francisco duas semanas atrás na Audiência Geral, para que “possa ser um abrigo e refúgio para todas as almas e especialmente para os pobres pecadores”. De fato, no Evangelho daquele domingo, Jesus ressuscitado dá aos discípulos o anúncio de sua misericórdia: “A quem perdoardes os pecados, eles serão perdoados”.

Altar dedicado a São João Paulo II no santuário da Divina Misericórdia em Santo Spirito in Sassia, foto Reflexa (Vatican News)

Do coração do Ressuscitado, a misericórdia ilumina o mundo

A imagem de Jesus Ressuscitado, com dois raios de luz que partem do coração e iluminam o mundo, é a que Cristo pediu à irmã Faustina para pintar e abençoar, com a inscrição “Jesus, eu confio em ti!”.

“Através do coração de Cristo crucificado, a Misericórdia Divina alcança os homens: “Minha filha, diga que sou o Amor e a Misericórdia em pessoa”, disse Jesus à irmã Faustina (Diário, 374).”

Esta misericórdia Cristo derrama sobre a humanidade através do envio do Espírito que, na Trindade, é a Pessoa-Amor. A misericórdia não é talvez um “segundo nome” do amor, entendido em seu aspecto mais profundo e tenro, em sua atitude de atender todas as necessidades, especialmente em sua imensa capacidade de perdão?

Uma saúde fraca, mas uma vida que se torna um canto

A sua breve vida, como a Irmã Faustina escreve em seu diário, “Secretária da Divina Misericórdia”, não foi nada fácil, mas Cristo havia anunciado a ela numa visão. Já fraca de constituição, o estilo de vida severo e os jejuns que se impuseram nos treze anos de vida religiosa minaram sua saúde. Ela ficou doente de tuberculose e teve que ser hospitalizada duas vezes num sanatório perto de Cracóvia. Ela sempre aceitou com obediência as humildes tarefas que lhe foram confiadas, de cozinheira, jardineira e porteira, mas “escondida em seu convento de Lagiewniki, em Cracóvia, lembra João Paulo II, fez de sua existência um canto de misericórdia: Misericordias Domini in aeternum cantabo”, diz o Salmo 88.

A canonização da irmã Faustina tem uma eloquência particular: com esse ato pretendo hoje transmitir esta mensagem ao novo milênio. Eu a transmito a todos os homens para que aprendam a conhecer melhor a verdadeira face de Deus e a verdadeira face dos irmãos.

A sua dor pelas dores do próximo, grande amor

O Pontífice que veio da Polônia, que Francisco canonizou em 27 de abril de 2014, junto com João XXIII, concelebrando com o papa emérito Bento XVI (que o beatificou em 1° de maio de 2011), indica no amor de Santa Faustina pelo próximo, a fonte de inspiração para a humanidade de hoje “a fim de enfrentar a crise de significado, os desafios das mais diversas necessidades, sobretudo a exigência de salvaguardar a dignidade de cada pessoa humana”, porque “cada pessoa é preciosa aos olhos de Deus, para cada um Cristo deu sua vida”.

A irmã Faustina Kowalska deixou escrito em seu diário: “Sinto uma dor tremenda quando observo os sofrimentos do próximo. Todas as dores do próximo se repercutem em meu coração; carrego suas angústias em meu coração, de modo que me aniquilam até fisicamente. Eu gostaria que todas as dores caíssem sobre mim, para dar alívio ao próximo” (Diário, pag. 365). Eis a que ponto de partilha leva o amor quando é medido no amor de Deus!

A imagem de Jesus Misericordioso e a estátua de Santa Faustina em Santo Spirito in Sassia, foto Reflexa (Vatican News)

O abandono que consola: Jesus, eu confio em vós!

“A mensagem da Divina Misericórdia”, explicou ainda João Paulo II, “é dirigida sobretudo a quem, aflito por uma provação particularmente difícil ou esmagado pelo peso dos pecados cometidos, perdeu toda a confiança na vida, sendo tentado a ceder ao desespero”.

A doce face de Cristo é apresentada a ele, sobre ele vem aqueles raios que partem de seu coração e iluminam, aquecem, indicam o caminho e infundem esperança. 

“Quantas almas foram consoladas pela invocação “Jesus, eu confio em vós”, que a Providência sugeriu através da irmã Faustina!”

Esse simples ato de abandono a Jesus atravessa as nuvens mais densas e faz um raio de luz passar na vida de todos.

Viver a experiência da Divina Misericórdia e testemunhá-la

Unamos a nossa voz de Igreja peregrina, é o convite final do Papa Wojtyla, à voz de Maria, “Mãe da misericórdia", à voz desse nova santa, “que canta a misericórdia na Jerusalém celeste junto com todos os amigos de Deus”.

“E você, Faustina, presente de Deus ao nosso tempo, presente da terra da Polônia para toda a Igreja, nos ajude a perceber a profundidade da Divina Misericórdia, nos ajude a experimentá-la e testemunhá-la aos irmãos.”

Que a sua mensagem de luz e esperança se espalhe por todo o mundo, incentive os pecadores a se converter, amenize as rivalidades e ódios, abra os homens e nações à prática da fraternidade. Hoje, fixando nosso olhar contigo na face de Cristo ressuscitado, fazemos nossa a sua oração de abandono confiante e dizemos com firme esperança: Jesus, eu confio em vós!

Photogallery:

Foto:Crédito: Vatican News
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Foto:Crédito: Vatican News
Foto:Crédito: Vatican News

Jesus a chamou de "Secretária da Divina Misericórdia"

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

As cores que vestem a fé: um guia para as vestes litúrgicas

© Alessia GIULIANI/CPP/CIRIC

Paulo Teixeira - publicado em 03/10/25

A liturgia católica é rica em simbolismo, e um dos seus elementos mais visíveis e expressivos é a cor das vestes sacerdotais. Longe de ser uma mera questão de estética, a cor dos paramentos litúrgicos funciona como uma ferramenta pedagógica que, ao longo do ano, conduz os fiéis através dos mistérios da fé e do ritmo da vida cristã.

A Instrução Geral do Missal Romano (IGMR), o documento oficial que guia as celebrações da missa, dedica um trecho específico para explicar o significado de cada cor das vestes litúrgicas. O objetivo é que as cores “exprimam externamente de modo mais eficaz, por um lado, o carácter peculiar dos mistérios da fé que se celebram e, por outro, o sentido progressivo da vida cristã ao longo do ano litúrgico”. 

As cores das vestes litúrgicas

Branco: A cor da alegria, pureza e luz. É usada nos tempos litúrgicos do Natal e da Páscoa. Também veste as celebrações de Nossa Senhora, dos anjos, dos santos (que não são mártires, porque para eles se usa vermelho) e em festas do Senhor, como Corpus Christi. 

Vermelho: Representa o fogo do Espírito Santo e o sangue do martírio. É a cor do Domingo de Ramos, Sexta-Feira Santa, Pentecostes, e das festas dos apóstolos e mártires, que derramaram seu sangue em testemunho de Cristo. 

Verde: O símbolo da esperança e da vida. É a cor mais utilizada, marcando o chamado Tempo Comum, a maior parte do ano litúrgico, quando os fiéis aprofundam a vida e os ensinamentos de Jesus. 

Roxo: Simboliza a penitência e a dor. Veste os tempos do Advento (preparação para o Natal) e da Quaresma (preparação para a Páscoa). Também pode ser usado em missas de defuntos. 

Rosa: Um "alívio" do roxo, usado em dois momentos específicos: no III Domingo do Advento e no IV Domingo da Quaresma. Simboliza uma quebra na penitência, anunciando a alegria que se aproxima. 

Preto: Representa o luto e pode ser usado em missas de defuntos, onde a tradição assim o permitir. 

A particularidade do azul: uma tradição regional

Enquanto a regra geral é clara, algumas exceções culturais se manifestam. É o caso do uso da cor azul, que não é mencionada na instrução geral, mas é utilizada em celebrações de Nossa Senhora em alguns países. Em via de regra, são utilizados paramentos brancos com detalhes azuis para recordar a Virgem Maria. Mas, em 1854, quando foi proclamado o Dogma da Imaculada Conceição, o Papa concedeu que na Espanha fossem utilizados paramentos azuis. Logo, os territórios espanhóis na américa Latina também aderiram e até hoje costumam celebrar a Imaculada Conceição, em 8 de dezembro, com paramentos azuis.

O essencial além da cor

Apesar da importância do simbolismo das cores, o bispo Santo Agostinho já ensinava que a cor é um detalhe, um “acidental” que nos ajuda a entrar no mistério, mas não é o cerne da fé. 

A verdadeira essência está na santidade, uma jornada que não tem cor, mas que "fica bem com todas as cores", como dizia o santo. A santidade é a busca por uma vida íntegra e justa, um caminho que os cristãos são chamados a seguir. As cores litúrgicas são, em última análise, um auxílio para que os fiéis se aprofundem nesse chamado. 

Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/10/03/as-cores-que-vestem-a-fe-um-guia-para-as-vestes-liturgicas/

Esclarecimento sobre o Caminho Neocatecumenal

Caminho Neocatecumenal (CncMadrid)

02 de outubro de 2025

CncMadrid

O Caminho Neocatecumenal é um itinerário de formação católica implementado nas dioceses por meio de serviços gratuitos (cf. Art. 4 do Estatuto do Caminho Neocatecumenal), aprovado pela Santa Sé.

As reuniões celebrativas da comunidade utilizam diversos materiais (cantos, elementos litúrgicos e pinturas), frutos da criatividade de Kiko Argüello e Carmen Hernández, que, sem fins lucrativos, os colocaram gratuitamente à disposição dos irmãos e das paróquias, para uso litúrgico.

Nos últimos anos, devido à reprodução descontrolada desses materiais nas redes sociais, tornou-se necessário registrar a autoria das obras de Kiko para garantir seu livre uso por parte dos irmãos e defender sua autenticidade e finalidade própria. De fato, alguns têm difundido indevidamente esses conteúdos, alterando-os ou impedindo seu uso gratuito, livre e adequado.

Para tal fim, foi solicitada a criação da fundação diocesana “Obra Artística Kiko Argüello”, encarregada de preservar a autenticidade, a finalidade e o uso dessas obras.

Os cantos litúrgicos de Kiko estão registrados na SIAE (Sociedade Italiana de Autores e Editores).

Cabe destacar também que sempre foi desejo dos Iniciadores do Caminho que as catequeses sejam transmitidas presencialmente, pelo método da tradição oral, e que não sejam compartilhadas nas redes sociais, uma vez que encontram sua razão de ser na celebração catequética e litúrgica.

Fonte: https://neocatechumenaleiter.org/pt-br/esclarecimento-sobre-o-caminho-neocatecumenal/

SAÚDE: Do morango do amor ao pudim: por que brasileiros gostam tanto de açúcar (Parte 2/2)

A receita do pudim brasileiro tem mais açúcar do que a do francês (Crédito: Getty Images)

Do morango do amor ao pudim: por que brasileiros gostam tanto de açúcar?

Autor: André Biernath

Da BBC News Brasil em Londres

14 agosto 2025

Os doces brasileiros são mais doces?

Fazer uma comparação como essa é difícil, mas algumas receitas indicam que o brasileiro, em geral, usa mais açúcar que o resto do mundo. Geralmente, as receitas brasileiras levam cerca de 50% a mais de açúcar do que as versões parecidas disponíveis em outros países.

Um exemplo clássico é o tradicional bolo de cenoura com cobertura de chocolate. Enquanto a versão inglesa do carrot cake leva cerca de 200 gramas de açúcar, a brasileira pode chegar a 400 gramas, ou seja, o dobro.

Situação semelhante acontece quando comparamos a receita do pudim de leite brasileiro com o francês, ou o nosso doce de leite e o dulce de leche argentino.

"Se você for pensar no pão de mel alemão, ele é um pão, um pão com especiarias, tem açúcar mascavo, uma doçura menor, ele é mais seco. Aqui [no Brasil], quando você fala pão de mel, você pensa em um bolinho, recheado com doce de leite, se possível banhado com chocolate", exemplifica a historiadora Débora Oliveira.

Até mesmo nossas próprias "criações" são bem açucaradas. O brigadeiro, por exemplo, marca registrada do Brasil, é preparado com uma lata inteira de leite condensado. Esse ingrediente já carrega, em média, 55 gramas de açúcar a cada 100 gramas.

Quanto açúcar o brasileiro consome?

O Ministério da Saúde calcula que o brasileiro consome, em média, 80 gramas de açúcar por dia — o equivalente a 18 colheres de chá de açúcar. Isso representa 50% a mais do limite máximo recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), de 50 gramas diárias, ou 12 colheres de chá.

Esse alto consumo coloca o Brasil no topo do ranking mundial de ingestão de açúcar, ao lado dos Estados Unidos, Rússia e México. Para comparação, os brasileiros chegam a consumir o triplo de açúcar que chineses ou japoneses.

Dados do Ministério da Agricultura e Pecuária ainda revelam que esse hábito cresceu nas últimas décadas. Nos anos 1930, o consumo individual era de cerca de 15 quilos de açúcar por ano. Em 1990, esse número passou para 50 quilos, e hoje gira em torno de 65 quilos, segundo a OMS.

O consumo médio de açúcar também cresceu em outras partes do mundo. Estima-se que o consumo aumentou 100 vezes de 1850 até os dias de hoje, com algumas variações regionais.

Estudos apontam que cerca de 60% dessa ingestão vêm de açúcares adicionados a alimentos e bebidas. O restante está presente em produtos processados e ultraprocessados.

"É muito comum no Brasil, no setor público, por exemplo, você ter café e ele já estar adoçado na garrafa. A pessoa nem adoça o próprio café, porque essa é a prática. Temos também pessoas que adicionam açúcar no leite com achocolatado, que já tem o açúcar", destaca a professora do Instituto de Nutrição da UERJ Daniela Canella.

Adição de açúcar de mesa em bebidas, como café e sucos, é um hábito dos brasileiros (Crédito: Getty Images)

Excesso de açúcar e saúde

Se por um lado o açúcar está enraizado na cultura brasileira, por outro, o consumo excessivo se tornou um grave problema de saúde pública.

