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segunda-feira, 21 de agosto de 2023

As causas de uma “crise eucarística” (1/4)

Celebração Eucarística (Presbíteros)

As causas de uma “crise eucarística”

A doutrina católica sobre a Eucaristia remonta aos primeiros tempos do cristianismo, embora tenha sido dogmaticamente perfilada ao longo dos séculos, chegando à sua máxima expressão nos textos de São Tomás de Aquino. O Catecismo da Igreja Católica e os Catecismos anteriores recolheram exatamente essas mesmas definições.

As rubricas litúrgicas, que vão desde as genuflexões até todos os gestos de cuidado para com as espécies consagradas chegam a detalhes carinhosos que não são outra coisa senão a expressão da fé da Igreja na presença real de Cristo no Santíssimo Sacramento.

Podemos dizer, portanto, que existe uma relação direta entre a fé e a piedade eucarística; e, paradoxalmente, que há também uma relação direta entre a crise de fé na Eucaristia e toda a falta de piedade que disso decorre.

Por que precisamos dizê-lo? Por duas razões principais: porque é necessário não inverter o sintoma com a causa e porque é preciso rastrear a origem da causa para suprimir a patologia que adoece a fé, ao distanciar a nossa consciência daquilo que ensina a Igreja. Ora, podemos falar de uma crise de fé na Eucaristia? Como esta começou? Quais as suas origens?

Diagnóstico de um problema

Com grande prudência e cuidado, o Papa Pio XII escrevia, na Encíclica Mediator Dei: “nem se diga que tal culto eucarístico provoca uma errônea confusão entre o Cristo histórico, como dizem, que viveu na terra, o Cristo presente no augusto sacramento do altar, e o Cristo triunfante no céu e dispensador de graças; deve-se, pelo contrário, afirmar que, desse modo, os fiéis testemunham e manifestam solenemente a fé da Igreja, com a qual se crê que um e idêntico é o Verbo de Deus e o Filho de Maria virgem, que sofreu na cruz, que está presente e oculto na Eucaristia, e que reina no céu” (n. 120).

O Papa São Paulo VI, com muita preocupação e, segundo suas próprias palavras, com “grande ansiedade”, escreveu, em sua Encíclica Mysterium fidei:

“Bem sabemos que, entre os que falam e escrevem sobre este Sacrossanto Mistério, alguns há que, a respeito das missas privadas, do dogma da transubstanciação e do culto eucarístico, divulgam opiniões que perturbam o espírito dos fiéis, provocando notável confusão quanto às verdades da fé, como se fosse lícito, a quem quer que seja, passar em silêncio a doutrina já definida da Igreja ou interpretá-la de tal maneira, que percam o seu valor o significado genuíno das palavras ou o alcance dos conceitos.

Não é lícito, só para aduzirmos um exemplo, exaltar a Missa chamada ‘comunitária’, a ponto de se tirar a sua importância à Missa privada; nem insistir tanto sobre o conceito de sinal sacramental, como se o simbolismo que todos, é claro, admitimos na Sagrada Eucaristia, exprimisse, única e simplesmente, o modo da presença de Cristo neste sacramento; ou ainda discutir sobre o mistério da Transubstanciação sem mencionar a admirável conversão de toda a substância do pão no corpo e de toda a substância do vinho no sangue de Cristo, conversão de que fala o Concílio Tridentino; limitam-se apenas à transignificação e transfinalização, conforme se exprimem.

Nem é lícito, por fim, propor e generalizar a opinião que afirma não estar presente Nosso Senhor Jesus Cristo nas hóstias consagradas que sobram, depois da celebração do Sacrifício da Missa” (nn. 10-11).

O mesmo Papa refere um testemunho importante, do século II: “os fiéis julgavam-se culpados, e com razão, conforme lembra Orígenes, se, recebendo o Corpo do Senhor e conservando-o com a maior cautela e veneração, apesar disso deixavam cair algum fragmento” (n. 60). São João Paulo II, na Encíclica Ecclesia de Eucharistia também indica os mesmos problemas:

“A par destas luzes, não faltam sombras, infelizmente. De fato, há lugares onde se verifica um abandono quase completo do culto de adoração eucarística. Num contexto eclesial ou outro, existem abusos que contribuem para obscurecer a reta fé e a doutrina católica acerca deste admirável sacramento. Às vezes transparece uma compreensão muito redutiva do mistério eucarístico. Despojado do seu valor sacrificial, é vivido como se em nada ultrapassasse o sentido e o valor de um encontro fraterno ao redor da mesa. 

Além disso, a necessidade do sacerdócio ministerial, que assenta na sucessão apostólica, fica às vezes obscurecida, e a sacramentalidade da Eucaristia é reduzida à

simples eficácia do anúncio. Aparecem depois, aqui e além, iniciativas ecumênicas que, embora bem-intencionadas, levam a práticas na Eucaristia contrárias à disciplina que serve à Igreja para exprimir a sua fé. Como não manifestar profunda mágoa por tudo isto? A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções” (n. 10).

E a fé se manifesta no cuidado até os mínimos detalhes: “Dando à Eucaristia todo o realce que merece e procurando com todo o cuidado não atenuar nenhuma das suas dimensões ou exigências, damos provas de estar verdadeiramente conscientes da grandeza deste dom. A isto nos convida uma tradição ininterrupta desde os primeiros séculos, que mostra a comunidade cristã vigilante na defesa deste ‘tesouro’.

Movida pelo amor, a Igreja preocupa-se em transmitir às sucessivas gerações cristãs a fé e a doutrina sobre o mistério eucarístico, sem perder qualquer fragmento. E não há perigo de exagerar no cuidado que lhe dedicamos, porque, ‘neste sacramento, se condensa todo o mistério da nossa salvação” (n. 61).

Ora, os Papas diagnosticaram uma espécie de “crise eucarística” e procuraram dar o remédio para ela. Mas qual a raiz deste problema?

Pe. Dr. José Eduardo de Oliveira e Silva

Fonte: https://presbiteros.org.br/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF