“Não temas, pequeno rebanho”. Evangelizar em uma época de
mudanças (1)
É hora de mudar o olhar, de passar da nostalgia à audácia, de uma fé em posição defensiva a uma fé que propõe com confiança uma visão do mundo e da vida.
23/10/2025
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Um “apóstolo moderno”[3] pode
se sentir também, como um desses exploradores de baixa estatura, em um mundo de
gigantes. Exploradores que desejariam levar ao coração do mundo a arca da
aliança que iluminará todas as nações. “Filhos da luz, irmãos da luz: isso
somos. Portadores da única chama capaz de iluminar os caminhos terrenos das
almas, do único fulgor, no qual nunca poderão dar-se obscuridades, penumbras ou
sombras”[4].
Como o povo que acompanhava Josué, gostaríamos de encontrar
a confiança para passar do deserto a uma terra compartilhada com pessoas muito
diferentes. Porque é essa imersão que nos permitirá converter-nos em luz para
os povos. Para consegui-lo, no entanto, é preciso primeiro dar esse grande
passo que o povo no deserto deixou pendente. É necessário decidir-se a entrar
em contato. Nós, um povo eleito, mas bem consciente de nossa
pequenez e insuficiência; e os outros, que são a verdadeira razão
pela qual o Senhor nos escolheu. Esses outros, que parecem às vezes gigantes, e
que podem dar a impressão de ser tão diferentes, mas que no fundo são como nós.
Alguns deles ainda não conhecem o Deus vivo e verdadeiro, ou têm uma imagem
equivocada d’Ele. E necessitam de nós, porque apesar de viver em uma terra
rica, passam frequentemente por momentos difíceis.
Em todo caso, “não é verdade que toda a gente de hoje –
assim, em geral e em bloco – esteja fechada ou permaneça indiferente ao que a
fé cristã ensina sobre o destino e o ser do homem; não é verdade que os homens
destes tempos se ocupem só das coisas da terra e se desinteressem de olhar para
o céu. Ainda que não faltem ideologias – e pessoas que as sustentam – que
permanecem fechadas, há em nossa época anseios elevados e atitudes rasteiras,
heroísmos e covardias, idealismos e desenganos; criaturas que sonham com um
mundo novo mais justo e mais humano, embora outras, decepcionadas talvez com o
fracasso dos seus primitivos ideais, se refugiem no egoísmo de procurar apenas
a sua própria tranquilidade ou de permanecer imersas no erro”[5].
Como sair ao seu encontro? Como decidir-se, não apenas a
entrar em contato, mas a permanecer em um intercâmbio permanente com tantas
pessoas que encontramos pelo caminho da vida? Em muitos lugares do mundo é
evidente que nós, cristãos nos convertemos em um “pequeno rebanho” (Lc 12, 32),
como eram os nossos primeiros irmãos na fé. Como é claro, lemos de vez em
quando com alegria notícias alentadoras: por exemplo sobre o crescente número
de batismos de adultos em alguns países ou sobre o aumento de vocações sacerdotais
em outros continentes. Dá-nos também segurança ver tantos jovens celebrando o
jubileu junto com o Papa. Tudo isso nos dá alegria, porém, não impede que, em
alguns lugares, continuemos sendo uma minoria, às vezes silenciada por uma
cultura que com frequência não assimila a fé cristã. As gerações mudam e a
transmissão da fé torna-se mais difícil. Compreende-se o desconcerto de muitos
pais e mães que, apesar de seus esforços, não conseguiram transmitir a fé
cristã a seus filhos. Com frequência, tentaram fazer o que viram seus pais
fazerem. Desta vez, no entanto, a transmissão não funcionou. Algo saiu mal.
Entre outros fatores causados por este fenômeno, um deles é a mudança radical
do contexto, que agora exige algo diferente.
Bento XVI explicava como “enquanto, no passado, era possível
reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo
aos conteúdo da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é
assim em grandes sectores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que
atingiu muitas pessoas”[6].
Anos atrás o venerável Fulton Sheen já o havia anunciado
também com grande lucidez, diante de um público atônito: “estamos no fim da
cristandade. Não do cristianismo, não da Igreja, mas da cristandade. Pois bem,
o que se entende por cristandade? A cristandade é a vida econômica, política e
social inspirada nos princípios cristãos. Isso está chegando a seu fim, nós o
vimos morrer”. No entanto, acrescentava, “estes são dias grandes e maravilhosos
para estarmos vivos (...). Não se trata de um panorama sombrio, é simplesmente
uma visão instantânea da Igreja em meio a uma oposição crescente por parte do
mundo. Vivam, portanto, suas vidas com plena consciência desta hora de prova e
apoiem-se no coração de Cristo”[7].
[3] São
Josemaria, Caminho n. 335.
[4] São
Josemaria, Carta 6, n. 3.
[5] São
Josemaria, É Cristo que passa, n. 132. Cfr. também F. Ocáriz, Carta
pastoral, 14/02/2017, n. 1.
[6] Bento
XVI, Carta apostólica Porta fidei, n.2.
[7] Fulton
Sheen, citado em De la cristiandad a la misión apostólica,
Universidade de Mary, Rialp, Madrid, 2025, p. 30.

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