O mistério da Cruz: A Liturgia de hoje, neste domingo em que
celebramos a Exaltação da Santa Cruz, coloca diante de nós o mistério da cruz
de Cristo.
Cardeal Paulo Cezar Costa - Arcebispo Metropolitano de
Brasília
A cruz era suplício de ladrões e de inimigos do império. A
teologia judaica da época de Jesus, expressa em Dt 21,21-22, afirmava que todo
aquele suspenso no madeiro era amaldiçoado, amaldiçoado por Deus. Se esse
texto, num primeiro momento, aplicava-se a quem era enforcado, posteriormente,
devido ao horror da crucifixão, começou a ser aplicado a quem era crucificado.
O texto do Evangelho (Jo 3,13-17) faz uma releitura do texto
de Nm 21,4-9, onde a serpente é levantada numa haste e todos os que eram
picados por cobra olhavam-na e ficavam curados. O Evangelho mostra que a
verdadeira salvação não vem do olhar para a serpente, mas do Filho do Homem
levantado na cruz: "Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no
deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja levantado, para que todos
os que Nele crerem tenham a vida eterna” (Jo 3,14-15). Jesus morto e ressuscitado
é o coração da nossa fé. É de Jesus crucificado e ressuscitado que vem a
salvação. Pela fé, através do batismo, a salvação realizada por Jesus Cristo se
torna nossa. Por isso, quem crê em Jesus Cristo morto e ressuscitado tem a vida
eterna. A vida eterna é viver eternamente com Jesus Cristo, em comunhão plena
com o mistério de Deus, "na contemplação e participação do seu amor
infinito. Tudo que agora vivemos em esperança, vê-lo-emos então na realidade. A
propósito Santo Agostinho escreveu: 'quando me unir a Vós, com todo o meu ser,
não existirá para mim em lado algum dor e tristeza. A minha vida será uma vida
verdadeira, totalmente cheia de Vós" (Spes non Confundit, 20).
O envio do Filho manifesta o amor do Pai, manifesta que Deus
não é indiferente diante do ser humano, mas é um Deus que ama e se envolve na
salvação: "Pois Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho único,
para que todo o que nele crê tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Através da ação
amorosa de Deus para conosco, na nossa salvação, percebe-se quem é Deus:
"Deus é Amor” (1Jo 4,16). O verbo entregar exprime o envio do Filho, Jesus
Cristo, ao mundo, mas principalmente a sua morte de cruz, onde o Pai entregou o
seu Filho amado pela nossa salvação.
Por isso, contemplando o mistério da cruz que era símbolo de
horror, de maldição, nós contemplamos o amor de Deus por nós. A cruz, a partir
do momento em que foi assumida pelo Filho como instrumento de salvação, não
perdeu a sua tragicidade, mas se tornou expressão do amor de Deus por nós. Por
isso, nós a veneramos como instrumento de salvação. Ela permanece, sempre para
o cristianismo, critério de juízo para medir a nossa capacidade de amar e a
nossa doação. Que celebrar a exaltação da Santa Cruz nos ajude a perceber que
não existe cristianismo sem cruz, que o verdadeiro seguimento de Jesus Cristo
implica tomar a nossa cruz e segui-lo pelos caminhos da vida e da história.
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