Segundo o Ministério da Saúde, o alto consumo de açúcar está relacionado a uma série de doenças crônicas que cresceram no Brasil nas últimas décadas, como o diabetes tipo 2 e a obesidade.

"Um ponto bem importante é o ganho de peso, e se a gente pensa que a obesidade cresce no Brasil e no mundo, o ganho de peso é bastante sensível. Não é a obesidade, o peso mais elevado como uma questão estética. A obesidade é um problema e está relacionada ao desenvolvimento de infinitas doenças: diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares, alguns tipos de câncer", explica Daniela Canella.

Isso não quer dizer que você deva cortar todo o açúcar da sua alimentação ou que não possa experimentar o tão famoso morango do amor. Segundo a nutricionista, o segredo é consumir com moderação.

Reduzir gradualmente o açúcar nas receitas, resgatar o sabor real dos ingredientes — que muitas vezes acabam escondidos pela doçura — e repensar hábitos alimentares são estratégias que ajudam a equilibrar saúde e prazer à mesa.

"Talvez a redução drástica seja muito difícil porque as pessoas estão acostumadas com aquele paladar, mas talvez fazer uma transição sem substituir por edulcorante [aditivos alimentares popularmente conhecidos como adoçantes]. Se você vai reduzindo aos poucos, o paladar vai se acostumando até parar de consumir ou consumir menos. E evitar consumir ultraprocessados com alerta de açúcar e, no dia a dia, tentar reduzir esse açúcar adicionado [em bebidas, cafés] também ajuda muito", aconselha Canella.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cp3eqv91x1vo

Reduções Jesuítico-Guarani, alternativa ao sistema de dominação e colonização reinante (Parte 1/2)

Detalhe da Misión jesuítica de San Ignacio Miní (Foto: Prof. Marina Massini)

As Reduções buscaram ser alternativa ao sistema de dominação e colonização por parte das Coroas espanhola e portuguesas dos territórios latino-americanos, "buscando uma possibilidade de espaço para as componentes indígenas da sociedade e especialmente no caso da população da etnia Guarani", cuja adesão ao projeto dos jesuítas possibilitou aos indígenas uma margem de liberdade - possível dentro daquelas circunstâncias históricas - e também de instrução, de formação, explica a Prof. Marina Massimi.

Jackson Erpen – Cidade do Vaticano

Em junho de 2025, o governo do Rio Grande do Sul lançou a contagem regressiva para as comemorações, em 2026, dos 400 anos das Missões Jesuítico-Guaranis, com objetivo de criar uma ampla mobilização cultural, turística e econômica, com investimentos e planejamento a longo prazo para valorizar este importante patrimônio.

De fato, em 1983, a UNESCO declarou como Patrimônio Mundial o Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, as ruínas de San Ignacio Miní, Nossa Senhora de Santa Ana, Nossa Senhora de Loreto e Santa María Maior, localizadas em território argentino. Em 2015, São Miguel das Missões recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o estatuto de Patrimônio Cultural Brasileiro pelas suas associações com a história e a espiritualidade guarani.

Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo (Foto: José Roberto de Oliveira)

No contexto das comemorações dos 400 anos desta “experiência”, considerada por muitos como a “realização de uma grande utopia”, conversamos com a professora Marina Massimi*, que no âmbito do Instituto de Estudos Avançados da USP, coordena um grupo de pesquisa chamado “Tempo, Memória e Pertencimento”, que se ocupa da preservação do patrimônio histórico e documental e monumental do Brasil e da América Latina. Hoje, propomos a primeira parte da entrevista, na qual a docente italiana, que vive no Brasil desde 1981, começa falando sobre “o que foram as Reduções Jesuítico-Guaranis”:

Elas nasceram a partir de dois objetivos. Primeiro, era garantir a liberdade da população nativa, dos indígenas dentro do contexto do domínio colonial. O domínio colonial na América Latina era em parte da Coroa espanhola e em outra da Coroa portuguesa. As Reduções nasceram no âmbito de um território que pertencia à Coroa espanhola. E por que garantir a liberdade dos nativos dentro do domínio da colônia? Porque os nativos eram submetidos a um regime de trabalho semiescravo. No âmbito do Brasil se tratava de fato do trabalho escravo, propriamente dito. No âmbito do domínio espanhol se tratava de um sistema chamado de “encomenda” que de alguma forma era muito parecido ao regime da escravatura, porque o indígena tinha que trabalhar para o colono, que recebia um certo território e uma certa população por “encomenda”. Nesse sentido, a primeira coisa era garantir essa liberdade para permitir o desenvolvimento humano das populações. Isso era ligado também ao segundo objetivo das Reduções, que era a evangelização. Era possível evangelizar as pessoas, sujeitos livres portanto, que tivessem a possibilidade de se autodeterminar quanto às suas escolhas e tivessem os direitos humanos garantidos. Então, esses dois objetivos, a defesa da liberdade e da dignidade da pessoa e o objetivo da evangelização, levaram alguns jesuítas, em particular o jesuíta espanhol Diego de Torres Bollo, no início do século XVII, a encaminhar um projeto junto à Companhia, à direção geral da Companhia de Jesus, junto ao Padre Geral por um lado e à Coroa espanhola por outro, da constituição de agregações sociais, comunidades, em outras palavras, ou reduções – depois vou explicar porque esse nome -, onde fossem morar indígenas nativos e pudessem ter uma vida civil, uma vida social, uma vida de trabalho, de digamos uma vida humana nesse sentido, sob a supervisão de um pequeno grupo de dois ou três missionários da Companhia de Jesus. Nesse território, onde nasceriam essas cidades, a Coroa espanhola garantiria autonomia dessas comunidades, no sentido que nenhum colono poderia adentrar no território, ainda menos submeter à escravatura ou ao sistema da “encomenda” nenhum dos moradores dessas cidades.

Prof. Marina Massini acompanhada por colegas de pesquisa (Vatican News)

Por que eram chamadas de "Reduções” e qual o significado dessa experiência? 

O termo Redução nasce do latim de uma expressão latina que quer dizer 'Reductio ad unum'. A ideia era que - utilizando parafraseando também as palavras de Antonio Ruiz de Montoya, que foi um dos primeiros jesuítas que também se envolveram com essa experiência -, reduzir populações espalhadas no território em pequenos grupos de três, quatro famílias que viviam na floresta, e migrantes, de um lugar para outro numa comunidade fixa num certo território, onde pudesse viver uma experiência de uma comunidade civil, uma sociedade, que incluía o direito ao trabalho livre e a educação e a formação religiosa e também a formação artística, cultural, e essas populações poderiam viver isso sob a supervisão de um grupo de dois ou três jesuítas no máximo, A ideia era que, portanto, precisava da adesão dessas populações indígenas à proposta. De fato, houve muita adesão, sobretudo de um grupo de uma etnia chamada guaranis. Muitos desses grupos, desses chefes das etnias guaranis, toparam na proposta que para ele significava de alguma forma garantir uma margem de liberdade num território totalmente colonizado pelos europeus e ao mesmo tempo ter a possibilidade e a opção então de serem evangelizados. Tratava-se de uma escolha, de fato, nem todos os guaranis, nem todos os nativos toparam essa proposta, teve grupos que se rebelaram, que até se rebelaram de forma violenta e até isso levou ao martírio de alguns dos jesuítas missionários, que tinham se adentrado na floresta para fazer essa proposta. Mas uma grande parte da população topou. Topou, porque isso era muito conveniente, significava a possibilidade de uma vida livre, mas também a possibilidade de aprender, a criar uma sociedade com sustento político e econômico e cultural para si e para as suas famílias e para os seus filhos. De forma que se criaram ao longo do tempo umas cerca de 30 cidades, podemos chamá-las assim, cada uma compreendia uma população de 1000 a 7000 nativos e em cada uma delas a supervisão, a presença de três ou dois jesuítas no máximo. Isso torna também muito evidente o fato que houve uma adesão, de fato, pela população dos nativos a essa proposta. Nessas cidades, então, ao longo de cerca de 150 anos, pode se desenvolver uma vida civil, uma vida social, uma vida econômica, uma vida cultural, havia direito também à formação. Todos os moradores das Reduções haviam direito à formação, então, todos os guaranis das Reduções sabiam ler e escrever e o território das Reduções era totalmente autônomo do domínio colonial. O rei da Espanha garantia, de fato, autonomia a essas agregações. Cada um dos índios reduzidos era considerado como vassalo direto do rei da Espanha, a quem era pago imposto de forma direta, sem passar, portanto, pelo encomendero. E essa experiência, então, deu origem também a uma vivacidade civil, econômica e cultural muito grande nessas cidades. Hoje nós temos dessas cidades remanescentes, ruínas remanescentes situadas na região entre Paraguai, Brasil e Argentina - era o território que então era totalmente parte do Império espanhol, da Colônia espanhola - e que mostram de qualquer forma a grandeza dessa experiência. Eram cidades que foram construídas também de forma muito bonita, com a vinda também de arquitetos jesuítas, engenheiros, pedreiros e com envolvimento também das populações guaranis. As ruínas atestam, portanto, a beleza, mas também a organização dessas cidades. Podemos ver que ela se formava em torno de uma grande praça. Nessa praça, o ponto central era a igreja, ao lado a casa dos padres, ao lado da Casa dos Padres o colégio, que mostra, portanto, o significado da educação, dado a educação pela proposta, um cemitério, depois as oficinas, onde eram desenvolvidos vários tipos de trabalho, desde o trabalho agrícola, ao trabalho artístico e a todo o trabalho finalizado à vida e à convivência. Havia também o Cotiguaçú, que era uma casa que hospedava as viúvas e a as moças solteiras, as mães solteiras propriamente e também cada Redução tinha uma estância, que era um território distante, uma espécie de fazenda, de grande fazenda, onde também era desenvolvida de forma ampla e o cultivo, a agricultura e a pecuária, portanto, agropecuária, e a produção dessas estâncias chegou a ser muito intensa, ao ponto que as Reduções chegaram também a exportar produtos como erva-mate, como algodão, e portanto, também, as Reduções conseguiram se tornar ricas, possibilitando o bem-estar de suas populações.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

EXEGESE: Sua verdadeira carne transfigurou (Parte 1/2)

Cena da Transfiguração (Diocese do Crato)

Arquivo 30Dias n 12 - 2001

Relatório do Prefeito da Biblioteca Ambrosiana na conferência sobre "O Rosto dos Rostos"

Sua verdadeira carne transfigurou

"O Cristo glorioso não apaga a verdade da Encarnação." Publicamos o relatório do Prefeito da Biblioteca Ambrosiana no congresso sobre "O Rosto dos Rostos", realizado em outubro de 2001 na Pontifícia Universidade Urbaniana. O congresso, organizado pelo Instituto Internacional de Pesquisa sobre o Rosto de Cristo, publicou um volume com as atas.

por Gianfranco Ravasi

A nossa será uma leitura singular da cena da Transfiguração. Consideraremos, de fato, um verdadeiro "drama" no sentido original do termo. Estrutura, desenvolvimento, atores e sequências temporais garantem que o evento seja capaz de se reproduzir diante de nossos olhos em sua ação e mensagem com sua própria eficácia representativa. Os dados do texto — que, como se sabe, nos são oferecidos nas três versões sinóticas ( Mt 17,1-9; Mc 9,2-10; Lc 9,28-36) — serão recompostos por nós de acordo com um enredo confiado a sete personagens que, em diferentes níveis e em diferentes papéis, sustentam todo o "drama".

Jesus, o protagonista

E justamente porque uma performance solene precisa de sua trilha sonora ideal, propomos imediatamente como fio condutor musical um oratório moderno, aquele que Olivier Messiaen compôs entre 1965 e 1969 para coro misto, sete solistas instrumentais e uma grande orquestra (a estreia contou com 216 intérpretes no total!), intitulando-o La Transfiguration de Notre-Seigneur Jésus Christ (2). Apresentada pela primeira vez em 7 de junho de 1969 em Lisboa por ocasião do Festival Gubelkian e em 29 de outubro do mesmo ano no Palais de Chaillot em Paris, esta obra assemelha-se a uma grandiosa catedral harmônica (dura pelo menos uma hora e meia). Complexo em sua divisão em duas linhas de sete sílabas, mas linear em sua monumentalidade, ele se baseia no relato de Mateus sobre a Transfiguração, bem como em textos litúrgicos e até mesmo em citações da Summa Theologiae de Tomás de Aquino — todos estritamente em latim — e em evocações instrumentais exóticas (címbalos turcos, crótalos, marimba, gongo, tamtam, xilorimba, vários instrumentos populares e assim por diante). Tudo culmina no coral final da luz da Glória, baseado no Salmo 26:8: "Senhor, eu amo a beleza da tua casa e o lugar onde a tua glória habita!" E Messiaen comenta: "A Glória habitou no monte da Transfiguração, A Glória habita no Santíssimo Sacramento de nossas igrejas, A Glória habitará na eternidade."

E se realmente não pudermos dispor de um comentário musical tão monumental, bastará recorrer à mais simples, porém deliciosa, composição para piano de Franz Liszt, intitulada precisamente In festo Transfigurationis Domini nostri . Como pano de fundo para o nosso "drama", é difícil não pensar imediatamente na famosa tela de Rafael preservada nos Museus do Vaticano (1520), mas também no afresco de Beato Angélico no convento florentino de São Marcos (1441), de Andrej Rubliov, com seu ícone da Metamorfose.(1405), a Giovanni Bellini com uma tela (1480) presente em Nápoles na Galeria Capodimonte. Muitos outros pintores, no entanto, nos oferecem a possibilidade de criar o cenário ideal para esta cena. Um cenário que também pode ser constituído por uma fotografia daquele pico tradicionalmente identificado como a montanha anônima da Transfiguração evangélica, ou seja, o Tabor, com seus 582 metros e com o perfil da basílica franciscana erguida pelo arquiteto Antonio Barluzzi entre 1919 e 1924. Mas agora chegou o momento de apresentar o primeiro personagem, o protagonista.

Ele dominará todo o desenrolar do "drama" e é imediatamente apresentado por seu nome próprio Iesous 4, pronunciado quatro vezes na versão de Marcos ( Mc 9,2.4.5.8). Outros títulos solenes serão atribuídos a ele, propostos na continuação da história e na aparição dos vários atores do evento. Por ora, contentar-nos-emos em apontar o tríptico terminológico posto na boca de outro personagem da Transfiguração, Pedro. Ele se dirige a Jesus como Kyrie , "Senhor", segundo Mateus ( Mt 17,4): é o reconhecimento do senhorio supremo de Cristo sobre o ser e a história, mas é também — alusivamente — uma referência à divindade, se for verdade que na Bíblia grega cristã o nome sagrado YHWH de Deus foi traduzido precisamente como Kyrios (cf. Fl 2,9-11). Jesus é invocado por Pedro, segundo Marcos ( Mc 9,5), como rabino, que em sua raiz hebraico-aramaica (rab, "grande") segue o título anterior, mas que também assume a conotação de "mestre" supremo da verdade de Deus. E finalmente, segundo Lucas ( Lc 9,33), Jesus é epistáta (vocativo de epistátes ), título caro ao terceiro evangelista ( Lc 5,5; 8,24.45; 9,49; 17,13). O termo pode ser considerado como a tradução grega do rabino anterior: o conceito de “mestre” se entrelaça com o de primazia, superioridade, regência ou inspeção. Sob essa luz, poderíamos dizer que o tríptico de títulos cristológicos converge na atribuição de senhorio a Jesus não apenas dentro da cena da Transfiguração, mas também no palco da história como um todo e da verdade (na prática, poderíamos pensar no francês “maître” que, por si só, incorpora as funções de “senhor, mestre” e a de “magisterial”).

O retrato de Jesus, porém, será completado, ou melhor, capturado em sua identidade mais íntima e profunda, pela última personagem, como teremos ocasião de ver. Os exegetas, de fato, concordam que o propósito último da cena é precisamente revelar a pessoa de Cristo como Senhor da glória, mestre, filho de Deus, e sua missão como profeta e legislador perfeito e definitivo. Sob essa luz, devemos reunir uma série de detalhes. Comecemos pela colocação espacial de sua figura no "alto monte" ( Mt 17,1; Mc 9,2), uma evocação simbólica não desprovida de certa alusão bíblica: como não pensar em uma espécie de Sinai galileu ou no monte da aparição galileana da Páscoa de Mateus ( Mt 28,16)? Há, portanto, uma coordenada temporal exaltada por Marcos ( Mc 9,2) e Lucas ( Lc 9,28): segundo Marcos, é "depois de seis dias" que o evento é celebrado, portanto, estamos no sétimo dia da Páscoa, enquanto para Lucas é o "oitavo dia", talvez uma forma mais greco-romana de formular a mesma ideia de uma plenitude temporal da Páscoa já alcançada.

Não à toa, mesmo que o padrão das aparições pascais não possa ser plenamente traçado em nosso evento, é certo que a "metamorfose" ( Mt 17,2; Mc 9,2; Lucas evita o termo para não criar mal-entendidos entre seus leitores acostumados às "metamorfoses" dos deuses em forma humana, como ensina Ovídio) é uma Cristofania na qual Jesus aparece aureolado pela luz pascal. De fato, é o seu Rosto imerso em esplendor ( Mt 17,2) e "outro" em sua aparência ( Lc 9,29), e é a sua vestimenta, surpreendentemente branca (o "traço" de Marcos é famoso, Mc 9,3), que sinaliza a glória da Páscoa e a eternidade divina. Até François Rabelais, no capítulo X de seu famoso Gargântua (1534), escreveu: "Branco significa alegria, júbilo, celebração...

Na Transfiguração de Nosso Senhor, suas vestes eram brancas como a luz, e essa brancura luminosa fez com que seus três apóstolos presentes, Pedro, Tiago e João, intuíssem a ideia e a substância das alegrias eternas"(3). Assim, entrelaçando elementos pascais e apocalípticos, evocando com a nuvem – que é sinal da presença divina no Êxodo ( Mt 17,5; Mc 9,7; Lc 9,34), a teofania sinaítica ( Êx 19,9; 24,15-16; 33,9) à qual retornaremos – temos um perfil de Jesus com contornos epifânicos. A meio do seu percurso terrestre, Cristo revela o seu Rosto autêntico, por ora oculto sob as feições do homem da Galileia. Não é à toa que falamos de uma “visão” ( frequentemente em Mt17,3; Mc 9,4; cf. Lc 9,31 e Mt 17,9): este é o verbo típico das aparições pascais, mesmo que não seja agora aplicado diretamente a Jesus.

No entanto, há outro detalhe que deve ser observado para completar o retrato do protagonista. É Lucas, como de costume, quem o indica quando observa que Jesus sobe à montanha para rezar e é durante a oração que a visão se abre. É bem sabido que o terceiro evangelista situa os acontecimentos capitais da vida de Cristo num contexto orante: a cena do batismo no Jordão é emblemática ( Lc 3,21), em muitos aspectos análoga à da Transfiguração. Poderíamos então dizer que o acontecimento que se passa na montanha se insere no quadro de um êxtase quase místico que é uma revelação e um encontro com o mistério de Deus. Não é à toa que os espectadores ficarão deslumbrados e precisarão, no final, do toque de Jesus ( Mt 17,7) para serem trazidos de volta à vida cotidiana. E naquele momento encontrarão autòn Iesoun mónon ( Mt 17,8; cf. Mc 9,8; Lc 17,36): é somente Jesus quem, em última análise, domina toda a cena, como havia acontecido no início. Mas ali, depois da Cristofania, a sua será uma singularidade simbólica que eclipsa qualquer outra presença, por mais grandiosa que seja, como a de Moisés e Elias. Só Ele nos bastará, só Ele será a meta para a qual convergirá a nossa "escuta" – a obediência – ( Mt 17,5; Mc 9,7; Lc 17,35).

NOTAS

1 A análise exegética desta cena é amplamente desenvolvida em todos os comentários aos três Evangelhos Sinópticos e em um número considerável de ensaios específicos, entre os quais destacamos, a título de exemplo, JP Heil, A Transfiguração de Jesus , Roma 2000; E. Nardoni, La transfiguración de Jesús y el dialogo sobre Elias , Buenos Aires 1977 e JM Nützel, Die Verklärungserzählung im Markusevangelium , Würzburg 1973.
2 FR Tranchefort (ed.), Guide de la musique sacrée et coral profane de 1750 à nos jours , Paris 1993, pp.
3 Citado em Dizionario culturale della Bibbia , Turim 1992, p. 247.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Reflexão para o XXVII Domingo do Tempo Comum (C)

Evangelho do domingo (Vatican News)

No Evangelho, Jesus pede que o povo tenha mais fé em Deus, e seja mais fiel e leal ao Senhor.

