Translate

sábado, 30 de dezembro de 2023

Sagrada Família

Sagrada Família (Crédito: Guadium Press)

Uma família constituída em torno da Lei divina jamais se afastará de Deus. As bênçãos e as graças divinas pairam sobre ela.

Redação (30/12/2022, Gaudium Press) Após o Natal, a Santa Igreja reserva um dia específico para festejar a Sagrada Família, convidando-nos a refletir sobre o valor e o verdadeiro sentido da instituição familiar.

Ela é a célula-mãe, o fundamento da sociedade, e se hoje assistimos a uma tremenda crise moral na humanidade, isso se deve em certa medida à desagregação da família. Abalada esta, o resto da sociedade não se sustenta.

Lemos no Gênesis que, depois de criar o homem e a mulher, Deus abençoou-os e lhes disse: “Frutificai e multiplicai-vos” (Gn 1,28). Homem e mulher: era a primeira família, formada por mãos divinas. Esta união é tão adequada à natureza humana que, no Antigo Testamento, não se compreendia o celibato, pois quase equivalia “a cometer um homicídio, a diminuir no mundo a semelhança divina”,[1] salvo no caso de vocações muito especiais como, por exemplo, a de Santo Elias. Não ter filhos e morrer sem descendência era considerado um sinal de castigo e de maldição.

Já no Novo Testamento, Nosso Senhor Jesus Cristo inaugurou um novo estado de vida, o celibato religioso, do qual Ele próprio é o sublime arquétipo. Também São João Batista, o varão que desfechava o Antigo Testamento e apontava para o Novo, não se casou. Entretanto, uma vez fundada a Igreja, era preciso haver uma noção mais clara e sólida da religiosidade da família, tendo representado um enorme benefício a existência, ao lado desta, de quem se consagrasse inteiramente a Deus pela prática da castidade perfeita. Deste modo, coíbe-se a tendência do homem de satisfazer seu egoísmo, de se voltar só para o que é material e sensível, esquecendo-se de Deus.

A finalidade da família

Como o desígnio de Deus para a generalidade das pessoas é que o homem se una à mulher em casamento para constituírem um lar, a vocação ao celibato é uma exceção aos padrões da natureza. No entanto, por ocasião da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, a família adquire caráter sobrenatural pela elevação da união matrimonial, contrato natural entre um homem e uma mulher, à categoria de Sacramento, simbolizado na misteriosa e indissolúvel união entre Cristo e sua Igreja. Isto contraria a ideia errada, em voga na atualidade, de que a família não tem um objetivo religioso, mas apenas social ou afetivo.

São Paulo, na segunda leitura da liturgia de hoje, insiste no amor mútuo – conceito atualmente tão deturpado ― como uma novidade trazida por Nosso Senhor Jesus Cristo:

“Como o Senhor nos perdoou, assim perdoai também. Mas, sobretudo, amai-vos uns aos outros, pois o amor é o vínculo da perfeição” (Cl 3,12-14).

Dentro do convívio familiar deve existir um amor intenso entre esposo e esposa, nem sentimental nem romântico, decorrente do amor a Deus e visando antes de tudo a santificação do outro cônjuge e, por conseguinte, de toda a família.

Por sua vez, o salmo responsorial sublinha um outro dever familiar:

“Felizes os que temem o Senhor e trilham os seus caminhos!” (cf. Sl 127, 1)

Este Salmo nos põe no contexto da relação familiar, que precisa ser pervadida por esse temor de Deus: pai, mãe e filhos jamais quererão ofendê-Lo! Esta é a família bem constituída, imitadora da Sagrada Família.

Uma família assim composta, jamais se afastará de Deus. As dificuldades virão – esta verdade é inegável –, pois é impossível ― ao contrário da ideia divulgada por certos filmes ou novelas ― viver sem dificuldades. “Militia est vita hominis super terram ― A vida do homem sobre a Terra é uma luta” (Jó 7, 1). Eis a verdadeira chave da felicidade familiar: o respeito recíproco entre os esposos. Nunca discutirem ou se desentenderem, sempre dispostos a perdoar as fraquezas mútuas, a suportar as diferenças temperamentais, adaptando-se às preferências do outro.

A família em torno da Lei de Deus

Eis o aspecto maravilhoso da família quando se desenvolve em torno de um eixo: a Lei de Deus, o próprio Deus.

A Igreja nos propõe nesta festa litúrgica o inigualável exemplo da Sagrada Família: São José, obediente, de nada se queixa; Nossa Senhora toma os reveses com inteira cordura e submissão; e o Menino Jesus Se deixa conduzir e governar por ambos, sendo Ele o Criador do Universo. Nós também devemos, portanto, ser flexíveis à vontade de Deus e estar dispostos a aceitar com doçura de coração, com resignação plena e total, os sofrimentos que a Providência exigir ao longo de nossa vida.

Esta atitude diante da cruz é a raiz da verdadeira felicidade, bem-estar e harmonia familiar, e atrai sobre cada um de nós graças especialíssimas que nos restauram as almas, curando-as das misérias e firmando-as rumo ao Céu.

