Aleteia
Brasil - publicado em 20/09/19 - atualizado em 24/10/25
Muitos de nós consideramos a depressão um tempo sombrio,
uma página vergonhosa de nossa história, uma doença que aleija a alma.
O que faz a vida parecer tão frequentemente sem sentido a uma
pessoa?” Esta é uma pergunta que você já pode ter se feito durante algum tempo,
ou que esteja se fazendo agora. O que para os pássaros é a muda – época em que
trocam de plumagem, os tempos difíceis –, a depressão é para os seres humanos.
Uma visão diferenciada
Talvez tenhamos um conceito muito negativo desta que se
tornou a doença dos últimos tempos. Por isso, gostaria de propor-lhes uma visão
diferenciada, um outro modo de encarar o que para nós possa ser sinônimo apenas
de fracasso. Acredito que muitos frutos podem ser colhidos nesse tempo;
lembro-me agora de algumas frutas próprias do inverno e de como alegram os dias
chuvosos e sombrios. Passada essa época, permanece a lembrança, não das chuvas
e do frio, mas dos frutos da estação.
Porém, antes de falarmos mais sobre este assunto, é
imprescindível estabelecer a diferença entre a depressão de caráter endógeno e
a depressão decorrente de lutas e angústias, que também podemos chamar de
psico-espiritual. Esta definição é necessária, pois o nosso objetivo é tratar
apenas desta.
Depressão endógena X Depressão psico-espiritual
As depressões endógenas podem ser desencadeadas por um fator
psicológico, mas são condicionadas bioquimicamente e até hereditariamente
alicerçadas. Nesse caso, é preciso uma farmacoterapia adequada e acompanhamento
médico. Pode acontecer, inclusive, que esse tipo de depressão não esteja
vinculado a nenhuma crise pessoal ou estressor social. Por exemplo, uma pessoa
depressiva que traz em sua história familiar a depressão em gerações
anteriores, ou que apresenta um déficit de serotonina, quando está livre da crise,
consegue dedicar-se ao seu sentido de vida. Mas existem também os casos em que
os dois tipos de depressão vêm juntos.
Vejamos agora o que é a depressão psico-espiritual, que tem
acometido tantas pessoas, independentemente de faixa etária, nível socioeconômico,
profissional e religioso. Segundo Victor Frankl, psicoterapeuta
existencialista, essa depressão é causada por um vazio existencial, decorrente
de uma falta de sentido de vida, podendo ser encontrado por trás de uma vida
profissional excessiva, no refúgio de uma atividade desportiva, na fuga para o
mundo dos romances ou televisão, nos fenômenos psicológicos de massa, no
decaimento psicofísico dos aposentados, na necessidade de nunca se deixar
descansar ou na febre de novas ações e novas experiências.
Esse vazio não chega a ser uma enfermidade, salvo quando
acompanhado por sintomas na dimensão psicofísica, mas provoca um quadro
depressivo – apatia, desânimo generalizado, desinteresse por tudo ao redor,
podendo causar inclusive o suicídio –; adição – desespero frente ao tempo,
corre-se atrás de um relógio, sem nunca parar, com receio de enfrentar seu
próprio vazio –; e agressividade – pode ser explícita, como a que vemos tomar
as manchetes de jornais de todo o mundo, e implícita, presente nos relacionamentos,
nas discussões no trânsito etc.).
O Inverno e os frutos
Pronto! agora que você já sabe do que se trata a depressão,
podemos voltar a falar de um assunto mais interessante: do inverno e dos
frutos, dos pássaros e suas plumagens… Você já havia pensado na depressão como
algo assim? Olhando-a desta maneira, não nos parece tão terrível, não é mesmo?!
Muitos de nós consideramos a depressão um tempo sombrio, uma
página vergonhosa de nossa história, uma doença que aleija a alma. Difícil
considerá-la um tempo de crescimento, de maturidade, de transformação… Será por
causa da pergunta que se faz? Aquela acerca do sentido da vida? Afinal,
reconhecer-se confuso, admitir que o mundo não lhe satisfaz, que a felicidade é
simples, que o trabalho não lhe preenche, não é lá muito fácil! É preferível
não mexer nisso, vestir o luto e ver no que vai dar. Sim ou não?! Não.
Vejamos o porquê: a depressão enquanto condição humana, se
bem orientada, deve conduzir o ser humano à tomada de consciência da sua
própria vida e do seu sentido último (nada de fugir de si mesmo!). Quando isso
acontece, estamos falando de maturidade espiritual, uma vez que é reconhecida a
necessidade de orientar-se para Alguém que o transcende – para quem fomos
criados, para uma missão a realizar e/ou uma pessoa a conhecer e amar. Isso é
próprio do ser humano, é uma lei inscrita em seu coração, não dá para negar
esta verdade. Temos desejo de Deus.
Consideremos, então, a depressão uma prova que o Senhor nos
envia. Não são todos os que o Senhor decide provar desta maneira, mas,
permito-me dizer, que os escolhidos por Ele são dotados de muita coragem, pois
a crise consiste em admitir que se está vazio e que é preciso encher-se; que se
tem sede e precisa-se de água, e para isso é preciso romper com muitas coisas,
como fez a samaritana. “Deus tem sede que tenhamos sede dele”, já dizia Santo
Agostinho.
O motivo está dentro
Se conseguirmos entender a depressão desta forma,
aceitaremos este meio que o Senhor escolheu para nos amar, e todo o vazio será
ocupado por Sua presença que se encarregará de dar sentido à nossa vida. Mas,
se buscamos um motivo fora de nós para tamanha tristeza e melancolia, muito
pouco Deus poderá fazer por nós, uma vez que nos recusamos aceitar que temos
sede Dele. Termino com uma citação de Santa Teresinha, intercedendo a Deus por
você, que passa hoje por esta dor. Não esqueça: Ele não nos prova acima de
nossas forças.
“É preciso que Deus nos ame com um amor todo particular para
provar-nos desta maneira. Não percamos a provação que o Senhor nos envia, ela é
uma mina de ouro a ser explorada, será que vamos perder a ocasião?”

Nenhum comentário:
Postar um comentário