Vatican News

“O justo viverá por sua fidelidade.” O Profeta Habacuc diz que o justo viverá por sua fidelidade, por sua lealdade à Palavra e à vontade de Deus, depois de ter dito ao Senhor que não concordava com a lentidão de Sua justiça diante dos tormentos sofridos pelo povo e suplicado ao Senhor que esses infortúnios cessassem.

No Evangelho, Jesus pede que o povo tenha mais fé em Deus, e seja mais fiel e leal ao Senhor.

Também nós elevamos preces a Deus pedindo pelo Seu povo e por todos os homens de boa vontade, cansados de sofrer agressões gravíssimas não apenas por parte de delinquentes, mas também por muitos daqueles que deveriam zelar pela justiça e pelo desvalido. Diante dessa situação clamamos a Deus: “até quando, Senhor, até quando?”

E o Senhor nos responde pedindo maior confiança, maior fé e fidelidade.

Mas como ter maior fé, se fé é crer ou não? A Fé cristã se traduz no seguimento de Jesus Cristo, por isso ela poderá aumentar ou diminuir. Dentro das comparações feitas por Jesus no Evangelho de hoje, a Fé poderá ser avaliada como a força que desenraiza uma árvore de grande porte, mesmo que ela - a fé - seja tão pequenina como o grão de mostarda.

Se pensarmos bem, não se trata da intensidade da fé, se grande ou pequena, mas de sua qualidade, se pura ou não.

Quando o Pe. Nóbrega, no Brasil Colonial, viu que os indígenas, após a conversão ao Cristianismo, estavam voltando aos antigos costumes, não os culpou, mas fez um exame de consciência para ver onde os missionários haviam errado. Ele chegou à conclusão de que o ardor e a fé missionária haviam perdido qualidade e vigor.

Foi feito um “mea culpa” e os jesuítas procuraram purificar sua fé, pondo apenas no Senhor sua confiança e esperança e agindo como colaboradores de Deus. Deixaram o protagonismo para o Espírito e permaneceram como agentes da Evangelização.

Portanto, não é o Senhor quem não escuta nossas súplicas, mas somos nós que não cremos em Seu poder e possuímos fé imperfeita. Creiamos em Deus, no poder de Seu Amor e façamos aquilo que Ele nos sugere e pede através da oração, da reflexão sobre a realidade, sem medo e sem receios. Se o Senhor está conosco, somos poderosos e poderemos mudar o mundo, ou melhor, nós não, mas o Espírito através de nossas ações iluminadas e guiadas por Ele.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

sábado, 4 de outubro de 2025

SAÚDE: Do morango do amor ao pudim: por que brasileiros gostam tanto de açúcar (Parte 1/2)

Morango do amor, doce que combina leite condensado, morango e açúcar, se tornou uma sensação no último mês (Crédito: Getty Images)

Do morango do amor ao pudim: por que brasileiros gostam tanto de açúcar?

Autor: André Biernath

Da BBC News Brasil em Londres

14 agosto 2025

Do morango do amor aos brigadeiros gourmet, passando pelos bolos de pote e ovos de Páscoa recheados, o Brasil viveu sucessivas "febres" de doces.

Mas, afinal, por que os brasileiros gostam tanto de açúcar?

A história do açúcar no Brasil começa séculos atrás, bem antes dos doces modernos, e tem relação direta com a colonização portuguesa.

A cana-de-açúcar, de onde boa parte do açúcar utilizado no país é extraído, é originária da Papua Nova Guiné, na Oceania.

Pesquisadores acreditam que ela passou a ser cultivada pelos seres humanos há cerca de 10 mil anos e, aos poucos, se espalhou pela Polinésia, pela Ásia e pelo Mediterrâneo.

Mas, durante muito tempo, a oferta de açúcar era bem limitada e ficava restrita às farmácias, onde havia uso na formulação de remédios ou como tônico para dar energia.

Isso começou a mudar a partir do século 14, quando Portugal investiu nas suas primeiras grandes plantações de cana-de-açúcar na Ilha de Madeira, modelo que foi expandido para o Brasil — em uma escala ainda maior — a partir do século 16.

O açúcar, então, se tornou a grande commodity da então colônia portuguesa, que dependia da mão-de-obra dos escravizados nas lavouras e nos engenhos.

Brasil é o principal exportador de açúcar do mundo (Crédito: Getty Images)

Em seu livro História da Alimentação no Brasil, o historiador Luís da Câmara Cascudo estima que, entre 1583 e 1587, os 66 engenhos de Pernambuco produziram quase 3 mil toneladas de açúcar.

Ainda que boa parte dessa produção fosse exportada pra Europa, a facilidade no acesso ao açúcar no Brasil influenciou diretamente as receitas de bolos e outras sobremesas, além das conservas e compotas com frutas.

"No século 16, você já começa a perceber a alteração através dos livros de receitas das rainhas, principalmente, a alteração de receitas que eram feitas com mel ou tinham uma outra configuração. Por exemplo, o manjar branco, que antes era um prato que não era feito nem com açúcar nem mel, passa a ser feito com açúcar", explica a historiadora e professora da USP Vera Ferlini.

"Gradativamente, o açúcar vai entrando como um elemento da dieta e da constituição de um receituário, principalmente conventual, de doces, que são os que nós conhecemos: os fios de ovos, vários tipos de pasteis, esses doces com massas, o pão de ló e tudo aquilo que ainda encontramos na doçaria portuguesa. Então a doçaria brasileira vai ser uma herdeira dessa doçaria portuguesa", acrescenta.

Houve ainda a influência dos africanos e dos indígenas, que de acordo com a pesquisa de Câmara Cascudo, preferiam o gosto que vinha direto da cana, de frutas como o cupuaçu, o açaí, o guaraná e o caju, ou dos favos de mel das abelhas.

Mesmo hoje, séculos depois, o Brasil continua sendo o maior exportador de açúcar do mundo.

A revolução do leite condensado

A partir do século 20, a relação do brasileiro com o açúcar se diversificou. A industrialização dos alimentos trouxe novos produtos à mesa: refrigerantes, bolachas recheadas e o leite condensado.

Em 2021, em uma reportagem da BBC Brasil, a Nestlé disse — citando dados de uma pesquisa do Kantar Ibope, realizada em 2020 — que o leite condensado estava presente na casa de 94% dos brasileiros, que consomem em média 6 quilos e meio de leite condensado por ano.

A empresa, que é uma das maiores fabricantes do produto, afirma que o leite condensado é parte de cerca de 60% das sobremesas feitas no Brasil, um número sem paralelo em nenhum outro país.

A popularização deste produto, fabricado há mais de 100 anos, se reflete em inúmeras sobremesas no Brasil: no brigadeiro, nos mousses, pavês e, mais recentemente, no morango do amor.

"O leite condensado junta em um produto só vários atributos que o brasileiro ama. Porque a gente gosta de coisas doces, bem doces. E a gente gosta de doces molhadinhos. E o leite condensado é isso. Ele é úmido, ele é doce, ele traz textura. E ele é neutro, porque a base láctea permite esses acréscimos do pistache, do chocolate, do morango, do limão, do maracujá, do coco, do café, da laranja… Então você abre um leque de receitas com saborização enorme, com uma facilidade de uso imensa", explica a historiadora Débora Oliveira, autora do livro Dos Cadernos de Receitas as Receitas de Latinha : Indústria e Tradição Culinária (Editora Senac).

