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domingo, 14 de setembro de 2025

Jean Pouly: “O uso sistemático do ChatGPT pode afetar as capacidades cognitivas dos alunos”

Avec l'autorisation de Jean Pouly. (Jean Pouly) | Aleteia

Mathilde de Robien - publicado em 12/09/25

Consultor em mediação digital e apaixonado por novas tecnologias, Jean Pouly descreve a chegada da inteligência artificial (IA) no ensino como um verdadeiro tsunami. Ele oferece algumas chaves para compreender como lidar com essa nova realidade.

Aleteia: O senhor usa em seu livro a palavra “tsunami” para descrever a chegada das tecnologias digitais na educação. Em que sentido a aprendizagem foi transformada pelo digital e, mais especificamente, pela IA?

Jean Pouly: Eu retomava uma expressão usada há mais de dez anos por Emmanuel Davidenkoff em seu livro O tsunami digital. Na época, esperava-se um tsunami na educação, mas ele ainda não havia realmente acontecido: surgiram os quadros digitais e os computadores nas salas de aula, mas ainda havia professor, livros, cadernos, lápis… Hoje, porém, estamos diante de um verdadeiro “tsunami”, rápido e profundo. Duas coisas estão mudando: o fim do monopólio da escola, já que agora se aprende em todo lugar e o tempo todo, não apenas na escola ou nos livros. Pode-se aprender no ônibus, seja o código de trânsito ou acordes de violão em um tutorial.

E qual é a outra mudança em curso?

O uso constante da IA, que tem resposta para tudo, está revolucionando o acesso ao conhecimento. De repente, é como se houvesse 30 professores a mais em cada sala, diante de um professor que já não detém o monopólio do saber. Isso não significa que a escola vá desaparecer, mas redefine de forma ainda mais profunda o papel dos docentes e formadores. Ganham destaque competências insubstituíveis pela IA, como o apoio moral e afetivo, o acompanhamento personalizado, o nível de experiência e expertise do professor, o direcionamento, a capacidade de animar e motivar um grupo.

“O uso permanente da IA está transformando o acesso ao conhecimento e ao saber.”

Vemos de um lado o desenvolvimento do adaptive learning, ferramentas que se adaptam ao nível e ao progresso dos alunos, mas de outro, países como a Suécia estão reintroduzindo o livro de papel. Pode haver um retorno?

Os suecos recuaram porque perceberam que a escrita manual favorece o aprendizado e a memorização, e tiveram a coragem de voltar atrás. Mas isso não impede o avanço do adaptive learning, que considero interessante. Um sistema de IA coleta dados sobre o aprendizado de um aluno e adapta seu percurso. Isso permite personalizar a aprendizagem. Não é fácil dar aula para uma turma inteira, já que não existem dois alunos que aprendem da mesma forma. O adaptive learning propõe a cada um conteúdo ajustado a suas necessidades, ritmo e modo de aprender. É o sonho da “máquina de ensinar” enfim realizado! Vejo aí uma oportunidade de uso que deve crescer.

A partir do ensino médio, alguns professores pensam em avaliar os prompts de seus alunos. Qual é a lógica disso?

Saber usar bem a IA e redigir prompts é uma nova competência. A arte de fazer a pergunta certa, chamada prompting, é quase mais importante que a resposta da máquina. Surge então a questão: devemos avaliar os prompts dos alunos ou as respostas da IA? Se a pergunta for vaga, não tem valor algum. Perguntar, por exemplo, “Quais são as origens da Primeira Guerra Mundial?” é muito geral. Onde está a contribuição do aluno nessa questão? Nenhuma. O ideal é que os alunos reflitam antes sobre o tema e depois peçam à IA informações que complementem a inteligência humana. Avaliar prompts é uma boa ideia, desde que haja pesquisa prévia do aluno para que sua pergunta seja complexa, bem elaborada, sutil e que leve a uma resposta precisa, com real valor.

E para os deveres de casa? Os pais devem proibir o uso do ChatGPT?

Não acredito muito em proibições, mas sim na descoberta conjunta e no acompanhamento. Porém, é preciso cuidar para que certos hábitos não se instalem. O uso sistemático do ChatGPT pode prejudicar as capacidades cognitivas de um aluno. Se uma criança se acostuma a perguntar tudo à IA em vez de refletir por si mesma, o risco é que seu cérebro atrofiará. Gosto da imagem da órtese e da prótese: a IA produz seu verdadeiro valor apenas quando se conecta bem à inteligência humana. Nesse caso, ocorre um aumento da inteligência, uma “órtese digital”. Caso contrário, corremos o risco da “prótese digital”, em que a IA substitui totalmente a reflexão humana. Dar uma calculadora a um estudante de nível avançado em matemática o ajuda a progredir, mas entregá-la a uma criança que não sabe contar não fará com que ela avance. Os adultos, mesmo sujeitos a essa atrofia no longo prazo, já adquiriram os fundamentos; as crianças não. Por isso, é crucial estar atento ao impacto cognitivo. O antídoto está em fazê-los ler, refletir, elaborar pensamento próprio.

Em 2011, psicólogos americanos descreveram o “efeito Google”: a tendência de memorizar mais o caminho até a informação do que a informação em si. Podemos falar em um “efeito ChatGPT”?

Ainda é cedo para afirmar, falta perspectiva. Mas uma coisa é certa: estamos diante de uma revolução de natureza antropológica. Inventamos sistemas que nos imitam, competem conosco e, às vezes, nos substituem. Ao delegar cada vez mais funções cognitivas às máquinas, corremos o risco de enfraquecer, reduzir, atrofiar e até perder gradualmente capacidades intelectuais como refletir, relacionar ideias, sintetizar, memorizar, deduzir, classificar, hierarquizar, orientar-se. É por isso que precisamos exercitar o espírito crítico e o livre-arbítrio para decidir quando a tecnologia deve nos apoiar — como uma órtese sustenta uma articulação — ou quando passa a nos substituir, como uma prótese que ocupa o lugar de um membro.

Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/09/12/jean-pouly-o-uso-sistematico-do-chatgpt-pode-afetar-as-capacidades-cognitivas-dos-alunos/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF