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segunda-feira, 29 de maio de 2023

“O mal que o homem pode fazer parece inacreditável”, lamenta Papa

Antoine Mekary | ALETEIA | #image_title

Por I. Media

"Sou rápido para julgar, apontar o dedo e bater a porta na cara dos outros, vendo-me como vítima de tudo e de todos? […] Ou eu perdoo, promovo a reconciliação e crio comunhão?"

Para as pessoas “desconectadas umas das outras, anestesiadas pela indiferença e oprimidas pela solidão”, o Papa Francisco recomendou o recurso ao Espírito Santo, durante a missa que celebrou na festa de Pentecostes, em 28 de maio, na Basílica de São Pedro. Sem o Espírito Santo, o Papa também disse, “a fé é apenas uma doutrina, a moralidade apenas um dever”.

“Tantas guerras, tantos conflitos: o mal que o homem pode realizar parece inacreditável”, lamentou o 266º Papa em sua homilia. Por trás dessas “hostilidades”, ele denunciou “o espírito de divisão, o demônio”, que “se deleita com antagonismos, injustiças e calúnias”.

Sem o Espírito Santo, “a Igreja é inerte”

Observando que “nossos esforços para construir a harmonia não são suficientes”, o chefe da Igreja Católica recomendou o recurso ao Espírito Santo, que “renova a terra, […] não mudando a realidade, mas harmonizando-a”.

Sem o Espírito Santo, insistiu o sucessor de Pedro, “a Igreja é inerte, a fé é apenas uma doutrina, a moral é apenas um dever, o trabalho pastoral é apenas um trabalho”. É “Dele, acima de tudo, que a Igreja precisa hoje”, disse ele. E pediu: “Coloquemos o Espírito Santo de volta no centro da Igreja, caso contrário, nossos corações não estarão ardendo de amor por Jesus, mas por nós mesmos”.

O Bispo de Roma também pediu que “o Espírito seja colocado no início e no coração do trabalho do Sínodo”. O “Sínodo sobre a Sinodalidade” – um processo de reflexão sobre o futuro da Igreja, que começará em 2021 e terminará em 2024 – não tem como objetivo “reivindicar direitos e necessidades de acordo com a agenda do mundo”, nem “ir aonde o vento nos levar”, reiterou.

Andar de acordo com o Espírito

O Espírito Santo não tem um “projeto estruturado”, nem um “plano preciso e articulado”, acrescentou o pontífice argentino, criticando de passagem as “doutrinas frias, que parecem matemáticas”, de certos teólogos.

Para “andar de acordo com o Espírito” com sucesso, o Papa aconselhou invocá-lo diariamente. “Digamos a ele todos os dias: vem! [Comecemos cada dia rezando a ele”. Ele deixou a assembleia com algumas perguntas: “Sou rápido para julgar, apontar o dedo e bater a porta na cara dos outros, vendo-me como vítima de tudo e de todos? […] Ou eu perdoo, promovo a reconciliação e crio comunhão?”.

“Se o mundo está dividido, se a Igreja está polarizada, se o coração está fragmentado, não percamos tempo criticando os outros e ficando com raiva de nós mesmos, mas invoquemos o Espírito, ele é capaz de resolver”, concluiu o Papa.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

ANTIQUUM MINISTERIUM

Papa Francisco assinando a Carta Apostóloca "Antiquum Ministerium" | Vatican News

CARTA APOSTÓLICA
SOB FORMA DE «MOTU PROPRIO»

DO SUMO PONTÍFICE
FRANCISCO

ANTIQUUM MINISTERIUM

PELA QUAL SE INSTITUI O
 MINISTÉRIO DE CATEQUISTA

1. MINISTÉRIO ANTIGO é o de Catequista na Igreja. Os teólogos pensam, comumente, que se encontram os primeiros exemplos já nos escritos do Novo Testamento. A primeira forma, germinal, deste serviço do ensinamento achar-se-ia nos «mestres» mencionados pelo apóstolo Paulo ao escrever à comunidade de Corinto: «E aqueles que Deus estabeleceu na Igreja são, em primeiro lugar, apóstolos; em segundo, profetas; em terceiro, mestres; em seguida, há o dom dos milagres, depois o das curas, o das obras de assistência, o de governo e o das diversas línguas. Porventura são todos apóstolos? São todos profetas? São todos mestres? Fazem todos milagres? Possuem todos o dom das curas? Todos falam línguas? Todos as interpretam? Aspirai, porém, aos melhores dons. Aliás vou mostrar-vos um caminho que ultrapassa todos os outros» (1 Cor 12, 28-31).

O próprio Lucas afirma, na abertura do seu Evangelho: «Resolvi eu também, depois de tudo ter investigado cuidadosamente desde a origem, expô-los [os factos que entre nós se consumaram] a ti por escrito e pela sua ordem, caríssimo Teófilo, a fim de reconheceres a solidez da doutrina em que foste instruído» (Lc 1, 3-4). O evangelista parece bem ciente de estar a fornecer, com os seus escritos, uma forma específica de ensinamento que permite dar solidez e vigor a quantos já receberam o Batismo. E voltando ao mesmo tema, o apóstolo Paulo recomenda aos Gálatas: «Mas quem está a ser instruído na Palavra esteja em comunhão com aquele que o instrui, em todos os bens» (Gal 6, 6). Como se vê, o texto acrescenta uma peculiaridade fundamental: a comunhão de vida como caraterística da fecundidade da verdadeira catequese recebida.

2. Desde os seus primórdios, a comunidade cristã conheceu uma forma difusa de ministerialidade, concretizada no serviço de homens e mulheres que, obedientes à ação do Espírito Santo, dedicaram a sua vida à edificação da Igreja. Os carismas, que o Espírito nunca deixou de infundir nos batizados, tomaram em certos momentos uma forma visível e palpável de serviço à comunidade cristã nas suas múltiplas expressões, chegando ao ponto de ser reconhecido como uma diaconia indispensável para a comunidade. E assim o interpreta o apóstolo Paulo, com a sua autoridade, quando afirma: «Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; há diversidade de serviços, mas o Senhor é o mesmo; há diversos modos de agir, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. A cada um é dada a manifestação do Espírito, para proveito comum. A um é dada, pela ação do Espírito, uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de ciência, segundo o mesmo Espírito; a outro, a fé, no mesmo Espírito; a outro, o dom das curas, no único Espírito; a outro, o poder de fazer milagres; a outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, a variedade de línguas; a outro, por fim, a interpretação das línguas. Tudo isto, porém, o realiza o único e o mesmo Espírito, distribuindo a cada um, conforme lhe apraz» (1 Cor 12, 4-11).

Por conseguinte é possível reconhecer, dentro da grande tradição carismática do Novo Testamento, a presença concreta de batizados que exerceram o ministério de transmitir, de forma mais orgânica, permanente e associada com as várias circunstâncias da vida, o ensinamento dos apóstolos e dos evangelistas (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, 8). A Igreja quis reconhecer este serviço como expressão concreta do carisma pessoal, que tanto favoreceu o exercício da sua missão evangelizadora. Olhar para a vida das primeiras comunidades cristãs, que se empenharam na difusão e progresso do Evangelho, estimula também hoje a Igreja a perceber quais possam ser as novas expressões para continuarmos a permanecer fiéis à Palavra do Senhor, a fim de fazer chegar o seu Evangelho a toda a criatura.

3. Toda a história da evangelização destes dois milénios manifesta, com grande evidência, como foi eficaz a missão dos catequistas. Bispos, sacerdotes e diáconos, juntamente com muitos homens e mulheres de vida consagrada, dedicaram a sua vida à instrução catequética, para que a fé fosse um válido sustentáculo para a existência pessoal de cada ser humano. Além disso, alguns reuniram à sua volta outros irmãos e irmãs, que, partilhando o mesmo carisma, constituíram Ordens religiosas totalmente dedicadas ao serviço da catequese.

Não se pode esquecer a multidão incontável de leigos e leigas que tomaram parte, diretamente, na difusão do Evangelho através do ensino catequístico. Homens e mulheres, animados por uma grande fé e verdadeiras testemunhas de santidade, que, em alguns casos, foram mesmo fundadores de Igrejas, chegando até a dar a sua vida. Também nos nossos dias, há muitos catequistas competentes e perseverantes que estão à frente de comunidades em diferentes regiões, realizando uma missão insubstituível na transmissão e aprofundamento da fé. A longa série de Beatos, Santos e Mártires catequistas que marcou a missão da Igreja, merece ser conhecida, pois constitui uma fonte fecunda não só para a catequese, mas também para toda a história da espiritualidade cristã.

4. A partir do Concílio Ecuménico Vaticano II, a Igreja apercebeu-se, com renovada consciência, da importância do compromisso do laicado na obra de evangelização. Os Padres conciliares reafirmaram várias vezes a grande necessidade que há, tanto para a implantação da Igreja como para o crescimento da comunidade cristã, do envolvimento direto dos fiéis leigos nas várias formas em que se pode exprimir o seu carisma. «É digno de elogio aquele exército com tantos méritos na obra das missões entre pagãos, o exército dos catequistas, homens e mulheres, que, cheios do espírito apostólico, prestam com grandes trabalhos uma ajuda singular e absolutamente necessária à expansão da fé e da Igreja. Hoje em dia, em razão da escassez de clero para evangelizar tão grandes multidões e exercer o ministério pastoral, o ofício dos catequistas tem muitíssima importância» (Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Ad gentes, 17).

A par do rico ensinamento conciliar, é preciso referir o interesse constante dos Sumos Pontífices, do Sínodo dos Bispos, das Conferências Episcopais e dos vários Pastores, que, no decorrer destas décadas, imprimiram uma notável renovação à catequese. O Catecismo da Igreja Católica, a Exortação apostólica Catechesi tradendae, o Diretório Catequístico Geral, o Diretório Geral da Catequese, o recente Diretório da Catequese, juntamente com inúmeros Catecismos nacionais, regionais e diocesanos são expressão do valor central da obra catequística, que coloca em primeiro plano a instrução e a formação permanente dos crentes.

5. Sem diminuir em nada a missão própria do Bispo – de ser o primeiro Catequista na sua diocese, juntamente com o presbitério que partilha com ele a mesma solicitude pastoral – nem a responsabilidade peculiar dos pais relativamente à formação cristã dos seus filhos (cf. CIC cân. 774 §2; CCEO cân. 618), é necessário reconhecer a presença de leigos e leigas que, em virtude do seu Batismo, se sentem chamados a colaborar no serviço da catequese (cf. CIC cân. 225; CCEO câns. 401 e 406). Esta presença torna-se ainda mais urgente nos nossos dias, devido à renovada consciência da evangelização no mundo contemporâneo (cf. Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium, 163-168) e à imposição duma cultura globalizada (cf. Francisco, Carta enc. Fratelli tutti100.138), que requer um encontro autêntico com as jovens gerações, sem esquecer a exigência de metodologias e instrumentos criativos que tornem o anúncio do Evangelho coerente com a transformação missionária que a Igreja abraçou. Fidelidade ao passado e responsabilidade pelo presente são as condições indispensáveis para que a Igreja possa desempenhar a sua missão no mundo.

Despertar o entusiasmo pessoal de cada batizado e reavivar a consciência de ser chamado a desempenhar a sua missão na comunidade requer a escuta da voz do Espírito que nunca deixa faltar a sua presença fecunda (cf. CIC cân. 774 §1; CCEO cân. 617). O Espírito chama, também hoje, homens e mulheres para irem ao encontro de tantas pessoas que esperam conhecer a beleza, a bondade e a verdade da fé cristã. É tarefa dos Pastores sustentar este percurso e enriquecer a vida da comunidade cristã com o reconhecimento de ministérios laicais capazes de contribuir para a transformação da sociedade através da «penetração dos valores cristãos no mundo social, político e económico» (Evangelii gaudium, 102).

6. O apostolado laical possui, indiscutivelmente, uma valência secular. Esta exige «procurar o Reino de Deus, tratando das realidades temporais e ordenando-as segundo Deus» (Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, 31). A sua vida diária é tecida de encontros e relações familiares e sociais, o que permite verificar como «são especialmente chamados a tornarem a Igreja presente e ativa naqueles locais e circunstâncias em que, só por meio deles, ela pode ser o sal da terra» (Lumen gentium, 33). Entretanto é bom recordar que, além deste apostolado, «os leigos podem ainda ser chamados, por diversos modos, a uma colaboração mais imediata no apostolado da Hierarquia, à semelhança daqueles homens e mulheres que ajudavam o apóstolo Paulo no Evangelho, trabalhando muito no Senhor» (Lumen gentium, 33).

No entanto, a função peculiar desempenhada pelo Catequista especifica-se dentro doutros serviços presentes na comunidade cristã. Com efeito, o Catequista é chamado, antes de mais nada, a exprimir a sua competência no serviço pastoral da transmissão da fé que se desenvolve nas suas diferentes etapas: desde o primeiro anúncio que introduz no querigma, passando pela instrução que torna conscientes da vida nova em Cristo e prepara de modo particular para os sacramentos da iniciação cristã, até à formação permanente que consente que cada batizado esteja sempre pronto «a dar a razão da sua esperança a todo aquele que lha peça» (cf. 1 Ped 3, 15). O Catequista é simultaneamente testemunha da fé, mestre e mistagogo, acompanhante e pedagogo que instrui em nome da Igreja. Uma identidade que só mediante a oração, o estudo e a participação direta na vida da comunidade é que se pode desenvolver com coerência e responsabilidade (cf. Cons. Pont. para a Promoção da Nova Evangelização, Diretório da Catequese, 113).

7. Com grande clarividência, São Paulo VI emanou a Carta apostólica Ministeria quaedam tendo em vista não só adaptar ao novo momento histórico os ministérios de Leitor e Acólito (cf. Carta ap. Spiritus Domini), mas também pedir às Conferências Episcopais para promoverem outros ministérios, entre os quais o de Catequista: «Além destes ministérios comuns a toda a Igreja Latina, nada impede que as Conferências Episcopais peçam outros à Sé Apostólica, se, por motivos particulares, julgarem a sua instituição necessária ou muito útil na sua região. Tais são, por exemplo, as funções de Ostiário, de Exorcista e de Catequista». O mesmo instante convite voltava na Exortação apostólica Evangelii nuntiandi, quando, ao pedir para saber ler as exigências atuais da comunidade cristã numa continuidade fiel com as origens, exortava a encontrar novas formas ministeriais para uma pastoral renovada: «Tais ministérios, novos na aparência mas muito ligados a experiências vividas pela Igreja ao longo da sua existência – por exemplo, o de Catequista (…) – , são preciosos para a implantação, a vida e o crescimento da Igreja e para a sua capacidade de irradiar a própria mensagem à sua volta e para aqueles que estão distantes» (São Paulo VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi, 73).

Com efeito, não se pode negar que «cresceu a consciência da identidade e da missão dos leigos na Igreja. Embora não suficiente, pode-se contar com um numeroso laicado, dotado de um arreigado sentido de comunidade e uma grande fidelidade ao compromisso da caridade, da catequese, da celebração da fé» (Evangelii gaudium, 102). Por conseguinte, receber um ministério laical como o de Catequista imprime uma acentuação maior ao empenho missionário típico de cada um dos batizados que, no entanto, deve ser desempenhado de forma plenamente secular, sem cair em qualquer tentativa de clericalização.

8. Este ministério possui uma forte valência vocacional, que requer o devido discernimento por parte do Bispo e se evidencia com o Rito de instituição. De facto, é um serviço estável prestado à Igreja local de acordo com as exigências pastorais identificadas pelo Ordinário do lugar, mas desempenhado de maneira laical como exige a própria natureza do ministério. Convém que, ao ministério instituído de Catequista, sejam chamados homens e mulheres de fé profunda e maturidade humana, que tenham uma participação ativa na vida da comunidade cristã, sejam capazes de acolhimento, generosidade e vida de comunhão fraterna, recebam a devida formação bíblica, teológica, pastoral e pedagógica, para ser solícitos comunicadores da verdade da fé, e tenham já maturado uma prévia experiência de catequese (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Christus Dominus, 14; CIC cân. 231 §1; CCEO cân. 409 §1). Requer-se que sejam colaboradores fiéis dos presbíteros e diáconos, disponíveis para exercer o ministério onde for necessário e animados por verdadeiro entusiasmo apostólico.

Assim, depois de ter ponderado todos os aspetos, em virtude da autoridade apostólica,

instituo

o ministério laical de Catequista.

A Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos providenciará, dentro em breve, a publicação do Rito de Instituição do ministério laical de Catequista.

9. Convido, pois, as Conferências Episcopais a tornarem realidade o ministério de Catequista, estabelecendo o iter formativo necessário e os critérios normativos para o acesso ao mesmo, encontrando as formas mais coerentes para o serviço que estas pessoas serão chamadas a desempenhar em conformidade com tudo o que foi expresso por esta Carta Apostólica.

10. Os Sínodos das Igrejas Orientais ou as Assembleias dos Hierarcas poderão receber quanto aqui estabelecido para as respetivas Igrejas sui iuris, com base no próprio direito particular.

11. Os Pastores não cessem de abraçar esta exortação que lhes recordavam os Padres conciliares: «Sabem que não foram instituídos por Cristo para se encarregarem por si sós de toda a missão salvadora da Igreja para com o mundo, mas que o seu cargo sublime consiste em pastorear  de tal modo os fiéis e de tal modo reconhecer os seus serviços e carismas, que todos, cada um segundo o seu modo próprio, cooperem na obra comum» (Lumen gentium, 30). O discernimento dos dons que o Espírito Santo nunca deixa faltar à sua Igreja seja para eles o apoio necessário para tornar concreto o ministério de Catequista para o crescimento da própria comunidade.

Quanto estabelecido por esta Carta Apostólica em forma de “Motu próprio”, ordeno que tenha vigor firme e estável, não obstante qualquer coisa em contrário ainda que digna de menção particular, e que seja promulgado mediante publicação no jornal L’Osservatore Romano, entrando em vigor no mesmo dia, e publicado depois no órgão oficial Acta Apostolicae Sedis.

Dado em Roma, junto de São João de Latrão, na Memória litúrgica de São João de Ávila, Presbítero e Doutor da Igreja, dia 10 de maio do ano de 2021, nono do meu pontificado.

Francisco

Fonte: https://www.vatican.va/

Mediação de Maria, parte do patrimônio da fé cristã

@Musei Vaticani

"A mediação de Maria faz parte do patrimônio da fé cristã e é a partir desta verdade, tão presente nos ensinamentos dos santos como também no Magistério ordinário da Igreja, que a porção dos fiéis pode unir-se mais eficazmente contra os desvios mundanos, a fim de alcançar a coroa do Céu."

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

Deus não prescindiu da Mãe: por maior força de razão, precisamos nós d’Ela. O próprio Jesus no-La deu; e não num momento qualquer, mas quando estava pregado na cruz: «Eis a tua mãe» (Jo 19, 27) – disse Ele ao discípulo, a cada discípulo. Nossa Senhora não é opcional: deve ser acolhida na vida. É a Rainha da paz, que vence o mal e guia pelos caminhos do bem, repõe a unidade entre os filhos, educa para a compaixão. (Papa Francisco)

Com um Decreto publicado em 3 de março de 2018 pela então Congregação do Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos (agora Dicastério), o Papa Francisco determinou a inscrição da Memória da “Bem-aventurada Virgem, Mãe da Igreja” no Calendário Romano Geral, a ser celebrada todos os anos na segunda-feira depois de Pentecostes.

“Esta celebração - lê-se no Decreto - ajudará a lembrar que a vida cristã, para crescer, deve ser ancorada no mistério da Cruz, na oblação de Cristo no convite eucarístico e na Virgem oferente, Mãe do Redentor e dos redimidos”.

Alguns meses antes, em 12 de dezembro de 2017, o Papa Francisco presidiu na Basílica de São Pedro, a celebração da Festa de Nossa Senhora de Guadalupe, ocasião em que afirmou que "ao longo dos tempos, a piedade cristã procurou sempre" louvar Maria "com novos títulos: tratava-se de títulos filiais, títulos do amor do povo de Deus, mas que em nada tocavam o seu ser mulher-discípula."

Padre Gerson Schmidt*, que tem nos acompanhado ao longo dos últimos anos neste espaço Memória Histórica, dá início a uma série de programas sobre a mediação da Virgem Maria e sua importância na história da salvação:

"É importante agora precisar mais claramente o papel de Maria na história da salvação. A participação singular de Maria na obra da redenção não é apenas uma “opinião piedosa”, mas uma verdade ensinada repetidas vezes pelo Magistério da Igreja. Não há "fruto da graça na história da salvação que não tenha como instrumento necessário a mediação de Nossa Senhora".

A primeira vez que um Papa usou o termo de Correndentora referindo-se à Maria foi Pio XI, em uma alocução de 30 de novembro de 1933: “Pela natureza de sua obra, o Redentor devia associar sua Mãe com sua obra. Por esta razão, nós a invocamos sob o título de Corredentora. Ela nos deu o Salvador, acompanhou-O na obra da redenção até a cruz, compartilhando com Ele os sofrimentos, agonia e morte, com os quais Jesus deu pleno cumprimento à redenção humana”.

A custo se conseguirá exprimir com maior precisão e clareza a doutrina da Corredenção mariana em Jesus Cristo com Ele e por Ele. Observa com razão Roschini: “Triunfar com Cristo, esmagando a cabeça da serpente, não é outra coisa que ser Corredentora com Cristo” [1]. Essa afirmação de Roschini se fundamenta numa declaração do Papa PIO IX - Ineffabilis Deus – que declara assim: “Ao glosar as palavras com as quais Deus, anunciando no início do mundo os remédios preparados em sua misericórdia para regenerar os mortais, confundiu a audácia da serpente sedutora e levantou maravilhosamente a esperança de nossa linhagem, dizendo: ‘porei inimizades entre ti e a Mulher, entre tua descendência e a dela’ (Gn 3, 15), os Padres da Igreja e outros doutores ensinaram que, por este divino oráculo, foi clara e patentemente anunciado o misericordioso Redentor do gênero humano, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, e foi do mesmo modo designada sua santíssima Mãe, a Virgem Maria, bem como brilhantemente posta em relevo a mesmíssima inimizade de ambos contra o demônio. Por esse motivo, assim como Cristo, mediador entre Deus e os homens, assumiu a natureza humana, anulou o decreto contra nós exarado e o cravou triunfante na Cruz, assim a Santíssima Virgem – unida a Ele por estreito e indissolúvel vínculo, exercendo com Ele e por Ele suas eternas inimizades – triunfou plenissimamente da venenosa serpente, cuja cabeça esmagou com seu pé imaculado”.

Quando Bento XVI declarou não existir "fruto da graça na história da salvação que não tenha como instrumento necessário a mediação de Nossa Senhora", ele não estava simplesmente fazendo uso de um exagero retórico próprio da linguagem dos santos [2]. A mediação de Maria faz parte do patrimônio da fé cristã e é a partir desta verdade, tão presente nos ensinamentos dos santos como também no Magistério ordinário da Igreja, que a porção dos fiéis pode unir-se mais eficazmente contra os desvios mundanos, a fim de alcançar a coroa do Céu."

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
____________________

[1] ROSCHINI, OSM, Gabriel Maria. La Madre de Dios según la fe y la Teología. Madrid: Apostolado de la Prensa, 1955, v.I, p.477.

Fonte:https://www.vaticannews.va/pt

São Paulo VI

São Paulo VI | arquisp

29 de maio

São Paulo VI

Paulo VI foi o papa de número 262 da história da Igreja, entre 1963 e 1978.

Nascido no dia 26 de setembro de 1897, Giovanni Battista Enrico Antonio Maria Montini era proveniente da cidade italiana de Concesio. Desde cedo, sua vida foi muito envolvida com religião. Entrou para o seminário com o objetivo de se tornar um sacerdote no ano de 1916. Depois de ser ordenado em 1920, estudou ainda na Universidade Gregoriana, na Universidade de Roma e na Pontifícia Academia Eclesiástica. Giovanni Montini tinha um talento notável para a vida religiosa, foi o que o levou rapidamente a desenvolver uma carreira na Cúria Romana. Na administração do Vaticano, ocupou cargos importantes dentro da Igreja Católica, desenvolvendo funções muito próximas e de confiança dos papas Pio XI e Pio XII. Já em 1944, Giovanni Montini trabalhava diretamente com o papa Pio XII.

A nomeação de Giovanni Montini para o cargo de Arcebispo de Milão parecia ser um método para afastá-lo do papado. Porém acredita-se mais que tal medida foi tomada por Pio XII para permitir que Giovanni tivesse mais experiência pastoral. De qualquer forma, mesmo sem ser cardeal da Igreja, durante o conclave de 1958 que elegeria o novo papa, Giovanni Montini recebeu vários votos. O sucessor de Pio XII acabou sendo João XXIII, que, no mesmo ano, elevou Giovanni à condição de cardeal.

João XXIII exerceu pouco tempo o cargo de Supremo Pontífice. Já em 1963 foi realizado um novo conclave para eleger seu sucessor. Desta vez, Giovanni Montini foi eleito papa, no dia 21 de junho. Para exercer o cargo máximo da Igreja Católica, escolheu o nome de Paulo VI, indicando que tinha uma missão mundial de propagar a mensagem de Cristo. Inicialmente, determinou a reabertura do Concílio Vaticano e lhe atribui prioridade e direção. Promoveu grandes reformas no cristianismo que foram significativas para afetar toda a Igreja.

Paulo VI era devoto de Maria, publicou três encíclicas marianas, discursou várias vezes para congressistas marianos e participou de várias reuniões. Mas também promoveu importantes diálogos com o mundo, sem distinções de religiosidade. Ao mesmo tempo, seguia a linha tradicional da Igreja Católica e era contrário à regulação da natalidade.

Paulo VI foi o primeiro papa a viajar de avião e o primeiro a visitar os cinco continentes. Chegou até a sofrer uma tentativa de assassinato nas Filipinas. Sua postura aberta ao diálogo foi fundamental durante seu papado, pois viveu uma fase de grandes acontecimentos na história da segunda metade do século XX. Aberto ao diálogo, foi o primeiro papa a conversar com o líder da Igreja Anglicana e o primeiro, depois de muitos séculos, a conversar com dirigentes das diversas Igrejas Ortodoxas do Oriente.

Paulo VI publicou a encíclica Humanae Vitae versando sobre o controle da natalidade, documento que se tornou de referência para a Igreja Católica nas questões sobre aborto, esterilização e métodos contraceptivos.

Paulo VI ocupou o posto de Sumo Pontífice por 15 anos. Faleceu no dia seis de agosto de 1978 e foi sucedido por João Paulo I. O processo de beatificação de Paulo VI começou em 1993 e se concretizou em 2014. Foi beatificado em 19 de outubro de 2014 e canonizado em 14 de outubro de 2018 pelo Papa Francisco.

*Fonte: Pia Sociedade Filhas de São Paulo Paulinas http://www.paulinas.org.br

https://arquisp.org.br/

Tempo Comum

Tempo Comum | CNBB

TEMPO COMUM

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ) 

O Tempo Comum é o tempo litúrgico mais extenso, sendo 34 semanas, divididas em duas partes. A primeira parte inicia após a Festa do Batismo do Senhor e vai até a terça-feira de Carnaval. A segunda parte inicia após a festa de Pentecostes. A cor predominante desse tempo é o verde, que simboliza a esperança, a esperança na vinda do reino de Deus. Durante o Tempo Comum, acompanhamos Jesus em sua vida pública e percorrendo Israel até chegar em Jerusalém e ser aclamado como Rei.  

O Tempo Comum encerra o ano litúrgico com a Solenidade de Cristo Rei e predomina durante quase todo o ano. Durante o Tempo Comum, vivemos a esperança da chegada do reino de Deus e da segunda vinda de Cristo. Vivemos a expectativa do “já” e “ainda não”, ou seja, construir o Reino de Deus aqui na terra para contemplá-lo de maneira definitiva no céu.  

Durante o Tempo Comum, somos enviados por Jesus a ser missionários e anunciar o Reino de Deus para as pessoas. Conduzir ao batismo aqueles que ainda não foram batizados, e iluminar a vida daqueles que andam nas trevas. Essa é a nossa missão como cristãos: ser construtores da paz e ser luz para aqueles que andam nas trevas. Temos que apontar o cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo.  

Algumas solenidades e festas importantes ocorrem durante o Tempo Comum, dentre algumas destacamos: Santíssima Trindade, que ocorre no domingo após Pentecostes; Solenidade de São Pedro e São Paulo, no fim do mês de junho ou início de julho; Assunção de Nossa Senhora, no dia 15 de agosto; e a Solenidade de Cristo Rei, na última semana do Tempo Comum.  

O ano litúrgico como um todo, dentre os seus tempos litúrgicos, gira em torno de uma única pessoa: Jesus Cristo. O centro do ano litúrgico é a Páscoa e todo o ano litúrgico gira em torno do mistério da paixão, morte e ressurreição de Jesus. 

Algumas celebrações importantes acontecem ao longo do ano e marcam a vida da Igreja. No mês de agosto, celebramos o mês vocacional e recordamos que cada batizado é chamado por Deus a construir o Reino de Deus aqui na terra e chamado para uma vocação específica e ajudar a sua comunidade a crescer no discipulado de Jesus.  

O Tempo Comum nos ajuda a ter um senso de comunidade, ou seja, ninguém constrói o Reino de Deus sozinho, mas com a ajuda do próximo. Jesus não enviou um discípulo sozinho para edificar o reino, mas enviou 12. O próprio Jesus não evangelizava sozinho, mas o grupo dos discípulos ia junto com ele. Da mesma forma hoje, Jesus não nos envia sozinhos para a missão, mas junto com a comunidade. Aproveitemos esse Tempo Comum para nutrir em nosso coração o desejo de ser discípulos e missionários do Senhor.  

O “Verbo se fez carne e habitou entre nós”. Esse verbo encarnado é Jesus, a palavra eterna do Pai que veio habitar entre nós, é isso que vivemos e celebramos durante o Tempo Comum. Agradeçamos a Deus por ter enviado o seu Filho Jesus para nos salvar. E é nossa missão levar adiante essa Palavra no mundo de hoje.  

Podemos entender como Tempo Comum um longo período de 34 semanas, em que somos convidados a pôr em pratica o Reino de Deus e anunciar Jesus Cristo às pessoas. A pausa que o Tempo Comum faz, durante a Quaresma, é uma pausa restauradora e tem uma total ligação com o mistério que está sendo celebrado. Quando o Tempo Comum retoma, após a Solenidade de Pentecostes, somos enviados por Jesus da mesma forma que os discípulos foram para sair anunciar o Reino de Deus.  

Temos que ir ao encontro do outro, como o Papa Francisco nos incita e sentir o cheiro das ovelhas. Temos que ir ao encontro daqueles que foram batizados, mas não vivem a fé no momento, se encontram afastados da Igreja. Temos que resgatar essas pessoas para Deus, novamente. O Espírito Santo recebido em Pentecostes nos guiará para essa missão.  

O Tempo Comum, ainda, apresenta a vida pública de Jesus propriamente dita. Acompanhamos os milagres, curas, ensinamentos e pregações. A cada semana do Tempo Comum aprofundamos um aspecto da vida de Jesus. O Tempo Comum nos aproxima da vida de Jesus.  

Durante esse período, rezemos pelas necessidades da Igreja, pelo Papa Francisco, por nosso bispo diocesano, padres, diáconos e seminaristas. Rezemos para que nunca faltem pessoas dispostas para levar adiante a mensagem do Evangelho. Que a Igreja conduzida pelo Papa Francisco continue sendo sinal de salvação para todos.  

