D. Virgílio Antunes celebra 40 anos de ordenação sacerdotal
e em entrevista ao jornal “Correio de Coimbra” recorda o seu percurso de vida e
reflete sobre o presente e o futuro da Igreja.
Rui Saraiva – Portugal
Virgílio do Nascimento Antunes nasceu há 64 anos na aldeia
da Pia do Urso, paróquia de São Mamede, na diocese de Leiria-Fátima e celebra
40 anos de ordenação sacerdotal.
Partilha memórias do seu percurso de vida e algumas
reflexões com o “Correio de Coimbra”, numa entrevista conduzida pela jornalista
Sônia Neves, diretora daquele jornal diocesano e agora também diretora do
Secretariado Diocesano das Comunicações Sociais de Coimbra.
Viver com Jesus a vida toda
D. Virgílio Antunes foi ordenado a 29 de setembro de 1985.
Foi aluno do Seminário Menor em Leiria e recorda o momento quando na sua
infância pensou pela primeira vez ser padre.
“A primeira vez que eu pensei em ser padre foi na igreja,
quando naquela catequese, que era a doutrina, que tinha um grande grupo na
igreja, o padre falou na possibilidade que nós tínhamos, enquanto criança, de
viver com Jesus a vida toda. E depois, a certa altura, eu acabei por pensar que
queria viver com Jesus a vida toda e por dizê-lo. Acabei por dizê-lo à minha
professora na escola primária. E ela disse: “então, podes ser padre, podes ir
para padre”, que era a expressão mais comum. E pronto, porque não teve assim um
impacto grande, mas de facto aconteceu. O conjugar estes diferentes fatores e
com o auxílio dela, depois do meu pároco e da minha família, acabei por ir para
o seminário menor logo aos dez anos.
Naturalmente, quando se vai para um seminário menor, como
era um seminário de Leiria naquela altura, que era um regime bastante aberto de
uma residência no seminário, das aulas no exterior, no ciclo preparatório, no
liceu. Andávamos à vontade, íamos para as aulas a pé, fazendo ali vinte minutos
ou meia hora a pé, dentro de uma cidade que era uma vilazinha que era muito
pequena na altura. Andava toda a gente à vontade, toda a gente tranquila.
Naturalmente, o sair de casa constituiu alguma marca, porque
tinha acabado de fazer dez anos. Mas depois, no contexto, na envolvência, no
ambiente, tínhamos um benefício, é que íamos a casa praticamente todos os fins
de semana. E, portanto, ao sábado de manhã íamos para casa e regressávamos, ou
no domingo à noite, ou na segunda de manhã, a tempo de ir para as aulas. Era um
seminário menor com esta particularidade que não dava aquela sensação de um
afastamento tão distante da família”, afirma.
Deus é tudo na tua vida
Aos dezoito anos, o jovem Virgílio Antunes ingressou no
Seminário Maior de Coimbra. Desses tempos de discernimento recorda uma frase
que o marcou: “Deus é tudo na tua vida”.
“Em mim teve muita importância, na altura, uma frase que
circulava em alguns movimentos eclesiais, que era “Deus é tudo na tua vida”. Se
estás com Deus, estás com tudo. Depois, a forma de realização da tua vocação
pode ser diversificada desde que tenhas como objetivo fundamental manter-te em
Deus e sentires que Deus é tudo na tua vida.
E isto, do ponto de vista espiritual, dá uma volta ao
pensamento e ao modo de ser e ao modo de estar de uma pessoa. E deixa-se de
andar a fazer cálculos, contas, o que é que é melhor, o que é que é pior, o que
é que se ganha, o que é que se perde, do ponto de vista da razão. E passa-se a
uma dimensão que é mais espiritual e essa quando entra definitivamente em nós é
sempre vencedora. E esta ideia, para mim, teve muita importância”, assinala.
Memórias excelentes do tempo de Seminário
D. Virgílio Antunes tem memórias excelentes do seu tempo de
formação no Seminário de Coimbra. Lembra a relação de amizade com os seus
formadores.
“Tenho memórias muito boas do meu tempo de seminarista,
tenho memórias muito boas do meu tempo de seminarista, no seminário menor, em
Leiria, nessas circunstâncias que eu referi, memórias excelentes do meu tempo
de Coimbra, foram uns seis anos maravilhosos, éramos um grupo pequeno, tínhamos
uns sacerdotes fabulosos, havia ali sintonia, havia amizade, portanto foi um
tempo fabuloso.
Havia um sacerdote que nos acompanhava aqui em Coimbra, que
depois acabou por falecer bastante novo, chamava-se Rogério, padre Rogério, e
que era o nosso irmão, era o nosso pai, era nosso amigo, era uma relação
muitíssimo boa, muitíssimo boa, que não mostrava nada daquilo que às vezes eu
via na literatura, o seminário é isto, o seminário é aquilo, eu não conheci
algum tipo de seminário que fosse assim uma coisa dessas, estranha, obscura,
não conheci, e portanto tive uma experiência de seminário muito tranquila”,
declara.
A Sagrada Escritura é uma paixão
E eis que o seu percurso de sacerdote estava destinado para
o estudo de Ciências Bíblicas em Roma. E com passagem por Jerusalém. O bispo de
Coimbra afirma que estudar a Sagrada Escritura é uma paixão.
“Eu estava a trabalhar no seminário de Leiria há sete anos,
colaborava também nas paróquias ali ao lado, nunca fiquei só fechado ali, e
depois o bispo de Leiria, o mesmo bispo que me tinha ordenado, D. Alberto Cosme
do Amaral, um dia chamou-me para me dizer que queria que fosse estudar a
Sagrada Escritura, Ciências Bíblicas para o Instituto Bíblico de Roma.
Foi uma novidade. Não sabia que isso iria acontecer e
deixou-me um bocadinho atemorizado. O facto de ir para fora, o facto de ser
ciências bíblicas, que à partida já sabia que era um percurso bastante
exigente, sobretudo por causa do estudo das línguas originais, o hebraico, o
aramaico e o grego, e sobretudo daquela escola jesuítica.
É uma escola de muito exigência, que aperta muito com as
pessoas, mas, confiei. Fui no mês de setembro para Roma, em 1992. Fui estudar
um bocadinho de italiano e depois iniciei aquele percurso de estudar grego e
hebraico. De manhã grego e hebraico de tarde, durante um ano inteiro, depois os
outros anos seguintes. Concluí com tranquilidade. Depois foi Jerusalém. No
final, já conhecia a realidade de Jerusalém, que era importante para a formação
bíblica, fui conhecer mais da história bíblica, a arqueologia bíblica, os
lugares bíblicos, a geografia bíblica. Fiz a proposta de mandar uma carta ao
bispo da altura que, entretanto, tinha mudado, era D. Serafim de Sousa,
Ferreira e Silva, a pedir se me concedia a possibilidade de ir um semestre
frequentar a escola bíblica e arqueológica francesa de Jerusalém. E ele
respondeu que sim. Eu fiquei até mais uma vez admirado, porque além do tempo,
também era dinheiro, porque custa dinheiro. E ele respondeu-me que sim, de modo
que me deixou muito feliz.
Foi uma experiência única de estudar no Instituto Bíblico de
Roma, estudar a Sagrada Escritura, é uma paixão”, sublinha.
Em Fátima, uma experiência inesquecível
D. Virgílio Antunes foi também reitor do Santuário de
Fátima, experiência que recorda como absolutamente inesquecível, pelo lugar,
pela mensagem, pela espiritualidade.
“Foi mais uma experiência de vida que é absolutamente
inesquecível, pelo lugar, pela mensagem, pelo significado, pela espiritualidade
mariana e católica, que foi sempre muito importante, que sempre fez parte da
minha vida.
Eu tinha também, de algum modo, nascido ali um bocadinho à
sombra da devoção à Nossa Senhora, incluindo o conhecimento da vida dos
pastorinhos, as peregrinações, desde a escola primária… Fez sempre parte da
minha vida”, salienta.
No futuro, mais entusiasmo, mais ânimo e confiança
Para o futuro, D. Virgílio Antunes gostava de ver mais
entusiasmo, mais ânimo e confiança na Igreja em Portugal. Uma Igreja mais viva
e mais dinâmica.
“Dito assim de forma muito breve, gostava de ver muito mais
entusiasmo, muito mais ânimo, muito mais confiança. Não significa que gostasse
de ver uma igreja exuberante, não é isso que eu peço… Nem uma igreja exuberante
ou uma igreja dominadora, mas uma Igreja extremamente visível, da parte dos
cristãos, uma Igreja com mais entusiasmo, com mais ânimo, com mais espírito,
com mais fé, com mais capacidade de testemunho, sem medo de mostrar aquilo que
é e de dar a sua colaboração em ordem à transformação da própria comunidade
humana, da própria sociedade, de uma forma humilde e de uma forma simples, de
forma como nos sentimos irmãos e em que abraçamos a humanidade toda, mesmo que
não se identifique com a nossa fé, nem com os nossos valores, nem com os nossos
ideais. Eu gostava de ver uma Igreja em Portugal mais viva, mais dinâmica”,
disse D. Virgílio Antunes.
Caminho sinodal para se viver em fraternidade
O bispo de Coimbra afirma que o caminho sinodal é o caminho
da Igreja, para que se possa viver mais na partilha e na fraternidade.
“É o caminho, evidentemente. É uma história muito antiga que
teve agora neste pontificado do Papa Francisco e concretamente na realização do
sínodo um epicentro, por assim dizer, no que diz respeito à clarificação, ao
assumir desta convicção da clarificação, inclusivamente de muitas realidades
que precisavam ser clarificadas. A Igreja de Cristo tem que viver mais no amor,
tem que viver mais na partilha, tem que viver mais na fraternidade, tem que ser
uma Igreja em que todos podem partilhar os dons de Deus, em que as relações, um
tema fundamental no sínodo, as relações têm de ser, de facto, fraternas, a
partir da comunhão com Deus, evidentemente, em que todos têm o seu lugar, a sua
missão, a sua participação, a sua quota parte de responsabilidade no ambiente
de fraternidade e de amor cristão. Portanto, há muito que nós temos de fazer e
a sinodalidade diz isso tudo”, declara o bispo de Coimbra.
D. Virgílio Antunes celebra 40 anos de ordenação sacerdotal
neste Ano Santo de 2025. Foi formador no Seminário de Leiria, professor no
Seminário de Coimbra, estudou Ciências Bíblicas em Roma e Jerusalém e foi
reitor do Santuário de Fátima. É desde 28 de abril de 2011, bispo de Coimbra.
Laudetur Iesus Christus
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