Esse ano, a CF tem como tema “Fraternidade e Ecologia
Integral” e como lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). É um convite
a refletir sobre os sintomas e as causas da crise socioambiental (ver/ouvir), a
contemplar a obra criadora de Deus e meditar sobre a missão confiada ao ser
humano.
Francisco de Aquino Júnior* - Presbítero da Diocese de
Limoeiro do Norte – CE.
Todos os anos, a Igreja do Brasil promove durante a quaresma
uma Campanha da Fraternidade – CF. Assim como somos chamados a uma conversão
pessoal (conversão do coração), também somos chamados a uma conversão social
(transformação da sociedade). A CF chama atenção para a dimensão social
do pecado que se concretiza na ruptura da fraternidade, nas injustiças
sociais e na destruição de nossa casa comum. E a consciência do pecado
social convida a uma conversão social que se
concretiza em relações de fraternidade e cuidado entre as pessoas, na defesa da
dignidade e dos direitos dos pobres e marginalizados e no cuidado da casa
comum.
Esse ano, a CF tem como tema “Fraternidade e Ecologia
Integral” e como lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). É um convite
a refletir sobre os sintomas e as causas da crise socioambiental (ver/ouvir), a
contemplar a obra criadora de Deus e meditar sobre a missão confiada ao ser
humano (iluminar/discernir) e a buscar alternativas de superação da crise
socioambiental e cuidado da casa comum (agir/propor).
Não é preciso fazer muito esforço para reconhecer que
vivemos uma profunda crise socioambiental com consequências trágicas para
grande parte da humanidade. Os sintomas estão aí bem perto de
nós: secas, enchentes, tempestades, desmoronamentos, furacões, calor,
queimadas, agrotóxicos, doenças, pandemias etc. Ainda está muito viva em nossa
memória e em nossa carne a pandemia da covid-19 e a tragédia no Rio Grande do
Sul em 2024. Mas não basta reconhecer os sintomas. É preciso se perguntar
pelas causas da crise. E em grande medida ela é fruto da ação
humana. Isso faz da crise ecológica uma crise socioambiental. O Papa Francisco
tem insistido muito na “raiz humana da crise ecológica”. O planeta não suporta
nem acompanha o ritmo de exploração da natureza e o consumismo desenfreado das
elites. Como bem destaca o Texto-Base da CF, “o modelo de desenvolvimento
capitalista, baseado na exploração dos patrimônios naturais, na queima de
combustíveis fósseis, como os derivados de petróleo, na expansão desenfreada do
consumo e na relação mercantilista com a natureza, tem contribuído para uma
série de problemas ambientais, como a degradação do solo, o desmatamento, o
extrativismo predatório, a poluição, a escassez de água, o comprometimento da
biodiversidade com a extinção de algumas espécies e as mudanças climáticas”.
A fé cristã nos faz ver ainda mais longe. A ruptura da
fraternidade, as injustiças e desigualdades sociais e a destruição da natureza
são, em última instância, um atentado contra obra criadora de Deus e seu
desígnio para a humanidade. Está em jogo a criação de Deus e a missão que ele
confiou ao ser humano de cuidar da criação. Como recorda Francisco, “dizer
‘criação’ é mais do que dizer natureza, porque tem a ver com um projeto do amor
de Deus, onde cada criatura tem um valor e um significado” (LS 76). Os relatos
da criação apresentam todos os seres como obra de Deus e em harmonia
uns com os outros e apresentam o ser humano como parte da criação e com a
missão de “cultivar e guardar” o jardim da criação. E a expressão ecologia
integral chama atenção tanto para o valor de cada ser e a relação
entre eles, como para o “valor peculiar” do ser humano que implica uma
“tremenda responsabilidade” com a casa comum. Não se pode reduzir os bens da
criação a meros “recursos” a serem explorados pela ganância humana. Nem se pode
pensar o ser humano separado da criação nem como senhor absoluto da criação. A
ruptura da fraternidade dos seres humanos entre si com a natureza é um atentado
contra a criação de Deus. Nas palavras do Patriarca Bartolomeu: “um crime
contra a natureza é um crime contra nós mesmos e um pecado contra Deus” (LS 8).
E a consciência do pecado socioambiental (destruição da criação) é um chamado à conversão ecológica (cuidado da criação). Ela nos leva a assumir a missão que Deus nos confiou de “cultivar e guardar” o jardim da criação (Gn 2,15). Isso implica mudança de mentalidade: a natureza não é mero “recurso” a ser apropriado; o ser humano é parte da natureza; a destruição da natureza é destruição do próprio ser humano e pecado contra Deus; muitos projetos de desenvolvimento produzem mais males do que bens para sociedade etc. Mas implica também atitude pessoal e social:
1) superar o consumismo, não desperdiçar água, cuidar dos resíduos etc.;
2) apoiar a agricultura familiar camponesa e suas lutas contra agrotóxicos, desmatamento e destruição da biodiversidade;
3) tomar posição contra projetos políticos que destroem a casa comum como pulverização área, mineração, destruição das leis de proteção ambiental para favorecer os interesses do capital etc.;
4) Defender e apoiar comunidades e movimentos que lutam pela preservação ambiental e por justiça social;
5) escutar e se deixar comover pelo “grito dos pobres e da
terra”, através do qual Deus nos chama à conversão social e política.
*Francisco de Aquino Júnior: Presbítero da Diocese de
Limoeiro do Norte – CE; professor de teologia da Faculdade Católica de
Fortaleza (FCF) e da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).
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