Deus advertiu Caim, dizendo-lhe que o pecado estava à porta
e que deveria dominá-lo. No entanto, Caim não deu ouvidos à advertência divina
e chamando Abel para o campo em um ato de violência brutal, matou seu irmão.
Padre José Inácio Medeiros, CSsR - Instituto Histórico
Redentorista
Uma das mais intrigantes histórias da Bíblia é a que trata
da diferença entre os irmãos Caim e Abel, colocada bem no começo da narrativa
bíblica, no livro do gênesis, diretamente ligada com a origem da humanidade
sobre a face da terra.
Caim e Abel eram filhos de Adão e Eva, o primeiro casal
criado por Deus. Abel era pastor de ovelhas, enquanto Caim trabalhava como
agricultor. Ambos decidiram oferecer sacrifícios a Deus em gratidão por suas
colheitas e criações. Abel ofereceu o melhor de seu rebanho, enquanto Caim
apresentou os melhores frutos da terra.
De acordo com a narrativa, Deus aceitou com agrado a oferta
de Abel, mas rejeitou a de Caim. As razões exatas para isso não são
explicitamente detalhadas, mas a tradição interpreta que Deus preferiu a oferta
de Abel devido à sua sinceridade e dedicação, enquanto Caim teria sido menos
generoso ou de coração impuro em sua oferta.
Tomado pelo ciúme e ressentimento, Caim, em vez de buscar
melhorar o seu comportamento, deixou que a ira o consumisse. Deus advertiu
Caim, dizendo-lhe que o pecado estava à porta e que deveria dominá-lo. No
entanto, Caim não deu ouvidos à advertência divina e chamando Abel para o campo
em um ato de violência brutal, matou seu irmão.
E aconteceu que Caim trouxe do fruto da terra uma
oferta ao Senhor. E Abel também trouxe dos primogênitos das suas ovelhas, e da
sua gordura; e atentou o Senhor para Abel e para a sua oferta. Mas para Caim e
para a sua oferta não atentou. E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o
semblante.
E o Senhor disse a Caim: Por que te iraste? E por que
descaiu o teu semblante? Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não
fizeres bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele
deves dominar.
E falou Caim com o seu irmão Abel; e sucedeu que,
estando eles no campo, se levantou Caim contra o seu irmão Abel, e o matou. E
disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, teu irmão? E ele disse: Não sei; sou eu
guardador do meu irmão?
E disse Deus: Que fizeste? A voz do sangue do teu
irmão clama a mim desde a terra. E agora maldito és tu desde a terra, que abriu
a sua boca para receber da tua mão o sangue do teu irmão. (Gn
4,3-11)
Após o assassinato, Deus confrontou Caim, perguntando:
"Onde está Abel, teu irmão?". Caim respondeu: "Não sei; serei eu
o responsável pelo meu irmão?". Então, Deus revelou que o sangue de Abel
clamava da terra por justiça. Como punição, Caim foi amaldiçoado e condenado a
vagar pelo mundo como um errante, sem uma terra para cultivar.
Embora Deus tenha infligido a punição a Caim, Ele também o
protegeu, colocando um sinal sobre ele para que ninguém o matasse durante seu
exílio.
Chegando nesse ponto a narrativa bíblica provoca uma séria
inquietação nos leitores: Em suas andanças pela terra Caim encontrou outras
pessoas fora do Paraíso, chegou a contrair matrimônio. Mas como, havia outras
pessoas fora do paraíso que Deus criou?
E saiu Caim de diante da face do Senhor, e habitou na
terra de Node, do lado oriental do Éden. E conheceu Caim a sua mulher, e ela
concebeu, e deu à luz a Enoque; e ele edificou uma cidade, e chamou o nome da
cidade conforme o nome de seu filho Enoque (Gn 4,16,17).
O drama das relações humanas
A história de Caim e Abel frequentemente é interpretada como
uma lição sobre os perigos da inveja, a importância da sinceridade no
relacionamento com Deus e as consequências da violência. Também é uma reflexão
sobre a fragilidade das relações humanas e a responsabilidade de cada indivíduo
em cuidar de seu próximo. A frase "Sou eu o cuidador do meu irmão?"
tornou-se emblemática, destacando o dever moral que os seres humanos têm uns
com os outros.
A história de Caim e Abel narrada no Livro de Gênesis, é
também um dos primeiros relatos de conflito humano, representando o drama da
inveja, do ciúme e da violência entre irmãos.
O célebre biblista Carlos Mester escreveu um livro
intitulado “Paraiso terrestre, saudade ou esperança” no qual
retoma a narrativa bíblica do paraíso e da criação dos primeiros seres humanos
não em sua versão literal, com suas múltiplas contradições como a que levou
Caim a encontrar pessoas fora do éden, mas numa versão simbólica dos primórdios
da humanidade.
O povo hebreu sustentou durante muito tempo uma tradição na
qual as histórias eram passadas de geração em geração de forma oral. Até que os
primeiros textos bíblicos passassem a ser redigidos, receberam muitas
influências dos povos vizinhos. Certas “lendas” e mitos são repetidos nas
páginas da bíblia para tentar explicar as perguntas fundamentais que a
humanidade sempre se fez: Quem sou eu? de onde eu vim? para onde eu vou? como
se explica o mal na face da terra?
A história da criação, o fratricídio entre Caim e Abel, o
dilúvio e outras narrativas bíblicas são chamados de “mitos originais”, uma
tentativa de resposta a estas perguntas fundamentais.
Primeiramente o paraíso designa não um espaço
geográfico, mas um lugar de paz e felicidade, que pode ser encontrado em
qualquer lugar e depois expressa o mundo espiritual pós-morte reservado para
todos os que serão salvos.
Porque, eis que eu crio novos céus e nova terra; e não
haverá mais lembrança das coisas passadas, nem mais subirão ao coração. Porém
vos alegrareis e exultareis perpetuamente no que eu crio; porque eis que crio
para Jerusalém uma alegria, e para o seu povo, um regozijo (Is 65,17-18).
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