ENTRE O CÉU E A TERRA
Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
Jesus levou os discípulos para fora da cidade, e, próximo à
Betânia, levantou a mão, abençoou-os e se despediu. Lucas transmite a
melancolia desse derradeiro adeus. Depois de tê-los amado tanto, depois de ter
vencido a falta de fé que assolara o grupo, Jesus se elevou ao céu, bem diante
de seus olhos (Lc 24,50).
Ele foi visto subindo para o céu de onde tinha vindo. Depois
daquele dia nunca mais o vimos de novo, pois ele voltou para o mistério da
Santíssima Trindade, para o seio do Pai, onde esperamos encontrá-lo quando da
nossa própria ressurreição.
Demorou, mas finalmente aconteceu. A fé foi testada numa
concretude que nunca se tinha visto. Corações foram curados. Como um aerólito
ele chegou em nosso meio. Como imigrante e refugiado ele acolheu os eliminados
da sorte, aqueles que a duras penas eram tolerados.
Os homens e mulheres que se enraizavam como podiam
encontraram nele segurança e afeto. Sua passagem neste mundo mudou tudo: a
sociedade, a ideia de bem e de fidelidade. No centro o valor dos indivíduos.
Mas como ninguém duvidava desse valor ele apresentou os sem valor e lhes deu a
marca do reconhecimento.
Até aquele grupo heterogêneo do início se modificou. Já não
é mais um agregado de mulheres e homens, mas atendemos, ainda hoje, por um nome
comum: os discípulos do Senhor.
Os primeiros de nós testemunharam a sua despedida. Ficaram
maravilhados e o adoraram. A sua natureza divina foi revelada na plenitude,
pois só a Deus se adora. Um discipulado de adoradores, que realinha, até os
dias de hoje, os caminhos das lembranças de tudo que ele havia
ensinado.
Ele voltou para céu, nós ficamos na terra, mas nós nunca
mais ficamos sem ele. As palavras de sua despedida ecoam na existência e
continuam provocando o mundo. E porque alguns ainda insistissem em perguntar:
“Senhor, é agora que vais restaurar o Reino em Israel?” (At. 1,6), Jesus
recomenda olhar em outra direção. Não a curiosidades vãs ou perda de tempo, não
temos tempo para disputas tolas (2Tm 2,22). Essencial é continuar no mundo o
que Jesus começou.
Até a contemplação dos discípulos é interrompida. Depois de
eles terem testemunhado a subida de Jesus: “Apareceram então dois homens
vestidos de branco, que lhes disseram: ‘Homens da Galileia, por que ficais
aqui, parados, olhando para o céu’?” (At 1,11).
O aprendizado foi suficiente para pôr em marcha as
engrenagens do Reino. Afinal, foi Jesus mesmo que disse: “recebereis o poder do
Espírito Santo que descerá sobre vós, para serdes minhas testemunhas em
Jerusalém, em toda a Judeia e na Samaria, e até os confins da terra” (At
1,8).
Ninguém nunca tinha ida até os confins da terra. Este é o
desafio. Um anúncio que servisse a todos os povos. Uma palavra capaz de varar a
soleira do tempo para escrever no abismo da posteridade palavras de esperança.
Isso ninguém jamais havia feito, mas ninguém também jamais havia vindo da
eternidade e para lá voltou, quebrando de vez o limiar entre o céu e a
terra.
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