CONJUGAR CONTEMPLAÇÃO E AÇÃO
Cardeal Paulo Cezar Costa
Arcebispo de Brasília
Neste domingo, no Evangelho, a Palavra de Deus coloca diante
de nós a atitude de duas mulheres: Marta e Maria (Lc 10, 38-42). A atitude
delas não está em oposição, mas revela aspectos importantes da existência que
devem estar correlacionados: contemplação e ação. Maria se coloca aos pés do
mestre para ouvir a sua palavra; Marta está preocupada com os muitos afazeres
da casa e interpela Jesus: “Senhor, não te importas que minha irmã me deixe
sozinha, com todo o serviço? Manda que ela venha me ajudar” (Lc 10, 40).
Papa Francisco nos ajuda a entrar no mistério desse texto do
Evangelho. “(…) Nesta cena de Maria de Betânia aos pés de Jesus, São Lucas
mostra a atitude orante do crente, que sabe estar na presença do Mestre para o
ouvir e para se pôr em sintonia com Ele. Trata-se de fazer uma pausa durante o
dia, de se recolher em silêncio, por alguns minutos, para dar espaço ao Senhor
que ‘passa’ e para encontrar a coragem de permanecer um pouco ‘à parte’ com
Ele, para depois voltar, com serenidade e eficácia, às situações da vida de
todos os dias. Elogiando o comportamento de Maria, que ‘escolheu a melhor
parte’ (v. 42), Jesus parece repetir a cada um de nós: ‘Não te deixes dominar
pelas coisas a fazer, mas, antes de tudo, ouve a voz do Senhor, para cumprir
bem as tarefas que a vida te confiar’.
“Depois há a outra irmã, Marta. São Lucas diz que foi ela
quem acolheu Jesus (cf. v. 38). Talvez Marta fosse a mais velha das duas irmãs,
não sabemos, mas certamente esta mulher tinha o carisma da hospitalidade. Com
efeito, enquanto Maria ouve Jesus, ela está totalmente ocupada com os numerosos
serviços. Por isso, Jesus diz-lhe: ‘Marta, Marta, estás inquieta e perturbada
com muitas coisas’ (v. 41). Com estas palavras, Ele certamente não tenciona
condenar a atitude de serviço, mas sobretudo a ansiedade com que às vezes ele é
vivido. Também nós compartilhamos a preocupação de Santa Marta e, seguindo o
seu exemplo, propomo-nos fazer com que, nas nossas famílias e comunidades, se
viva o sentido de hospitalidade e fraternidade, para que todos possam sentir-se
‘em casa’, especialmente os pequeninos e os pobres quando batem à porta.
“Portanto, o Evangelho de hoje recorda-nos que a sabedoria
do coração consiste precisamente em saber conjugar estes dois elementos: contemplação
e ação. Marta e Maria indicam-nos o caminho. Se quisermos
saborear a vida com alegria, devemos associar estas duas atitudes: por um lado,
‘estar aos pés’ de Jesus, para o ouvir enquanto Ele nos revela o segredo de
tudo; por outro, estar atentos e prontos na hospitalidade, quando Ele passa e
bate à nossa porta, com o rosto do amigo que tem necessidade de um momento de
conforto e fraternidade. É necessária esta hospitalidade! (…)” (Papa
Francisco, Angelus de 21 de julho de 2019).
Vivemos num mundo que talvez se assemelhe a Marta, muito
preocupado com o fazer, o operar, o realizar. A sabedoria do coração consiste
em conjugar contemplação e ação. É encontrando tempo para o silêncio, a oração,
para escutar o Senhor que vamos encontrando a unidade do nosso ser. Numa
sociedade da fragmentação, a contemplação nos ajuda a encontrar a unidade do
ser.
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