Celebremos o mistério da Palavra de Deus encarnada ao longo desse Tempo Comum e peçamos que Deus nos guie na missão de discípulos e missionários de Jesus. Amém.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

domingo, 28 de maio de 2023

TEOLOGIA: O Espírito Santo na Revelação e na Igreja

Dumitru Staniloae | ECCLESIA

O Espírito Santo na Revelação e na Igreja

Dumitru Staniloae

O Espírito Santo, introduzindo a energia divina nas profundezas da criatura, suscita, ao mesmo tempo, na medida em que esta energia vem inteiramente de Cristo, uma sensibilidade para Deus, pela presença e ação divinas na vida humana e no mundo. “Sem o Espírito Santo, escreve santo Atanásio, somos estranhos a Deus e estamos longe d’Ele. Pelo Espírito participamos de Deus. Pois estar em Deus não depende de nós, mas do Espírito que está em nós e habita em nós, enquanto o conservamos em nós pela confissão (da fé)” (Or. III contra Arianos, PG 26, 373). No Espírito Santo e, por conseguinte, em Cristo, Deus deifica a criatura, porque o Espírito a faz transparente a Deus. “N’Ele (no Espírito), nota de novo santo Atanásio, o Verbo glorifica a criatura e, deificando-a, apresenta-a ao Pai. Mas, Aquele que unifica a criatura com o Verbo não podia ser ele mesmo uma criatura” (Ep. Ad Serapionem, PG 26, 589).

Esta sensibilidade é, em primeiro lugar, a capacidade que a alma recebe de perceber Deus para lá de tudo. Mas aquele que se torna sensível a Deus, torna-se igualmente sensível aos seus semelhantes: vê Deus neles, e vê-os em Deus. Tal sensibilidade por Deus torna, pois, o homem plenamente humano.

O primeiro grau dessa sensibilidade é a fé. À medida que ela se desenvolve, a intuição da realidade transcendente, mas simultaneamente omnipresente de Deus não cessa de aumentar no homem. Aquele que tem tal sensibilidade vê Deus em toda a parte, em todas as coisas. Implantada na alma pelo Espírito, esta sensibilidade é, alternadamente, ora pelo Espírito Santo, ora pelo homem. Este sentimento de estar sempre e em todo o momento na presença de Deus impele a uma oração incessante.

Tal sensibilidade é, ao mesmo tempo, um profundo afeto e um sentimento agudo de responsabilidade para com Deus. Os Padres gregos chamaram-na aisthêsis toû noos, “sensibilidade do Espírito” (Diodoco de Fotice, Sermão ascético, 34, 36, 37, 39).

A responsabilidade pode tomar a forma de temor, de obediência a uma missão, de obrigação de evitar o pecado, de levar uma vida pura. Toda esta gama de sentimentos é produzida pelo Espírito Santo. No ser humano, criatura ínfima, a responsabilidade para com Deus, suscitada pelo Espírito, toma a forma de adoração, se é um afeto puro, ou de temor e tremor, se está associada à consciência de pecado, ou ainda de uma missão interior, se descobre a obrigação absoluta de cumprir a vontade de Deus. Só o Espírito pode despertar em nós a resposta ao amor e ao apelo do Pai, que o próprio Espírito nos traz. Só o Espírito pode dar a essa resposta o seu carácter de fervor e gozo. Só o Espírito pode fazer-nos participar da sensibilidade e responsabilidade do Filho para com o seu Pai.

Todas estas atitudes aparecem naqueles que recebem a Revelação. Se, nas primeiras etapas da Revelação, o Espírito de Deus impressionou os homens através, sobretudo, de manifestações de poder, através de atos exteriores extraordinários, a partir dos profetas a sua ação exprimiu-se antes pela força espiritual e moral que lhes concedeu, assim como a outros homens de Deus. Tal dom implica a colaboração do homem, o seu esforço por aprofundar a sua relação com Deus, por cumprir a missão que lhe foi confiada, por levar uma vida conforme à vontade divina.

A inabitação e a ação na alma caracterizam o Espírito Santo, porque a alma, por natureza, está preparada para essa ação do Espírito nela. Como expressão da hipostásis [i.e., realidade pessoal] humana, a alma é uma imagem do Logos divino e, pela atração que sente naturalmente para com o Deus pessoal e as pessoas humanas, tem em si mesma, desde o princípio, o Espírito de Deus.

Debilitando essa tendência na relação com a Pessoa suprema e com as demais pessoas humanas, o pecado trouxe à alma um estado contrário à sua natureza. A inabitação do Espírito restabelece e fortalece a alma na sua capacidade de relação com Deus e o próximo; desse modo, restaura-lhe o estado conforme à sua natureza – pros to ek phuseôs kallos [à beleza da sua natureza] – como disse são Basílio, o Grande (De Spiritu Sancto, PG, 109).

O Espírito Santo, justamente porque representa a perfeição da relação entre a pessoa do Filho e a do Pai, tem a capacidade de fortalecer a relação do sujeito humano, como imagem do Filho divino, com Deus e com cada sujeito pessoal.

É assim que a alma se torna transparente a Deus e Deus se torna transparente à alma. A santidade é o estado de transparência do Espírito que se torna como a interioridade da alma, ao mesmo tempo que a transparência da alma que se torna como a interioridade de Deus. É, unicamente, unificando a sua subjetividade com a subjectividade do Espírito, santo por essência, que o homem pode santificar-se. Unificada com o Espírito, a alma fica transparente, vê o Filho e o Pai, faz resplandecer Deus à sua volta. É o Espírito, enquanto Terceiro, que abre o homem para Deus e o homem para o homem, porque Ele mesmo é a capacidade suprema de abertura.

Antes da encarnação, o Espírito Santo irradiava o Verbo. Porém, é em Cristo que se realiza o retorno do Espírito Santo ao ser humano. Cristo, sendo a hipóstasis [i.e., realidade pessoal] que fez sua a natureza humana, leva na sua própria humanidade o Espírito em plenitude. Na encarnação do Filho, o Espírito encontra-se hipostaticamente unido [ou seja, unido até às raízes da nossa identidade pessoal] a Ele como estava já desde toda a eternidade. Cristo, como homem, recebe assim, para sempre, o Espírito, como receberam os grandes líderes e profetas de Israel. Mas, ao mesmo tempo, Ele [Cristo] recebe o Espírito por inteiro, enquanto aqueles não receberam. Este Espírito, enquanto hipostásis, repousa permanentemente sobre o Filho durante a sua encarnação. É isto que é revelado no Batismo quando o Espírito aparece entre o Pai e o Filho encarnado, unindo-os, de certo modo, e circulando de um para o outro. O Pai apresenta todos ao Filho encarnado, sobre o qual plana o Espírito sob a forma de uma pomba: “Este é o meu filho amado, no qual pus todo o meu afeto” (Mt 3,17).

A encarnação do Filho permite esta manifestação. Enquanto homem, o Filho responde em nosso nome ao amor do Pai com um amor obediente até ao sacrifício da cruz; dá essa resposta permanente no Espírito que reside entre Ele e o Pai. Cristo, enquanto homem, eleva ao mais alto grau a sensibilidade humana para com o Pai e a responsabilidade humana para com todos os homens. É por isto que eleva também ao mais alto grau a oração que dirige ao Pai em favor de todos os irmãos em humanidade, e por toda a criação. Por isso recebe, como homem, o poder mais alto da parte do Pai: o poder sobrenatural do amor, poder capaz de transformar as almas e ultrapassar os limites da natureza.

Porém, este poder pleno sobre as almas pelo qual as torna sensíveis a Deus e provoca, sem destruir as leis da natureza, efeitos que não provêm desta, Cristo manifesta-o somente no momento da sua ressurreição e, sobretudo, na ascensão do seu corpo, quando a sua natureza humana, completamente deificada, se torna plenamente transparente para o Pai e para os homens, quando realiza, como homem, também, e de uma maneira total, a sua capacidade de comunhão com o Pai e com os homens.

O Senhor promete aos apóstolos que o Espírito Santo também os preencherá da sua força. “Quando o Espírito Santo vier sobre vós, recebereis a minha força” (At 1, 8). Sem a força do Espírito, quer dizer, sem o Pentecostes, a Igreja não teria chegado à sua existência concreta e não teria durado. A Revelação não seria imposta como uma evidência. “A minha palavra e a minha pregação, escreve Paulo aos Coríntios, nada tinham da linguagem persuasiva da sabedoria, mas era o Espírito que manifestava o seu poder, para que a vossa fé fosse fundada não sobre a sabedoria dos homens, mas sobre o poder de Deus” (1 Cor 2,4-5; cf. 1 Ts 1,5).

Pode-se considerar que o Espírito está implicado em todos os momentos onde a Escritura evoca o poder com o qual o Evangelho se propagou, uma vez que a Boa Nova é poder de Deus para aquele que crê (1 Cor 1,16). A Igreja, como Reino de Deus em marcha, começa com a penetração daquele Evangelho de poder nas almas, e desenvolve-se e perdura através dele: porque o Reino de Deus não consiste na palavra, mas no poder (1 Cor 4, 20). O Espírito Santo, descido no Pentecostes, não funda somente a Igreja, mas permanece nela com a torrente das suas energias incriadas, invisíveis, mas operantes. A Escritura, assinalando que o Reino de Deus consiste no poder, indicou através dele que o Espírito e a sua força se manifestam na Igreja. A Igreja é a revelação de Deus em Cristo, cuja eficácia prossegue através do Espírito e no seu poder. Ela continua a Revelação em Cristo, não como um incremento do seu conteúdo, mas como atualização, no Espírito, da presença ativa de Cristo que se revelou plenamente nos seus atos e palavras e pelos dos apóstolos. Pelo Espírito, tomamos consciência da nossa unidade com Cristo e entre nós, enquanto corpo de Cristo. Pela experiência do poder do Espírito, Cristo torna-se-nos transparente.

É também pelo Espírito que Deus mantém o mundo, atua nele e, através do mistério da Igreja, o conduz para o seu telos [i.e., a sua finalidade], para a sua realização. É pelo Espírito Santo que os homens acolhem a Revelação de Deus e que Deus, neles, pode atuar. É nas águas vivas que manam do Espírito Santo que a Igreja irriga as suas raízes, e nas quais os seus membros extraem a sua força, pela fé, no progresso na santidade. É pelo Espírito Santo que se atualiza e irrompe a comunhão daqueles que depositam em Cristo toda a sua fé.

Assim, do mesmo modo que na Trindade o Espírito Santo mostra que o Pai e o Filho são distintos, mas uno em essência, unidos por amor; o Espírito Santo, do mesmo modo, consagra-nos como pessoas inteiramente distintas, edificando-nos na Igreja, unindo-nos pela alegria de uma inteira comunhão. Pelo Espírito Santo entramos no amor do Pai e do Filho, sentimos, até na distinção, todo o fogo do amor do Pai para com o seu Filho e para conosco, na medida em que estamos unidos ao Filho; o Espírito Santo é o fogo – fogo distinto, hipostático – que irradia do Filho, feito nosso Irmão, que arde em nós tornando-se no nosso próprio amor filial pelo Pai. Pelo Espírito Santo sentimo-nos unidos em Cristo e orientados para o Pai, e assim formamos a Igreja. Ubi Spiritus Sanctus, ibi ecclesia (onde está o Espírito Santo está a Igreja), dizia santo Ireneu, e este adágio pode inverter-se: Ubi ecclesia, ibi Spiritus Sanctus (onde está a Igreja está o Espírito Santo). Mas santo Ireneu precisa: “Onde está o Espírito Santo está a Igreja, e onde está a Igreja, está a verdade”. Direi que a verdade é a plenitude da realidade. E a plenitude da realidade é Deus feito homem, é a comunhão com Ele. Assim é a Igreja. A experiência da plena comunhão pessoal tornou-se possível para nós através da Encarnação. Não há comunhão senão com uma pessoa, e a pessoa perfeita, que se torna plenamente acessível – e conservando inteiramente o seu mistério -, é Deus encarnado: é Cristo. Não há verdadeira vida, verdadeiro gozo, senão na nossa comunhão com Cristo e em Cristo, quer dizer, na Igreja.

Mas Cristo só pode fazer brilhar em nós essa comunhão porque Ele mesmo vive na comunhão infinita, perfeita, das Pessoas da Trindade. Dando-nos o Espírito Santo, Cristo dá-nos o Espírito dessa perfeita comunhão trinitária.

O homem agoniza quando é privada de toda a comunhão com outro homem. Mas a comunhão entre pessoas humanas agoniza quando não encontra a sua fonte e seu fundamento em Deus, Pessoa infinita ou, melhor dito, Unidade Infinita de Pessoas divinas.

A relação entre pessoa e pessoa é a única via da realidade e do mistério. É o aprofundamento pleno do amor de uma pessoa na outra, e somente isto procura a vida e a alegria. Mas não se pode obter a revelação do outro como profundidade que brota, como fonte de uma vida sem limites, sem o Espírito Santo, que nos mostra o outro em Deus, no mistério do Deus pessoal que se revela. A única pessoa da qual brotam inesgotavelmente a vida e a luz é Cristo.

As experiências místicas que os jovens procuram, hoje, no ioga ou na metafísica hindu estão condenadas ao fracasso se não desembocam na comunhão pessoal com Cristo, na inesgotável profundidade e calor da sua pessoa divino-humana. É somente na pessoa divino-humana de Cristo, conhecida graças ao fogo do Espírito, que a pessoa humana se salva do inferno da solidão. Porque em nenhum lugar, senão na comunhão plena e inesgotável com a pessoa de Cristo, e unicamente em Jesus Cristo, que encontramos o Espírito de uma incansável comunhão entre os homens, encontramos a Igreja. Por todas estas razões, o Espírito Santo é a Pessoa que faz do homem uma sarça ardente, que nos enche da luz de Cristo, se tentamos, sem cessar, viver em Cristo, tendo sempre no nosso pensamento o nome de Jesus. Mas só a Igreja pode sustentar em nós a oração incessante a Jesus. Como disse Olivier Clément, a Igreja é, no mundo, a grande sarça ardente, cujo fogo infinito nada é senão o Espírito Santo.

Contacts, vol XXVI, nº 87 (1974).

Traduzido por Rui Fernandes sj da versão em castelhano, disponível em ECCLESIA


Fonte: https://www.ecclesia.org.br/

O Espírito Santo: intercessor em favor de todos

O Espírito Santo | Guadium Press
“A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum” (1Cor 12,7)

Redação (28/05/2023 12:36Gaudium Press) Após a Igreja ter reservado cinquenta dias para comemorar as festas Pascais, ela encerra este ciclo litúrgico celebrando a solenidade de Pentecostes.

Que ensinamentos podemos extrair de tal liturgia?

A presença do Espírito Santo

Quando São Paulo passou por Corinto e chegou à cidade de Éfeso, chamou alguns discípulos que haviam abraçado a fé cristã, e lhes perguntou: “Vós recebestes o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?” Ao que eles responderam: “Nós nem sequer ouvimos dizer que há Espírito Santo” (At 19,1-2). Após batizá-los, receberam o Espírito Santo ao impor-lhes as mãos; então, começaram a falar em línguas e a profetizar (cf. At 19,6).

De fato, grandes são os benefícios e assistências que o Espírito Santo concede às almas – segundo afirmam os teólogos –,[1] mas infelizmente, poucos são aqueles que O invocam e O conhecem. Sem embargo, todos os dons, que as criaturas do Céu e da Terra possuem na ordem da natureza e da graça, são provenientes da Terceira Pessoa da Trindade, da maneira mais íntima e espiritual.[2] Além da escassez de doutrina acerca do Espírito Santo, e da falta de devidas devoções a Ele, há um motivo que leva a maioria dos cristãos a desconhecê-Lo: as suas manifestações muito pouco sensíveis e perceptíveis aos olhos humanos.

Segundo as Escrituras, Ele apenas apareceu três vezes de maneira sensível a nós: no Batismo de Jesus, ao descer em forma de pomba; quando Jesus se transfigurou no monte Tabor, aparecendo como uma nuvem resplandecente; e ao pousar em forma de línguas de fogo sobre Nossa Senhora e os Apóstolos, reunidos no Cenáculo, a qual a liturgia de hoje recorda.

São Lucas, no Atos dos Apóstolos, descreve que os discípulos de Jesus estavam reunidos todos no mesmo lugar:

“De repente, veio do céu um barulho como se fosse uma forte ventania, que encheu a casa onde eles se encontravam” (At 2,1-2).

Neste instante, apareceram línguas de fogo que se repartiram e desceram sobre cada um deles, e “todos ficaram cheios do Espírito Santo” (At 2,3-4).

Sem dúvida alguma, esta foi uma manifestação patente do Espírito Santo. Entretanto, é preciso ressaltar que esta não é a forma ordinária de Sua ação nas almas. Na maioria das vezes, Ele age de maneira discreta em nosso interior. Isto, porém, não significa que os auxílios d’Ele, Sua presença e os efeitos de Sua ação em nossas almas sejam menos eficazes.

A ação do Paráclito nas almas

Vemos, na segunda leitura, São Paulo afirmar que há diversidade de dons e de ministérios, mas um mesmo é o Espírito que intercede em favor de todos, para o bem comum (cf. 1Cor 12,4-7).

Há na Santa Igreja diversidade de membros, de carismas, como também há diversos graus de santidade. Uns possuem — segundo o Pe. Royo Marín[3] — a graça santificante[4] em suas manifestações mais excelsas; outros são, todavia, menos santos; e há aquelas almas que possuem apenas o imprescindível para se salvarem. Com efeito, em união com o Pai e o Filho, o Espírito Santo é o hóspede destas almas em estado de graça,[5] onde mora como em um verdadeiro templo, e por esta razão, Ele não habita de uma maneira inoperante, mas orienta e conduz à perfeição — se a alma não põe obstáculos à sua ação —, levando-a à plena união com Deus.

Como se dá esta ação do Espírito Santo?

Quase sempre julgamos que os atos bons que tenhamos praticado são iniciativa de nosso próprio engenho. Não percebemos que, por detrás de nós, está o Espírito Santo nos inspirando, aconselhando e impulsionando-nos à prática da virtude e dos mandamentos. Muitas vezes não damos ouvido à “suave voz” do Divino Espírito Santo que diz em nosso interior o caminho a ser seguido, pois as preocupações da vida nos perturbam e preenchem nossa atenção.

Contudo, ainda que por desleixo nosso, ou até pelo lastimoso estado de inimizade com Deus no qual um pecador pode se achar, o Espírito Santo não deixa de auxiliar-nos.

Desta maneira, cabe a nós pedirmos a Maria Santíssima, a Esposa do Espírito Santo, que nos obtenha a graça de estarmos sempre atentos e abertos à ação do Paráclito, para que se operem em nossos corações maravilhas da graça cada vez mais eficazes.

Por Guilherme Motta


[1] Cf. MARÍN, Antônio Royo. El gran desconocido: El Espíritu Santo y sus dones. Madrid: BAC, 2004, p. 3-12.

[2] Cf. BASILE DE CÉSARÉE. L’Esprit-Saint, 24, 55. In: Michel Corbin. Paris: Cerf, 2010, p. 313.

[3] Cf. MARÍN, Antônio Royo. Op. cit., p. 55-57; 90

[4] A graça santificante é um dom sobrenatural infundido por Deus em nossa alma — no dia do nosso Batismo —, a fim de dar-nos uma participação verdadeira e real de sua própria natureza divina, fazendo-nos filhos seus e herdeiros da glória. Cf. MARÍN, Antônio Royo. Op. cit., p. 61.

[5] Por estado de graça, entende-se aquela alma batizada que não está em pecado mortal.

Fonte: https://gaudiumpress.org/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF