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sexta-feira, 1 de maio de 2020

Em tempos de Pascom

Neste período da Pandemia do COVID-19, estamos vivenciando experiências singulares jamais imaginadas pela nossa geração.
Neste período da Pandemia do COVID-19, estamos vivenciando
experiências singulares jamais imaginadas pela nossa geração.  (ANSA)
Graças a generosa dedicação dos nossos agentes da Pascom, foi possível levar, através dos vários meios de comunicação, “a Igreja” às casas. Com eles “redescobrimos e evidenciamos a necessidade do cuidado mútuo e de proteger os nossos vínculos como cidadãos e colaboradores do bem comum, não como indivíduos isolados, mas como membro de uma família”.

Padre Arnaldo Rodrigues

O Decreto sobre o apostolado dos leigos Apostolicam Actuositatem (18 nov. 1965), do Concílio Vaticano II, nos recorda vivamente a importância da participação ativa dos leigos na vida e ação da Igreja, de modo particular, colaborando com os pastores no apostolado para o bem dos membros todos do Povo de Deus. “A sua ação dentro das comunidades eclesiais é tão necessária que, sem ela, o próprio apostolado dos pastores não pode conseguir, a maior parte das vezes, todo o seu efeito. Porque os leigos com verdadeira mentalidade apostólica, à imagem daqueles homens e mulheres que ajudavam Paulo na propagação do Evangelho (cfr. At. 18, 18, 20; Rom. 16, 3), suprem o que falta a seus irmãos e revigoram o espírito dos pastores e dos outros membros do povo fiel (cfr. 1 Cor. 16, 17-18)”[1].

Neste período da Pandemia do COVID-19, estamos vivenciando, nos diversos âmbitos (social, familiar, religioso, etc.), experiências singulares jamais imaginadas pela nossa geração. Para muitos, essa nova realidade pode ser apenas um acontecimento negativo e fatal na própria história da humanidade. Obviamente, existe o drama do sofrimento causado pelo aumento de vítimas fatais, pelo aumento do número de pessoas hospitalizadas, pelo risco de contaminação daqueles que estão na linha de frente (médicos, enfermeiros, policiais, motoristas dos transportes públicos, funcionários de farmácias e supermercados etc.), e pelos que vivem sozinhos sem nenhum auxílio ou por simplesmente viverem sozinhos e com medo. Não obstante os problemas, mirando o olhar no Ressuscitado, somos convidados em meio ao caos, a termos atitudes de esperança e fé, atitudes verdadeiramente humanas e solidárias.

Dentre as diversas manifestações de solidariedade em benefício do Povo de Deus, destaco o trabalho e missão dos agentes da Pastoral da Comunicação (PASCOM). Graças a generosa dedicação dos nossos agentes, foi possível levar, através dos vários meios de comunicação, “a Igreja” às casas. Com eles “redescobrimos e evidenciamos a necessidade do cuidado mútuo e de proteger os nossos vínculos como cidadãos e colaboradores do bem comum, não como indivíduos isolados, mas como membro de uma família”[2].

Diante da preocupação dos pastores de não deixar faltar aos fiéis os bens espirituais da Igreja, principalmente os auxílios da Palavra de Deus e dos sacramentos (cf. can. 213), observa-se um volume sem precedentes de conteúdos religiosos e litúrgicos nas redes. As iniciativas são inúmeras: algumas mais simples e outras mais estruturadas, mas todas com o mesmo objetivo: manter os fiéis interligados entre si e unidos como comunidade orante. Por um lado, mais do que fornecer uma plataforma de conteúdo, a necessidade inicial foi de criar vínculos de forma virtual. Por outro, embora já existente, começaram a ser potencializados os ambientes para as formações cotidianas.
As transmissões das celebrações litúrgicas, dos momentos de adorações ou orações do rosário, das meditações e também das ações sociais em favor da população mais frágil, foram realizadas graças a dedicação e disponibilidade dos nossos irmãos e irmãs da PASCOM. O Documento de Aparecida – retomando a Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi do Papa Paulo VI – afirma que os meios de comunicação “[colocados] a serviço do Evangelho, [...] oferecem a possibilidade de difundir quase sem limites o campo da audiência da Palavra de Deus, fazendo chegar a Boa Nova a milhões de pessoas”[3].

Antes e durante a Semana Santa, foram inúmeras as transmissões realizadas pelos meios de comunicação convencionais (Rádio e TV) e pelas redes sociais (FacebookInstagramYoutube e Twitter). Quão importante foi o auxílio dos agentes da PASCOM aos sacerdotes durante as celebrações litúrgicas e ações sociais. Este apostolado possibilitou que os fiéis permanecessem “conectados” entre si e com sua paróquia. Milhares de agentes por todo o Brasil, não mediram esforços para que milhões de fiéis, juntamente com seus familiares e amigos, pudessem acompanhar e “participar” das missas, dos momentos de adoração, dos terços e tantos outros instantes espirituais e formativos. De modo inovado, ajudaram as “Igrejas domésticas”, a celebrar os mistérios da vida de Cristo.

Neste ínterim de isolamento domiciliar, as respostas dos que acompanharam e rezaram por meio das transmissões, foram inúmeras manifestações de carinho e agradecimento. Fotos, áudios, vídeos e textos, preencheram, e continuam a preencher, os feeds de notícias e comentários. Esta resposta positiva no tocante ao apostolado dos agentes da PASCOM, nos recorda a mensagem do Papa Francisco sobre a cultura do encontro proporcionada pelos meios e comunicação: “Neste mundo, os mass-media podem ajudar a sentir-nos mais próximo uns dos outros; a fazer-nos perceber um renovado sentido de unidade da família humana, que impele à solidariedade e a um compromisso sério para uma vida mais digna. Uma boa comunicação ajuda-nos a estar mais perto e a conhecer-nos melhor entre nós, a ser mais unidos”[4].

Infelizmente, nem todos os agentes são recordados por este belo apostolado que possibilita o fiel continuar participando, de modo singular, da vida da sua comunidade, mesmo estando em sua casa. Quantos fiéis, nem mesmo sabem da existência destes agentes e de suas contribuições. Isto não deve desmotivar-nos. Pelo contrário, pois nunca foi tão essencial este empenho pastoral da PASCOM em nosso país como agora. Neste tempo de desafios, podemos com muita boa-vontade, paciência, criatividade e alguma técnica, obter bons resultados na evangelização e fazendo com que a mensagem de Cristo chegue, através dos meios de comunicação, a um número cada vez maior de pessoas. Diante disto, é muito importante o nosso agradecimento aos agentes da PASCOM por toda dedicação, por colocarem em prol da Igreja os dons recebidos por Deus.

Comunicação é relacionamento, encontro e histórias, principalmente no modo de comunicar cristão, é testemunho como nos recorda o próprio Papa Francisco: “E a nossa comunicação deve ser testemunho. Se quiserdes comunicar apenas uma verdade sem bondade e beleza, parai, não o façais. Se quiserdes comunicar uma verdade aproximativa, mas sem vos envolverdes, sem testemunhardes com a própria vida, com a própria carne, parai, não o façais. Há sempre a assinatura do testemunho em cada coisa que fazemos. Testemunhas. Ser cristão significa ser testemunha, ‘mártir’. Esta é a dimensão ‘martirial’ da nossa vocação: sermos testemunhas”[5]. Desta forma, reforçamos o nosso apelo aos agentes da PASCOM, continuem incansavelmente este apostolado de “ser presença” na vida das pessoas, irradiando “ações próprias do campo da comunicação com o sentido pastoral”.[6] Avante e Coragem!
__________________
[1] Cf. Decreto Apostolicam Actuositatem, n. 10. In: Compêndio do Vaticano II. Constituições, Decretos, Declarações, Petrópolis: Ed. Vozes 1968, 527-564.
[2] Dom Orani João Tempesta (Card.), Discurso ao clero. https://drive.google.com/file/d/1W5UoddTrUZK6ItKRCTyOSUCjmAtjdPHO/view
[3] Conselho Episcopal Latino-Americano, Documento de Aparecida, 2a ed., Brasília-São Paulo 2007, n. 485.
[4] Papa Francisco, Mensagem para o 48o Dia mundial das comunicações sociais. [Acesso: 15.04.2020], http://www.vatican.va/content/francesco/pt/messages/communi>
cations/documents/papa-francesco_20140124_messaggio-comunicazioni-sociali.html
[5] Papa Francisco, Discurso aos funcionários do Dicastério para a comunicação. [Acesso: 15.04.2020], http://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2019/septe>
mber/documents/papa-francesco_20190923_dicastero-comunicazione.html
[6] https://pascombrasil.org.br/pascom/

Vatican News

Hoje começamos maio, mês dedicado a Maria

REDAÇÃO CENTRAL, 01 Mai. 20 / 07:00 am (ACI).- Maio é o mês que a Igreja Universal dedica à Mãe de Deus, a Bem-aventurada Virgem Maria. Este tempo é uma oportunidade para renovar o amor de todos os batizados pela Mulher que Deus, da eternidade, escolheu para dar à luz cuidar Dele.

A Santíssima Virgem Maria é para sempre a Rainha do Céu e da Terra, não há santidade sem Maria porque toda Ela leva a Cristo.
Maria, a mais humilde entre as mulheres, é precisamente o modelo de toda mulher, como assinalou o Papa Francisco em abril de 2014, em uma mensagem a mais de 20 mil jovens reunidos em Buenos Aires, Argentina.
“Para vós existe um único modelo: Maria, a mulher da fidelidade, aquela que não entendia o que acontecia, mas obedecia. Aquela que, quando soube do que a sua prima precisava, foi depressa ter com ela; a Virgem da Prontidão!”.
O Papa assinalou ainda que Maria é “aquela que fugiu como refugiada para um país estrangeiro a fim de salvar a vida do seu Filho. Aquela que ajudou o seu Filho a crescer, que o acompanhou e, quando o seu Filho começou a pregar, seguiu-o. Aquela que padeceu tudo o que acontecia com o Menino, com o Jovem. Aquela que permaneceu ao lado do seu Filho, e lhe indicava os problemas que surgiam: 'Olha, não têm vinho!'. Aquela que, no momento da Cruz, estava com Ele”.

Por que maio é o Mês de Maria?


REDAÇÃO CENTRAL, 01 Mai. 20 / 08:00 am (ACI).- Durante vários séculos a Igreja Católica dedicou todo o mês de maio para honrar a Virgem Maria, Mãe de Deus. A seguir, explicamos o porquê.
A tradição surgiu na antiga Grécia. O mês de maio era dedicado a Artemisa, deusa da fecundidade. Algo semelhante ocorreu na antiga Roma, pois maio era dedicado a Flora, deusa da vegetação. Naquela época, celebravam os ‘ludi florals’ (jogos florais) no fim do mês de abril e pediam sua intercessão.
Na época medieval abundaram costumes similares, tudo centrado na chegada do bom clima e o afastamento do inverno. O dia 1º de maio era considerado como o apogeu da primavera.
Durante este período, antes do século XII, entrou em vigor a tradição de Tricesimum ou “A devoção de trinta dias à Maria”. Estas celebrações aconteciam do dia 15 de agosto a 14 de setembro e ainda são comemoradas em alguns lugares.
A ideia de um mês dedicado especificamente a Maria remonta aos tempos barrocos – século XVII. Apesar de nem sempre ter sido celebrado em maio, o mês de Maria incluía trinta exercícios espirituais diários em homenagem à Mãe de Deus.
Foi nesta época que o mês de maio e de Maria combinaram, fazendo com que esta celebração conte com devoções especiais organizadas cada dia durante todo o mês. Este costume durou, sobretudo, durante o século XIX e é praticado até hoje.
As formas nas quais Maria é honrada em maio são tão variadas como as pessoas que a honram.
As paróquias costumam rezar no mês de maio uma oração diária do Terço e muitas preparam um altar especial com um quadro ou uma imagem de Maria. Além disso, trata-se de uma grande tradição a coroação de Nossa Senhora, um costume conhecido como Coroação de Maio.
Normalmente, a coroa é feita de lindas flores que representam a beleza e a virtude de Maria e também lembra que os fiéis devem se esforçar para imitar suas virtudes. Em algumas regiões, esta coroação acontece em uma grande celebração e, em geral, fora da Missa.
Entretanto, os altares e coroações neste mês não são apenas atividades “da paróquia”. Mas, o mesmo pode e deve ser feito nos lares, com o objetivo de participar mais plenamente na vida da Igreja.
Deve-se separar um lugar especial para Maria, não por ser uma tradição comemorada há muitos anos na Igreja ou pelas graças especiais que se pode alcançar, mas porque Maria é nossa Mãe, mãe de todo o mundo e porque se preocupa com todos nós, intercedendo inclusive nos assuntos menores.
Por isso, merece um mês inteiro para homenageá-la.
ACI Digital

quinta-feira, 30 de abril de 2020

Nova datação do Novo Testamento (Parte 11/11): conclusões


Bíblia - Tradição - Magistério

11. CONCLUSÕES
No Capítulo 10 (“Uma Pós-Data Pós-Apostólica”), Robinson examina este problema: se todos os livros canônicos do Novo Testamento (NT) devem ser datados como anteriores ao ano 70 (como ele sustentou nos nove capítulos anteriores), o período de 70 a 100 (que antes se imaginava ocupado por grande parte do NT) deveria ser considerado agora um espaço vazio ou quase-vazio da literatuca cristã? Não se geraria assim uma distância temporal excessiva entre o NT e as primeira produções literárias da Era Subapostólica?
Robinson analisa detidamente quatro dessas produções: a Epístola de Barnabé, o Pastor de Hermas, a Didaqué e a Primeira Epístola de Clemente. Como me resta impossível resumir os seus argumentos, limito-me a apresentar os seus resultados:
    • “Para concluir, pareceria haver bem pouco em conta da seguinte sequência:
    • a Didaque: de 40 a 60
    • 1Clemente: inícios do ano 70
    • Epístola de Barnabé: por volta de 75
    • O Pastor de Hermas: pouco antes de 85″ (pp.334-335).
Geralmente se considera que 1Clemente é do ano 95 ou 96, porque se entende que foi escrita enquanto Clemente era Bispo de Roma; porém, Robinson pensa que, ao escrever esta Epístola, Clemente não era ainda o Bispo, mas algo como que o Secretário de Relações Exteriores da Igreja de Roma, como parece sugerir também o Pastor de Hermas.
O autor começa o Capítulo XI (“Conclusões e Corolários”) apresentando 10 observações gerais (cf. pp.336-348):
1) Há pouca evidência interna para a datação de qualquer dos livros do NT.
2) Em relação à evidência externa, segundo o testemunho da Igreja primitiva, a situação é bem diferente.
3) A pequena quantidade de literatura cristã primitiva e seu caráter ocasional fazem com que o argumento do silêncio (de que tal ou qual livro do NT não existia ou não era ainda conhecido para ser citado ou atestado) seja extremamente precário.
4) Em relação ao uso corrente, convém apelar para um rigor e reserva muito maiores no uso do argumento das citações como um indicador para a datação.
5) Parece apropriada uma crítica similar da segurança com que muitos acadêmicos se pronunciaram sobre as supostas profecias após o evento [de 70].
6) Também é desanimador descobrir quão pouca base existe para muitas das datas atribuídas confiantemente por especialistas modernos aos documentos do NT.
7) Há uma cegueira aparentemente voluntária por parte dos investigadores para coisas que parecem óbvias (p.ex., o porquê de Atos terminar onde termina).
8) Muitas datações de livros do NT foram determinadas mais por um processo de eliminação do que por indicações positivas.
9) Observa-se subjetividade na avaliação dos intervalos requeridos para o desenvolvimento, a distribuição e a difusão [dos escritos do NT].
10) Finalmente, cabe apontar a multiforme tirania das suposições não examinadas, muitas vezes devidas a modismos ou à preguiça acadêmica.
Passando para as conclusões, Robinson enumera os livros do NT na ordem cronológica aproximada em que ele crê que receberam sua composição final. No entanto, indica que se deve considerar que alguns livros (principalmente os Evangelhos) devem ser vistos como produtos de um período de gestação bem mais longo. Simplesmente não é possível dizer que Marcos foi escrito no ano X da mesma forma que, com bastante precisão, se pode afirmar que 1Coríntios foi escrito no ano Y.
A seguir, reproduzo a lista de livros do NT e suas datas. As estações do ano correspondem ao hemisfério norte. O símbolo “~” significa “aproximadamente”. O símbolo “+” colocado no fim de um ano significa “ou um pouco depois”. O símbolo “-” colocado no início de um ano significa “ou um pouco antes”.
  • Tiago: ~47-48
  • 1Tessalonicenses: inícios de 50
  • 2Tessalonicenses: 50-51
  • 1Coríntios: primavera de 55
  • 1Timóteo: outono de 55
  • 2Coríntios: inícios de 56
  • Gálatas: fins de 56
  • Romanos: inícios de 57
  • Tito: fins da primavera de 57
  • Filipenses: primavera de 58
  • Filemon: verão de 58
  • Colossenses: verão de 58
  • Efésios: depois do verão de 58
  • 2Timóteo: outono de 58
  • Marcos: ~45-60
  • Mateus: ~40-60+
  • Lucas: –57-60+
  • Judas: 61-62
  • 2Pedro: 61-62
  • Atos: –57-62+
  • 2-3-1João: ~60-65
  • 1Pedro: primavera de 65
  • João: ~–40-65+
  • Hebreus: ~67
  • Apocalipse: fins de 68 (-70)
Destas conclusões, Robinson extrai 3 corolários:
1) Todos os vários tipos de literatura da Igreja primitiva estavam nascendo mais ou menos concorrentemente no período entre 40 e 70. É o que naturalmente se poderia esperar.
2) O padrão da História da Igreja primitiva sugerido pelos documentos do NT agora reforça o que se deduz independentemente dos Atos dos Apóstolos.
3) Assim como a redução da duração de 50-150+ para 50-100+ desacreditou algumas das formas mais extremas de ceticismo sobre a tradição cristã, assim também uma ulterior redução das datações finais para mais da metade, de -50 até -70, deve tender a reforçar um maior conservadorismo. O autor, que não deixou de ser um teólgo ultra-liberal, insiste que suas conclusões não tornam inútil o estudo crítico do NT dos últimos 200 anos e que ele não quer apoiar uma aproximação obscurantista ou literalista do NT; entretanto, admite que as datações menos tardias tornam menos prováveis as distorções entre os eventos da vida, morte e ressurreição de Jesus e dos escritos eclesiásticos.
Terminarei esta resenha reproduzindo “um comentário um pouco travesso” de A. H. N. Green-Armytage, que Robinson inclui na p.356:
  • “Há um mundo – não digo “um mundo” no qual todos os acadêmicos vivem, mas de todo modo um em que todos eles às vezes se extraviam, e que alguns deles parecem permanentemente habitar – que não é o mundo no qual eu vivo. No meu mundo, se “The Time” e “The Telegraph” contam uma mesma história com palavras um pouco diferentes, ninguém conclui que um deles copiou o outro, nem que as variáveis da história têm algum significado esotérico; porém, nesse [outro] mundo do qual estou falando, isto certamente ocorreria. Ali, nenhuma história deriva jamais dos fatos, mas sempre da versão da mesma história de outra pessoa (…) No meu mundo, quase cada livro, exceto alguns produzidos pelos departamentos de governo, é escrito por um autor; nesse [outro] mundo, quase cada livro é produzido por um comitê e, alguns deles, por uma série completa de comitês. No meu mundo, se eu leio o que o sr. Churchill, em 1935, disse, de que a Europa estava se dirigindo para uma guerra desastrosa, eu aplaudo a sua previsão; nesse [outro] mundo, nenhuma profecia, por mais que esteja enunciada de forma vaga, é jamais feita senão depois do evento. No meu mundo, dizemos: ‘A Primeira Guerra Mundial ocorreu entre 1914 e 1918’; nesse [outro] mundo, eles dizem: ‘A narrativa da guerra mundial tomou forma na terceira década do século XX’. No meu mundo, os homens e as mulheres vivem durante um tempo considerável – 70, 80, inclusive 100 anos – e são equipados com uma coisa chamada ‘memória’; nesse [outro] mundo (ao que parece), eles vêm à existência, escrevem um livro e perecem no ato, tudo como um relâmpago; e se nota neles, com assombro, que ‘preservam traças da tradição primitiva’ sobre as coisas que ocorreram bem dentro do tempo de sua própria vida adulta”.
Veritatis Splendor

quarta-feira, 29 de abril de 2020

A família e isolamento social

Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta
Voltemos à família, fiquemos em casa. O isolamento social, por causa da COVID-19 já nos trouxe alguns questionamentos, ligados à economia, à indústria, ao meio ambiente e à política. De fato, gostaria de nos perguntarmos qual o impacto sobre nossas famílias e sobre nossa vida de fé. Este tempo de confinamento obrigatório pode nos recordar um tempo muito desejado: os casais conviverem, os filhos sendo educados e amados. Faz-nos retornar ao princípio de toda a vida social: a família. Nós cremos na família, sabemos do seu valor insubstituível. Nenhuma instituição poderá superá-la ou realizar o que lhe compete. Quem pode amar como um pai ou uma mãe? Mesmo que alguém faça o papel de pai e mãe, como isto é muito comum, é difícil dizer que psicologicamente assume o lugar do pai humano.
            Em primeiro lugar, a presença. Todos sabemos que presença é mais do que passar algum tempo. É conviver e conversar. Gastar o tempo com aqueles que Deus deu como presente. Eles são perfeitos? Possivelmente não. Mas é possível e necessário conversar a partir de uma compreensão de que eu não sou o centro, que há outra pessoa ou pessoas com as quais convivo. O passar dos anos, com os desafios próprios da convivência familiar, pedem um tipo diferente de postura, de amor que se reinventa. Mas será sempre o mesmo amor, abençoado por Deus, no dia do sacramento. Este tempo nos obrigou ao convívio, à presença.
A harmonia familiar transborda na vida gerada e educada. Cada criança que é gerada é um grande dom de Deus. Todos são importantes. Um filho será sempre muito amado por Deus e pelos pais. Ele é amado porque é filho. De fato, toda criança tem o direito de ter o amor do pai e da mãe. Ambos são necessários, pelas suas características, para a educação de um filho ou filha. Não somente pelo fato que o casal ame o filho, mas, bem importante, que o filho veja o amor dos pais entre si. De fato, os pais “mostram aos seus filhos o rosto materno e o rosto paterno do Senhor” (AL 172). A educação dos filhos é responsabilidade dos pais. A sociedade, com suas instituições, são suplementares, como a escola e a igreja. É aí na família que, no convívio com os pais, as crianças vão internalizando valores, a partir de atitudes que os pais realizam. Mais desafiadora é a fase da juventude na vida familiar. Contudo, é exatamente na família que os adolescentes e jovens confiam e esperam. Não deixemos de conversar com os jovens sobre sua vida e seus sonhos, tantas vezes iludidos pelas ondas do momento. Importante lhes mostrar um Deus que os ama e que sempre está com eles.
Não menos importante é a convivência familiar como um lugar por excelência da vida de oração. Na casa há um pequeno espaço para um “santuário doméstico”. Já se falou tanto disso. De fato é muito importante. Ele nos recorda, pela imagem, que aí mora uma família cristã. Desde que são crianças vão aprendendo que nossa vida é um dom, um grande dom de Deus. As imagens do Crucificado, da Virgem Maria, a foto da família, o rosário e a Sagrada Escritura formam os sinais visíveis de uma vida de fé que inicia aí, na vida familiar. Um pai e uma mãe sabem também falar de Deus, do seu jeito, recordando-lhes de que temos sempre um Deus Criador e seu Filho que sempre está conosco. Como não podem ir à igreja, recolhem-se para rezar em casa, a partir dos meios digitais.
Convivemos mais, amemo-nos mais, rezemos mais. Que oportunidade.
CNBB

Nova datação do Novo Testameto (Parte 10/11): o Evangelho e as Epístolas de João


Bíblia - Tradição - Magistério

10. O EVANGELHO E AS EPÍSTOLAS DE JOÃO
Em relação à questão da autoria da literatura joaneia (Evangelho, 1João, 2João, 3João e Apocalipse), as posições acadêmicas variam muito, desde a que sustenta que o Apóstolo João, filho de Zebedeu, é o autor dos cinco livros, até aquela que sustenta que ele não é autor de nenhum dos cinco, passando por quase todas as outras posições combinatórias possíveis. No entanto, apesar das grandes diferenças sobre a questão da autoria, a grande maioria dos estudiosos concorda em datar os cinco livros mais ou menos entre os anos 90 e 100. Robinson se inclina a pensar que o Quarto Evangelho e as três Epístolas joaneias foram escritas pela mesma pessoa e que essa pessoa é o Apóstolo João. Também, ainda que muitos os diferenciem, pensa que o Apóstolo João é “o discípulo amado” tão mencionado no Quarto Evangelho (sendo que aqui o Apóstolo nunca é mencionado por seu nome); ao contrário, pensa que o Apocalipse foi escrito por outro João, ainda que pertencente ao mesmo círculo joaneu.
As fontes mais antigas (Ireneu de Lião, por volta do ano 180; Cânon Muratoriano, final do século II; Clemente de Alexandria, por volta do ano 210; Eusébio de Cesareia, por volta do ano 325; etc.) dizem que o Quarto Evangelho foi composto pelo Apóstolo João e que este morreu idoso, mas não dizem que foi em sua velhice que compôs o Quarto Evangelho! Essa inferência surge tardiamente, por volta do ano 375, numa obra de Epifânio.
Críticos radicais (como Baur), começaram datando o Evangelho de João bem tardiamente, como o ano 170, mas desde então foram obrigados a reconhecer datas cada vez inferiores. Depois da descoberta do papiro p52, a hipótese de João ter escrito [seu Evangelho] provavelmente na última década do século I foi quase universalmente aceita. Nas recentes introduções ao Novo Testamento ou ao Evangelho de João, a questão da data de composição deste último costuma ser apresentada em poucas palavras e, muitas vezes, até mesmo sem apresentar nenhum argumento. Às vezes, é apresentado o argumento de que João conheceu e empregou um ou mais dos Evangelhos Sinóticos. Pois bem: tendo Robinson já provado que a tese tradicional da redação não-tardia de Mateus, Marcos e Lucas não só é defensável como também bastante plausível, esse argumento não prova que João tenha sido escrito tão tardiamente assim.
Os trabalhos do teólogo protestante inglês Charles Harold Dodd (1884-1973), especialmente em “Historical Tradition in the Fourth Gospel”, de 1963, demonstraram que a tradição que está por detrás do Evangelho de João encontra-se tão próxima da fonte palestinense como as que estão por detrás dos outros três Evangelhos. João apresenta com exatidão (às vezes, até mais que os Sinóticos) a topografia de Jerusalém, a situação política e as divisões geográficas e psicológicas da Palestina anteriores à “guerra judaica” e emprega “metáforas e argumentos que seriam ‘apenas inteligíveis’ fora de um contexto puramente judeu em período bem menos tardio” (p.264).
Isto levanta a seguinte questão capital: qual foi a relação do evangelista com essa tradição antiga? Ou, em outras palavras, como cubrir a grande lacuna temporal existente entre ambos (fonte e Evangelho)? Robinson analisa as três formas possíveis de se resolver este problema:
1) Negar que a tradição esteja tão próxima aos eventos no espaço ou no tempo, como se afirma;
2) Preencher a lacuna estabelecendo uma cadeia contínua de laços entre seus dois extremos;
3) Negar que o evangelista esteja tão afastado ou isolado da sua tradição, como se afirma aqui.
Robinson pensa que o primeiro enfoque foi superado por Dodd e outros:
  • “Não é necessário repetir aqui a massa de evidências que em anos recentes levou a uma importante revalorização da tradição histórica que está por detrás do Quarto Evangelho, reforçando a conclusão, sempre sustentada pelos acadêmicos conservadores, de que reflete um contato íntimo com um mundo palestinense eliminado do mapa no ano 70 d.C.” (pp.267-268).
Robinson toma Raymond Edward Brown (1928-1998), sacerdote e exegeta católico norte-americano, como representante típico do segundo enfoque. Brown postula um mínimo de cinco etapas na composição do Quarto Evangelho:
a) Entre os anos 40 e 60, o Apóstolo João conserva um corpo de material tradicional sobre as palavras e atos de Jesus;
b) até o ano 75, os discípulos de João desenvolvem este material em estilo joaneu;
c) até o ano 80, um desses discípulos (o evangelista) organiza o material em um Evangelho joaneu;
d) até o ano 90, o evangelista produz uma segunda edição desse Evangelho;
e) até o ano 100, outro discípulo (o redator) produz a terceira e última edição do Quarto Evangelho.
Robinson rejeita alguns dos argumentos de Brown (p.ex., não considera que a crítica moderna tenha demonstrado que a história da unção, em João 12,1-7, seja uma mistura de duas histórias diferentes) e acaba insinuando que, visto que Brown supôs um desenvolvimento mais ou menos paralelo dos quatro Evangelhos, se (como Robinson quis mostrar) os Evangelhos Sinóticos são anteriores ao ano 70, então não há boas razões para postular um período de composição do Evangelho de João que duplica com os acréscimos dos outros três Evangelhos.
Para apoiar o terceiro enfoque, o autor começa rejeitando o argumento de que João pressupõe a expulsão formal dos cristãos da sinagoga. Anatematizar os hereges já era uma disciplina regular em Qumran e as palavras que designam esse tipo de exclusão da comunidade religiosa são empregadas em muitos outros livros do Novo Testamento.
O Evangelho de João está cheio de polêmicas “contra os judeus” (os judeus que rejeitam Cristo, se subentenda), mas não tem uma só alusão à destruição nem à ruína do Templo, nem à queda de Jerusalém. Alguns creem ver uma alusão a esse fato histórico nas palavras dos líderes judeus em João 11,47-50. Porém, o próprio evangelista diz a seguir que o que Caifás profetizou foi a morte redentora de Jesus (cf. João 11,51-52). Robinson conclui que não é razoável que o Quarto Evangelho tenha sido escrito após o ano 70 e que, inclusive, deve ter sido escrito algum tempo antes. Ele pensa que o horizonte histórico que corresponde ao Quarto Evangelho é o do ano 65.
Robinson argumenta que João é principalmente dirigido aos judeus e não aos gentios. De fato, nem sequer menciona os gentios, exceto Pilatos e seus soldados. Este é, talvez, o melhor lugar para inserir um argumento bastante forte, que Jean Carmignac extraiu de “Redating the New Testament”, porém que ele desenvolveu mais claramente que o próprio Robinson. Esse argumento se baseia na diferente situação do pagão e do judeu que se convertiam ao Cristianismo. O pagão precisava aceitar principalmente seis verdades religiosas, totalmente novas para ele:
1) a existência de Deus (os pagãos acreditavam em deuses, não em um Deus único e pessoal);
2) que Deus criou o mundo (a noção de Criação era desconhecida fora do judaísmo);
3) que Deus falou no Antigo Testamento;
4) que Deus quis salvar o seu povo e lhe prometeu um Messias;
5) que esse Messias era Jesus;
6) que Jesus é o Filho de Deus.
Ao contrário, o judeu já acreditava nas quatro primeiras verdades; portanto, para se tornar cristão, apenas tinha que acrescentar à sua fé as últimas duas verdades: que o Messias era Jesus e que Jesus é o Filho de Deus. Pois bem: em quase todo o Novo Testamento, se dão por supostas a existência de Deus, a Criação, a inspiração da Escritura e a promessa do Messias; mas, pelo contrário, muitas vezes se tenta provar que Jesus era o Messias e o Filho de Deus. Há uma exceção: o discurso de São Paulo no Areópago de Atenas (cf. Atos 17,22-31), onde ele, pela única vez, fala perante um auditório puramente pagão. Ali Paulo aborda imediatamente os temas da existência de Deus, da Criação e do envio de um Salvador da parte de Deus, temas totalmente desconhecidos pelos pagãos e não tratados no restante do Novo Testamento.
De tudo isto se deduz que, quando o Novo Testamento foi escrito, a missão cristã tinha ainda como destinatários principais os judeus e os prosélitos (pagãos integrados ao judaísmo, que já guardavam a fé judaica). Mas esta situação só se deu nas primeiras décadas da História da Igreja. Apesar da concentração inicial da missão cristã nas comunidades judaicas, o Cristianismo se expandiu tanto entre os pagãos que já por volta do ano 70 as comunidades cristãs de diversos lugares eram compostas, na sua maioria, por pessoas vindas diretamente do paganismo. Este fenômeno se acentuou ainda mais depois do ano 70 e da expulsão dos judeus-cristãos da sinagoga. Disto se pode concluir que todo o Novo Testamento é anterior ao ano 70 (cf. Jean Carmignac, “Juifs et païens face à la conversion au Christ et date du Nouveau Testament selon Robinson”, in: Les Nouvelles de l’Association Jean Carmignac, n° 1 – Jan./1999, pp.2-4; http://www.abbe-carmignac.org).
Não há dúvida de que João 21 é um Epílogo acrescentado posteriormente ao Quarto Evangelho e que este originalmente terminava em 20,31. Também é quase certo que João 21,18-23 pressupõe a morte de Pedro, o que faz com que João 21 seja datado algum tempo após o ano 65.
Quanto ao Prólogo (João 1,1-18), Robinson não vê “razão nenhuma para supor que sua origem seja não-cristã ou que deva ser atribuído a uma outra mão” (pp.282-283):
  • “O material de Qumran (…) eliminou todo dogmatismo de que as categorias joânicas fundamentais devem ser helenísticas e tardias. Igualmente o estudo do novo material gnóstico, que serviu para demonstrar mais o abismo do que as semelhanças entre o Quarto Evangelho e os sistemas gnósticos do século II” (p.284).
As Epístolas de João foram originalmente destinadas a comunidades judaico-cristãs da Ásia Menor. Apresentam características bastante semelhantes às de Judas e 2Pedro: total ausência de referências à perseguição [contra os cristãos] e ênfase na denúncia dos falsos mestres. É, pois, razoável supor que todas essas epístolas foram compostas mais ou menos ao mesmo tempo. 1-2-3João pressupõem que o Apóstolo João esteve orientando as mencionada comunidades durante alguns anos.
Robinson dedica a parte final do Capítulo IX (pp.298-311) a discutir a questão da autoria do Evangelho e das Epístolas de João. Em suma, Robinson considera errôneo rejeitar a identidade entre o Apóstolo João e o Evangelista ou entre aquele e “o discípulo amado”. Como resultado da sua análise, propõe a seguinte tentativa de cronograma (cf. p.307):
  • 30-50 – formação da tradição joaneia e do proto-Evangelho, em Jerusalém
  • 50-55 – primeira edição de nosso Evangelho atual, na Ásia Menor
  • 60-65 – 2-3-1João
  • 65+ – a forma final do Evangelho, com o Prólogo e o Epílogo
Veritatis Splendor

Nova datação do Novo Testamento (Parte 9/11): o livro do Apocalipse


Bíblia - Tradição - Magistério

9. O LIVRO DO APOCALIPSE
  • “O livro do Apocalipse é o único, entre os escritos do Novo Testamento, que foi datado pela tradição primitiva” (p.221).
A data da composição do Apocalipse foi tratada de forma prevalente pela Tradição (dada como em torno do ano 95, no final do reinado de Domiciano): teve seu primeiro apoio em uma obra do ano 180 de Ireneu de Lião, nativo da Àsia Menor, que conheceu Policarpo, Bispo de Esmirna, o qual, por sua vez, conheceu o Apóstolo João.
  • “É difícil crer que uma obra tão vigorosa quanto o Apocalipse possa ser verdadeiramente produto de um nonagenário, como João filho de Zebedeu deveria ser então, inclusive se ele fosse cerca de dez anos mais jovem que Jesus” (p.222).
No século XIX, os exegetas em geral, inclusive os racionalistas, tendiam a atribuir ao Apocalipse uma data de redação não-tardia (entre os anos 68 e 70), contrária à data tardia tradicional. No século XX, essa situação se reverteu a tal ponto que Robinson só conhece dois defensores da datação não-tardia.
No tocante a evidência interna do Apocalipse, Robinson analisa em primeiro lugar os capítulos 1 a 3: as cartas dirigidas às sete igrejas da Ásia Menor. Esta primeira parte do Apocalipse corresponde a uma situação bastante similar à observada em 1Pedro:
  • “Ambos [os escritos] são dominados por uma situação política que exige o pseudônimo simbólico ‘Babilônia’ e por uma situação escatológica que obriga à esperança de que agora a consumação não pode tardar muito. Ambos também pressupõem que a perseguição ultrapassou Roma e chegou à Ásia” (p.226).
Também há importantes paralelos entre Apocalipse 1-3 e Judas e 2Pedro quanto à denúncia dos falsos mestres, que em Apocalipse 2,6.15 são identificados com os nicolaítas. Ao que parece, os nicolaítas pretendiam combinar a vida cristã com o culto aos ídolos. Por outro lado, o Apocalipse parece pressupor que a separação final entre cristãos e judeus ainda não tinha ocorrido (cf. Apocalipse 2,9; 3,9).
Robinson refuta duas objeções habituais contra a datação não-tardia:
1) Muitos autores repetem que Policarpo, em sua Epístola aos Filipenses, afirma que a sua própria igreja de Esmirna fora fundada após a morte de Paulo, motivo pelo qual Apocalipse 2,8-11 não poderia ter sido escrito em 68/70. No entanto, tudo o que Policarpo diz é que os filipenses se converteram ao Evangelho antes dos esmirnenses.
2) Também se objeta que Laodiceia foi destruída por um terremonto no ano 60 ou 61, razão pela qual sua igreja não podia ser rica em 68/70. “Porém, a cidade se orgulhava de ter se reconstruído sem esperar a ajuda de fundos imperiais, e até o final dessa década bem poderia estar se orgulhando: ‘sou rica, me enriqueci e não necessito de nada’ (Apocalipse 3,17)” (p.230).
Quanto à segunda parte do Apocalipse (capítulos 4 a 22), Robinson analisa dois dos seus principais temas: a perseguição e o culto imperial. Apocalipse 4-22 pressupõe claramente uma grande perseguição aos cristãos por parte do Império Romano. Da lista tradicional das dez grandes perseguições romanas à Igreja, somente as duas primeiras (a de Nero, por volta do ano 64, e a de Domiciano, por volta do ano 95) podem ser aludidas pelo Apocalipse. Robinson se inclia para a perseguição de Nero, entre outras razões porque foi bem maior e mais sangrenta que a de Domiciano. Ademais, de longe a solução mais aceita para a cifra de Apocalipse 13,18 é aquela que afirma que o 666 (“o número da besta”) representa o nome “Nero César”. Nero, que se suicidou com sua própria espada, pode muito bem ser a besta que tinha uma ferida mortal de espada e sobreviveu em seus sucessores tirânicos (cf. Apocalipse 13,3.12.14).
No tocante à objeção de que o decreto que ordenava adorar o imperador ou sua estátua não pode ter sido mencionado em 68/70 porque seria bem posterior, Robinson responde o seguinte:
  • “Tudo o que alguém pode dizer é que ainda que a evidência do culto imperial não exclua uma data domiciana, tampouco a estabelece. A linguagem de adoração obrigatória ao imperador por todo o mundo, sob pena de morte, em todo caso não deve ser tomada literamente. A tarefa do vidente é distinguir, não descrever. O que ele enxerga na visão não ocorreu mais na época de Domiciano do que na época de Nero: ele está projetando sobre o fim – a era do Nero redivivo – o resultado inevitável de uma tirania totalitária” (pp.237-238).
O autor analisa profundamente esta passagem-chave para a datação do livro:
  • “As sete cabeças são as sete colinas sobre as quais a mulher está sentada e também são sete reis: cinco caíram, um subsiste, outro não chegou, mas quando chegar permanecerá por pouco tempo. A besta que existia, mas já não existe, é o oitavo, ainda que ele seja também um dos sete, e permanecerá até a perdição” (Apocalipse 17,9-11).
Roma é a cidade das sete colinas. Os sete reis são evidentemente sete imperadores de Roma. Se se lê esta passagem sem a ideia preconcebida de que o sexto rei é Domiciano, a interpretação da passagem fica bem simples e natural: os cinco primeiros reis, que já caíram, são: Augusto, Tibério, Calígula, Cláudio e Nero. O sexto rei, que subsiste, é Galba, que reinou de 8 de junho de 68 a 15 de janeiro de 69. O sétimo rei, que ainda não chegou e quando chegar permanecerá por pouco tempo, é Otão, que reinou de 15 de janeiro a 16 de abril de 69. A besta, o oitavo rei, simbolicamente também é Nero (um dos sete) redivivo. Portanto, o próprio Apocalipse diz que foi escrito em 68/69.
Robinson pensa que o autor do Apocalipse compartilhou dos sofrimentos dos cristãos de Roma durante e depois da perseguição de Nero e reergue uma tese de Edmundson que reconcilia genialmente o dado da Tradição (de que João foi exilado por Domiciano e liberado por Nerva) com a datação não-tardia do Apocalipse: Domiciano teria enviado João para o exílio no ano 70, sendo ainda cônsul imperial em Roma, e Nerva, seu colega de consulado, teria anulado a ordem de Domiciano no ano seguinte.
Por fim, tampouco o Apocalipse contém alguma referência explícita à destruição de Jerusalém e seu Templo pelos romanos, o que seria muito estranho se tivesse sido escrito depois do ano 70.
Veritatis Splendor

São Pedro Chanel - Presbítero mártir (†1841)

S. Pedro Chanel | ALETEIA
28 de abril
São Pedro Chanel
Pedro Chanel, em francês Pierre-Louis-Marie, nasceu em Montrevel-en-Bresse, na França, no dia 12 de julho de 1803.
Aos doze anos, após o convite de seu pároco, Pe. Trompier, iniciou seus estudos no seminário, o que lhe permitiu entrar no seminário maior de Bourg, em 1824, e onde recebeu três anos depois a ordenação sacerdotal.
Quis imediatamente sair em missão, mas seu bispo precisava urgentemente de padres. Foi durante algum tempo vigário de Amberieu e Gex.
Em 1831, no entanto, seu desejo de servir em missões estrangeiras o levou a ingressar na recém-fundada “Sociedade de Maria”, a quem foi confiada, após seu reconhecimento formal em 29 de abril de 1836, a evangelização da Oceania Ocidental. Depois de emitir os três votos religiosos nas mãos do padre Colin, fundador e pai superior dos maristas, Chanel embarcou no mesmo ano para sua distante missão sob a orientação do bispo Bataillon e foi enviado à ilha de Horn, que os geógrafos chamavam de Allofatu e os nativos de Futuna. Futuna é uma pequena ilha entre o equador e o trópico de Capricórnio, no Oceano Pacífico e faz parte do conjunto de ilhas que formam o arquipélago conhecido como Ilhas Fiji.
Quando o navio chegou a Futuna, Pedro Chanel foi convidado a desembarcar e ficar lá, na companhia do irmão leigo Nicécio, de vinte anos. As guerras tribais e a prática do canibalismo haviam reduzido a população para alguns milhares de pessoas quando Chanel desembarcou em suas margens. Pe. Pedro fez uma penetração lenta e paciente no pequeno mundo daquelas pessoas tão diferentes em estilo de vida e mentalidade, se comprometendo fielmente diante das grandes dificuldades, aprendendo a língua dos nativos, cuidando dos enfermos, batizando os moribundos e conquistando o apelido de “homem de bom coração”.
Niuliki, governante das Ilhas Fiji à época, inicialmente teve uma atitude amigável para com o missionário, até chamando-o de “tabu”, que é sagrado e inviolável, mas quando viu que seus súditos estavam sendo demovidos de seus ídolos em relação à religião do homem branco, emitiu um decreto contra ele para impedir conversões ao cristianismo. Durante esse mesmo período, seu filho Meitala se converteu ao cristianismo. No entanto, este sucesso marcou ao mesmo tempo a exacerbação da hostilidade das gerações mais velhas.
Pouco tempo depois, Musumusu, primeiro ministro de Niuliki e hostil ao cristianismo, planejou uma conspiração juntamente com vários chefes contra os cristãos, que foi realizada com grande crueldade. Ao amanhecer de 28 de abril de 1841, os conspiradores se encontraram e, depois de ferir muitos neófitos surpresos durante o sono, foram para a cabana de Chanel. Um deles quebrou seu braço e o feriu na têmpora esquerda com um taco. Outro nocauteou-o com uma baioneta. Um terceiro bateu nele com um bastão. Enquanto o missionário pronunciava palavras de resignação gentil, Malie fuai (isto é, bom para mim), o próprio Musumusu, enfurecido pela morte tardia, esmagou o crânio do mártir com um machado.
Os restos mortais do missionário, enterrados às pressas, foram posteriormente reivindicados por M. Lavaux, comandante francês da estação naval do Taiti, e levados de volta à França por transporte governamental, em 1842.
O processo de beatificação de Chanel, iniciado em 1857, terminou em 16 de novembro de 1889 com o Rito Quemadmodum Abreviado. O rito solene de beatificação foi presidido pelo Papa Leão XIII e ocorreu no dia seguinte em Roma, na Basílica de São Pedro, no Vaticano.
Foi canonizado em 13 de junho de 1954 pelo papa Pio XII.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF