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sexta-feira, 23 de maio de 2025

Cidade onde Leão XIV cresceu quer comprar casa em que ele passou a infância

Casa de infância de Robert Prevost, atual papa Leão XIV, em Dolton, Illinois, EUA. | Michael Howie, atribuição, via Wikimedia Commons

Cidade onde Leão XIV cresceu quer comprar casa em que ele passou a infância.

Por Amira Abuzeid*

22 de mai de 2025

A vila de Dolton, um subúrbio ao sul de Chicago, EUA, e cidade natal do papa Leão XIV, está tentando comprar sua casa de infância para usá-la como um local histórico.

Steve Budzik, corretor da casa, disse à CNA, agência em inglês da EWTN, que ele e Pawel Radzik, o atual proprietário, estão ansiosos para trabalhar com a vila e chegar a um acordo.

“O vendedor quer vender e a vila quer comprar. A questão é: como determinamos o valor justo de mercado para algo tão único, tão raro? Não há comparações, não há nada parecido”, disse Budzik à CNA.

Segundo Budzik, eles receberam uma carta da vila na semana passada, indicando seu interesse em comprar a casa. A carta dizia que a arquidiocese de Chicago também está trabalhando com a cidade para adquirir a casa. A arquidiocese não respondeu a um pedido de comentário.

Segundo Burt Odelson, o advogado da vila, Dolton gostaria de comprar a casa, que foi colocada à venda em janeiro, para transformá-la num local histórico acessível ao público. Se não for possível chegar a um acordo sobre o preço, Odelson disse à Fox2Now que a vila tentará adquirir a casa por desapropriação.

“Temos o direito legal de tomar a propriedade para uso público. Essa é a palavra-chave — uso público. Um sítio histórico é uso público”, disse ele.

Jason House, prefeito de Dolton eleito recentemente, disse à rede de televisão ABC7 Chicago que a vila só usará essa opção se as negociações atuais falharem.

No ano passado, Radzik pagou US$ 66 mil (cerca de R$ 371,5 mil) pela casa de três quartos, três banheiros e 99,7 m² no número 212 da East 141st Place. Depois de muitas reformas, ela foi colocada à venda por US$ 219 mil (cerca de R$ 1,2 milhões) em janeiro. O preço caiu para US$ 199,9 mil (cerca de R$ 1,12 milhões) em abril.

Ao saber, em 8 de maio, que a casa era dos pais do papa recém-eleito, que a compraram do construtor em 1949 e viveram nela por décadas, o dono a retirou do mercado "para se reorganizar" e reavaliar a situação, segundo Budzik.

Cerca de uma semana depois, com a ajuda da imobiliária Paramount Realty USA Radzik colocou a casa a venda novamente num leilão fechado. Os lances estão ativos e abertos até 18 de junho.

No entanto, House disse à ABC7 Chicago que se outra pessoa comprar a casa no leilão, deve saber que sua compra só seria “temporária", porque a cidade ainda tentará adquiri-la por meio de domínio eminente.

O anúncio diz que a casa é "um pedaço da história papal", chamando-a de "uma oportunidade única" com "uma história de transformação, legado e potencial ilimitado", e onde um comprador pode "ter um lugar onde a história foi feita".

“Nascido Robert Francis Prevost em Chicago e criado aqui em Dolton, a jornada do papa Leão XIV deste humilde bairro até o Vaticano é um testemunho de fé, perseverança e propósito. Agora, você tem a rara oportunidade de ter uma parte tangível de seu legado inspirador”, diz o anúncio.

Na última segunda-feira, autoridades de Dolton decidiram renomear uma parte do 141st Place em homenagem ao primeiro papa nascido nos EUA, disse Budzik à CNA.

Ward Miller, do grupo Preservation Chicago, uma organização sem fins lucrativos dedicada à preservação de locais históricos de Chicago e ao incentivo à designação de marcos históricos na cidade, disse à CNA que, embora a casa não possa ser considerada para a designação de marco histórico pela cidade de Chicago, por estar fora da jurisdição municipal, espera que ela receba, ao menos, o título de marco histórico local de Dolton.

Ele disse que isso "não impediria que a casa fosse eventualmente" listada como um local do Registro Nacional de Lugares Históricos dos EUA "ou mesmo um marco histórico nacional".

Miller defende que a paróquia de Santa Maria da Assunção, em que Leão XIV passou a infância, que fica dentro da jurisdição da cidade, receba o título de patrimônio histórico de Chicago. Uma petição (link em inglês) foi criada para esse fim.

A paróquia está vaga desde 2011. "A designação de marco histórico de Chicago é a única coisa que impedirá que o prédio seja demolido", disse Miller à CNA. O imóvel foi adquirido recentemente por Joel Hall, que disse à ABC7 Chicago que está aberto a buscar a designação de marco histórico de Chicago.

Miller disse à CNA que a Preservation Chicago compareceu diante de um comitê da Comissão de Marcos Históricos de Chicago na última sexta-feira (16), recomendando a criação de um distrito histórico com muitos locais — como a paróquia de Santa Maria da Assunção — associados a Leão XIV.

Ele disse que espera que a decisão de criar o distrito histórico seja acelerada, considerando a "coisa fenomenal e notável que aconteceu" com a eleição de Prevost ao papado.

Essa é "uma chance para Chicago chegar ao topo", disse Miller, que é católico, à CNA.

"É incrível, o primeiro papa americano, e ele é de Chicago!", disse também Miller.

*Amira Abuzeid é editora sênior da Catholic News Agency, agência em inglês da EWTN News.

Fonte: https://www.acidigital.com/noticia/62865/cidade-onde-leao-xiv-cresceu-quer-comprar-casa-em-que-ele-passou-a-infancia

Um trabalho digno para todos: a mensagem dos três últimos Papas

Um trabalho digno para todos (Vatican News)

O vídeo com a intenção de oração pontifícia para o mês de maio muda de formato com o falecimento de Francisco. Para favorecer a reflexão, o tema sobre o trabalho é apresentado através de mensagens de João Paulo II, Bento XVI e Francisco que reafirmam que as pessoas devem ser prioridade para que, através dele, "cada pessoa se realize, as famílias sejam sustentadas com dignidade e se humanize a sociedade”.

https://youtu.be/FUyOnKqRVTk

Vatican News

Na publicação anual das intenções de oração para 2025, o Papa Francisco nos convidou a rezar em maio “Pelas condições de trabalho”. Devido à sua morte, em 21 de abril, o vídeo que acompanha esta intenção de oração muda de formato: para favorecer a reflexão, recorda mensagens sobre o tema dos três últimos Papas - João Paulo II, Bento XVI e Francisco.

O Vídeo do Papa de maio foi realizado com a ajuda da Câmara de Comércio de Roma e da Fondazione PRO Rete Mondiale di Preghiera del Papa, divulgado pela Rede Mundial de Oração do Papa e convida “para que, através do trabalho, cada pessoa se realize, as famílias sejam sustentadas com dignidade e se humanize a sociedade”.

As imagens que acompanham as palavras dos Pontífices reúnem diferentes experiências de vida em torno do mundo do trabalho. Em primeiro lugar, vemos uma oficina de carpinteiro, com uma imagem de São José esculpida à mão no século XIX, em madeira de tília, por mestres escultores de Val Gardena. O vídeo ainda traz as várias realidades da Cidadela de Loppiano - a oficina de cerâmica, a cooperativa agrícola, a empresa de embalamento e acabamento de muitos artigos - em que o trabalho é vivido numa perspectiva de comunhão. E não faltam imagens evocativas da exploração de que são vítimas milhões de trabalhadores em várias partes do mundo.

160 milhões de crianças obrigadas a trabalhar

O mundo do trabalho tem estado muito presente no magistério da Igreja desde o final do século XIX: uma consequência do olhar atento dos Papas sobre a realidade e da sua preocupação com o bem espiritual e material das pessoas. Atualmente, segundo dados da ONU e da OIT, 402,4 milhões de pessoas em todo o mundo estão desempregadas; 160 milhões de crianças são obrigadas a trabalhar; 240 milhões de trabalhadores recebem um salário inferior a 3,65 dólares por dia; e mais de 60% da população ativa mundial trabalha na economia informal, o que significa que cerca de 2 mil milhões de pessoas estão privadas de direitos laborais e de proteção social.

Os Papas e o mundo do trabalho

As palavras de Francisco sublinham que o trabalho confere “uma unção de dignidade”: ganhar o pão dá dignidade à pessoa. O próprio Jesus trabalhou como carpinteiro, “um ofício bastante duro” que “não assegurava grandes rendimentos”, e que partilhou com todos os trabalhadores ao longo da história.

Algumas das frases de Bento XVI sublinham a importância primordial do trabalho “para a realização humana e o desenvolvimento da sociedade”. Por conseguinte, o trabalho deve ser “organizado e realizado no pleno respeito da dignidade humana e ao serviço do bem comum”. Ao mesmo tempo, o homem não deve deixar-se “escravizar pelo trabalho (...) pretendendo encontrar nele o sentido último e definitivo da vida”, que só se encontra em Deus.

Por fim, as palavras de São João Paulo II exortam a enfrentar os desequilíbrios económicos e sociais e as situações de injustiça que existem no mundo do trabalho, colocando em primeiro lugar “a dignidade do homem e da mulher que trabalha, a sua liberdade, responsabilidade e participação”. Tudo isto, sem esquecer “aqueles que sofrem por falta de emprego, por salários insuficientes, por falta de meios materiais”. São precisamente estes desequilíbrios e situações de injustiça que tornam necessário rezar para que o centro do trabalho e da vida económica e social seja o ser humano e não o lucro.

Um bem-estar partilhado

"O trabalho”, comenta Lorenzo Tagliavanti, presidente da Câmara de Comércio de Roma, "é como o ar: apercebemo-nos do seu valor quando nos falta. Segundo a Doutrina Social da Igreja, o trabalho é um direito humano fundamental e um elemento decisivo para a realização pessoal de cada um e para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e solidária: tudo aspetos sobre os quais procuramos dar o nosso melhor todos os dias, como instituição de referência da comunidade económica de Roma e da sua Província, ao lado das empresas e dos trabalhadores. Esta intenção de oração, que acompanha o Jubileu dos Trabalhadores e o Jubileu dos Empresários, oferece-nos, portanto, a oportunidade de reafirmar o compromisso assumido em 1831, quando precisamente um Papa - Gregório XVI - fundou a Câmara de Comércio de Roma com decreto do Cardeal Bernetti, Secretário de Estado: prosseguir um modelo de desenvolvimento baseado na cooperação e na atenção ao interesse comum". “Permita-me”, conclui Tagliavanti, "recordar as palavras do Papa Francisco em 2023 a um grupo de empresários franceses: 'se é verdade que o trabalho enobrece o homem, é ainda mais verdade que é o homem que enobrece o trabalho'. É precisamente esta atenção ao homem que motiva o nosso trabalho quotidiano, na busca de um modelo de desenvolvimento orientado para um bem-estar partilhado por todos”. 

Trabalho e dignidade

"Outro conceito sublinhado pelos Pontífices é que o valor do trabalho vai muito além do seu aspeto económico. Se perguntarmos a dez crianças o que gostariam de fazer quando crescerem”, comenta Stefano Simontacchi, membro fundador e membro do conselho de administração da Fondazione PRO Rete Mondiale di Preghiera del Papa, “provavelmente obteremos dez respostas diferentes, porque as aspirações de cada um são diferentes: como na parábola dos talentos, de facto, a cada um foi dado o seu, e o trabalho é a possibilidade de o fazer frutificar, de realizar a sua personalidade. No trabalho, de facto, há muito mais do que a independência económica, que também é importante: há o contributo que se dá à sociedade e, para nós, crentes, também a participação na criação divina. O Papa Francisco usou uma expressão muito bonita para definir tudo isto: chamou ao trabalho a “unção da dignidade”, e esta unção da dignidade é o que realmente faz a diferença nas nossas vidas”. Ainda mais nesta era de grandes mudanças, como a inteligência artificial, que nos deve levar a promover sistemas solidários como forma de coesão social. A gratidão, o respeito e a solidariedade devem ser a nossa bússola”.

Trabalho digno, um objetivo prioritário

O diretor internacional da Rede Mundial de Oração do Papa, Pe. Cristóbal Fones, explica que, para São João Paulo II, o ser humano é chamado ao trabalho exatamente “porque é feito à imagem e semelhança de Deus”: é precisamente o Senhor que lhe dá a possibilidade de participar na sua obra criadora através do trabalho. Na sua encíclica Laborem exercens, João Paulo II diz-nos que, através do nosso trabalho, a dignidade humana, a união fraterna e a liberdade devem multiplicar-se na terra. O trabalho do cristão, unido à sua oração, faz progredir o mundo e, mais importante ainda, contribui para o desenvolvimento do Reino de Deus”.

“Nesta base” - continua o Pe. Fones - "o seu sucessor, Bento XVI, afirma na encíclica Caritas in Veritate que a dignidade da pessoa exige que as escolhas económicas não aumentem a desigualdade e que o trabalho digno para todos seja um objetivo prioritário. Bento XVI assegura que a pobreza é, em muitos casos, o resultado da violação da dignidade do trabalho humano: por vezes as possibilidades da pessoa são limitadas, como no caso do desemprego ou do subemprego; e outras vezes o direito a um salário justo ou à segurança do trabalhador e da sua família não é respeitado”.

Neste sentido, o Pe. Fones sublinha a continuidade do magistério do Papa Francisco com o dos seus antecessores: “o Papa Francisco diz-nos que o trabalho é sagrado. É o meio que temos para construir uma sociedade mais humana: se queremos uma sociedade mais justa, temos de promover o emprego digno, estável, realizado em ambientes saudáveis e com medidas de segurança adequadas, o que implica o respeito pelos direitos fundamentais e a proteção social, bem como um salário que permita às famílias manter uma boa qualidade de vida”.

Isso será possível “se recuperarmos o verdadeiro valor do trabalho, se abandonarmos a lógica do lucro a qualquer custo e colocarmos ao centro as pessoas, especialmente aquelas que hoje não conseguem viver de forma humanamente digna”.

Finalmente, no contexto do Ano Santo de 2025, O Vídeo do Papa adquire uma relevância especial, porque nos dá a conhecer as intenções de oração pontifícia. Para obter a graça da indulgência jubilar, é necessário rezar por estas intenções.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Novos corações serão criados: Matrimônio e celibato apostólico (1) – Parte I

Lanternas de papel (Opus Dei)

Novos corações serão criados: Matrimônio e celibato apostólico (1) – Parte I

Como amar a Cristo, uma pessoa viva a quem não vemos? E como amar os outros como Ele nos amou? No matrimônio e no celibato, o Espírito Santo transforma nossos sentidos para tornar nosso coração semelhante ao Dele.

22/05/2025

As pessoas que caminharam com Jesus durante sua passagem pela terra, teriam imaginado durante aqueles anos que, em algum momento, teriam que continuar sua existência sem Ele? Ao vê-lo morrer na Cruz, teriam vislumbrado como continuariam, na sua ausência, durante todos os anos que ainda viveriam? Mais cedo ou mais tarde, tiveram que enfrentar esses pensamentos. Talvez por isso se esforçaram para guardar cada momento. Verônica procura manter as feições de Cristo na tela; a Virgem Maria, Maria Madalena e, perto delas, São João, gravam em seu coração cada gesto e cada palavra do Senhor. Outros apóstolos talvez também tenham tentado conservar esses momentos, contemplando-os à distância, por medo de serem reconhecidos. Em todos os casos, a separação foi dolorosa, pois nunca é fácil dizer adeus a quem se ama.

Três dias depois da sua morte, no entanto, Jesus volta. Podemos imaginar a alegria dos apóstolos. Talvez tenham recuperado uma esperança, mais forte desta vez, de permanecer o resto de suas vidas junto ao Mestre, com a certeza de que Ele não partiria novamente. Os encontros com os discípulos de Emaús, com Maria Madalena e com os outros discípulos parecem apontar para isso. “Fica conosco” (Lc 24,29), pedem os que o encontraram afastando-se de Jerusalém. No entanto, o Senhor pede, a cada um, de diferentes modos, que não o retenha. “Não me segures” (Jo 20,17), pede a Maria Madalena, enquanto “desaparecia” (Lc 24,31) da presença dos discípulos de Emaús. Depois de transmitir seus últimos ensinamentos aos apóstolos, parece que desta vez Ele realmente parte definitivamente: “Afastou-se deles e foi levado para o céu” (Lc 24,51).

Como entender essa separação anunciada e desejada pelo próprio Jesus? Mais ainda, como entendê-la quando Ele já não estava sujeito às limitações do tempo nem do espaço? Jesus ressuscitado podia aparecer em uma casa fechada, caminhar junto aos discípulos sem ser reconhecido e desaparecer em um instante. Já não havia distâncias que O separassem dos seus, nem muros que impedissem sua presença. Ele podia estar onde quisesse, com quem quisesse, quando quisesse. E, no entanto, escolhe partir. Justo quando nada o prende, justo quando o vemos manifestar-se sem restrições, decide subir ao céu. Essa escolha, tão inesperada, nos fala de um mistério ainda mais profundo: o seu desejo de nos ensinar a amar de outro modo.

Amar de um modo novo

Talvez nós também já tenhamos imaginado, em algum momento, como teria sido emocionante ver e ouvir Jesus diretamente, viver em seu tempo, senti-lo fisicamente mais perto. Em alguma ocasião, como aconteceu com São Josemaria, pode ter vindo à nossa mente um pensamento como este: “Senhor, quero te dar um abraço!”[1]. Assim como os discípulos de Jesus naquele dia da ascensão, nós também desejamos entender o sentido dessa separação. Pode ser que naquele dia tenham lembrado as palavras que Cristo havia pronunciado um tempo antes: “Quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós” (Jo 14,3). O próprio Jesus lhes havia dito que essa separação era para nos atrair a um lugar melhor e, desta vez sim, definitivo. Ele “precede-nos junto do Pai, eleva-se à altura de Deus e convida-nos a segui-lo”[2]. Embora surpreendente, sua ausência será como um ímã para que não nos detenhamos aqui, mas para que nos aproximemos progressivamente do nosso destino, ao encontro definitivo com Jesus.

Os primeiros homens e mulheres que seguiram o Senhor ressuscitado tiveram que aprender algo realmente novo, algo que ninguém havia tido que realizar antes: aprender a amar uma pessoa viva, relacionar-se realmente com ela no presente, mas sem estar fisicamente perto dela. Tiveram que descobrir modos diferentes de se comunicar e de expressar o afeto. A partida de Jesus para o céu inaugura, para todos, um novo modo de amar. Os discípulos foram os primeiros que tiveram que descobrir essa realidade que, agora, todos os cristãos vivem, pois não podemos amar Jesus exatamente da mesma maneira que amamos outra pessoa. Por exemplo, diante de sua presença real na Eucaristia, nossos sentidos ficam confusos: “A vista, o tato, o gosto se enganam”[3], nos lembra São Tomás de Aquino. Que maneira peculiar de se tornar íntimo de alguém! À primeira vista pode parecer insuficiente, e por isso pressupõe uma nova educação dos sentidos; um processo que não será imediato, nem se realizará sem esforço. “Ai, quem poderá me curar!” – dizia São João da Cruz que, como todos, viveu constantemente esse aprendizado. “Entrega-te, pois, já deveras, e não queiras enviar-me mais mensageiro algum, pois não sabem dizer-me o que desejo[4]”.

Aprender a relacionar-se com um Deus que se revela e que ao mesmo tempo se esconde não é questão de um dia, nem apenas tarefa do nosso próprio engenho. Desde o início, os próprios apóstolos precisaram de uma ajuda especial para entrar nesse novo modo de conhecer e amar. Jesus prometeu essa ajuda, que seria o Espírito Santo, pois Ele é quem “manifesta-lhes o Senhor ressuscitado, lembra-lhes sua palavra, abrindo-lhes o espírito à compreensão de sua Morte e Ressurreição. Torna-lhes presente o mistério de Cristo (...) a fim de reconciliá-los, de colocá-los em comunhão com Deus”[5]. Por isso, em um famoso hino da tradição cristã, pedimos ao Espírito Santo que desperte em nós os sentidos espirituais: “Vinde, Espírito Criador, visitai a alma dos vossos fiéis; enchei de graça celestial os corações que Vós criastes (...). Acendei a vossa luz em nossas almas, infundi o vosso amor em nossos corações; e a fraqueza da nossa carne, fortalecei-a com perpétua força”[6].

Os santos, casados ou não, aprenderam isso

Todos os cristãos, solteiros e casados, jovens e idosos, sacerdotes e leigos, precisam aprender este jogo de nos deixar atrair por um Deus que se manifesta e se esconde de um modo particular. Talvez naqueles que receberam o dom do celibato ou nas pessoas solteiras, essa necessidade de aprender a amar pela fé seja mais evidente, pois sua vida, também destinada a dar e receber amor, não conta com a presença física de uma pessoa com quem compartilhar sua existência e sua intimidade. No entanto, também na vida matrimonial, é Jesus Cristo quem preenche totalmente a necessidade de amor de cada cônjuge. Em uns e outros, assim como nos primeiros discípulos, o Espírito Santo é quem torna possível essa transformação.

Eduardo Ortiz de Landázuri[7], médico supernumerário do Opus Dei, casado com Laura Busca, contava que aprendeu sobretudo duas coisas de São Josemaria: amar todas as pessoas, com seus defeitos e limitações normais, porque via em cada uma um filho de Deus; e descobrir nas atividades normais de cada dia uma profundidade sobrenatural, espiritual, divina[8]. Ambas as coisas requerem ver além da superfície, do que aparece diante de nossos olhos, captar o verdadeiro valor das pessoas e até das coisas mais insignificantes. “As pessoas, geralmente, têm uma visão plana, pegada à terra, de duas dimensões – escrevia São Josemaria-. Quando a tua vida for sobrenatural, obterás de Deus a terceira dimensão: a altura. E, com ela, o relevo, o peso e o volume”[9]. Essa nova maneira de ver a realidade é especialmente importante nos momentos difíceis. Anos mais tarde, Eduardo contou a um jornal como estava vivendo sua doença, tinha sido diagnosticado com um câncer. Em resposta a seu testemunho, outro paciente escreveu-lhe uma carta de agradecimento e disse-lhe o quanto o havia achado inspirador, mesmo sendo ateu. Eduardo respondeu: “Pode ter certeza de que, como médico, estou totalmente convencido de que o Senhor acampa sempre junto ao doente. Isso faz muito bem a eles. Seus ouvidos são muito mais sensíveis e sua visão mais profunda”[10].

Os santos são os mestres dos sinais discretos de Deus e os que melhor aprenderam a olhar, compreender e amar desse modo novo. São Josemaria aprendeu a reconhecer a presença de Deus no que poderia parecer mais banal. Na sua adolescência, ao ver as pegadas de um carmelita na neve, acendeu-se nele a chama da vocação; nos primeiros anos de sacerdócio, vivendo com poucos recursos, atreveu-se a pedir ao seu anjo da guarda que o despertasse pela manhã; mais tarde, durante a guerra civil espanhola, saiu de uma grande perturbação interior quando, ao encontrar uma rosa de madeira (parte de um retábulo de uma igreja destruída), compreendeu que deveria seguir em frente em seu caminho; e posteriormente, durante sua vida e como parte desse aprendizado alcançado, gostava de decorar a casa em que vivia com objetos que despertassem o sentido da presença de Deus, essa nova maneira de se comunicar com Jesus. Os santos aprenderam a se guiar e a amar pelos sentidos espirituais. Sua tarefa agora é “despertar o desejo de Deus, naqueles que tem a felicidade de deles se aproximar”[11].

Gerard Jiménez Clopés e Andrés Cárdenas Matute

Tradução: Mônica Diez


[1] Pilar Urbano, O homem de Villa Tevere, Quadrante, São Paulo.

[2] Bento XVI, Homilia, 26 de maio de 2005.

[3] São Tomás de Aquino, Hino Adoro te devote

[4] São João da Cruz, Cântico Espiritual, Cântico 6-7.

[5] Catecismo da Igreja Católica, n.737.

[6] Hino Veni Creator.

[7] Eduardo Ortiz de Landázuri (1910-1985) foi um médico espanhol especializado em medicina interna, reconhecido por seu trabalho na Clínica da Universidade de Navarra. Destacou-se por sua profunda consciência da vocação cristã e sua dedicação ao atendimento dos pacientes.

