Reportagem local - publicado
em 15/01/19 - atualizado em 05/11/25
O silêncio pode ser um estado de "deoversão":
um movimento interior em direção a Deus, de profunda comunhão com Ele.
O silêncio é muito importante em nossas vidas.
Mais do que a simples ausência de palavras, entendemos o silêncio como
uma capacidade para estar atento e guardar os fatos no
coração, tal como fazia Maria, Mãe de Jesus e nossa.
O homem e a mulher silentes discernem quando é
conveniente falar e quando é conveniente calar. O critério fundamental para
este discernimento é a caridade.
Pergunte-se, então, a si mesmo ou a si mesma: qual é
a razão desse meu desejo de calar, neste momento particular da minha
vida? Às vezes, este desejo pode responder a uma necessidade que
tenho de estar a sós com Deus, de ouvir com mais clareza a sua voz,
de deixar que a sua Palavra acaricie e renove meu coração, depois de um momento
muito intenso de atividade. Se este for o caso, o 'não querer falar' parece
plenamente justificado e, inclusive, pode ser uma manifestação de um chamado
especial que Deus me faz neste momento particular da minha
vida.
No seu livro sobre o Cardeal Newman, o Padre
Penido traça a personalidade do santo inglês e, entre um dos aspectos
que descobre, figura a “deoversão” que, sob um olhar superficial, pode
passar por uma simples “introversão”. Qual é a diferença entre
estes dois conceitos? Enquanto a introversão refere-se
ao estar ensimesmado, ou “voltado para dentro de si mesmo”, a “deoversão” significa
um movimento interior em direção a Deus, uma espécie de subida que a pessoa
faz, na sua experiência de comunhão com Ele.
Esta “deoversão”, que Penido descobre em Newman,
deveria ser, em realidade, uma experiência muito comum entre nós cristãos,
já que desde o nosso Batismo, a Santíssima Trindade -
Pai, Filho e Espírito Santo - habitam em nossos corações. Neste sentido, ao
fazer um movimento de “introspecção”, de entrar em nós mesmos, a nossa
experiência não deveria ser de solidão, mas de uma profunda
comunhão com Deus, que "é mais íntimo a mim mesmo do que eu
mesmo", como dizia Santo Agostinho.
Esta constatação de que a solidão não é o mais profundo em
nós, já que fomos criados à imagem e semelhança de Deus, e feitos partícipes,
pelo nosso Batismo, do amor trinitário, está também presente numa das obras
literárias de Karol Wojtyla (depois Papa João Paulo II).
Referimo-nos à sua obra teatral “Raio de paternidade”:
Rezar e pedir
Muitas vezes em nossas vidas, a resposta mais adequada às
situações e pessoas com as quais lidamos é realmente a de calar, a
de rezar e pedir a Deus alguma luz, antes de dizer ou fazer
alguma coisa concreta. Isto não significa isolamento, mas, pelo contrário,
reverência e constatação de que precisamos da ajuda de Deus para
nós mesmos sermos de alguma ajuda aos outros. Pode ser que, em algumas
situações, realmente Deus nos peça a nossa intervenção, inclusive através de
uma correção fraterna. Os mestres espirituais dizem que isto nunca deve ser
feito em momentos de ira ou exaltação, mas quando estivermos tranquilos.
A outra pessoa deve perceber que a nossa intenção é
realmente a de ajudar. Mesmo assim, em ocasiões a nossa correção pode
não ser bem aceita num primeiro momento. Isso foi previsto por Nosso Senhor,
quando explicou aos seus discípulos como devia ser feita a correção numa
comunidade cristã (Cf. Mt 18,15-18).
O máximo exemplo de silêncio, o encontramos no Senhor Jesus.
Basta uma leitura atenta da sua Paixão para percebermos como o Senhor escolhe
os momentos para calar e falar, sempre visando a salvação de todos, inclusive
daqueles que O crucificaram.
Depois Dele, a Nossa Mãe Santa Maria nos oferece um belo
exemplo de silêncio. São pouquíssimas as suas palavras nos Evangelhos,
sempre reverentes e em sintonia com a vontade de Deus. Quiçá um dos momentos
mais emblemáticos é o das Bodas de Caná, passagem que é uma verdadeira escola
de silêncio e de intimidade com seu Filho, expressa em gestos e palavras. O
que a leva a intervir, a pedir o milagre é a preocupação pelos noivos, próprias
da mãe e da intercessora que é de todos os homens e mulheres.
Peçamos a Ela que nos ajude a viver o silêncio,
a saber quando falar e quando calar, para que ambos sejam em nós uma
concretização do amor, tal como o foram na vida Dela.

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