O brigadeiro, marca registrada da doçaria brasileira, usa uma lata de condensado, que tem 55 gramas de açúcar a cada 100g (Crédito: Getty Images)

Curiosamente, as primeiras campanhas de marketing promoviam o leite condensado como um alimento pra bebês e crianças, uma espécie de substituto do leite tradicional e das fórmulas infantis.

Uma marca famosa dizia para as mães: "Senhora, não se aflija com a falta de leite. Há um bom substituto, o único substituto, no qual você deve ter total confiança."

Não existe nenhuma evidência científica que sustente essas afirmações — e hoje o consumo de açúcar é desaconselhado antes dos dois anos de idade.

A BBC News Brasil entrou em contato com a Nestlé, que fabrica a principal marca de leite condensado no mercado, para que ela pudesse comentar o assunto, mas não foram enviadas respostas até a publicação da reportagem.

Alguns anos depois, o leite condensado passou a trazer fascículos com receitas, ou instruções de preparo de sobremesas nos próprios rótulos, que passaram a ser colecionados pelas donas de casa.

Segundo pesquisadores, essas campanhas acertaram ao mirar exatamente nas principais dores dos consumidores e oferecer uma solução prática, confiável e barata pra preparar alimentos ligados ao conforto e ao bem-estar de reuniões de família.

"O Gilberto Freyre tem essa frase no livro dele, que eu amo, que aqui no Brasil, o doce visita. O doce agradece. O doce dá as condolências. O doce celebra e tem um papel social. Então, quando nasce alguém, nasceu seu sobrinho, você vai visitar a criança e não leva um leitão à pururuca. Você leva um docinho. O doce tem uma função social de ser recompensa, de ser essa gratidão, onde ele simboliza muito do afeto", afirma Débora Oliveira, que tem mestrado pela USP.

O antropólogo Gilberto Freyre escreveu livros inteiros sobre a importância desse ingrediente para a formação da identidade nacional. É o caso da obra Açúcar: uma Sociologia do Doce, em que ele defende que, sem o açúcar, não é possível compreender o homem do Nordeste.

Leite condensado é usado em várias receitas brasileiras (Crédito: Getty Images)

O leite condensado também teve impacto em outros setores da vida pública, como a política.

O próprio nome de um dos doces mais populares do Brasil, o brigadeiro, teve origem nas eleições de 1945, quando o brigadeiro Eduardo Gomes candidatou-se à presidência da República. No contexto militar, brigadeiro é uma das mais altas patentes da força aérea brasileira.

Os apoiadores de Eduardo Gomes criaram o slogan: "Vote no brigadeiro, que é bonito e solteiro" e distribuíram um novo doce, que recebeu o mesmo nome, em festas e eventos de campanha.

O doce virou um sucesso, mas não foi suficiente pra garantir a vitória nas eleições, que sagraram Eurico Gaspar Dutra como o novo presidente.

Anos depois, o leite condensado voltou à cena política em uma polêmica, por representar gastos de R$ 15,6 milhões pelo Governo Federal.

Na época, o presidente era Jair Bolsonaro, que compartilhou diversos vídeos comendo esse ingrediente em um pedaço de pão.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cp3eqv91x1vo

EDITORIAL: “Nunca mais a guerra!” O grito inatendido e atualíssimo de Paulo VI

O discurso de Papa Paulo VI na ONU, em 4 de outubro de 1965 (Vatican News)

Sessenta anos atrás, a intervenção de Papa Montini nas Nações Unidas, vinte anos após o fim da imensa tragédia da Segunda Guerra Mundial. O mundo estava dividido em dois blocos e tinha apenas recentemente iniciado um tempo de diálogo e de distensão.

Andrea Tornielli

“Nunca mais a guerra, nunca mais a guerra!”. Passaram-se sessenta anos desde que Paulo VI, Bispo de Roma, elevou seu grito de paz no Palácio de Vidro das Nações Unidas. Era segunda-feira, 4 de outubro de 1965, o mundo, saído vinte anos antes da imensa tragédia da Segunda Guerra Mundial, estava dividido em dois blocos e havia apenas iniciado um tempo de diálogo e distensão, com as primeiras tentativas de acordo sobre o controle das armas nucleares.

LEIA AQUI O TEXTO COMPLETO DO DISCURSO DE SÃO PAULO VI

“A palavra que vós esperais de Nós – disse Papa Montini – e que Nós não podemos pronunciar sem estar conscientes da sua gravidade e da sua solenidade: jamais uns contra os outros, nunca mais. Não foi sobretudo com esta finalidade que nasceu a Organização das Nações Unidas: contra a guerra e para a paz?”. E acrescentava: “Escutai as palavras lúcidas de um grande desaparecido, John Kennedy”, que proclamava: “A humanidade deverá pôr fim à guerra, ou é a guerra que porá fim à humanidade”. O juízo de Kennedy revela todo o seu trágico realismo justamente na hora sombria que o mundo vive neste momento. A crise do multilateralismo e das instituições como a ONU está diante dos olhos de todos. Aquela Terceira Guerra Mundial iniciada em pedaços, que há mais de dez anos o Papa Francisco começou a denunciar, parece aproximar-se de maneira sinistra. A humanidade parece ter perdido a memória do passado recente: estamos cobertos por milhões de supostas informações da era digital que nos fazem sentir a geração mais consciente, mas estamos cercados por fake news, por propaganda de guerra, pelos interesses inconfessáveis dos fabricantes de armas e dos mercadores da morte.

A guerra fratricida no coração da Europa cristã, desencadeada pela agressão russa à Ucrânia, a guerra fratricida no coração da Terra Santa, provocada pelo ato terrorista desumano do Hamas e hoje perpetrada com violência injustificável pelo exército israelense, são apenas dois dos muitos conflitos que se combatem no mundo e permanecem esquecidos, fora dos radares. A tragédia de Gaza, a detenção e o assassinato de reféns, o massacre da população civil – de dezenas de milhares de crianças, mulheres, idosos – assim como as tantas vítimas civis da guerra na Ucrânia, representam uma afronta, um buraco negro para a consciência moral do mundo. O direito internacional e o direito humanitário são invocados e distorcidos de acordo com as conveniências do mais forte. Diante de governantes que falam de guerra, preparam a guerra, investem somas enormes em armamentos, o grito do inofensivo Pontífice de Brescia ressoa ainda hoje, mais dramaticamente atual do que sessenta anos atrás. São palavras em profunda sintonia com o sentimento dos povos, que ainda se indignam com os massacres diários aos quais assistimos e esperam que a diplomacia, a negociação, a criatividade na mediação, a capacidade de diálogo e de percorrer novos caminhos de paz, encontrem finalmente quem os trilhe em vez de se render à mais vulgar propaganda de guerra.

Para proclamar o fim das Nações Unidas, Paulo VI quis “recordar que o sangue de milhões de homens, os sofrimentos espantosos e inumeráveis, os inúteis massacres e as aterradoras ruínas sancionam o pacto que vos une, num juramento que deve mudar a história futura do mundo: nunca mais a guerra, nunca mais a guerra. É a paz, a paz que deve guiar o destino dos povos e de toda a humanidade!”. Não o esqueçamos, sobretudo hoje.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

A amizade segundo Santo Agostinho

A amizade segundo Santo Agostinho (Frases Pequenas)

A AMIZADE SEGUNDO SANTO AGOSTINHO

03/10/2025

por Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá

A amizade é um dos grandes valores da vida humana e divina (cfr. Ecl 6,14). Ela condiz com o mandamento da lei do Senhor pelo amor a Deus, ao próximo como a si mesmo (cf. Mt 22,37-39). Jesus disse para os seus discípulos que não os chamaria mais de servos, mas de amigos, porque Ele deu a conhecer tudo o que ouviu de seu Pai(cfr. Jo 15,15). A amizade com Deus faz-nos mais humanos entre nós sempre em busca da paz e do amor, da necessidade de amigos e amigas em vista do Reino de Deus. Veremos a seguir a visão da amizade em Santo Agostinho como graça de Deus e como responsabilidade humana[1].

O fato do bispo usar a palavra amizade: conhecimento e amor

Santo Agostinho tinha presente o termo amizade para exprimir idéias múltiplas. Ele a utilizava para especificar os laços que unem duas pessoas numa mútua simpatia. É o sentido que ele encontrou num plano puramente natural: “O ano da nossa amizade era apenas terminado”[[2], porque na sua juventude descreveu a morte de um amigo. Ele teve presentes também a sua relação com os maniqueus nas quais ele queria aprofundar o sentido da amizade com eles mais do que com os outros homens. Era claro que tudo ocorreu num plano natural da amizade[3]. Mas Santo Agostinho estendeu o sentido da amizade na perspectiva de um ponto de vista muito mais amplo do que o simples conhecimento. A amizade não conhece limites estreitos porque ela se estende a todos aqueles com os quais devemos o nosso amor[4]. É claro também a visão que a amizade não pode ter ligação com o pecado[5]

A amizade cristã

Santo Agostinho especificou a importância da amizade proveniente da visão cristã. Para ele era uma forma particular da caridade fraterna. O amor a Deus passa pela pessoa do próximo[6]. A Palavra de Deus fala que a caridade apaga uma multidão de pecados (cfr. 1 Pd 4,8). O bispo falava da amizade com Deus que eleva o ser humano à participação da sua mesma vida, dizendo que diante dos perigos é preciso esperar com toda segurança com a amizade de Cristo[7].

Sentimento com outra pessoa

A amizade provoca na pessoa uma relação com outra pessoa, suscitando sentimentos bons. Os afetos que unem as pessoas amigas chamam-se caridade, amor[8]. O bispo de Hipona utilizou a realidade da amizade não sendo uma questão da razão, mas para amar a outra pessoa e a Deus[9].

O dom da amizade

A amizade tem o seu ponto principal vindo do Senhor Deus. Ela é um dom divino. Toda a pessoa deve pedir esta graça para vivê-la na realidade humana. Por isso Santo Agostinho disse que “Nenhuma amizade é fiel se não em Cristo. É somente nele que esta pode ser feliz e eterna”[10]. “Ama verdadeiramente o seu amigo aquele que ama Deus no seu amigo, porque Ele vive nele ou pelo qual vive nele”[11]. O bispo continuou a sua argumentação nesta mesma linha da amizade como dom ao afirmar que é potente a misericórdia do nosso Deus, dando a sua graça para a superação da tristeza através da oração[12]. A pessoa é conhecida pela amizade dada e recebida[13].

O conceito de amizade alargada

Santo Agostinho colocou o valor da amizade em unidade com o mandamento da lei do Senhor (cfr. Mt 22, 37-38). Desta forma ele alargou e enriqueceu o conceito clássico de amizade, passando do simples conhecimento em forma de amigo, amiga, para alcançar à uma definição como amizade por uma união entre as pessoas que amam a Deus com todo o seu coração, a sua alma, e a sua mente e amam a outra pessoa como a si mesmas, são unidas por toda a eternidade umas com as outras e a Cristo mesmo. O bispo de Hipona colocou a eternidade da amizade porque ela se refere a Deus como dom dado às pessoas neste mundo em vista da eternidade. O fato é que a amizade une as almas em Deus porque elas nunca conhecerão fim, por Deus ser infinito e imortal[14].

A união das pessoas

A amizade faz uma pessoa amar a outra pessoa. Isto é graça de Deus. Segundo Santo Agostinho só Deus une pessoas, porque só Ele realiza a união das mesmas. O vinculo que as une é a caridade difundida nos corações humanos por obra do Espírito Santo que foi dado aos seres humanos (cfr. Cl 3,14). Este amor é o ágape, é aquele que une Deus Pai a Cristo, Cristo aos seus discípulos e os cristãos entre eles. Pelo seu caráter divino, o amor ágape confere à amizade cristã um caráter de estabilidade, de fidelidade, de amor. Desta forma para Santo Agostinho todas as pessoas que estão unidas a Deus, são também ligadas pela amizade, tratando-se de caridade fraterna, porque a caridade une as pessoas a Deus e às pessoas entre si[15].

A amizade é conhecimento, é amor a Deus pelas pessoas, tornando-as capazes de amar como Deus ama a todas as pessoas. É preciso cultivar amizades que nos levam à vida eterna. Santo Agostinho colocou a importância da amizade para assim fortalecer os laços entre as pessoas e com o Criador, a fonte da amizade para ser vivida neste mundo e um dia na eternidade, com o Deus Uno e Trino.

_________________________________

[1] Cfr. Marie Aquinas Mcmamara. L´amicizia in Sant´Agostino. Editrice Àncora Milano. Monza, 1970, pgs. 241-258.

[2] Cfr. Santo Agostinho. Confissões, 4,4,7. São Paulo: Paulus, 1997, pg. 94.

[3] Cfr. Idem, 5, 10,19, pgs. 133-134.

[4] Cfr. Ep. 130, 13. In: Marie Aquinas Mcmamara. L´amicizia in Sant´Agostino, pg. 242.

[5] Cfr. Serm. 20. Ibidem, pg 242.

[6] Cfr. Santo Agostinho. Confissões, 4,4,7, pg. 94.

[7] Cfr. En. in ps. 131,6: In: Marie Aquinas Mcmamara, pg. 243.

[8] Cfr. Ibidem.

[9] Cfr. Serm. 349. Ibidem, pg. 244.

[10] Contra duas ep. Pel. 1,1. In: Ibidem, pg. 245.

[11] Serm. 336,1. Ibidem.

[12][12] Cfr. Ep. 250, 3, ad Ausílio. Ibidem.

[13] Cfr. De Div. Quaest. 83, q. 71,5. In: Ibidem, pg 246.

[14] Cfr. Marie Aquinas Mcmamara. L´amicizia in Sant´Agostino, pg. 249.

[15] Cfr. Idem, pg. 251.

Fonte: https://cnbbn2.com.br/