Perder o essencial é hipocrisia
Dom Jacinto Bergmann
Arcebispo de Pelotas (RS)
JESUS e o seu ABBÁ – no Evangelho dominical (01/09/24)
Eu me encontrava, Abbá, em Genesaré e o seus habitantes me
reconheceram. De toda região vinham pessoas e levavam em macas os que estavam
doentes. Suplicavam que pudessem ao menos tocar a borla da minha veste. Com
alegria interior, eu constatava que todos que a tocavam ficavam curados.
Aconteceu então, Abbá, que um grupo de fariseus e alguns
escribas, vindos de Jerusalém, reuniram-se em torno a mim. Eles viram que
alguns de meus discípulos comiam pão com as mãos impuras, isto é, sem as terem
lavado. De fato, os fariseus e os judeus em geral, apegados à tradição, só
comem depois de lavar bem as mãos; ao voltar da praça, não comem sem tomar
banho. E seguem muitos outros costumes que receberam por tradição, como, a
maneira certa de lavar copos, jarras e vasilhas de cobre.
Isso, levou, ó Abbá, os fariseus e os mestres da Lei me
perguntarem: “Por que os teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas
comem o pão sem lavar as mãos?” Inspirado pelo Espírito Santo, que me assiste
na minha missão, percebi, ó Abbá, que era hora de chamar atenção ao demasiado
legalismo e ritualismo dos fariseus e mestres da Lei.
Lembrei-lhes as palavras do grande profeta Isaías e
apliquei-as a eles, chamando-os de hipócritas. As palavras de Isaías são: “Este
povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta
o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos.
Vós abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens”.
Honrar-nos com os lábios, Abbá, mas o coração longe de nós,
é hipocrisia; prestar-nos culto, mas ensinando doutrinas que são meros
preceitos humanos, é hipocrisia; abandonar o nosso mandamento para seguir a
mera tradição dos homens, é hipocrisia. Como o ser humano, criado com tanta
semelhança conosco, perde-se no essencial e encontra-se no acidental! Como o
ser humano, criado com tanta semelhança conosco, desvia-se da liberdade do
espírito e fixa-se na escravidão da lei! É preciso sempre chamar a atenção!
Feita a advertência aos fariseus e mestres da lei, chamei a
multidão mais perto de mim. Queria, Abbá, que todos escutassem e compreendessem
bem a mensagem que lhes tinha a dar. Afirmei com toda a força: “Escutai todos e
compreendei: o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora,
mas o que sai do seu interior. Pois é de dentro do coração humano que saem as
más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, ambições
desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de
juízo”.
Ter tomado o exemplo da pureza e impureza, penso, ó Abbá,
que todos entenderam bem do que se tratava. Realmente o que torna impuro o
homem e a mulher é o que “sai do interior”. Os exemplos que lembrei a eles,
elenquei muitos para não deixar dúvida nenhuma: “Todas estas coisas más saem de
dentro, e são elas que tornam impuro o ser humano”.
Abbá, peço-te pela humanidade para que não se perca no
essencial; para que sinta sua hipocrisia nessa perda do essencial; para que
ouça a nossa voz e não ouça tanto “as vozes das serpentes”: essas são
especialistas de fazer comer “das árvores proibidas. Amém!”
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