[8] Cfr. Esteban López-Escobar, Pedro Lozano, Eduardo Ortiz de Landázuri, Palabra, Madrid 1994, 267-268.

[9] São Josemaria, Caminho, n.279.

[10] Juan Antonio Narváez Sánchez, El doctor Ortiz de Landázuri. Un hombre de ciencia al encuentro con Dios, Palabra, Madri 1997, 177.

[11] São João Paulo II, Homilia, 18 de outubro de 1991.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/novos-coracoes-serao-criados-matrimonio-e-celibato-apostolico-1/

Papa Francisco, doze anos de novos dinamismos e portas abertas

Papa Francisco na Praça São Pedro (Vatican Media)

Papa Francisco, doze anos de novos dinamismos e portas abertas

O pontificado de Jorge Mario Bergoglio no trono de Pedro, entre viagens, reformas, documentos, reestruturações eclesiais, compromissos pela paz, pelos pobres e migrantes, no horizonte da inovação e da fraternidade.

Salvatore Cernuzio – Vatican News

Papa Francisco foi o primeiro em muitas coisas. Primeiro Papa jesuíta, primeiro Papa originário da América Latina, primeiro a escolher o nome Francisco sem um numeral, primeiro a ser eleito com seu antecessor ainda vivo, primeiro a residir fora do Palácio Apostólico, primeiro a visitar terras nunca antes tocadas por um pontífice - do Iraque à Córsega -, primeiro a assinar uma Declaração de Fraternidade com uma das autoridades islâmicas mais importantes. Também foi o primeiro Papa a se equipar com um Conselho de Cardeais para governar a Igreja, a atribuir funções de responsabilidade a mulheres e leigos na Cúria, a lançar um Sínodo que envolvia diretamente o povo de Deus, a abolir o segredo pontifício para casos de abuso sexual e a remover a pena de morte do Catecismo. O primeiro também, a liderar a Igreja enquanto no mundo não há “a” guerra, mas muitas guerras, pequenas e grandes, travadas “em pedaços” nos diferentes continentes. Uma guerra que “é sempre uma derrota”, como repetiu nos mais de 300 apelos, mesmo quando sua voz falhava, e que ocuparam todos os últimos pronunciamentos públicos desde o início da violência na Ucrânia e no Oriente Médio.

Última passagem com o Papamóvel de Francisco na Praça São Pedro, após a Urbi et Orbi de ontem, 20 de abril de 2025, Domingo de Páscoa   (Vatican Media)

Processos

Mas Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, provavelmente não gostaria que o conceito de “primeiro” fosse associado ao seu pontificado, projetado nesses 12 anos não para atingir metas ou conquistar primados, mas para iniciar “processos”. Processos em andamento, processos concluídos ou distantes, processos que provavelmente são irreversíveis até mesmo para quem o sucederá no trono de Pedro. Ações que geram “novos dinamismos” na sociedade e na Igreja - como está escrito na road map do pontificado, a Evangelii Gaudium - sempre no horizonte do encontro, da troca, da colegialidade.

Do fim do mundo

“E agora iniciamos este caminho, Bispo e povo”, foram as primeiras palavras pronunciadas da Sacada Central da Basílica de São Pedro, no final da noite de 13 de março de 2013, para uma multidão que lotava a Praça São Pedro há um mês, sob os refletores após a renúncia de Bento XVI. Para aquela multidão, o recém-eleito Papa de 76 anos, escolhido por seus irmãos cardeais, originário “do fim do mundo”, pediu uma bênção. Com o povo, quis recitar uma Ave Maria, tropeçando em um italiano que até então não havia praticado assiduamente, dadas as raras visitas do pastor de Buenos Aires a Roma, pronto para fazer as malas imediatamente após o Conclave. E ao povo, no dia seguinte, ele quis prestar sua homenagem íntima, dirigindo-se à paróquia de Santa Ana no Vaticano e depois à Basílica de Santa Maria Maior, agradecendo à Salus Populi Romani, protetora de seu pontificado, a quem ele continuou a prestar homenagem em todos os momentos mais fortes. E exatamente nessa Basílica, Francisco expressou seu desejo de ser enterrado.

A eleição em 13 de março de 2013   (ANSA)

Pastor no meio do povo

A proximidade com o povo, um legado do ministério argentino, foi manifestada pelo Papa em todos os anos seguintes de várias maneiras: com visitas aos funcionários do Vaticano nos seus escritórios, com as Sextas-feiras da Misericórdia no Jubileu de 2016 em locais de marginalização e exclusão, com as celebrações da Quinta-feira Santa em prisões, asilos e centros de acolhida, com o longo tour em paróquias nos subúrbios romanos, com visitas e telefonemas surpresa. E manifestou essa proximidade em todas as viagens apostólicas, começando pela primeira ao Brasil em 2013, herdada de Bento XVI, da qual nos lembramos a imagem do papamóvel bloqueado no meio da multidão.

Primeiro Papa no Iraque

O Pontífice argentino completou quarenta e sete peregrinações internacionais, feitas com base em eventos, convites de autoridades, missões a serem realizadas ou algum “movimento” interno, como ele mesmo revelou no voo de volta do Iraque. Sim, exatamente o Iraque: três dias em março de 2021 entre Bagdá, Ur, Erbil, Mosul e Qaraqosh, terras e vilarejos com cicatrizes ainda evidentes da matriz terrorista, com sangue nas paredes e tendas de pessoas deslocadas ao longo das estradas, em meio à pandemia da Covid e preocupações gerais com a segurança. Uma viagem desaconselhada por muitos por causa da saúde e do risco de atentados; uma viagem desejada a todo custo. A “mais bela” viagem, como o próprio Francisco sempre confidenciou, o primeiro Papa a pisar na terra de Abraão, onde João Paulo II não conseguiu ir, e a conversar com o líder xiita Al-Sistani.

Papa Francisco entre os escombros de Mosul, viagem ao Iraque (2021)   (Vatican Media)

A Porta Santa em Bangui e a mais longa viagem ao Sudeste Asiático e à Oceania

Uma boa obstinação o levou ao Iraque, a mesma que em 2015 o levou a Bangui, a capital da República Centro-Africana ferida por uma guerra civil que, nos mesmos dias da visita, deixou mortos pelas ruas. No país africano, onde disse que queria ir mesmo ao custo de saltar “de paraquedas”, Francisco abriu a Porta Santa do Jubileu da Misericórdia em uma cerimônia comovente que também marca o recorde de um Ano Santo aberto não em Roma, mas em uma das regiões mais pobres do mundo. Também pode ser descrito como uma boa obstinação a que animou sua decisão de empreender a viagem mais longa do pontificado em setembro de 2024, aos 87 anos: Indonésia, Papua-Nova Guiné, Timor-Leste, Cingapura. Quinze dias, dois continentes, quatro fusos horários, 32.814 km percorridos de avião. Quatro universos diferentes, cada um representando os principais temas do Magistério: fraternidade e diálogo inter-religioso, periferias e emergência climática, reconciliação e fé, riqueza e desenvolvimento a serviço da pobreza.

A abertura da Porta Santa em Bangui   (ANSA)

De Lampedusa a Juba

Não se pode esquecer, repercorrendo as viagens apostólicas e as visitas pastorais, a primeira viagem fora de Roma, à pequena ilha de Lampedusa, cenário de grandes tragédias migratórias, com a coroa de flores lançada no “cemitério a céu aberto” do Mediterrâneo. A denúncia também se repetiu na dupla viagem a Lesbos (2016 e 2021) nos contêineres e tendas de refugiados e pessoas deslocadas.

Na história do pontificado, ficaram marcadas também a viagem à Terra Santa (2014); à Suécia, em Lund (2016) para as celebrações do 500º aniversário da Reforma Luterana; ao Canadá (2022) com o pedido de perdão às populações indígenas pelos abusos sofridos por representantes da Igreja Católica. E, em seguida, na República Democrática do Congo e ao Sudão do Sul, em Juba (2023), esta última etapa compartilhada com o Arcebispo de Canterbury, Justin Welby, e o Moderador da Assembleia Geral da Igreja da Escócia, Ian Greenshields, para sublinhar a vontade ecumênica de curar as feridas de um povo. As mesmas que ele implorou que fossem curadas aos líderes sul-sudaneses, reunidos em 2019 para dois dias de retiro na Casa Santa Marta, concluídos com o gesto perturbador de beijar seus pés.

Também, Cuba e Estados Unidos (2015), uma viagem para selar o estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países. Um evento histórico para o qual Francisco passou meses, enviando cartas a Barack Obama e Raúl Castro, instando-os a “iniciar uma nova fase”. Foi o próprio Obama quem agradeceu publicamente ao Pontífice. Em Havana, houve também o encontro com o Patriarca Kirill e a assinatura de uma declaração conjunta para colocar em prática o “ecumenismo da caridade”, o compromisso dos cristãos para uma humanidade mais fraterna. Um compromisso que se tornou, anos depois, tragicamente atual e um tanto desconsiderado com a eclosão da guerra no coração da Europa.

A assinatura da Declaração sobre a Fraternidade Humana em Abu Dhabi (2019) (Vatican Media)

A assinatura do Documento sobre a Fraternidade Humana em Abu Dhabi

Por último, mas não menos importante, entre as viagens, Abu Dhabi (2019) e o Documento sobre a Fraternidade Humana assinado em conjunto com o Grão Imame al-Tayeb, coroando o degelo com a universidade sunita de Al-Azhar que começou com um abraço na Casa Santa Marta e terminou com a assinatura de um texto que imediatamente se tornou a pedra angular do diálogo islâmico-cristão, também transposto para várias Constituições.

As encíclicas

As experiências, os diálogos e os gestos vividos nessas viagens fluíram para os documentos do pontificado. Quatro encíclicas: a primeira, Lumen Fidei, sobre o tema da fé, a quatro mãos com Bento XVI; depois, Laudato si', um grito para invocar uma “mudança de rumo” para a “casa comum”, em crise pelas mudanças climáticas e pela exploração excessiva, e para estimular ações para erradicar a miséria e para o acesso equitativo aos recursos do planeta. A terceira encíclica, a Fratelli Tutti, o eixo fundamental do Magistério, fruto do Documento de Abu Dhabi, profecia - antes da deflagração de novas guerras - da fraternidade como o único caminho para o futuro da humanidade. Por fim, a Dilexit Nos para repercorrer a tradição e a atualidade do pensamento “sobre o amor humano e divino do coração de Jesus” e lançar uma mensagem a um mundo que parece ter perdido seu coração.

O Sínodo para a Região Pan-Amazônica   (Vatican Media)

Exortações Apostólicas e Motu Proprio

São sete exortações apostólicas: desde a já mencionada Evangelii Gaudium até C'est la confiance, para o 150º aniversário do nascimento de Teresa do Menino Jesus. Entre elas, as exortações pós-sinodais - Amoris Laetitia (Sínodo sobre a família), Christus Vivit (Sínodo sobre os jovens), Querida Amazonia (Sínodo para a Região Pan-Amazônica) -, Gaudete et Exsultate sobre o chamado à santidade no mundo contemporâneo, Laudate Deum, uma sequência ideal da Laudato si' para completar seu apelo para reagir pela Mãe Terra antes de um “ponto de ruptura”.

Foram emitidos cerca de 60 Motu Proprio para reconfigurar as estruturas da Cúria Romana e do território da Diocese de Roma, para alterar o Direito Canônico e o sistema judiciário do Vaticano, para emitir regras e procedimentos mais rigorosos na luta contra os abusos. Esse é o caso do Vos estis lux mundi, um documento que incorporou resultados, indicações e recomendações do Summit sobre a Proteção dos Menores, realizado no Vaticano, em fevereiro de 2019. Uma cúpula que representou o auge do trabalho para combater a pedofilia do clero e os abusos não só sexuais; uma expressão da disposição da Igreja de agir com verdade e transparência em uma atitude penitencial. Com o Vos estis lux mundi, Francisco estabeleceu novos procedimentos para a denúncia de assédios e violências e introduziu o conceito de accountability, ou seja, garantir que bispos e superiores religiosos prestem conta de suas ações.

Os melhores votos à Cúria Romana em dezembro de 2024   (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Reforma da Cúria

Portanto, processos. Os processos de reformas foram uma constante no papado de Francisco, que não quis ignorar as recomendações dos cardeais nas congregações pré-conclave que pediam ao futuro novo Papa que reestruturasse a Cúria Romana e, em particular, as finanças do Vaticano, que durante anos estiveram no centro de escândalos. Logo após sua eleição, o Papa criou um Conselho de Cardeais, o C9 (que se tornou C6 e C8 ao longo dos anos, conforme os vários membros foram mudando), um pequeno “senado” para ajudá-lo a governar a Igreja universal e trabalhar na reforma da Cúria. Fusões de Dicastérios e outras mudanças de títulos e organogramas foram os sinais do work in progress; o passo final foi a Constituição Apostólica Praedicate evangelium: aguardada por anos, promulgada em 2022, sem aviso prévio ou preâmbulo, introduzindo novidades significativas. Entre elas, a instituição do novo Dicastério para a Evangelização, presidido diretamente pelo Pontífice, e o envolvimento dos leigos “em funções de governo e responsabilidade”. Nessa onda de mudanças, devem ser vistas as nomeações do primeiro prefeito leigo, Paolo Ruffini, para o Dicastério para a Comunicação, da primeira “prefeita” para o Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada, Irmã Simona Brambilla, e da primeira governadora da Cidade do Vaticano, Irmã Raffaella Petrini.

As Mulheres

As mulheres, outra vertente destes anos de Bergoglio no trono de Pedro, o Papa que, mais do que outros, confiou a figuras femininas papéis de responsabilidade, que criou duas comissões para o estudo das diaconisas, que nunca deixou de recordar o “gênio” feminino e a dimensão materna da Igreja (que “é mulher” porque “é a Igreja, não Igreja"). Além disso, colocou as mulheres lado a lado com cardeais e bispos nas mesas do último Sínodo sobre a Sinodalidade, irmãs, missionárias, professoras, especialistas, teólogas, às quais deu, pela primeira vez, o direito de voto.

Com os jovens na Jornada Mundial da Juventude em Lisboa   (Vatican Media)

“Todos, todos, todos”

Uma abertura, como tantas outras feitas por Francisco. Aberturas e não extirpações, nem saltos; para alguns muito rápidos, para outros cautelosos demais. De fato, também esses, processos. Como a concessão dos sacramentos aos divorciados recasados, na perspectiva da Eucaristia como “remédio” para os pecadores e não como “alimento para os perfeitos”; a acolhida às pessoas Lgbtq+ com o convite à proximidade pastoral, porque dentro da Igreja há espaço para “todos, todos, todos”; a obstinação em dialogar com representantes de outras denominações e religiões cristãs, após séculos de preconceitos e suspeitas, também em virtude do “ecumenismo do sangue”. Também, o olhar à China, com o Acordo Provisório para a Nomeação de Bispos, assinado em 2019 e renovado três vezes. Um sinal de diálogo, entre tropeços e retomadas, com um “povo nobre” que ele desejou visitar por todos esses anos. Um desejo que remonta às aspirações missionárias da juventude.

Missionariedade e sinodalidade

Missão, este também é um tema central. De fato, a “missionariedade”, é um convite recorrente em textos e homilias, assim como a “sinodalidade”, outro termo que ressoou tantas vezes nesses doze anos. O Papa dedicou nada menos que duas sessões do Sínodo (2023 e 2024) à “sinodalidade”, renovando a estrutura e o funcionamento da assembleia, percebendo a necessidade de começar o caminho sinodal “de baixo” e instituindo também dez grupos de estudo para aprofundar temas doutrinários, teológicos e pastorais após os trabalhos.

Com migrantes no campo de refugiados em Lesbos (Vatican Media)

Pobres e migrantes

Neste pontificado serão lembrados também os axiomas que encapsularam inteiras realidades eclesiais, políticas e sociais: “Cultura do descarte”, “globalização da indiferença”, “Igreja pobre para os pobres”, “Igreja em saída”, “pastores com cheiro de ovelhas”, “ética global da solidariedade”. Permanecerá a atenção aos pobres com a instituição, em 2017, de um Dia dedicado a eles, sempre caracterizado pelo almoço do Papa na Sala Paulo VI, lado a lado com pessoas em situação de rua e sem-teto. Permanecerá o ensinamento sobre os migrantes, declinado nos quatro verbos “acolher, proteger, promover e integrar”, como indicações programáticas para enfrentar “uma das maiores tragédias deste século”. Assim como permanecerá o convite para elaborar “compromissos honrosos” como soluções para os conflitos que estão dilacerando a Europa, o Oriente Médio e a África.

Compromisso em prol da paz

Conflitos, angústia dos últimos anos, denunciados em apelos ressonantes e cartas a núncios e povos vítimas de violências, aliviados por meio de videochamadas - sobretudo a diária para a paróquia de Gaza - ou missões de cardeais e o envio de produtos de primeira necessidade. “Não pensei que seria um Papa em tempo de guerra”, confidenciou no primeiro e único podcast com a mídia do Vaticano no décimo aniversário de sua eleição.

A paz foi o objetivo constante. Pela paz, o Papa Francisco pediu continuamente orações, convocando Dias de jejum e oração - pela Síria, Líbano, Afeganistão, Terra Santa - envolvendo os fiéis de todas as latitudes; consagrou a Rússia e a Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria em 2022; organizou momentos históricos, como o plantio de uma oliveira nos Jardins do Vaticano em 8 de junho de 2014 com os presidentes de Israel, Shimon Peres, e da Palestina, Mahmoud Abbas. Em prol da paz, o Papa fez gestos inusitados, como entrar em seu carro e ir, no dia seguinte ao lançamento da primeira bomba em Kiev, ao escritório do embaixador russo na Santa Sé, Alexander Avdeev, tentando iniciar contatos com o presidente Putin e assegurando-lhe sua disposição de mediar. Francisco repreendeu várias vezes os chefes de Estado e de governo, advertiu os senhores da guerra de que eles prestarão contas diante de Deus pelas lágrimas derramadas entre os povos, estigmatizou o florescente mercado de armas lançando uma proposta para usar os gastos com armas para criar um Fundo Mundial para erradicar a fome. Pediu a construção de pontes e não a construção de muros, e insistiu em colocar o bem comum acima das estratégias militares, sendo às vezes mal interpretado e criticado.

O Angelus de 2 de fevereiro de 2025   (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Inovações

Em todos esses anos não faltaram críticas contra o Papa argentino, que comentou escaladas e os ventos contrários com aquele humor que é o que “mais se aproxima da graça de Deus”. Francisco questionou e surpreendeu, talvez tenha feito alguém torcer o nariz pela quebra de tabus e a ruptura de protocolos e velhos costumes, ou pela remodelação do próprio papado com roupas diferentes, uma residência diferente, uma inusual gestualidade, um estilo pastoral original. Ou aparecendo em transmissões ao vivo pela Internet e em programas de TV, usando a conta X @Pontifex, em 9 idiomas, ou como um canal para transmitir mensagens de divulgação e imediatismo necessários.

Momentos difíceis e problemas de saúde

Nesses anos sempre densos, com raríssimos momentos de descanso (e o cancelamento das tradicionais férias papais em Castel Gandolfo), não faltaram momentos difíceis, em meio a processos judiciais - liderados pelo longo e complexo processo pela gestão dos fundos da Santa Sé -, o caso Vatileaks 2, escândalos de abusos e corrupção e a publicação de livros sem “nobreza e humanidade”. Também não faltaram problemas de saúde entre as operações no Hospital Gemelli em 2021 e 2023, a internação no mesmo hospital, novamente em 2023, as complicações respiratórias, e depois os resfriados, as gripes e as dores no joelho que o forçaram a usar a cadeira de rodas nos últimos três anos.

Saudações da Policlínica Gemelli   (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Dados estatísticos

Tantas dificuldades que nunca impediram uma intensa atividade ou sua presença em eventos. Várias estatísticas testemunham isso: mais de 500 audiências gerais, dez Consistórios para a criação de 163 novos cardeais que restituíram caráter de universalidade ao rosto da Igreja; mais de 900 canonizações (incluindo três predecessores: João XXIII, João Paulo II, Paulo VI); os “Anos Especiais”, entre os quais os da Vida Consagrada (2015-2016), São José (2020-2021) e a Família (2021-2022); quatro Jornadas Mundiais da Juventude: Rio de Janeiro, Cracóvia, Panamá, Lisboa. Dois Jubileus: o extraordinário sobre a Misericórdia em 2016 e o ordinário em 2025, atualmente em andamento, com o tema “Peregrinos da Esperança”.

Statio Orbis durante a pandemia da Covid

Jorge Mario Bergoglio foi um Papa que buscou a proximidade com o grande público também por meio de entrevistas, livros, prefácios, autobiografias. Um Papa do qual, talvez, mais do que as muitas palavras e escritos, será recordado com uma imagem: ele, sozinho, mancando, na chuva, no silêncio geral do lockdown e com o único som de fundo de uma ambulância, enquanto atravessa a Praça São Pedro no tempo suspenso da pandemia. Era a Statio Orbis de 27 de março de 2020, com o mundo fechado dentro de casa vendo em streaming um homem idoso que parecia carregar sobre os ombros todo o peso de uma tragédia que revirou cotidianidade e hábitos. A humanidade estava aflita, mas o Papa falou de esperança. E de fraternidade: “Demo-nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados, mas ao mesmo tempo todos chamados a remar juntos”.

A Statio Orbis de 27 de março de 2020 (Vatican Media)
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt.html

Santo Agostinho: seguidor do Senhor, da Igreja e do reino de Deus

Santo Agostinho (FASBAM)

SANTO AGOSTINHO: SEGUIDOR DO SENHOR, DA IGREJA E DO REINO DE DEUS

por Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá

Os estudos sobre Santo Agostinho são muito abrangentes, englobantes tornando-se quase impossível dar uma ideia de seu pensamento, prática pastoral e eclesial. A sua influência tornou-se grande nos séculos passados, sobretudo na realidade atual nas quais as suas idéias referem-se ao seu seguimento a Jesus Cristo, a teologia, a sua conversão de vida, a Igreja, a comunidade eclesial. Foi um Autor que se destacou muito no final do século IV e por algumas décadas no século V, diante da Diocese de Hipona, no Norte da África. Santo Agostinho escreveu muito da realidade de seu tempo, mas ele teve presente, o Reino de Deus, a meta final do ser humano. Nós tivemos a eleição de um Cardeal Agostiniano, para Papa, Robert Prevost, cujo nome é: Leão XIV, de modo que é importante aprofundar a doutrina de Santo Agostinho para as pessoas da  realidade de ontem e de hoje.

A pessoa de Agostinho

Santo Agostinho foi uma personalidade profunda seja no nível de filosofia como de teologia. Foi um polemista, escritor, pastor. São muitas as qualidades que se completam de uma forma mútua a respeito do Bispo de Hipona que fez o ser humano Santo Agostinho uma pessoa muito importante para a vida da Igreja e para o mundo. Ele unia em si a energia criadora de Tertuliano, a largueza de espírito de Orígenes, as idéias e as concretizações dos maiores filósofos, Platão e Aristóteles[1]. Após um longo caminho percorrido sendo catecúmeno, ele viveu o seguimento a Jesus Cristo e à sua Igreja, sendo um bom cristão, monge, sacerdote e bispo. 

Os mistérios cristãos

Santo Agostinho tratou dos mistérios cristãos. Tudo isso foi feito com muita humildade e ardor de espírito, determinando um grande progresso dogmático que a história da Teologia teve em todos os períodos da sua história. Em seus escritos nós encontramos a importância da graça de Deus e da responsabilidade humana, a doutrina em relação ao mistério de Deus Uno e Trino, a Redenção, a Salvação do gênero humano, os Sacramentos, a Igreja, a Escatologia, as últimas realidades[2].

Os argumentos teológicos e sociais

Muitos argumentos teológicos e sociais foram tratados por Santo Agostinho. Ele era bispo que viveu a eclesialidade com a Igreja do Senhor, em comunhão com o Bispo de Roma e também era preocupado com as pessoas que viviam em seu tempo, sobretudo aquelas que eram sofredoras, as pobres, as necessitadas. Ele teve uma palavra sobre a moral centralizada no mandamento do amor do Senhor, a Deus, ao próximo como a si mesmo (Cfr. Mt 22,37-39). Ele também falou muito das questões sociais, como a solidariedade, a ajuda para as pessoas carentes e pobres, a partilha. Ele teve presente também a política como bem comum para todas as pessoas[3].

A Verdade

Santo Agostinho buscou a Verdade nos níveis humano e divino, afirmando que Jesus é a Verdade (cfr. Jo 14,6) na qual todas as pessoas são chamadas a segui-lo. Ele era convicto da originalidade da doutrina cristã, católica, defendendo-a contra os grupos diversos em seu tempo, como os pagãos, os judeus, os donatistas, os maniqueus, os arianos, e todas pessoas que não buscavam a Verdade suprema, o Senhor Jesus. Uma atitude muito importante era o diálogo com todas as pessoas, os seus adversários, mantendo respeito com eles, mas ele também era firme em suas convicções religiosas, bíblicas, espirituais, morais, e humanas[4].

Pastor do Senhor e do povo

Santo Agostinho foi um grande pastor no seguimento a Jesus Cristo e à Igreja. Ele buscava na comunidade, o sentido do pastoreio em unidade com Jesus, o Pastor dos pastores. Ele definia-se como servo de Cristo e servo dos servos de Cristo Jesus. Ele tirava a partir dessas considerações à plena disponibilidade para servir às necessidades dos fiéis, desejando não ser salvo sem a presença deles[5]. Desta forma ele via a graça da salvação dada em sentido comunitário, fraterno.

Mestre e discípulo

Ele se sentia mestre em ligação ao Mestre Jesus Cristo quando ensinava, procurando também testemunhar com a vida a Palavra de Deus. Ao mesmo tempo estava presente em sua vida, o sentido do discípulo de Cristo assim como foram os discípulos de Jesus. Nas diversas controvérsias tratadas por ele, tinha um desejo que todas as pessoas fossem discípulas do Senhor, Mestre e eles buscassem a vida na unidade com a Igreja[6].

Bispo – Cristão

Santo Agostinho teve uma fala e prática bem objetivas em relação ao seu episcopado e o seu ser cristão, seguidor do Senhor na Igreja. Ele disse: “Para vós sou bispo; convosco, sou cristão ”[7]. Ele não negava a sua missão para com os fiéis, o povo de Deus no sentido de ser bispo, mas tinha presente que ele era cristão como o povo de Deus, seguidor de Jesus Cristo e de sua Igreja. Ele também dizia que deveria levar adiante a missão recebida não escondendo certa preocupação, mas ele ficava consolado pelo fato de ser cristão com todo o povo de Deus a ele dado[8].

Santo Agostinho seja uma força no amor a Jesus Cristo e de sua comunidade eclesial. Assim como ele viveu a sua doação pela Igreja, pelo Reino seja também para nós um modelo de vida para que nós nos doemos aos outros e um dia sejamos participante do Reino dos céus.

____________________________

[1] Cfr. Institutum Patristicum Augustinianum. Patrologia. I Padri Latini. Marietti, Casale, Marietti, 1983, pg. 332.

[2] Cfr. Idem, pg. 333.

[3] Cfr. Ibidem.

[4] Cfr. Ibidem.

[5] Cfr. Ibidem, pg. 334.

[6] Cfr. Ibidem.

[7] Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo. Sermo 340,1: PL 38, 1483-1484. In: Ofício das Leituras, Liturgia das Horas, IV. Aparecida, SP: Editora Vozes, Paulinas, Paulus, Editora Ave-Maria, 1999, pg. 1293.

[8] Cfr. Idem, pg. 1293.

Fonte: https://cnbbn2.com.br/santo-agostinho-seguidor-do-senhor-da-igreja-e-do-reino-de-deus/

Santa Rita: A Última Palavra é de Deus

Santa Rita de Cássia (Vatican News)

No Dia de Santa Rita de Cássia, o mundo recorda a Santa das causas impossíveis e seu testemunho de fé inabalável.

Fernando Nunes - Vatican News

22 de maio

Hoje, a Igreja celebra a memória de Santa Rita de Cássia, padroeira das causas impossíveis e testemunho vivo de fé inabalável. Mulher de oração incansável e de coragem silenciosa, Rita é, para milhões de fiéis, um sinal claro de que a graça de Deus nunca abandona os que nele confiam — mesmo diante do impossível.

Sua vida foi marcada por dores profundas, decisões radicais e uma fé que jamais recuou diante dos sofrimentos. A convicção que carregava no coração — de que a última palavra sempre é de Deus — é o fio condutor de sua história e de sua santidade.

Casada muito jovem, e sem grande entusiasmo, enfrentou com perseverança e oração o temperamento violento do marido, Paolo Ferdinando. Próximo de sua morte, ele foi tocado pela graça, pouco antes de ser assassinado. Os dois filhos do casal juraram vingança, mas Rita, profundamente unida a Deus, suplicou para que o Senhor os impedisse de cometer esse crime. Sua súplica foi ouvida: os dois faleceram ainda jovens, reconciliados com Deus, sem carregar o peso do ódio ou da vingança.

Esse gesto — incompreensível para os que vivem apenas à luz da lógica humana — revela o coração de uma mulher enraizada na eternidade. Para Rita, o mais importante não era prolongar os dias dos filhos, mas garantir-lhes a vida eterna.

Após essa fase da vida, Rita ingressou, por um verdadeiro milagre, no mosteiro das Irmãs Agostinianas de Cássia. A regra da congregação impedia a entrada de viúvas, mas a força da intercessão — e a insistência da fé — abriram portas. Ali, viveu profundamente unida a Cristo, especialmente nos últimos 15 anos de sua vida, marcados por uma dolorosa ferida na testa, sinal visível de sua união com a Paixão do Senhor.

Corpo de Santa Rita (Vatican News)

Um corpo que fala

Após sua morte, em 1457, algo extraordinário começou a chamar a atenção: seu corpo, nunca sepultado da forma adequada, permaneceu surpreendentemente preservado ao longo dos séculos. Exalava um perfume delicado, e da ferida em sua fronte emanava uma luz inexplicável. Documentos da época relatam fenômenos místicos no momento de sua morte: perfumes, sinos tocando e uma claridade celeste enchendo a cela do convento.

Em 1627, por ocasião de seu processo de beatificação, o corpo de Santa Rita foi cuidadosamente examinado. O veredito surpreendeu os peritos: a pele conservava a coloração natural, e não havia sinais visíveis de decomposição — fato notável especialmente porque seu corpo nunca havia sido sepultado formalmente em mais de 150 anos.

Canonizada em 1900 por Leão XIII, Santa Rita passou a repousar em um relicário de ouro, exposto na Basílica a ela dedicada, na comuna de Cássia, Itália. Ali, todos os anos, milhares de devotos se reúnem para venerá-la — entre eles, uma imensa multidão de brasileiros, cuja devoção à santa é especialmente intensa.

Devoção no Brasil

No Brasil, Santa Rita de Cássia é uma das santas mais populares. Desde o século XIX, sua devoção se espalhou pelo país, com a criação de paróquias, festas e romarias em sua honra. A cidade de Santa Cruz (RN), por exemplo, abriga o maior monumento religioso dedicado à santa no mundo — uma imagem de 56 metros de altura que atrai milhares de peregrinos todos os anos. Em diversas cidades brasileiras, sua festa litúrgica, celebrada neste 22 de maio, é ocasião de intensa vivência da fé e expressão de confiança na sua intercessão poderosa.

Um Papa devoto e agostiniano

O Papa Leão XIV, atual Sucessor de Pedro, partilha com Santa Rita não apenas a devoção, mas também a espiritualidade agostiniana. Membro da Ordem de Santo Agostinho, o pontífice já esteve inúmeras vezes em Cássia, onde nutre especial afeto pelo santuário que abriga o corpo da santa. Sua vida de oração e perseverança diante dos desafios da Igreja encontra eco na figura de Rita, que soube responder com fé ao sofrimento e à contradição.

A santa do impossível

A vida de Santa Rita é uma pregação viva sobre o valor do sofrimento unido a Cristo. Ela testemunha que nenhum obstáculo, por mais humano que pareça, pode impedir o agir de Deus. Seja na vida matrimonial ou religiosa, seu exemplo aponta para a eternidade — e lembra aos devotos que, de fato, a última palavra sempre é de Deus.

Neste 22 de maio, sua memória é celebrada em todo o mundo, especialmente nas muitas cidades do Brasil onde igrejas, capelas e comunidades levam seu nome.

Que Santa Rita de Cássia nos ensine a nunca desistir, a sofrer com paciência e oferta, e a lembrar, com fé viva, que esta vida é breve — e que a última palavra sempre é de Deus.

Santa Rita de Cássia, rogai por nós.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

quarta-feira, 21 de maio de 2025

Leão XIV na Audiência Geral: a Palavra de Deus é para todos, mas atua diferente em cada um

Audiência Geral de 21/05/2025 - Papa Leão XIV (Vatican News)

Na sua primeira Audiência Geral, o Papa retomou o ciclo de catequeses proposto por Francisco para refletir sobre as parábolas. Leão XIV escolheu aquela do semeador e afirmou que "A Palavra de Jesus é para todos, mas atua de uma forma diferente em cada pessoa", dependendo do solo encontrado, de quando estamos "mais superficiais e distraídos" ou "disponíveis e acolhedores". Mas "Ele nos ama assim: não espera que nos tornemos o melhor solo, Ele nos dá sempre generosamente a Sua palavra".

https://youtu.be/bWC_zM_0Kk8

Andressa Collet - Vatican News

"Estou feliz em receber vocês nesta minha primeira Audiência Geral", disse o Papa Leão XIV, logo no início da catequese, a sua primeira no encontro semanal e com cerca de 40 mil fiéis na Praça São Pedro. Também é a segunda do ciclo de catequeses jubilares, preparada pelo Papa Francisco e divulgada pela Sala de Imprensa da Santa Sé em 16 de abril, durante o período de convalescença de Bergoglio que veio a falecer 5 dias depois e há exatamente um mês. Francisco tinha o desejo de "refletir sobre algumas parábolas" e Leão XIV retomou o tema “Jesus Cristo, nossa esperança”, escolhido por Bergoglio para este Ano Santo do Jubileu. Nesta quarta-feira (21/05), assim, o Papa meditou sobre a parábola do semeador (ver Mt 13,1-17), que fala da dinâmica e dos efeitos da Palavra de Deus, "e o que ela produz", que é como semente deitada no terreno do nosso coração e no terreno do mundo.

As provocações e os questionamentos

"Cada parábola conta uma história retirada do quotidiano", recordou Leão XIV, fazendo "nascer em nós perguntas" como: "onde estou eu nesta história? O que diz esta imagem à minha vida?". De fato, continuou o Pontífice, "cada palavra do Evangelho é como uma semente lançada no solo da nossa vida":

"No capítulo 13 do Evangelho de Mateus, a parábola do semeador introduz uma série de outras pequenas parábolas, algumas das quais falam precisamente do que acontece no solo: o trigo e o joio, o grão de mostarda, o tesouro escondido no campo. Então, o que é este solo? É o nosso coração, mas é também o mundo, a comunidade, a Igreja. A palavra de Deus, com efeito, fecunda e provoca toda a realidade."

Deus, assim, espalha abundantemente a Palavra, ainda que ela nem sempre encontre terreno bom para produzir. "A Palavra de Jesus é para todos, mas atua de uma forma diferente em cada pessoa", reforçou Leão XIV. "Estamos habituados a calcular as coisas – e às vezes é necessário – mas isso não vale no amor!". E, apesar de atuar em nós de modo diverso, a Palavra conserva sempre o poder de fecundar as situações da vida de cada um, pois vem de Deus e Ele nunca desiste:

"Jesus nos diz que Deus lança a semente da sua Palavra em todo o tipo de solo, ou seja, em qualquer das nossas situações: ora somos mais superficiais e distraídos, ora deixamo-nos levar pelo entusiasmo, ora somos oprimidos pelas preocupações da vida, mas também há momentos em que estamos disponíveis e acolhedores. Deus está confiante e espera que mais cedo ou mais tarde a semente floresça. Ele nos ama assim: não espera que nos tornemos o melhor solo, Ele nos dá sempre generosamente a Sua Palavra."

"Semeador no Pôr do Sol", de Vincent van Gogh | Vatican News

Leão XIV então, convidou os peregrinos a analisar uma obra de Vincent van Gogh (1853-1890), a do Semeador no Pôr do Sol. O pintor holandês, mundialmente conhecido que chegou a produzir quase 900 telas em menos de 10 dias, pintou um agricultor, com o trigo já maduro e "sob o sol abrasador" que domina a cena de esperança, lembrando que é Deus "quem move a história, mesmo que por vezes pareça ausente ou distante. É o sol que aquece os torrões da terra e faz amadurecer a semente". E o Papa deixou a sua mensagem final de reflexão:

“Queridos irmãos e irmãs, em que situação da vida nos chega hoje a Palavra de Deus? Peçamos ao Senhor a graça de acolher sempre esta semente que é a sua palavra. E se percebermos que não somos solo fértil, não desanimemos, mas peçamos-Lhe que trabalhe mais em nós para nos tornarmos um solo melhor.”

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Laudato Si, 10 anos da Carta do Cuidado e da ternura da Terra e suas criaturas

Laudato sì  (Renan Dantas | Diocese de Juína)

LAUDATO SI, 10 ANOS DA CARTA DO CUIDADO E DA TERNURA DA TERRA E SUAS CRIATURAS 

21/05/2025

Dom Roberto Francisco Ferreria Paz 
Bispo de Campos (RJ)

No dia 24 de maio de 2015 o Papa Francisco publicava a Encíclica Laudato Si, a primeira sobre a temática ambiental, com o subtítulo que especifica o foco: Sobre o Cuidado da Casa Comum expressão que daria a nossa Terra o sentido de lar e habitat comunitário de todos os seres.  

Tem sido considerada a Segunda Carta da Terra, o Evangelho da Criação fazendo alusão ao seu segundo capítulo, a tradução reflexiva e pensada do Cântico das Criaturas de São Francisco para os dias de hoje.  

Sem dúvida um documento profético que dá voz ao grito da Terra não só na sua urgência premente de escapar da destruição, mas de mostrar a Criação como uma maravilhosa dádiva e dom do Criador.  

Se nos perguntássemos qual a novidade e a diferença com pronunciamentos anteriores do magistério eclesial veríamos uma linha evolutiva desde a e ética ambiental a partir de São Paulo VI e São João Paulo II , passando pela ecologia humana de Bento XVI que aprofundava e demandava um novo relacionamento do ser humano com a terra em todas as suas dimensões; com a Laudato Si chegamos a um novo olhar  sobre a questão ambiental que o Papa Francisco chama de Ecologia Integral, por tratar-se de uma visão inclusiva, sistémica e integradora que postula que tudo está interligado (LS 16).  

Sim, não se pode abordar a questão da pobreza sem ver as relações com a fragilidade do planeta e a crise climática, a crítica ao paradigma tecnocrático do poder, com a necessidade de repensar a economia e a própria política, o valor de cada criatura e o sentido humano da ecologia superando o reducionismo e limitações de outras propostas ecológicas. Porém a questão ambiental deve ser pensada desde a vida cotidiana envolvendo a todos e todas, levando a uma autêntica e profunda conversão ambiental e ecológica, uma vez que como afirma o Patriarca Bartolomeu: “Quando os seres humanos destroem a biodiversidade na criação de Deus, quando os seres humanos comprometem a integridade da terra e contribuem para a mudança climática, desnudando a terra das florestas naturais ou destruindo as suas zonas húmidas, quando os seres humanos contaminam as águas, o solo, o ar … tudo isso é pecado”.  

Porque afirmava o Papa Francisco um crime contra a natureza é um crime contra nós mesmos e um pecado contra Deus. Diante desta grave encruzilhada civilizatória importa viver e testemunhar uma sobriedade feliz, isto é uma nova forma de viver com modéstia, pureza, e partilha cuidando dos bens comuns, gerando uma economia circular, colaborativa, que aprenda a preservar, reciclar e reduzir o impacto de nossa pegada ecológica, tornando-nos jardineiros, guardiães e cuidadores da Casa Comum. Deus seja louvado! 

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF