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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

PAIS DA IGREJA: Sobre a Vida de Moisés (Parte 11/20)

São GREGÓRIO DE NISSA

(Aprox. 330-395)

Sobre a Vida de Moisés

Tradução segundo a Patrologia Grega de Migne
com base na versão de D. Lucas F. Mateo

História de Moisés

Capítulo 24

Assim pois, quando Moisés cresce em conhecimento, confessa que vê Deus nas trevas, isto é, que agora sabe que a Divindade, por sua própria natureza, é algo que supera todo conhecimento e toda compreensão. Moisés - disse - entrou nas trevas, onde estava Deus (Ex 20, 21). Que Deus? Aquele que fez das trevas seu esconderijo (Sal 17, 12), como disse Davi, o qual foi iniciado nos mistérios secretos no mesmo santuário. Chegando ali, Moisés recebe de novo por meio da palavra os mandamentos que recebeu por meio das trevas, para que - assim creio -, nos confirmasse os ensinamentos sobre estas coisas com o testemunho da palavra divina. Pois em primeiro lugar, a palavra divina proíbe que os homens comparem a Divindade com alguma das coisas conhecidas, porque todo conceito, elaborado pelo entendimento com uma imagem sensível para conhecer e alcançar a natureza divina, dá uma imagem falsa de Deus, e não dá a conhecer o próprio Deus. A virtude da piedade tem dois aspectos: o que concerne a Deus e o que concerne à retidão dos costumes, pois a pureza de vida é uma parte da piedade. Moisés, ao aprender em primeiro lugar o que é necessário saber a respeito de Deus, que conhecê-lo consiste em não formar nenhuma idéia dEle a partir das coisas conhecidas segundo a forma humana de conhecer, entende também a outra face da virtude, ao aprender com que modo de viver se conduz retamente a vida virtuosa. Depois disto Moisés chega à tenda não feita por mão de homem. Quem o seguirá em seu caminhar através destas realidades e em seu elevar-se a tal altura com a mente, a ele, que subindo mais e mais, se eleva constantemente acima de si mesmo em ascensão às coisas mais altas? Primeiro abandonou a base da montanha, separando-se daqueles que careciam de forças para a ascensão. Depois, tendo chegado ao alto da subida, agüenta nos ouvidos o fragor das trombetas. Depois destas coisas, penetra no santuário secreto da teognose. Porem tampouco aqui permanece quieto, mas ascende até a tenda não feita por mão de homem (Hb 9, 11). Pois quem se elevou com tais ascensões encontra aqui o término. Parece-me que a trombeta celeste, interpretada de outra forma, se converte, para quem a ouve, em guia do caminhar até o que não está feito por mão de homem. Pois a harmonia das maravilhas existentes no céu grita a sabedoria divina que resplandece no universo e proclama por meio das coisas visíveis a grande glória de Deus, conforme o que foi dito: os céus proclamam a glória de Deus (Sal 18, 2). Esta, com a claridade e sonoridade de seu ensinamento, se converte em trombeta de grande voz, como disse um dos profetas: o céu fez soar a trombeta no alto (Eclo 45, 20). Quem purificou o ouvido do coração e o tornou sensível, depois de acolher este som - refiro-me ao que se origina da contemplação dos seres e que leva ao conhecimento do poder divino -, é guiado por ele até penetrar com o pensamento ali onde está Deus. Isto é chamado trevas pela Escritura, para indicar, como dissemos, o incognoscível e o invisível; tendo chegado ali vê aquela tenda não feita por mão de homem e mediante uma imitação material a dá a conhecer aos que estão abaixo.

Capítulo 25

Como era, pois, aquela tenda não feita por mão de homem, que foi mostrada a Moisés no alto da montanha, recebendo ordem de tomá-la como modelo para dar a conhecer, através de uma obra feita a mão, a maravilha não feita por mão de homem? Olha - disse - farás todas as coisas conforme o modelo que te foi mostrado na montanha (Ex 25, 40). Colunas de ouro apoiadas em bases de prata e adornadas também com capitéis de prata. Depois outras colunas cujos capitéis e cujas bases eram de bronze e o corpo do meio de prata. Todas tinham um suporte de madeira incorruptível e em toda sua volta se espalhava o resplendor próprio destes materiais de construção. Havia também uma arca de ouro puríssimo, que resplandecia do mesmo modo; o apoio do revestimento de ouro era também de madeira incorruptível. Alem disso um candelabro: único em sua base, mas dividido no alto em sete braços e sustentando em seus braços igual número de lâmpadas. Ouro era a matéria do candelabro, e seu interior não era oco, nem estava chapeado na madeira. Alem destas coisas, o altar, o expiatório e os querubins cujas asas davam sombra à arca (Hb 9, 5). Todas estas coisas eram de ouro; o ouro não só dava o brilho de ouro à superfície, mas era ouro maciço que estava inclusive no interior dos objetos. Havia ainda tapetes de diversas cores, tecidos com arte, com flores diversas abrindo-se entrelaçadas entre si como adorno do tecido. Com estes tapetes se separava o que, na tenda, era visível e acessível para alguns ministros sagrados, e o que estava vedado e era inacessível. O nome da parte anterior era o Santo, e o da parte secreta Santo dos Santos (Ex 26, 33). Enfim havia pias, incensários, a cobertura exterior das tendas, e tecidos de crinas e peles tingidas de vermelho; e todas as outras coisas que Moisés expôs com palavras (Ex 30, 18). Quem poderia compreendê-las com exatidão? Que realidades não feitas por mão de homem estas coisas imitam? Que proveito recebem os que vêem a imitação material daquelas coisas que foram contempladas ali por Moisés? Parece-me oportuno deixar a interpretação exata destas coisas a quem tem o poder de investigar as profundezas de Deus por meio do Espírito (1Co 2, 10), se há alguém que possa manifestar os mistérios no Espírito, como diz o Apóstolo (1Co 14, 2). De nossa parte, propomos hipoteticamente nossa interpretação destes assuntos, e a submetemos ao bom sentido de quem a ouça, deixando sua aceitação ou seu repúdio ao parecer de quem a examine.

Capítulo 26

Posto que Paulo nos revela em parte o mistério contido nestas coisas, tomando quanto já se disse como simples ponto de partida, dizemos agora que Moisés foi instruído profeticamente, em figuras, sobre o mistério da tenda que abrange o universo. Esta tenda é Cristo, força de Deus e sabedoria de Deus (1Co 1, 24), cuja própria natureza não é feita por mão de homem, mas que permitiu ser feito, quando foi conveniente que este tabernáculo fosse construído entre nós. Assim esta tenda é de certa forma incriada e criada: incriada em sua preexistência; vem a ser criada ao receber esta existência material.

 ECCLESIA Brasil

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF