Foi apresentado em Roma o relatório de 2025 da fundação
pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre. Segundo os dados, mais de 5,4 bilhões de
pessoas vivem em nações onde o direito de expressar livremente a própria fé é
sistematicamente negado. O autoritarismo dos governos é uma ameaça global.
Federico Piana - Cidade do Vaticano
O número é perturbador: “dois terços da humanidade vive em
países onde a liberdade religiosa não é plenamente garantida”. Se colocássemos
em fila um por um dos homens, das mulheres e das crianças que são impedidos de
rezar, externar a própria crença publicamente, ou que são até massacrados por
causa de sua fé, teríamos diante de nós um exército infindável: mais de 5,4
bilhões de pessoas a quem é negado não um privilégio, mas um direito.
Relatório extenso
E a Fundação pontifícia internacional Ajuda à Igreja que
Sofre (ACN, sigla em inglês) reitera esse fato em cada página, em cada dado, em
cada análise do novo relatório sobre a liberdade religiosa no mundo,
apresentado nessa terça-feira, 21/10, no auditório do pontifício Instituto
Patrístico Agostiniano de Roma. São 1.200 páginas - nunca assim tão numerosas
desde que, há 25 anos, foi publicado pela primeira vez este estudo bienal. A
extensão do documento demostra claramente como as coisas não estão indo bem. De
fato, em um quarto de século, elas até mesmo pioraram.
A intervenção do cardeal secretário de Estado no Pontifício
Instituto Patrístico Augustinianum para a apresentação do Relatório 2025 sobre
a liberdade religiosa no mundo publicado ...
Não apagar os holofotes
Isso foi confirmado pelos próprios palestrantes que, ao
apresentarem o relatório, pediram que não fossem apagados os holofotes sobre um
fenômeno sempre mais perigoso e talvez fora do controle.
Sandra Sarti, presidente da ACS Itália, Regina Lynch,
presidente da ACN Internacional, e Alfredo Matovano, subsecretário da
Presidência do Conselho de Ministros Italiano, moderados por Alessandro
Gisotti, vice-diretor da mídia do Vaticano, expressaram a convicção
compartilhada de que toda a comunidade internacional não pode mais evitar uma
intervenção imediata. Sem desviar o olhar.
Atitude também encorajada pelo cardeal secretário de Estado
Pietro Parolin, que em seu discurso de abertura alertou que é "dever dos
governos e das comunidades abster-se de forçar alguém a violar suas convicções
profundas ou de impedir que alguém as viva autenticamente".
Poucos progressos
Mas ao ler o Relatório — apresentado pela diretora editorial
do documento, Marta Petrosillo — entende-se como tudo isso é sistematicamente
desconsiderado. Antes de tudo, porque a pesquisa minuciosa, que analisou 196
nações no período de janeiro de 2023 a dezembro de 2024, “documenta graves
violações em 62 do total. Desse, 24 são classificados como países de
‘perseguição’ e 38 como países de ‘discriminação’”.
Só duas nações – Cazaquistão e Sri Lanka – registraram
melhorias em relação às edições anteriores do estudo. Na maioria dessas nações,
a causa da repressão religiosa é resultado do autoritarismo: “Os governos
recorrem a tecnologias de vigilância de massa, censura digital, legislações
injustas e prendem arbitrariamente para atingir as comunidades religiosas
independentes. O controle da fé se transformou em um instrumento de poder
político”.
Nacionalismo religioso
A África e a Ásia também sofrem com o aumento do jihadismo e
do nacionalismo religioso. Segundo o relatório, “em 15 países dos dois
continentes, essas são causas principais da perseguição e, em outros 10,
contribuem para a discriminação”. O epicentro da violência jihadista parece
estar em toda a área de Sahel, onde centenas de milhares de pessoas encontram a
morte e onde comunidades e cidades inteiras são deslocadas.
“O nacionalismo étnico-religioso - acrescenta o relatório -
alimenta, paralelamente, a repressão de minorias em algumas áreas da Ásia.
Estamos diante, em alguns casos, de uma ‘perseguição híbrida’, uma combinação
de leis discriminatórias e violência perpetrada por civis, mas encorajada pela
retórica política”.
A causa das guerras
Os conflitos que estão ensanguentando o mundo, como aqueles
na Ucrânia, no Mianmar e em Gaza, deram um impulso sem precedentes à violação
da liberdade religiosa. “As guerras geraram um crise silenciosa de
deslocamento. No Sahel, por exemplo, aldeias inteiras foram destruídas por
milícias islâmicas. Em tudo isso, também se insere o crime organizado que
emergiu como um novo agente de perseguição: grupos armados matam ou sequestram
líderes religiosos e extorquem dinheiro das paróquias para exercitar o controle
territorial”.
Europa e América do Norte também atacadas
Também na Europa e na América do Norte a liberdade religiosa
é severa e constantemente atacada. Para se ter uma ideia sobre isso, basta
observar os dados: “Em 2023, a França registrou quase mil ataques a igrejas. Na
Grécia, foram verificados outros 600 atos de vandalismo. Números semelhantes
foram registrados também na Espanha, na Itália e nos Estados Unidos”.
Ajuda à Igreja que Sofre, pela primeira vez, lançou uma
petição global, afirmaram os organizadores, para que “os governos e as
organizações internacionais garantam a proteção efetiva do artigo 18 da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reconhece, a todas as pessoas, o
direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião”.
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