"O Batismo na Igreja
primitiva acontecia numa piscina da regeneração, não numa pia ou bacia
ajeitada. O neófito era enxertado da Páscoa do Senhor, para renascer pelo banho
da eternidade. O resgate dos textos extraordinários e mais antigos sobre o Batismo
atestam esse rito batismal e refletem a riqueza fantástica do sacramento, que o
Concílio Vaticano II nos propõe recuperar."
Jackson
Erpen - Cidade do Vaticano
Os
sacramentos são essencialmente celebrados da mesma maneira. Os ritos e as
disposições exigidas pela Igreja mudam, mas a substância é a mesma. Nos
primeiros séculos da Igreja, por exemplo, o tempo em que se celebrava o Batismo
era pincipalmente a festa da Páscoa ou a festa de Pentecostes, precedido por
uma preparação ao longo de toda a quaresma. Naturalmente havia exceções, como
diante de uma grave doença, perseguições, etc. Batizava-se à noite, durante as
vigílias que antecediam essas festas, com os neófitos participando de toda ação
litúrgica juntamente com os outros fiéis. Ao longo dos séculos, o Batismo
também passou a ser realizado em outras festas, como na Epifania, em memória ao
Batismo de Jesus, mas também no Natal e na festa de São João Batista, e com o
passar do tempo em qualquer festividade e mesmo nos dias de semana.
"O
novo nascimento pela Ressurreição do Senhor", é o tema da reflexão
do padre Gerson Schmidt*:
"Dizíamos
que desde o século III, os cristãos começaram a estender algumas festividades
para além do seu próprio dia. Assim, as alegres celebrações da Páscoa eram
prolongadas e duravam pelo menos oito dias inteiros. Os cristãos sentiam cada
dia da Oitava como se fosse o Domingo de Páscoa. Esta tradição foi preservada
quer no rito romano como em vários ritos orientais. Durante a Oitava da
Páscoa não era realizado nenhum trabalho, era uma celebração contínua e
continuada. Os neófitos, batizados pelo Papa na Vigília Pascal, deviam
participar da Missa e receber a Sagrada Comunhão todas as manhãs em uma igreja
diferente em Roma. À noite iam a São João de Latrão, a Igreja do Papa, para a
oração do Ofício das Vésperas, geralmente presidida pelo Papa. Os recém-batizados
usavam a veste batismal durante toda a Oitava da Páscoa, como sinal de estarem
ressuscitados pelo Batismo que receberam na Vigília Pascal. O segundo domingo
da Páscoa foi chamado In Albis (=em branco) porque neste dia
depunham os neófitos as suas vestes brancas. Os neófitos, em sinal de que
chegou ao fim a festa, tiravam, pois, as suas túnicas brancas, para retomarem
as vestes ordinárias, havendo sentido já as doçuras que o Senhor prodigaliza
aos seus recém-nascidos nos primórdios da vida cristã, como reza os textos do
Introito do rito litúrgico, já agora revestidos com a veste do Ressuscitado.
O Batismo
na Igreja primitiva não acontecia numa pia batismal qualquer ou numa bacia
improvisada. Havia uma piscina com sete degraus, simbolizando os sete pecados
capitais que deviam ser vencidos pelo neófito, que descia às aguas
regeneradoras e batismais, despido totalmente de suas vestes e vícios, sendo
batizado no último degrau negro da morte, e revitalizado, subia os outros sete
degraus, do outro lado da piscina, que simbolizava os sete dons do Espirito
Santo que eram recebidos na Noite Santa. Saindo das águas batismais, o
recém-batizado era então revestido com uma túnica branca, num revestir-se do
homem novo, desfeito de suas práticas antigas. O simbolismo pascal e batismal
era realmente profundo e riquíssimo no catecumenato dos primeiros séculos. Estas
particulares tradições batismais, infelizmente, caíram em desuso, mas o Tempo
da Páscoa continua vibrante e festivo, um período de alegria para o cristão
permanecer ancorado na beleza da Ressurreição e vitória do Senhor.
O Batismo
na Igreja primitiva acontecia numa piscina da regeneração, não numa pia ou
bacia ajeitada. O neófito era enxertado da Páscoa do Senhor, para renascer pelo
banho da eternidade. O resgate dos textos extraordinários e mais antigos sobre
o Batismo atestam esse rito batismal e refletem a riqueza fantástica do
sacramento, que o Concílio Vaticano II nos propõe recuperar.
Recordamos
uma antiga Homilia Pascal, de Autor desconhecido, referendado no Ofício das
Leituras da Terça-feira da segunda semana do Tempo Pascal, no ciclo bienal. O
texto, intitulado “O Batismo é um enxerto para a eternidade”, recorda o
mergulho na morte de Cristo, pelo batismo, o enxerto na eternidade ao
recém-iluminado. No útero da piscina da regeneração, a entrada no céu da
Ressurreição, morada da incorrupção, vida nova ressurgida das fontes batismais.
Escreve assim esse autor que não conhecemos, rico documento histórico-batismal:
“Tu, recém-iluminado, foste
mergulhado nesses bens. A iniciação na graça tornou-se para ti,
recém-iluminado, penhor da ressurreição. Para ti o Batismo é penhor da vida
futura no céu. Imitaste com tua imersão a sepultura do Senhor. Mas emergiste
daí vendo as obras da ressurreição antes de quaisquer outras. Entra na
realidade das coisas cujos símbolos te foram mostrados. Toma como testemunha do
que te foi dito a Paulo que escreve: Se fomos enxertados nele por uma morte
semelhante à sua, seremos semelhantes a ele também pela ressurreição (Rm 6,5:
Vulg.). Como é bela a expressão enxertados nele! Porque o Batismo é um enxerto
para a eternidade, enxerto feito na fonte batismal e que dá fruto no céu. Ali a
graça do Espírito opera de maneira misteriosa: provocado pela natureza, não
deixes de reconhecer o milagre. A água serve apenas de ocasião, a graça é que
de fato regenera. Na piscina, como se fosse um útero, ela dá forma nova ao que
é introduzido. Na água, como numa fornalha, ela forja ao que imerge. Confere-lhe
os mistérios da imortalidade. Oferece o sinal da ressurreição.”
“Teus próprios trajes, ó
recém-iluminado, mostram os símbolos dessas maravilhas. Olha para ti mesmo,
ostentando as imagens desses bens. Essa veste esplêndida e brilhante te
manifesta os sinais da incorrupção. O pano branco que te envolve a cabeça, como
um diadema, apregoa a liberdade. A mão revela os sinais da vitória conseguida
sobre o demônio. De fato, Cristo se apresenta a ti como ressuscitado: agora
certamente por meio de símbolos, mas dentro em breve, na própria realidade.”
“Se não mancharmos a túnica da
fé com nossos pecados, se não extinguirmos a lâmpada da graça com nossas más
ações e se conservarmos a coroa do Espírito, então, nitidamente, lá do céu, o
Senhor clamará com voz terrível, mas benigna para os homens: Vinde, benditos de
meu Pai! Recebei em herança o Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do
mundo (Mt 25,34). A ele a glória e o poder pelos séculos dos séculos. Amém” ¹”
*Padre
Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além
da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em
Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
_________________________
[1] Oficio das Leituras, Bienal, 3ª Feira da 2ª
Semana da Páscoa, Sermo in sanctum Pascha: PG 28,1080-1082
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

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