Peçamos à Sagrada Família que, por sua intercessão, floresça nas famílias de toda a Terra a sólida determinação de abraçar sempre mais a via da santidade, da perfeição e da virtude, buscando em primeiro lugar o Reino de Deus e de Maria, na certeza de que, em compensação, o resto virá por acréscimo.

Por Guilherme Motta

Extraído, com adaptações, de: CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O inédito sobre os Evangelhos: comentários aos Evangelhos dominicais. Città del Vaticano-São Paulo: LEV-Instituto Lumen Sapientiæ, 2012, v. 1, p. 135-147.


[1] BONSIRVEN, Joseph. Le judaïsme palestinien au temps de Jésus-Christ. 2. ed. Paris: Gabriel Beauchesne, 1935, t. II, p. 207.

Fonte: https://gaudiumpress.org/

sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

O hino oficial da Igreja para agradecer a Deus no fim do ano

Te Deum na Basílica de São Pedro em 31 de dezembro de 2003 |
© giulio napolitano- shutterstock
Por Reportagem local - publicado em 29/12/23
Será que a Igreja tem uma oração específica de ação de graças para encerrar o ano? Sim: temos um belíssimo hino que existe há mais de 1600 anos!

A Igreja tem uma oração específica de ação de graças que costuma ser solenemente entoada em forma de canto gregoriano ao término de cada ano – muito embora não se trate de uma prece restrita a essa data, mas sim de uma oração que pode (e deveria) ser rezada todos os dias.

Como quer que seja, a resposta é sim, temos um belíssimo hino de ação de graças que pode certamente ser considerado a “oração oficial” da Igreja para agradecer a Deus no fim do ano.

Estamos falando do célebre hino “Te Deum laudamus”, que, em latim, quer dizer “Nós Vos louvamos, ó Deus”. O nome do hino, que vem da sua primeira frase, também é costumeiramente abreviado como “Te Deum”.

Essa preciosa oração, que pode ser cantada e que existe há mais de 1600 anos, faz parte do Ofício de Leituras da Liturgia das Horas. Sua autoria é atribuída a Santo Ambrósio e a Santo Agostinho, por ocasião do batismo deste último pelo primeiro, em 387, na catedral de Milão. Algumas correntes, no entanto, o atribuem a Santo Hilário ou, mais recentemente, ao bispo Nicetas de Remesiana.

Tradicionalmente cantado em eventos solenes como agradecimento por todas as bênçãos recebidas, o “Te Deum” é também rezado todos os dias por inúmeras comunidades religiosas de todo o mundo logo ao início de cada jornada. Afinal, a ação de graças é uma das formas de oração que mais nos fazem progredir espiritualmente, levando-nos a reconhecer a Bondade, a Beleza e a Verdade do Criador que se manifestam em nossa vida, apesar de todas as adversidades.

Eis o texto do cântico no original em latim e numa das traduções mais usadas em português.

Em latim: “Te Deum laudamus”

Te Deum laudamus: te Dominum confitemur.
Te æternum Patrem omnis terra veneratur.
Tibi omnes Angeli; tibi cæli et universæ Potestates;
Tibi Cherubim et Seraphim incessabili voce proclamant:
Sanctus, Sanctus, Sanctus, Dominus Deus Sabaoth.
Pleni sunt cæli et terra maiestatis gloriæ tuæ

Te gloriosus Apostolorum chorus,
Te Prophetarum laudabilis numerus,
Te Martyrum candidatus laudat exercitus.
Te per orbem terrarum sancta confitetur Ecclesia,
Patrem immensæ maiestatis:

Venerandum tuum verum et unicum Filium;
Sanctum quoque Paraclitum Spiritum.

Tu Rex gloriae, Christe.
Tu Patris sempiternus es Filius.
Tu ad liberandum suscepturus hominem,
non horruisti Virginis uterum.

Tu, devicto mortis aculeo,
aperuisti credentibus regna caelorum.
Tu ad dexteram Dei sedes, in gloria Patris.
Iudex crederis esse venturus.

Te ergo quaesumus, tuis famulis subveni:
quos pretioso sanguine redemisti.
Aeterna fac cum sanctis tuis in gloria numerari.

(Adicionado posteriormente, contendo trechos do Salmos:)

Salvum fac populum tuum, Domine, et benedic hereditati tuae.
Et rege eos, et extolle illos usque in aeternum.
Per singulos dies benedicimus te;
Et laudamus Nomen tuum in saeculum, et in saeculum saeculi.
Dignare, Domine, die isto sine peccato nos custodire.

Miserere nostri Domine,
miserere nostri.
Fiat misericordia tua, Domine, super nos,
quemadmodum speravimus in te.
In te, Domine, speravi: non confundar in aeternum.

Em português: “A Vós, ó Deus, louvamos”

A Vós, ó Deus, louvamos e por Senhor nosso Vos confessamos.
A Vós, ó Eterno Pai, reverencia e adora toda a Terra.
A Vós, todos os Anjos, a Vós, os Céus e todas as Potestades;
A Vós, os Querubins e Serafins com incessantes vozes proclamam:
Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus dos Exércitos!
Os Céus e a Terra estão cheios da vossa glória e majestade.

A Vós, o glorioso coro dos Apóstolos,
A Vós, a respeitável assembleia dos Profetas,
A Vós, o brilhante exército dos mártires engrandece com louvores!
A Vós, Eterno Pai, Deus de imensa majestade,

Ao Vosso verdadeiro e único Filho, digno objecto das nossa a adorações,
Do mesmo modo ao Espírito Santo, nosso consolador e advogado.

Vós sois o Rei da Glória, ó meu Senhor Jesus Cristo!
Vós sois Filho sempiterno do vosso Pai Omnipotente!
Vós, para vos unirdes ao homem e o resgatardes
não Vos recusastes a entrar no casto seio duma Virgem!

Vós, vencedor do estímulo da morte,
abristes aos fiéis o Reino dos Céus,
Vós estais sentado à direita de Deus,
no glorioso trono do vosso Pai!
Nós cremos e confessamos firmemente
que de lá haveis de vir a julgar no fim do mundo.

A Vós portanto rogamos que socorrais os vossos servos
a quem remistes com o Vosso preciosíssimo Sangue.
Fazei que sejamos contados na eterna glória,
entre o número dos Vossos Santos.

Salvai, Senhor, o vosso povo e abençoai a vossa herança,
E regei-os e exaltai-os eternamente para maior glória vossa.
Todos os dias Vos bendizemos
E esperamos glorificar o vosso nome agora e por todos os séculos.
Dignai-Vos, Senhor, conservar-nos neste dia e sempre sem pecado.

Tende compaixão de nós, Senhor,
compadecei-Vos de nós, miseráveis.
Derramai sobre nós, Senhor, a vossa misericórdia,
pois em Vós colocamos toda a nossa esperança.
Em Vós, Senhor, esperei, não serei confundido.

Entoado como canto gregoriano

Ouça em oração esta interpretação do “Te Deum” como canto gregoriano:

https://youtu.be/c_gcJc1MmCQ

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Dos Sermões de São Bernardo, abade

Na plenitude dos tempos veio a plenitude da divindade (iCatólia)

Dos Sermões de São Bernardo, abade

(Sermo 1 in Epiphania Domini, 1-2: PL 133, 141-143)            (Séc. XII)

Na plenitude dos tempos, veio a nós a plenitude da divindade


Apareceu a bondade e a humanidade de Deus, nosso Salvador (cf. Tt 3,4). Demos graças a Deus que nos dá tão abundante consolação neste exílio, nesta peregrinação, nesta vida tão miserável.


Antes de aparecer a sua humanidade, a sua bondade também se encontrava oculta; e, no entanto, esta já existia, porque a misericórdia do Senhor é eterna. Mas como poderíamos conhecer tão grande misericórdia? Estava prometida, mas não era experimentada e por isso muitos não acreditavam nela. Muitas vezes e de muitos modos, Deus falou por meio dos profetas (cf. Hb 1,1). E dizia: Eu tenho pensamentos de paz e não de aflição (cf. Jr 29,11). E o que respondia o homem, que experimentava a aflição e desconhecia a paz? Até quando direis paz, paz e não há paz? Por esse motivo, os mensageiros da paz choravam amargamente (cf. Is 33,7), dizendo: Senhor, quem acreditou no que ouvimos? (cf. Is 53,1).


Agora, porém, os homens podem acreditar ao menos no que vêem com seus olhos, pois os testemunhos de Deus são verdadeiros (cf. Sl 92,5); e para se tornar visível, mesmo àqueles que têm a vista enfraquecida, armou uma tenda para o sol (Sl 18,6).


Agora, portanto, não se trata de uma paz prometida, mas enviada; não adiada, mas concedida; não profetizada, mas presente. Deus Pai a enviou à terra, por assim dizer, como um saco pleno de sua misericórdia. Um saco que devia romper-se na paixão para derramar o preço de nosso resgate nele escondido; um saco, sim, que embora pequeno estava repleto. Pois, um menino nos foi dado (cf. Is 9,5), mas nele habita toda a plenitude da divindade (Cl 2,9). Quando chegou a plenitude dos tempos, veio também a plenitude da divindade.


Veio na carne para se revelar aos que eram de carne, de modo que, ao aparecer sua humanidade, sua bondade fosse reconhecida. Com efeito, depois que Deus manifestou sua humanidade, sua bondade já não podia ficar oculta. Como poderia expressar melhor sua bondade senão assumindo minha carne? Foi precisamente a minha carne que ele assumiu, e não a de Adão, tal como era antes do pecado.

Poderá haver prova mais eloquente de sua misericórdia do que assumir nossa miséria? Poderá haver maior prova de amor do que o Verbo de Deus se tornar como a erva do campo por nossa causa? Senhor, que é o homem, para dele assim vos lembrardes e o tratardes com tanto carinho? (Sl 8,5). Por isso, compreenda o homem até que ponto Deus cuida dele; reconheça bem o que Deus pensa e sente a seu respeito. Não perguntes, ó homem, por que sofres, mas porque ele sofreu por ti. Vendo tudo o que fez em teu favor, considera o quanto ele te estima, e assim compreenderás a sua bondade através da sua humanidade. Quanto menor se tornou em sua humanidade, tanto maior se revelou em sua bondade; quanto mais se humilhou por mim, tanto mais digno é agora do meu amor. Diz o Apóstolo: Apareceu a bondade e a humanidade de Deus, nosso Salvador. Na verdade, como é grande e manifesta a bondade de Deus! E dá-nos uma grande prova de bondade Aquele que quis associar à humanidade o nome de Deus.

Fonte: https://liturgiadashoras.online/

A Festa da Sagrada Família

A Sagrada Família (Portal Kairós)

A FESTA DA SAGRADA FAMÍLIA

Dom José Gislon
Bispo de Caxias do Sul (RS)

Estimados irmãos e irmãs em Cristo Jesus! Como povo de Deus a caminho da casa do Pai, dentro das celebrações do Tempo do Natal, neste último domingo do ano celebramos a festa da Sagrada Família. É a celebração em que recordamos aquela família simples de Nazaré, formada por Jesus, Maria e José. Mas também é uma celebração para colocarmos diante do Senhor a realidade das famílias, das nossas famílias, muitas vezes feridas e desestruturadas, pela falta de amor, compaixão, perdão e reconciliação. Onde o individualismo não conhece limites, nem abre espaço no coração para acolher e cuidar de uma nova vida. 

A festa da Sagrada Família nos traz a realidade e a simplicidade daquele lar de Nazaré, onde os seus moradores tinham no coração algo de muito precioso, que não se pode comprar, nem vender. Esse bem precioso, que existia no lar de Nazaré, chama-se “amor”. E o amor foi importante para acolher aquela criança, cuidá-la e ajudá-la a crescer e viver no mundo a missão que Deus Pai lhe havia confiado.  

O amor da família marcou a vida de Jesus e marca também a vida de cada um de nós. Tendo presente que todo ser humano que vem a este mundo precisa de amor, independente da condição social de quem o gerou, da família ou lugar que o acolhe. Os filhos são uma benção de Deus, porque, através deles, o mundo e a humanidade renovam a esperança em relação ao futuro. Embora nem sempre damos a devida importância, mas a família dá praticamente a direção da nossa vida. Nela nós vivemos a experiência do andar, do caminhar juntos nas estradas de Deus e do mundo. Ela é quem nos sustenta nos momentos difíceis, desenvolve a nossa maturidade no amor, e torna mais fácil e suportável os empenhos do dia a dia. 

A família é o lugar privilegiado para a formação e a educação básica da vida de uma pessoa, mas não é a único. Toda criança também precisa integrar-se numa comunidade, para que possa crescer, amadurecer, encontrar os irmãos e irmãs e aprender a acolher, a disponibilidade gratuita, a colaboração, a tolerância e o perdão. Para isso, é preciso que a família se abra a novos horizontes. Porque quando essa se fecha no seu pequeno mundo de afetos e interesses, pode perder o contato com a comunidade, deixando de construir fraternidade, alimentando apenas uma certa idolatria da instituição familiar. 

Mesmo com tantas mudanças sociais, que tocaram e fragilizaram a instituição “família”, podemos afirmar com convicção que a essência e os compromissos da família são definidos pelo amor. E a família recebe a missão de guardar, revelar e comunicar o amor, como um reflexo vivo e real do amor de Deus pela humanidade. 

Senhor Deus, que não falte amor em nossas famílias. Amor que favoreça o perdão e a reconciliação entre pais e filhos. Amor que defenda a vida, amor que gere a vida, amor que saiba amar sem medida.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Papa aos jovens de Taizé: ousem construir um mundo novo

Encontro da comunidade ecumênica Taizé (Vatican Media)

Francisco escreve aos jovens que participam em Ljubljana do 46º Encontro Europeu de Taizé, que começa hoje (28/12). O Papa incentiva os participantes a ouvir e a acolher os que estão à margem da sociedade.

Vatican News

O Papa Francisco enviou suas saudações aos jovens reunidos em Ljubljana com a comunidade de Taizé "para rezar e compartilhar a vida do povo local e das comunidades eclesiais". O 46º Encontro Europeu de Taizé, uma reunião ecumênica de jovens de vários países e denominações, acontece de 28 de dezembro a 1º de janeiro e tem como tema central: "Caminhando juntos".

Coragem para ouvir e dialogar

Na mensagem assinada pelo cardeal secretário de Estado Pietro Parolin, o Santo Padre destaca a possibilidade que os participantes têm de viver "a bela experiência da amizade com Deus e com os outros" como Igreja e comunidade.

Como o "Corpo do Senhor Ressuscitado presente no mundo", os jovens são convidados a redescobrir a arte de ouvir, um ato de amor que está no coração da escuta. Em um mundo onde os conflitos e as guerras surgem continuamente devido à falta de escuta, o Papa exorta a juventude a "ousar construir um mundo diferente, um mundo de escuta, diálogo e abertura".

46º Encontro Europeu de Taizé (Vatican Media)

Trabalhar pela "transformação qualitativa"

O desafio, diz o Papa, é "trabalhar para a transformação qualitativa de nossa vida nas sociedades", especialmente evitando todas as formas de "marginalização, fechamento, exclusão e rejeição" de várias categorias de pessoas. Assim, diz Francisco, os jovens podem desenvolver  "culturas e religiões para um mundo estável e aberto".

Viver como Jesus

Francisco incentiva a juventude a se comprometer a viver como Jesus, que não excluía ninguém, mas reconhecia a presença de Deus naqueles que estavam à margem da sociedade.

O cardeal Parolin conclui a carta com a garantia de que o Papa Francisco "conta com vocês e confia em vocês, e a Igreja confia em vocês". O Papa, diz o secretário de Estado do Vaticano, está pedindo que, com suas palavras e ações, "transmitam uma mensagem forte ao nosso mundo, que rejeita os vulneráveis. Tornem seus sonhos de amor, justiça e paz uma realidade concreta. Não deixem que seus sonhos sejam roubados e contribuam para construir uma sociedade digna".

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

S. TOMÁS BECKET, BISPO DE CANTUÁRIA, MÁRTIR

S. Tomás Becket (Biblioteca Apostólica Vaticana)
29 de dezembro

“Aceito a morte, em nome de Jesus e pela Igreja”. Tomás Becket pronunciou estas palavras pouco antes de morrer. Assim, cumpria-se uma parábola extraordinária do seu testemunho cristão. Aquele homem poderoso, acostumado a comandar, morreu como mártir e servo de Cristo, por não renegar à sua fé e por manter a liberdade da Igreja Católica.

Estadista

Tomás nasceu em Londres, em 1118, em uma família de origem da Normandia. Desde a juventude, foi encaminhado à carreira eclesiástica. Formou-se na Abadia de Merton e, a seguir, estudou na França e frequentou a universidade de Bolonha, distinguindo-se sempre pelas suas qualidades intelectuais.

Em 1154, foi arquidiácono na diocese de Cantuária; no ano seguinte, o novo Rei da Inglaterra, Henrique II, o nomeou Chanceler do seu reino. Tomás era o homem de maior confiança do monarca; vivia uma vida de bem-estar e não renunciava às insígnias e privilégios do poder. Não obstante, o nosso Santo nunca deixou de ser generoso com os pobres e demonstrou sua liberdade interior mesmo diante do soberano, do qual não só era conselheiro, mas também pessoa de confiança.

Ao serviço da Igreja

A reviravolta na vida de Tomás Becket deu-se em 1161, quando aceitou de se tornar Arcebispo de Cantuária. Tal nomeação foi fortemente recomendada por Henrique II, que jamais teria imaginado de encontrar um convicto adversário naquele que, uma vez, era seu colaborador mais íntimo. Desde então, Tomás passou a servir a um Senhor, bem maior que aquele soberano terreno. O contraste entre ambos ocorreu quando o rei quis limitar a liberdade e a independência da Igreja Católica na Inglaterra, por meio das chamadas Constituições de Clarendon. Tomás foi solicitado a sigilar aquela Carta, que delimitava as prerrogativas da Igreja, mas o novo Arcebispo de Cantuária demonstrou ser um baluarte invencível. A imposição do rei foi rejeitada com determinação: “Em nome de Deus onipotente, não colocarei meu sigilo”. Assim, o amigo de então se torna, aos olhos do rei, um inimigo obstinado.

Mártir da fé e da liberdade

Tomás experimentou os sofrimentos do exílio: foi hóspede em um mosteiro Cisterciense e, depois, encontrou refúgio na França, onde permaneceu seis anos distante da sua pátria.

Ao retornar a Cantuária, foi acolhido com alegria pelos fiéis, o que causou uma maior adversidade por parte da Coroa. Narra-se que, certo dia, Henrique II havia expresso o desejo de que alguém liquidasse aquele Bispo incômodo. Seu desejo foi levado a sério por quatro cavaleiros, que partiram de Londres rumo a Cantuária. Assim, Tomás Becket foi barbaramente assassinado a facadas no interior da sua Catedral. Era o dia 29 de dezembro de 1170. Narra-se ainda que, diante da pergunta dos seus assassinos “Onde está Tomás, o traidor?”, o arcebispo tenha respondido: “Estou aqui, mas não sou um traidor; sou apenas um bispo e sacerdote de Deus”.

A imensa comoção que este assassinato suscitou foi além dos confins da Grã-Bretanha, tanto que, apenas três anos depois, no dia 21 de fevereiro de 1173, o Papa Alexandre III sancionou o seu martírio, elevando-o à honra dos altares.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Papa Francisco volta a alertar: com o diabo não se dialoga

Andreas Solaro | AFP
Por Reportagem local - publicado em 27/12/23
Na audiência geral desta quarta-feira, o Pontífice ainda fez uma recomendação muito importante.

Na audiência geral desta quarta-feira, 27 de dezembro de 2023, o Papa Francisco iniciou um ciclo de catequeses com o seguinte tema: “Vícios e virtudes. Guardar o coração”.

O Santo Padre afirmou que “Deus coloca os progenitores como senhores e custódios da criação, mas quer preservá-los da presunção da onipotência, de se tornarem senhores do bem e do mal”.

Francisco ainda falou sobre as tentações e alertou: “o diabo é um sedutor. Nunca dialoguemos com ele, porque ele é mais esperto do que todos nós e far-nos-á pagar. Quando tiveres uma tentação, nunca dialogues. Fecha a porta, fecha a janela, fecha o coração.”

Veja a íntegra da catequese do Papa:

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de introduzir um ciclo de catequeses sobre o tema dos vícios e das virtudes. E podemos começar precisamente pelo início da Bíblia, onde o livro do Gênesis, através da narração dos progenitores, apresenta a dinâmica do mal e da tentação. Pensemos no Paraíso terrestre. No quadro idílico representado pelo jardim do Éden, aparece uma personagem que se torna o símbolo da tentação: a serpente, a personagem que seduz. A serpente é um animal insidioso: move-se lentamente, rastejando no chão, e às vezes a sua presença nem sequer se nota – é silenciosa – pois consegue camuflar-se bem com o seu ambiente e sobretudo isto é perigoso.

Quando começa a conversar com Adão e Eva, demonstra ser também um dialético requintado. Começa como se faz numa má bisbilhotice, com uma pergunta maliciosa: «É verdade que Deus disse: não comerás de nenhuma árvore do jardim?» (Gn 3, 1). A frase é falsa: na realidade, Deus ofereceu ao homem e à mulher todos os frutos do jardim, exceto os de uma árvore específica: a árvore da ciência do bem e do mal. Esta proibição não tem por objetivo impedir ao homem o uso da razão, como às vezes é mal interpretado, mas é uma medida de sabedoria. Como se dissesse: reconhece o limite, não te sintas senhor de tudo, pois a soberba é o princípio de todos os males. E assim, a história diz-nos que Deus coloca os progenitores como senhores e guardiães da criação, mas quer preservá-los da presunção da omnipotência, de se fazerem senhores do bem e do mal, que é uma tentação, uma péssima tentação até hoje. Esta é a insídia mais perigosa para o coração humano.

Como sabemos, Adão e Eva não conseguiram opor-se à tentação da serpente. A ideia de um Deus não realmente bom, que queria mantê-los submissos, insinuou-se na sua mente: eis o desabamento de tudo.

Com estas narrações, a Bíblia explica-nos que o mal não começa no homem de modo ruidoso, quando um ato já se manifestou, mas o mal tem início muito antes, quando começamos a entreter-nos com ele, a embalá-lo na imaginação, nos pensamentos, acabando por ser enganados pelas suas lisonjas. O homicídio de Abel não começou com uma pedra lançada, mas com o rancor que Caim guardou desventuradamente, levando-o a tornar-se um monstro dentro de si. Também neste caso, de nada servem as recomendações de Deus.

Prezados irmãos e irmãs, com o diabo não se dialoga. Nunca! Nunca se deve discutir. Jesus nunca dialogou com o diabo; expulsou-o. E no deserto, durante as tentações, não respondeu com o diálogo; retorquiu simplesmente com as palavras da Sagrada Escritura, com a Palavra de Deus. Atenção: o diabo é um sedutor. Nunca dialoguemos com ele, porque ele é mais esperto do que todos nós e far-nos-á pagar. Quando tiveres uma tentação, nunca dialogues. Fecha a porta, fecha a janela, fecha o coração. E assim, defendemo-nos desta sedução, porque o diabo é astuto, é inteligente. Procurou tentar Jesus com citações bíblicas, apresentando-se como grande teólogo. Atenção! Com o diabo não se dialoga, e com a tentação não devemos entreter-nos, não se dialoga. A tentação vem: fechemos a porta, guardemos o coração!

É preciso ser guardiões do próprio coração. Por isso não dialoguemos com o diabo. É a recomendação – preservar o coração – que encontramos em vários padres, nos santos. E devemos pedir esta graça de aprender a velar sobre o coração. É uma sabedoria conseguir guardar o coração. Que o Senhor nos ajude neste trabalho. Mas quem guarda o próprio coração, conserva um tesouro. Irmãos e irmãs, aprendamos a preservar o coração.

Saudações:

Saúdo os peregrinos de língua portuguesa. As “Boas Festas”, que trocamos, sejam expressão da alegria que sentimos por saber que Deus está presente no meio de nós e caminha conosco. A todos desejo um feliz Ano Novo, repleto das bênçãos de Deus Menino.”

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Sete acontecimentos que marcaram a Igreja em 2023

Cúpula do Vaticano | date 72 - Shutterstock

 

Por Abel Camasca

28 de dez de 2023

O ano de 2023 está prestes a terminar e por isso a ACI Digital apresenta uma retrospectiva dos sete acontecimentos mais importantes que marcaram a vida da Igreja Católica neste ano.

1. O enterro de Bento XVI

No último dia de 2022, quando todos se preparavam para receber 2023, a Igreja teve a notícia da morte do papa Bento XVI. Seu corpo foi exposto ao público na Basílica de São Pedro no dia 2 de janeiro e milhares de pessoas foram para se despedir.

O papa alemão, que foi prefeito da então Congregação (hoje Dicastério) para a Doutrina da Fé durante o pontificado de são João Paulo II, teve um funeral especial no dia 5 de janeiro com uma missa massiva rezada pelo papa Francisco. Os restos mortais do papa que surpreendeu com a sua renúncia ao pontificado em 2013 foram sepultados nas grutas vaticanas.

2. JMJ Lisboa 2023, com mais de 1 milhão e meio de peregrinos

Depois de quatro anos de espera por causa da pandemia do coronavírus, a grande Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023 aconteceu em Portugal de 1 a 6 de agosto. Neste grande evento, o papa Francisco encontrou-se com milhares de jovens de todo o mundo.

Francisco aproveitou a ocasião para visitar o local das aparições de Nossa Senhora de Fátima. Ele também celebrou uma missa solene de encerramento da qual participaram um milhão e meio de peregrinos. Lá também foi anunciado que a sede da próxima JMJ será Seul, em 2027.

3. A beatificação de uma família completa

Num acontecimento sem precedentes, em setembro deste ano a Santa Sé anunciou a beatificação de uma família inteira. Trata-se dos beatos da família Ulma, composta por Józef, Wittoria e seus sete filhos. Eles foram brutalmente exterminados pelos nazistas, incluindo um bebê que nasceu em meio ao martírio.

beatificação ocorreu no dia 10 de setembro em Markowa, Polônia, numa missa celebrada pelo prefeito do Dicastério para as Causas dos Santos, cardeal Marcello Semeraro, com a participação de cerca de 30 mil pessoas vindas de vários países.

4. A guerra em Gaza

Quando o mundo olhava perplexo para a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que começou em fevereiro de 2022, o início de outra guerra surpreendeu cristãos, judeus e muçulmanos. Por causa de um ataque de terroristas do Hamas em território israelense, no dia 7 de outubro, festa e Nossa Senhora do Rosário, Israel intensificou as suas operações militares na Faixa de Gaza.

Atualmente, os terroristas do Hamas mantêm israelenses sequestrados na área, enquanto os militares israelenses procuram desmantelá-los. Muitos morreram em ambos os territórios, incluindo duas cristãs que frequentavam a única paróquia católica em Gaza.

5. O Sínodo da Sinodalidade

Depois de dois anos de preparação e consulta em todo o mundo, teve início no dia 4 de outubro o Sínodo da Sinodalidade, no qual pela primeira vez mais de 50 mulheres tiveram direito a voto. No dia 28 de outubro, a Santa Sé publicou o relatório de síntese do sínodo e no dia seguinte o papa Francisco esteve presente na missa de encerramento.

A segunda parte do Sínodo continuará em outubro de 2024. Entretanto, a Secretaria Geral do Sínodo da Sinodalidade informou que nestes meses será feito trabalho sobre alguns temas, como o “aprofundamento da investigação teológica e pastoral sobre o diaconato e, mais especificamente, sobre o acesso das mulheres ao diaconato”.

6. A bênção às uniões do mesmo sexo

Em 18 de dezembro foi publicada a declaração “Fiducia supplicanssobre o sentido pastoral das bênçãos” do Dicastério para a Doutrina da Fé, assinada pelo papa Francisco. O documento autoriza bênçãos de casais em situação irregular, como divorciados em nova união, e uniões do mesmo sexo.

Esta nova diretriz, que permite a bênção a uniões do mesmo sexo num contexto não litúrgico e no qual não se confunda com um tipo de casamento, suscitou reações diversas entre cardeais e bispos de diferentes partes do mundo.

7. Perseguição contra a Igreja Católica na Nicarágua

No dia 24 de dezembro, o segundo vigário da catedral de Matagalpa, padre Jader Guido, foi preso durante 12 horas pelo governo da Nicarágua. Isto porque na missa da manhã o sacerdote pediu pelo seu bispo, dom Rolando Álvarez, bem como por todos os padres e religiosos da diocese.

O bispo de Matagalpa, dom Rolando Álvarez, está preso desde 10 de fevereiro de 2023, quando o regime de Daniel Ortega, ex-líder guerrilheiro de esquerda que soma 30 anos no poder, condenou o bispo a mais de 26 anos de prisão, acusado injustamente de “traidor da pátria”.

Em 20 de dezembro, um segundo bispo também foi preso. Foi o bispo de Siuna, dom Isidoro del Carmen Mora Ortega, de 63 anos. A prisão ocorreu um dia depois de o bispo ter celebrado uma missa em Matagalpa e ter pedido para rezar pelo bispo de lá, dom Rolando Álvarez. O governo da Nicarágua também proibiu diversas procissões.

Fonte: https://www.acidigital.com/

Francisco e o escândalo do Evangelho, o caminho desafiador

Cristo, bom pastor (Vatican Media)

Então, disse Jesus aos Doze: "Não quereis também vós partir?" Simão Pedro respondeu-lhe: "Senhor, a quem iremos? Tens palavras de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus" (Jo 6, 67-69). Uma reflexão acerca de "Fiducia supplicans", o documento recentemente publicado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé sobre o significado pastoral das bênçãos.

Por Francesco Ognibene

"Não quereis também vós partir?" Parece que ainda podemos ouvir essas palavras provocativas de Jesus quando, diante do escândalo de sua pregação, aqueles que o seguiam e diziam acreditar nele foram embora, como se houvesse uma medida da inteligência e do coração que nem mesmo Deus pode ultrapassar se não quiser ser abandonado pelos "seus".

A cena evangélica da solidão à qual o Senhor se entrega por ter se revelado plenamente em seu amor inaudito por nossa humanidade desencaminhada vem à mente toda vez que se eleva o escândalo de alguns cristãos em torno do Papa, que nos pede passos adiante na compreensão do Evangelho. Passos que nem sempre são fáceis, até mesmo indigestos para muitos, mas desde quando a fé nos promete uma vida fácil? O Papa Francisco, e antes dele outros Papas que conhecemos, nunca se detém nas convicções familiares e reconfortantes, ele continua a reler para nós o depósito da fé e da doutrina, mostrando-nos novos aspectos que, à luz de tempos complicados e incertos como os nossos, podem até provocar a reação instintiva de parar, de não segui-lo, ou até mesmo de ir embora. Como se achássemos exagerado o que Pedro nos explica, basicamente convencidos de que ele não pode nos pedir que o acompanhemos até aí. E, em vez disso, poderia ser exatamente dessa passagem mais impermeável que depende uma nova clareza sobre a mensagem cristã da qual desejamos ser testemunhas convictas. Algumas reações nestas horas após a divulgação da Declaração do Dicastério para a Doutrina da Fé Fiducia supplicans "sobre o significado pastoral das bênçãos", com as passagens sobre os casais formados por pessoas do mesmo sexo, parecem propor novamente aquela cena evangélica marcante: o Mestre que lança o olhar e vê o grupo de discípulos diminuindo e as fileiras de detratores aumentando. Um giro pelas mídias sociais é iluminador: alguns dão as costas ao Papa, outros o rechaçam, outros ficam indignados com ele, outros o contestam e relatam, cada um a seu modo, o que os levou a formar uma dissidência que resvala para a hostilidade. Hoje, como naquela época, há aqueles que acreditavam ter encontrado a verdade triunfante sobre o poder ideológico e opressor; em vez disso, a ilusão cai, com aquela doutrina que parecia tão certa e brilhante de repente se tornando desarmada, paradoxal, difícil demais de digerir, diferente das expectativas: "Essa palavra é dura! Quem pode escutá-la?"

No capítulo 6º de João, a solidão de Jesus dá um nó na garganta, com aquela carícia instintiva de Pedro ("A quem iremos? Tens palavras de vida eterna") acalmando uma das páginas mais amargas dos Evangelhos. A mesma emoção nos toma - confessamos - ao ler os ataques ao Papa por ter "ido longe demais" na misericórdia, com a bênção aos pecadores, como é cada um de nós, sem exceção, em busca de uma palavra que acolha e de uma mão que encoraje. O que seria tão inaceitável nesse cristianismo de pureza? Ao invés, há aqueles que não aceitam, reagem, rejeitam. E acabam derrubando a própria base da doutrina - a proclamação dirigida àqueles que devem ser convertidos, ou seja, você, eu, todos - na qual inspiram sua vida. O Evangelho virado de cabeça para baixo pode, assim, tornar-se uma vara brandida em nome da verdade, sua lei do amor transfigurada em um julgamento preventivo, a consciência do próprio limite removida para dar lugar à certeza de estar entre os já salvos, a certeza de ter as chaves do Reino no bolso, enquanto ele, o Papa, não, as teria perdido. E paciência para as noventa e nove ovelhas que estão vagando em algum lugar lá fora: o importante é estar seguro daquilo que se acredita ter entendido de uma vez por todas. "O magistério não pode ser mudado", é a voz que ribomba de um chat em um blog. Se isso fosse verdade, o Vaticano II - por exemplo - teria sido muito cuidadoso em não se abrir para a santidade dos leigos na vida cotidiana (um dos lugares mais infestados de pecado que se possa imaginar), uma ideia que até outro dia beirava a heresia

O risco da incompreensão e da solidão faz parte do anúncio evangélico desde o momento em que Deus se encarnou numa criança, em uma situação de degradação indescritível, contemplada por pastores e não por teólogos, embalada por uma jovem sem nada em um lugar remoto na periferia do mundo, não em Roma ou em Atenas. O gesto mais escandaloso da história humana. No entanto, daquela inversão do estabelecido senso comum do tempo (e do nosso também, para ser honesto), daquela história invertida, somos todos filhos. Seria útil lembrar disso agora que é Natal e, em casa, custodiamos zelosamente o presépio como penhor de um segredo precioso, para reconduzir-nos assim à dificilíssima humildade de ouvir, ler, esforçar-se para entender, para abraçar uma lógica que pode não ser a nossa - ainda não -, mas se for de fato a de Deus, então é uma perda de tempo nos colocarmos contra ela.

É o Papa que nos assegura isso, não um opinionista ou um influenciador passageiro. É o Papa, escolhido pelo Espírito Santo, a pedra sobre a qual o Senhor continua a edificar sua Igreja em todas as épocas. É o Papa que nos confirma e nos assegura na fé, que nos recorda todos os dias que não estamos iludidos, que este é o caminho. Cansativo, sem dúvida. Mas, junto com ele, temos certeza de uma coisa: que não nos perdemos, nunca nos perderemos. Não o deixemos sozinho, permaneçamos perto dele, com afeto e gratidão, justamente porque, como um bom pai, ele tem a coragem de propor um caminho desafiador, sabendo que somos capazes. E, por outro lado, a quem iremos?

Fonte: Avvenire, diário da Conferência Episcopal Italiana (CEI)

https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF