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terça-feira, 14 de março de 2023

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES (16/16)

O cristianismo e as religiões | Lausanne Movement

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES

(1997)

IV. CONCLUSÃO:
 DIÁLOGO E MISSÃO DA IGREJA

114. Neste fim do segundo milênio, a Igreja está chamada a dar testemunho de Cristo crucificado e ressuscitado "até as extremidades da terra" (At 1,8), em amplos mundos culturais e religiosos. O diálogo religioso é conatural à vocação cristã. Inscreve--se no dinamismo da Tradição vivente do mistério da salvação, cujo sacramento universal é a Igreja; é um ato dessa Tradição.

115. Como diálogo da Igreja, tem sua fonte, modelo e fim na Trindade Santa. Manifesta e atualiza a missão do Logos eterno e do Espírito Santo na economia da salvação. Por seu Verbo o Pai chama todos os seres humanos do nada à existência, e é seu Sopro que lhes dá a vida. Por seu Filho, que assume nossa carne e é ungido por seu Espírito, dirige-se a eles como a seus amigos, "fala com eles na terra" e lhes revela "todo o caminho do conhecimento" (cf. Br 3,36-38). Seu Espírito vivificante torna a Igreja Corpo de Cristo, enviada às nações para anunciar-lhes a Boa Notícia da ressurreição.

116. O Verbo pode nos dar a conhecer ao Pai porque aprendeu tudo dele e consentiu em aprender tudo do homem. Assim, deve se dar na Igreja para aqueles que querem encontrar seus irmãos e irmãs de outras religiões e dialogar com eles. Não são os cristãos os enviados, mas a Igreja; não são suas idéias o que apresentam, mas a Cristo; não será sua retórica que tocará os corações, mas o Espírito Paráclito. Para ser fiel ao "sentido da Igreja", o diálogo inter-religioso pede a humildade de Cristo e a transparência do Espírito Santo.

117. A pedagogia divina do diálogo não consiste apenas em palavras, mas também em fatos; as palavras manifestam a "novidade cristã", a do amor do Pai, de que os fatos dão testemunho. Agindo assim, a Igreja se mostra como sacramento do mistério da salvação. Nesse sentido, o diálogo inter-religioso forma parte, segundo os tempos e os momentos fixados pelo Pai, da "preparação evangélica". Com efeito, o testemunho mútuo é algo" inerente ao diálogo entre pessoas de religiões distintas. O testemunho cristão, aqui, não é ainda o anúncio do evangelho, mas já é parte integrante da missão da Igreja, como irradiação do amor derramado nela pelo Espírito Santo. Aqueles que, nos diversos modos do diálogo inter-religioso, dão testemunho do amor de Cristo Salvador realizam, em nível da "preparação evangélica", o ardente desejo do Apóstolo: "ser 'liturgo' de Jesus Cristo, consagrado ao ministério [hierourgunta] do Evangelho de Deus, a fim de os pagãos se tornarem uma oferenda que, santificada pelo Espírito Santo, seja agradável a Deus" (Rm 15,16).

Fonte: https://www.vatican.va/

Jesus olha para nós toda vez que olhamos para o crucifixo

Antoine Mekary | ALETEIA
Por Philip Kosloski

Às vezes pode ser tentador esquecermos que Jesus está vivo e presente.

Muitas vezes, ao olharmos para um crucifixo, imaginamo-nos ao pé da cruz contemplando o corpo sem vida de nosso Salvador.

No entanto, a representação de Jesus no crucifixo também deve recordar ao nosso coração a realidade de que Jesus está olhando para nós.

Bento XVI destacou esta realidade em uma alocução do ângelus em 2007.

Contemplando com os olhos da fé o Crucificado, podemos compreender em profundidade o que é o pecado, quanto é trágica a sua gravidade e, ao mesmo tempo, quanto incomensurável é o poder do perdão e da misericórdia do Senhor. Durante estes dias da Quaresma não afastemos o coração deste mistério de profunda humanidade e de alta espiritualidade. Olhando para Cristo, sintamo-nos ao mesmo tempo protegidos por Ele. Aquele que nós trespassámos com as nossas culpas não se cansa de derramar sobre o mundo uma torrente inexaurível de amor misericordioso.

Às vezes pode ser tentador esquecer que Jesus está vivo e presente não só no mundo, mas também na nossa vida pessoal. Ele está conosco, ao nosso lado. Jesus olha para nós com muita ternura e amor, não importa quantas vezes tenhamos falhado.

Da próxima vez que você olhar para um crucifixo, sinta o amor de Jesus fluir da cruz para o seu coração.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Francisco: "Não trocaria ser padre por nada"

Pe. Guillermo Marcó e o Papa Francisco | Vatican News

Publicamos um amplo trecho da entrevista com o Papa Francisco na Casa Santa Marta realizada para o site Infobae pelo padre argentino Guillermo Marcó, ex-porta-voz de Bergoglio quando era arcebispo de Buenos Aires.

Guillermo Marcó - Infobae

Andando pela Praça São Pedro, penso nos milhões de pessoas que adorariam ter uma conversa com o Papa Francisco. Tive por anos este raro privilégio. Em Buenos Aires eu costumava conversar com ele, às vezes mais de uma vez por dia. Hoje os contatos são menos frequentes, mas ele conserva o frescor da proximidade e da amizade adquirida ao longo dos anos; ele não mudou neste aspecto... Ouvi-lo é particularmente interessante ...

A primeira coisa que quero perguntar ao senhor é: o que mais o atrai no seguir Jesus ...

Não consigo expressá-lo verbalmente. O que posso dizer é que, quando estou em sintonia com Ele, sinto-me em paz, sinto-me feliz. Quando não o sigo, porque estou cansado, porque lhe fixo um horário determinado ou um limite de tempo, sinto-me insípido. É como se eu já estivesse cheio da minha vida... Alguém me disse uma vez: "Deus lhe dá liberdade, Ele sempre lhe dá liberdade, mas uma vez tendo conhecido Jesus, você perde a liberdade". Isso me colocou em crise. Não sei se a pessoa perde ou não, mas a maneira como o Senhor o chama e estabelece um diálogo com você o faz dizer "não, não vou a nenhum outro lugar, isso é suficiente para mim". Assim, sinto esse equilíbrio no bom senso da palavra, não psicológico, de paz, mesmo naqueles momentos de grande desequilíbrio devido a situações difíceis de enfrentar.

Naquele confessionário da paróquia de São José de Flores, o senhor pôde discernir sua vocação: o que sentiu de especial naquele chamado?

É curioso porque, depois daquela experiência de 21 de setembro, continuei minha vida sem saber o que ia fazer. Mas havia algo diferente que estava lentamente se impondo. Eu não saí de lá para ir para o seminário... Passaram-se três anos. É como um processo que muda suas orientações, suas referências. O Senhor entra em sua vida e a rearranja. E sem tirar-lhe a liberdade. Eu nunca tive a sensação de não ser livre.

O senhor continua se definindo como um "padre": do que o senhor mais gosta da vocação sacerdotal?

Estar a serviço. Uma vez um padre me disse - ele vivia em um bairro muito pobre, não em uma favela, mas quase, e tinha sua casa paroquial ao lado da igreja - e me contou que quando ele tinha que fechar a porta, as pessoas batiam na janela. Então ele me dizia: "Eu gostaria de fechar aquela janela porque as pessoas não deixam você em paz". As pessoas não o deixam em paz. E por outro lado, ele me dizia que se fechasse a janela, não ficaria tranquilo, mas muito pior. Porque quando você entra no ritmo do serviço, se sente mal quando toma uma fatia de egoísmo para si mesmo. A vocação para o serviço é um pouco assim, você não pode imaginar a vida se não estiver a serviço. Eu não trocaria ser padre por nada, depois da experiência de ser padre. Com limitações, com erros, com pecados, mas padre.

O que o senhor diz aos padres?

O que eu digo a um padre é "seja um padre". E se não funcionar para você, procure outro caminho, a Igreja abre outras portas para você. Mas não se torne um funcionário. Gosto de dizer o seguinte: seja um pastor do povo e não um clérigo de estado.

Como o senhor percebe a fraternidade entre os cardeais?

A longo prazo, há uma proximidade. Eles podem ter opiniões diferentes, mas a coisa positiva é que lhe dizem o que pensam. Eu tenho receio de agendas escondidas. Quando se tem algo e não se diz. Agradeço a Deus que no Colégio cardinalício haja comunicação, tanto entre os novos como entre os mais velhos, e que eles tenham a liberdade de falar ... Não sei se todos eles, mas muitos têm. Às vezes "Ei, tenha cuidado com isso", "olhe... ". Ah, obrigado. Vou pensar nisso e depois resolvo, lhe digo como ... ou eu não lhe dou ouvido, lhe digo: olhe, não lhe dou ouvido por causa disso, disso e disso. Mas o diálogo é aberto.

O senhor tem suas devoções. Aqui está este quadro de Nossa Senhora que desata os nós, uma devoção que adquiriu na Alemanha. Pode nos dizer por que sempre a enviava como cartão devocional em seus envelopes?

Eu nunca fui ao lugar onde está a imagem original. Aconteceu que uma freira alemã a enviou para mim como uma saudação. Eu gostei. Comecei a ter uma devoção a esta imagem na Argentina. A história é bonita, o quadro não vale muito, é do baixo barroco do século XVIII, já decadente. Um pintor da época que insultava a esposa. Eles eram muito católicos, mas discutiam todos os dias. E um dia ele leu o texto de Santo Irineu de Lyon, segundo o qual os nós que nossa mãe Eva tinha atado com seu pecado eram desatados por nossa mãe Maria com sua obediência. O Concílio o tomou e o incluiu, creio, na Constituição sobre a Igreja. Ele gostou e assim pediu a Nossa Senhora que desatasse o nó que tinha com sua esposa porque eles não se davam bem. E é por isso que, abaixo, retrata o arcanjo Rafael com Tobias levando-o para encontrar sua noiva, sua esposa, para conhecê-la. A Virgem realizou o milagre e tudo começou a partir daí. Eu tomei a devoção. Augsburg é a cidade. Na Igreja de São Pedro em Perlach. Eu nunca fui lá, estava perto dali, em Frankfurt. Mas isso foi o suficiente para mim, e a devoção começou na Argentina. É como se Nossa Senhora fosse capaz de ajudá-lo, como diz o texto de Santo Irineu, de ajudá-lo a desbloquear as coisas.

A desatar os nós da vida....

É a "maternidade" de Nossa Senhora.

E no que diz respeito a São José?

Foi minha avó que colocou São José na minha cabeça... Quando criança ela me fazia recitar orações a São José. A devoção permaneceu.

O senhor também tem uma pequena imagem de São José dormindo. Nela são colocadas intenções especiais....

Quando me pedem orações, eu as coloco debaixo da imagem. Eu digo: "Tu que dormes, resolve os problemas".

E Santa Teresinha?

Santa Teresinha sempre me atraiu... A coragem da pessoa comum. Se me perguntarem que coisas extraordinárias Santa Teresinha tinha: nenhuma. Ela era uma freira pobre e normal. Em seus últimos dias ela também sofreu as maiores trevas, as maiores tentações contra a fé, ela passou por todas elas. Uma mulher normal.

Para terminar, peço ao senhor algumas breves mensagens. A primeira mensagem é dirigida às crianças:

Cuidem dos avós. Falem com os avós. Visitem os avós. Deixem que os avós as encham de mimos.

Aos jovens...

Não tenham medo da vida. Não fiquem parados. Avancem. Vocês cometerão erros, mas o pior erro é ficar parado, então sigam em frente.

Aos pais e às mães...

Não desperdicem o amor. Tomem conta um do outro, assim poderão cuidar melhor de seus filhos.

Aos doentes...

Ah, isto é difícil porque aconselhar a paciência é fácil, mas eu não a tenho, portanto, entendo quando vocês ficam um pouco irritados. Peçam ao Senhor a graça da paciência e Ele lhes dará a graça de suportar tudo isso.

Por fim, aos idosos, dos quais o senhor fala tão frequentemente....

Aos idosos: não se esqueçam de que vocês são as raízes. Os idosos devem transmitir isto aos jovens, às crianças e aos jovens. Aquele versículo do Livro de Joel: qual é sua vocação como ancião, os idosos terão visões e os jovens farão profecias. Quando estão juntos, os idosos sonham com o futuro e o transmitem, e os jovens, apoiados pelos idosos, são capazes de profetizar e trabalhar para o futuro. Juntamente com os jovens, não tenham medo de nada. Um idoso amargurado é muito triste. É pior do que um jovem triste. Portanto, sigam em frente, estejam junto com os jovens.

domingo, 12 de março de 2023

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES (15/16)

O cristianismo e as religiões | Lausanne Movement

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES

(1997)

III.4. Diálogo inter-religioso e mistério de salvação

105. A partir do Vaticano II, a Igreja católica se comprometeu de modo decidido no diálogo inter-religioso (3); esse documento foi elaborado com o olhar posto nesse diálogo, embora não seja esse seu tema fundamental. O estado da questão a respeito do cristianismo e sua relação com as religiões, os pressupostos teológicos e as conseqüências que deles se deduzem sobre o valor salvífico das religiões, a revelação divina, são reflexões destinadas a iluminar os cristãos em seus diálogos com os fiéis de outras religiões.

106. Que esses diálogos se realizem entre especialistas, ou se deem na vida cotidiana, compromete com as palavras ou os comportamentos não só as pessoas que dialogam, mas também, e em primeiro lugar, o Deus que professam. O diálogo inter-religioso como tal comporta três participantes. Por isso, o cristão é interpelado nele por duas questões fundamentais, das quais depende o sentido do próprio diálogo: o sentido de Deus e o sentido do homem.

a. O sentido de Deus

107. No diálogo inter-religioso, cada um dos participantes se expressa de fato segundo determinado sentido de Deus; de maneira implícita levanta ao outro a pergunta: qual é seu Deus? O cristão não pode ouvir e compreender o outro sem fazer a si mesmo essa pergunta. A teologia cristã é mais que um discurso sobre Deus: trata de falar de Deus em linguagem humana como o Logos encarnado o dá a conhecer (cf. Jo 1,18; 17,3). Daí a necessidade de alguns discernimentos no diálogo:

108. a) Se se fala da divindade como valor transcendente e absoluto, trata-se de uma Realidade impessoal, ou de um Ser pessoal? b) A transcendência de Deus significa que ele é um mito intemporal, ou essa transcendência é compatível com a ação divina na história com os homens? c) Conhece-se a Deus só pela razão, ou se o conhece também por meio da fé pela qual ele se revela aos homens? d) Visto que uma "religião" é certa relação entre Deus e o homem, expressa um Deus à imagem do homem ou implica que o homem é à imagem de Deus? e) Se se admite que Deus é único como exigência da razão, que significa professar que é Uno? Um Deus monopessoal é aceitável pela razão, porém somente em sua autorrevelação em Cristo o mistério de Deus pode ser acolhido pela fé como Uni-Trindade consubstancial e indivisível. Esse discernimento é capital em razão das conseqüências que daí se desprendem para a antropologia e a sociologia inerentes a cada religião, f) As religiões reconhecem à divindade atributos essenciais, como a onipotência, a onisciência, a bondade, a justiça. No entanto, para compreender a coerência doutrinal de cada religião e superar as ambiguidades de uma linguagem aparentemente comum, é preciso compreender o eixo em torno do qual se articulam esses nomes divinos. Esse discernimento concerne especialmente ao vocabulário bíblico, cujo eixo é a aliança entre Deus e o homem, tal como se cumpriu em Cristo, g) Faz-se necessário outro discernimento sobre o vocabulário especificamente teológico, na medida em que é tributário da cultura de cada participante no diálogo e de sua filosofia implícita. É necessário, portanto, prestar atenção na peculiaridade cultural das duas partes, inclusive se ambas participam da mesma cultura original, h) O mundo contemporâneo parece preocupar-se, ao menos em teoria, com os direitos do homem. Alguns integrismos, inclusive entre os cristãos, opõem a eles os direitos de Deus. Contudo, nessa oposição, de que Deus se trata? E, em última análise, de que homem?

b. O sentido do homem

109. O diálogo inter-religioso implica ainda uma antropologia implícita, e isso por duas razões principais. De um lado, o diálogo põe em comunicação duas pessoas, e cada uma delas é o sujeito de sua palavra e de seu comportamento. Por outro lado, quando dialogam fiéis de religiões diferentes, tem lugar um acontecimento muito mais profundo que sua comunicação verbal: um encontro entre seres humanos, para o qual cada um se encaminha levando o peso de sua condição humana.

110. Num diálogo inter-religioso, têm as partes a mesma concepção da pessoa? A questão não é teórica, mas interpela a uns e a outros. A parte cristã sabe sem dúvida que a pessoa humana foi criada "à imagem de Deus", isto é, num apelo constante de Deus essencialmente relacional e capaz da abertura "ao outro". Porém, todos os participantes são conscientes do mistério da pessoa humana e do de Deus "mais além de tudo" (4)? Também o cristão é induzido a perguntar-se: de onde fala, quando dialoga? Do cenário de sua personagem social ou religiosa? Do alto de seu "superego" ou de sua imagem ideal? Visto que ele deve dar testemunho de seu Senhor e Salvador, em que "morada" de sua alma este se encontra? No diálogo inter-religioso, mais que em toda relação interpessoal, está implicada a relação de cada pessoa com o Deus vivente.

111. Aqui se mostra a importância da oração no diálogo inter-religioso: "O homem está à procura de Deus (...). Todas as religiões testemunham essa procura essencial dos homens" (3). Ora, a oração, como relação vivente e pessoal com Deus, é o próprio ato da virtude da religião e encontra expressão em todas as religiões. O cristão sabe que Deus "chama incessantemente cada pessoa ao encontro misterioso da oração" (6). Se Deus não pode ser conhecido senão se ele mesmo toma a iniciativa de revelar-se, a oração se mostra como absolutamente necessária porque põe o homem em disposição de receber a graça da revelação. Assim, na procura comum dá verdade que deve motivar o diálogo inter-religioso, "se dá uma sinergia entre a oração e o diálogo (...).. A oração é a condição do diálogo e transforma-se no fruto dele" (7). Na medida em que o cristão vive o diálogo em estado de oração, é dócil à moção do Espírito que atua no coração dos dois interlocutores. Então, o diálogo se faz mais que um intercâmbio: faz-se encontro.

112. Mais profundamente, em nível do não-dito, o diálogo inter-religioso é, com efeito, um encontro entre seres criados "à imagem de Deus", embora essa imagem se encontre neles um tanto obscurecida pelo pecado e pela morte. Dito de outro modo, os cristãos e os que não o são estão todos a espera de ser salvos. Por essa razão, cada uma de suas religiões se apresenta como uma procura de salvação e propõe caminhos para chegar a ela. Esse encontro na comum condição humana põe as partes em plano de igualdade e é muito mais verdadeiro que seu discurso religioso meramente humano. Tal discurso já é uma interpretação da experiência e passa pelo filtro das mentalidades confessionais. Pelo contrário, os problemas do amadurecimento pessoal, a experiência da comunidade humana (homem e mulher, família, educação etc.) e todas as questões que gravitam em torno do trabalho para "ganhar a vida", longe de ser temas de distração do diálogo religioso, constituem o terreno "a descoberto" para esse diálogo. Então, nesse encontro se dá conta de que o "lugar" de Deus é o homem.

113. Ora, a constante subjacente a todos os demais problemas da condição humana comum não é senão a morte. Sofrimento, pecado, fracasso, decepção, incomunicação, conflitos, injustiças... a morte está presente em todas as partes e em cada momento como a trama opaca da condição humana. Por certo, o homem, incapaz de exorcizá-la, faz todo o possível para não pensar nela. E não obstante é nela que ressoa com mais intensidade o chamado do Deus vivente. A morte é o sinal permanente da alteridade divina, pois só o que chama do nada o ser pode dar vida aos mortos. Ninguém pode ver a Deus sem passar pela morte, esse lugar ardente no qual o Transcendente atinge o abismo da condição humana.

A única pergunta séria, porque existencial e iniludível, sem a qual os discursos religiosos são "álibis", é esta: o Deus vivente assume ou não a morte do homem? Não faltam as respostas teóricas, mas estas não podem esquivar o escândalo que permanece: como Deus pode permanecer oculto e silencioso diante do inocente ferido e do justo oprimido? E o grito de Jó e de toda a humanidade. A resposta é "crucial", além de todas as palavras: na Cruzo Verbo é silêncio. Pendente de seu Pai, entrega-lhe seu espírito. E não obstante aí está o encontro de todos os humanos: o homem está em sua morte, e Deus se une a ele nela. Só o Deus amor é o vencedor da morte, e só pela fé nele o homem é libertado da escravidão da morte. A Sarça ardente da Cruz é assim o lugar oculto do encontro. O cristão contempla nela "aquele que traspassaram", e dela recebe "um espírito de benevolência e de súplica" (Jo 19,37; Zc 12,10). O testemunho de sua nova experiência será o de Cristo ressuscitado, vencedor da morte pela morte. O diálogo inter-religioso recebe então seu sentido na economia da salvação: faz mais que dar continuidade à mensagem dos profetas e à missão do Precursor; apoia-se no acontecimento da salvação consumada por Cristo e tende para o segundo Advento do Senhor. O diálogo inter-religioso se dá na Igreja em situação escatológica.

CAPÍTULO III:

1. Diálogo e Anúncio, 29: “Por meio da prática do que é bom em suas tradições religiosas e seguindo os ditames de sua consciência, os membros das outras religiões respondem positivamente ao convite de Deus e recebem a salvação em Jesus Cristo, ainda que não o reconheçam como seu salvador”.

2. Temas selectos de eclesiologia (1985), esp. Cap. 4; cf. Comisión Teológica Internacional, Documentos 1980-1985, Toledo, s.d., pp. 286-290; e especialmente Fides et inculturatio (1988): Greg 70 (1989), pp. 625-646.

3. Entre os documentos de João Paulo II, cf. RM 55-57; TMA 52-53; cf. Também o documento do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso e a Congregação para a Evangelização dos Povos Diálogo e Anúncio, aqui citado repetidas vezes.

4. Gregório Nazianzeno, Carminum liber I, sectio I, 29 (PG 37, 507). 56

5. Catecismo da Igreja Católica, 2566.

6. Ibid., 2567.

7. João Paulo II, Ut unum sint, 33.

Fonte: https://www.vatican.va/

Por que a água do mar é salgado enquanto que a dos rios e lagos é doce?

Gota d'água no mar | Mega curioso
Por Maria Luciana Rincon
Por que a água do mar é salgado enquanto que a dos rios e lagos é doce?

Mesmo que você nunca tenha levado um belo de um caldo na praia ou se engasgado com um golão enquanto brincava com os amigos em um rio, você já deve ter ouvido mil vezes que a água do mar é salgada, enquanto que a de rios e lagos é doce, não é mesmo? Mas você sabe dizer por que é que existe essa diferença? A salinidade dos mares é resultado, em realidade, de diversos processos naturais, incluindo, entre eles, a chegada da água dos rios no oceano.

A água doce tem sua origem na chuva que cai sobre a superfície do planeta, abastecendo os rios, lagos e aquíferos que servem para “matar a sede” de humanos, animais e plantas. Esse ciclo ocorre de forma contínua e, cada vez que a água evapora e vai para a atmosfera na forma de vapor, quando ocorre a sua precipitação e ela volta a cair sobre a Terra, a chuva essencialmente não contém muitos sais em sua composição.

Chove chuva

Água do mar | Mega curioso

Mas, além de suprir esses corpos hídricos que mencionamos acima, a chuva também cai sobre rochas e sedimentos e, conforme essa água percorre a superfície do planeta, ela vai coletando minerais, nutrientes e outros elementos.

No caso da água de rios e lagos, a chuva reabastece esses corpos hídricos constantemente, não permitindo que eles se tornem salgados, embora eles também não sejam completamente desprovidos de minerais e sais. Por outro lado, a água dos mares coletam todos os minerais e sais transportados pelos rios que desembocam no oceano.

Era uma vez...

Água do mar | Mega curioso

Nos primórdios da Terra, quando os mares ainda eram “jovenzinhos”, suas águas eram apenas levemente salgadas. Contudo, com o passar do tempo, ou seja, ao longo de 4,5 bilhões de anos, conforme a chuva foi caindo sobre o planeta e percorrendo sua superfície — provocando a erosão de rochas —, essa água toda acabou transportando um bocado de sais e minerais até o oceano, tornando-o progressivamente mais salgado.

Além disso, assim como ocorre a evaporação de rios e lagos, esse processo também ocorre com o mar, provocando um aumento em sua concentração de sais e minerais. Isso sem falar em vulcões e outras estruturas que existem no fundo do oceano e que contribuem liberando mais sais e minerais nas águas. Aliás, dentro de alguns bilhões de anos, com todos esses processos acontecendo, pode ter certeza de que a composição do oceano será bem diferente da atual!

O Papa: os oceanos são fatores de conexão, não lugares de tragédia

A água é um fator de conexão e “o oceano não tem fronteiras
políticas nem culturais” | Vatican News

Numa mensagem à conferência Our Ocean, assinada pelo cardeal Parolin, encerrada na última sexta-feira, na Cidade do Panamá, Francisco reitera a importância do oceano como vetor de conexão do qual dependem todos os seres humanos: "Adotar uma visão integral de desenvolvimento e ecologia".

Francesca Sabatinelli – Vatican News

O oceano "pode ser um importante fator de união, um vetor de ligação, uma causa comum". Para viver esta conexão, é preciso escutar "o grito dos pobres e o grito da Terra" e rever "estratégias de crescimento baseadas no desperdício e no consumismo, em modelos injustos e insustentáveis ​​de produção, transporte, distribuição e consumo". É o afirma o Papa na mensagem assinada pelo secretário de Estado, cardeal Pietro Parolin, enviada aos participantes da oitava edição da conferência Our Ocean (Nosso Oceano), realizada na Cidade do Panamá de 2 a 3 de março, dedicada este ano ao tema "Nosso oceano, nossa conexão".

Necessidade de unir-se

O texto sublinha outros dois pontos fundamentais para poder viver "esta Conexão com todas as realidades envolvidas", das administrações ao setor privado, do mundo da pesquisa ao da política e da cultura, das organizações religiosas e juvenis à Comunidade internacional. Um desses pontos é representado pela necessidade de unir-se para "proteger e restaurar os ecossistemas marinhos, costeiros e fluviais", o outro é marcado pela importância de facilitar "uma administração eficaz e uma coordenação institucional proporcional ao tamanho e complexidade do bem a ser protegido, o oceano".

Oceanos saudáveis ​​para as gerações futuras

A mensagem recorda como todos os seres humanos dependem dos oceanos, recebidos como dádiva do Criador, e como se espera que a sua utilização seja “justa e sustentável” para ser transmitida “às gerações futuras em boas condições”. Toda a família humana é, portanto, chamada, como indica a Laudato si', a adotar "uma visão integral do desenvolvimento" e uma "visão integral da ecologia". Infelizmente, porém, continuam presentes os fenômenos alarmantes de "poluição dos oceanos, acidificação, pesca ilegal e pesca excessiva", junto com a grande preocupação com "o desenvolvimento da indústria extrativista no fundo do mar" e com as "tragédias de migrantes em perigo no alto mar, o tráfico de seres humanos que ocorre no mar, as duras e por vezes ilegais condições de trabalho dos marítimos e as tensões geopolíticas em áreas marinhas consideradas importantes".

Água, fator de conexão

A água é um fator de conexão e “o oceano não tem fronteiras políticas nem culturais”, pois são as suas correntes, atravessando o planeta, que evidenciam “a interconexão e a interdependência entre comunidades e países”. “Somos uma só família, partilhamos a mesma inalienável dignidade humana, vivemos numa casa comum da qual somos chamados a cuidar”, conclui o Papa.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

O desafio que nos vem da Nicarágua

ACN | Aid to the Church in Need
Por Francisco Borba Ribeiro Neto

As perseguições religiosas quase sempre são assim: parecem ter uma causa confessional, mas são motivadas por interesses econômicos e políticos.

Oleitor de Aleteia já deve ter lido vários artigos sobre a situação política da Nicarágua de Daniel Ortega e da perseguição da qual estão sendo vítimas os cristãos daquele país. Trata-se de uma perseguição de natureza político-partidária: os cristãos são perseguidos não porque seu Deus seja outro que o de Ortega (ao menos oficialmente…), mas sim porque não se dobraram a uma vontade tirânica. As perseguições religiosas quase sempre são assim: parecem ter uma causa confessional, mas são motivadas por interesses econômicos e políticos. A diferença é que em alguns casos – como neste da Nicarágua – isso é evidente, em outros não.

O caso nicaraguense, além de demandar orações e solidariedade, nos dá muito o que pensar…

Lembrando Ernesto Cardenal

Em primeiro lugar, para os mais velhos, é impossível não lembrar do episódio constrangedor envolvendo São João Paulo II e Ernesto Cardenal, poeta e sacerdote nicaraguense. Diante do triste quadro fornecido pela ditadura somozista, de direita, que dominava a Nicarágua, padre Cardenal aderiu ao marxismo e chegou a integrar a Frente Sandinista de Libertação, liderada por Daniel Ortega. Com a vitória do sandinismo, em 1979, integrou a Junta de Governo, como Ministro da Cultura. Numa viagem à Nicarágua, em 1983, São João Paulo II o censurou publicamente, num dos gestos mais polêmicos de seu pontificado. Dois anos depois, Cardenal foi suspenso de suas atividades sacerdotais pelo Vaticano, que as considerou incompatíveis com seu cargo político. Em 1994, contudo, o próprio Cardenal, desiludido, rompeu com o sandinismo – posição que manteve até sua morte, em 2020.

Independentemente da validade maior ou menor da insurreição sandinista contra o regime somozista, que foi um dos mais cruéis e desumanos da América Central, da maior ou menor descortesia de São João Paulo II, existe uma lição na história de Cardenal, um homem brilhante e, sem dúvida, um idealista que procurava o melhor para seu povo. A Igreja não pode se omitir de um juízo ético sobre os malfeitos humanos na política, mas deve manter uma justa distância, que lhe permita exercer com liberdade sua função tanto crítica quanto educativa. Além disso, o exercício do poder tem sempre a capacidade de corromper mesmo os supostamente justos. Não é conveniente que a Igreja se confie ao poder político e/ou permita uma confusa identificação entre mando temporal e autoridade espiritual. Isso vale, não custa frisar, tanto para os que se consideram de esquerda quanto para os que se consideram de direita – e até mesmo para os “de centro” (as comunidades cristãs já sofreram muitas desilusões também com políticos ditos “moderados” que se apresentaram como defensores da fé e representantes do cristianismo junto ao poder).

O Brasil não é a Nicarágua

Nos últimos tempos, muitos apontam o perigo do Brasil se tornar uma nova Venezuela, ou uma nova Nicarágua, em função da vitória eleitoral de Lula. Analisando friamente a situação, temos que reconhecer que a possibilidade disto ocorrer é muito pequena. A história política, a solidez das instituições, por mais precárias que pareçam a nossos olhos, a enorme extensão territorial e a pluralidade das forças sociais e econômicas existentes fazem o Brasil muito diferentes destes outros países.

Para que um golpe autoritário dê certo, um país não pode ter um real equilíbrio entre os Poderes, com um Executivo muito mais forte que os demais; estrutura e a pluralidade social não podem ser grandes, pois quanto mais complexa e diversa for a sociedade, mas difícil congregar forças capazes de darem um golpe; as Forças Armadas devem ter pouco apreço pela democracia, de modo a serem facilmente cooptadas pelos golpistas. São todas condições que não são encontradas em nosso país na atualidade, como os últimos acontecimentos mostraram.

O Brasil com Lula não é como a Venezuela com Chavez e Maduro, ou como a Nicarágua com Ortega. Assim como o Brasil com Bolsonaro não era o Peru de Fujimori, considerado por muitos o mais autoritário governante de direta da América do Sul no período recente. Não é que não estejamos sujeitos a ameaças a nossa democracia. Ela, como todas as demais, em algum grau, só pode se manter com a permanente vigilância e consenso de toda a sociedade. Sem dúvida, contudo, tem hoje em dia robustez interna que lhe dá sustentabilidade ao longo do tempo, mesmo com todos os seus problemas e limites (que precisam ser sanados, evidentemente).

Não estamos livres de ameaças trazidas por partidos e posicionamentos ideológicos autoritários. Mas nossos problemas, à esquerda e à direita, se aproximam mais daqueles de outros países latino-americanos, como a Argentina, imersa numa crise socioeconômica que dura décadas e parece infindável, ou o Chile, que era considerado um modelo de sucesso no continente até a recente crise de 2019. Entender as diferenças de contexto político, social e econômico são importantes para enfrentar os problemas de forma realista e adequada…

Um diálogo e uma solidariedade que superem as ideologias

O grande desafio que a crise nicaraguense nos apresenta é conseguirmos ser solidários com um povo e uma Igreja que sofrem perseguição de um regime de esquerda, sendo que nosso governo também é de esquerda.  O posicionamento, no mínimo ambíguo, do PT em relação aos regimes autoritários de esquerda na América Latina é um fato. Pesam, nesse posicionamento, uma história colaborativa, no passado, e o esforço de criar, no presente, uma aliança regional de esquerdas.

Oposições gritando têm o seu impacto, mas – nesse caso – o mais importante é o protesto daqueles que votaram no PT no segundo turno das eleições. Um partido vitorioso não precisa se incomodar tanto com seus opositores, mas deve satisfazer seus simpatizantes. Por isso, é particularmente importante que os eleitores de esquerda reconheçam os desmandos do governo nicaraguense e peçam que o governo brasileiro se solidarize com os perseguidos políticos e com a Igreja do país.

A direita também tem seu papel nesse processo. Mais do que a denúncia partidária, da repetição exaustiva de que o outro é autoritário, esse é o momento de uma “comunicação empática”, para usar o tema de um artigo recente de Aleteia, que busque entender o outro e procurar ajudá-lo a ver as falhas de seus correligionários. Não é hora de querer se impor ou “provar que o outro está errado”, mas sim de ajudá-lo a perceber “como pode ser melhor”.

Não só porque nossos irmãos católicos estão sendo perseguidos, mas pelo bem de toda a população nicaraguense e de nós mesmos, a situação da Nicarágua nos desafia a sermos mais cristãos, de abandonarmos nossas posições partidárias – contrárias ou favoráveis ao regime atual – para um diálogo que nos ajude a ser sempre menos ideológicos e mais fiéis ao amor e à solidariedade.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Dom Paulo Cezar: Papa Francisco deu voz as periferias

Papa Francisco e dom Paulo Cezar Costa | Vatican News

Depoimento de Dom Paulo Cezar sobre o Papa Francisco, por ocasião dos 10 anos de seu pontificado.

Dom Paulo Cezar da Costa, cardeal arcebispo de Brasília, em sua mensagem sobre os 10 anos do pontificado do Papa Francisco destacou que ele “colocou a evangelização no centro, a missão no centro” e trouxe uma grande novidade no campo moral “onde a moral ficava muito no ‘pode, não pode’, o Papa propôs à Igreja criar processos. Tantas situações que a resposta era sim ou não, ele propôs acolher, acompanhar, integrar.” Segundo dom Paulo “Papa Francisco veio das periferias e aponta para as periferias (...) e dá voz para as periferias, trazendo as periferias para o centro.” Confira a declaração completa de Dom Paulo assistindo ao vídeo.

A Questão da Relação Corpo e Alma em Gregório de Nissa

São Gregório de Nissa | FASBAM

A Questão da Relação Corpo e Alma em Gregório de Nissa


A filosofia grega, de maneira geral, foi caracterizada por um desprezo com relação ao corpo e, inversamente, por uma valorização da alma. Este chamado “dualismo” entre o corpo e a alma se encontra marcado, sobretudo, em Platão que concebe o corpo como a prisão da alma. Na verdade, para Platão, o corpo nada mais é do que uma morada da alma por um determinado tempo até́ ela transmigrar para outros corpos e, finalmente, chegar ao Hades. Todavia, a alma se apresenta também como a faculdade por excelência do conhecimento, tanto intelectual quanto moral. Neste sentido, e ao que tudo indica, Platão foi, o primeiro a desenvolver, de maneira racional e sustentada ao longo de seus diálogos, a questão da imortalidade da alma. Nele se encontra também a divisão tripartite da alma. Deve- se, no entanto, notar que, embora Platão o faça de maneira racional, ele está́ constantemente fazendo apelo ao mito para demonstrar a imortalidade da alma. Assim, o que nos chama mais a atenção na filosofia de Platão é a problemática da imortalidade da alma, a sua tripartição e valorização com relação ao corpo. São estas as principais teorias platônicas de que Gregório de Nissa se utilizou para explicar a relação entre o corpo e a alma.

Porém, a filosofia platônica é apenas uma base para o desenvolvimento do pensamento de Gregório de Nissa que culmina, justamente, nas Sagradas Escrituras, sobretudo em São Paulo, no que diz respeito à concepção do corpo, da alma e de suas relações fundamentais. Evidentemente, Gregório inclui também, nas suas análises da alma e do corpo, a doutrina paulina da ressurreição. Trata-se, portanto, de um corpo glorioso, ou de luz.

Além de Platão, nós analisamos, embora de maneira breve, o pensamento de Aristóteles. Com efeito, Gregório de Nissa não foi tão influenciado pelo Estagirita como o fora por Platão. Na esteira de Platão, destacamos também o pensamento de Plotino naquilo que diz respeito à valorização da alma e do espírito com relação ao corpo. No tocante ao estoicismo, a influência deste movimento sobre o Nisseno foi principalmente moral e também, do ponto de vista ontológico, destacamos a questão do macrocosmo e do microcosmo. Isto quer dizer que o homem é uma miniatura, ou um resumo, do grande cosmos. No que se refere ao pensamento cristão, Gregório de Nissa foi, além das Escrituras, diretamente influenciado por Origenes. Na verdade, os seus contatos com o grande mestre alexandrino remontam à sua infância.

A partir destas considerações, em Gregório de Nissa, o ser humano é um composto de corpo, alma e espírito e que ele forma uma unidade indissociável, essencial, substancial. Isso nos remete tanto às ideias de Origenes quanto, mais diretamente, às do apóstolo Paulo. Em Paulo, com efeito, o ser humano se apresenta como uma unidade completa – corpo, alma e espírito – que deve estar sempre em referência a Deus, como criador, e a Jesus Cristo como salvador. Desta composição essencial do homem, e de sua referência a Deus, decorrem as outras doutrinas paulinas relativas à liberdade, ao mal, ao pecado, à carne, à morte e à ressureição.

São, pois, estas questões que irão influenciar fundamentalmente o pensamento de Gregório de Nissa que, conforme já dissemos, é tributário da filosofia grega (Platão), das Escrituras e do pensamento cristão: Origenes, sua avó, sua irmã̃ Macrina e seu irmão Basilio Magno. O pensamento do Nisseno não é exclusivamente platônico, origeneano ou paulino. Ele é, na verdade, imbuído destas três fontes, ao mesmo tempo em que elabora e cria o seu próprio pensamento, mas em referência à tradição que o precedera.

O pensamento do Nisseno, principalmente na obra A criação do homem, gira em torno da doutrina da participação, com base no dito de Gn 1,26: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Com esta afirmação, o Nisseno lança-se na questão da criação do mundo e, consequentemente, do homem. O homem se apresenta no seu universo numa escala gradativa, ou seja, desde as coisas mais ínfimas até́ os seres mais perfeitos. Ele está́, pois, colocado num entre-dois, isto é, entre o mundo dos brutos e o mundo das criaturas espirituais, que são os anjos. No homem, com efeito, se encontra não somente a sensibilidade – como nas criaturas irracionais – mas também a inteligência, o nous. É pelo nous que o homem manifesta a sua semelhança com o Criador. Na perspectiva de Gregório de Nissa, ele é um ser unitário, composto de corpo, alma e nous.

Autor: Juliano Slominski, licenciado em Filosofia pela FASBAM – Faculdade São Basílio Magno.

Reflexão para o III Domingo da Quaresma (A)

Evangelho do domingo | Vatican News

No Evangelho, a samaritana vai atrás da água para matar sua sede. Jesus, também. É meio-dia! Lembremo-nos que alguns meses mais adiante, nessa mesma hora, Jesus dirá que tem sede. Será do alto da cruz.

Padre Cesar Augusto, SJ - Vatican News

Em nossa vida, quando tudo vai de acordo com os nossos desejos, ficamos alegres, contentes e cordatos. Mas basta acontecer algo que não estava planejado, ou melhor, faltar algo com que contávamos, para que nossa alegria desapareça e comecemos a duvidar de tudo, inclusive daquela pessoa que proporcionou e continua nos proporcionando esses bens. Assim aconteceu com o povo judeu após a libertação do Egito.

Enquanto caminhavam rumo à terra prometida, a água veio a faltar. A reação foi tamanha que esqueceram as maravilhas que o Senhor havia operado em favor deles e até chegaram a desconfiar da fidelidade de Deus. Apesar dessa atitude, o Senhor continuou fazendo o bem ao povo e providenciou a água.

Podemos neste momento, fazer um exame de consciência de nossa vida. O Senhor nos deu a vida, nos alimenta, nos deu família, saúde e uma infinidade de bens, sejam espirituais ou materiais. Qual o nosso comportamento quando algo nos falta? Continuamos a nos sentir o centro do amor de Deus, ou nos esquecemos tudo o que Ele nos presenteou e só estamos atentos àquilo que nos falta?

No Evangelho, a samaritana vai atrás da água para matar sua sede. Jesus, também. É meio-dia!

Lembremo-nos que alguns meses mais adiante, nessa mesma hora, Jesus dirá que tem sede. Será do alto da cruz.

A samaritana escutando Jesus, diz desejar da água que ele lhe oferece, para que todas as suas necessidades sejam saciadas e ela não precise mais vir ao poço. Jesus continua a conversa e a samaritana, entendendo sua proposta, dá um salto qualitativo e deseja a água viva, aquela que irá aplacar não seus desejos limitados, mas a que irá saciar seus desejos de eternidade. Ele fala da nova vida que nos dará através de sua morte e ressurreição, assumida por nós nas águas batismais.

São Paulo, em sua carta aos Romanos, nos diz que a saciedade que ansiamos é um dom de Deus, já usufruído aqui nesta vida, é o dom do Espírito Santo, o Amor de Deus derramado em nossos corações. Essa é a água que nos sacia, sem a qual não poderemos viver.

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF