Por que o álcool é tão perigoso para o cérebro dos jovens
Por David Robson (*)
BBC Future
05 de abril 2024
Completei 18 anos um dia antes de sair de casa para
cursar a universidade.
Convenientemente, atingi o limite legal para
poder comprar
bebidas alcoólicas no
Reino Unido bem a tempo de visitar os bares e pubs estudantis.
Na minha primeira consulta perto da casa nova, a
médica perguntou quantas unidades de
álcool eu bebia por semana.
É uma forma comum de avaliar o consumo de álcool
aqui no Reino Unido – 1,5 unidades equivalem a cerca de uma taça pequena de vinho.
"Cerca de sete", respondi, calculando
rapidamente algumas discretas doses de vodca com suco de laranja que eu tomava
quando saía à noite com os amigos do tempo de escola. Achei que fosse pouco e
nunca fui muito de desrespeitar as regras.
"Isso vai aumentar, agora que você está
aqui", respondeu a médica, com um sorriso seco.
Ela não estava errada. Em algumas semanas, eu
estava alegremente esvaziando uma garrafa de vinho antes de alinhar shots no
bar dos estudantes.
Eu sabia que beber demais poderia causar
prejuízos para o resto da vida, mas não imaginava que minha juventude aumentasse esse perigo, em
comparação com pessoas com 30, 40 ou 50 anos. Eu pensava que os riscos seriam
certamente os mesmos para todos os adultos.
Se eu soubesse o que sei agora sobre como o álcool
pode afetar o cérebro dos jovens adultos, eu teria sido um pouco mais
cauteloso.
Aos 18 anos, meu cérebro ainda estava se
transformando e só atingiria a
maturidade pelo menos sete anos depois. Este processo altera a forma como
reagimos ao álcool – e beber nesse período crítico pode ter consequências de
longo prazo para o nosso desenvolvimento cognitivo.
Conversando com pesquisadores sobre os impactos do
álcool sobre os jovens, fui também surpreendido por muitas outras descobertas.
Pesquisas em todo o mundo começam a desmentir uma
série de conceitos comuns sobre a idade e o álcool, como a ideia de que a
cultura da bebida na Europa continental é mais saudável do que no Reino Unido
ou nos EUA. Ou que permitir que os jovens bebam em casa com as refeições ensina
a eles o consumo responsável do álcool.
Decidir se as novas descobertas científicas devem ou não alterar nossas leis atuais sobre a bebida é uma questão política complexa. Mas o maior conhecimento dos fatos pode, pelo menos, permitir que as gerações futuras tomem decisões mais informadas sobre suas formas de confraternização – e podem ajudar os pais a decidir como lidar com o álcool dentro de casa.
Corpos pequenos, cérebros grandes
Antes de tudo, vamos deixar um ponto muito claro: o
álcool é uma toxina. Seus riscos incluem acidentes fatais, doenças do fígado e
muitos tipos de câncer.
Até pequenas quantidades podem ser carcinogênicas,
o que levou a Organização Mundial da Saúde a declarar que "quando o
assunto é o consumo de álcool, não existe quantidade segura que não afete a
saúde".
Mas poucas atividades são totalmente livres de
riscos e os perigos costumam ser ponderados em comparação com os prazeres que o
álcool pode gerar. Por isso, nossas políticas de saúde são orientadas pelo
princípio de limitação dos danos, bebendo moderadamente.
Nos Estados Unidos, este nível é definido como não
mais de duas doses por dia para os homens e não mais de uma dose por dia para
as mulheres. E muitos outros países estabelecem orientações similares.
A cerveja e o vinho costumam ser considerados
bebidas mais seguras, como indicam as orientações americanas, mas o fator
importante não é o tipo de bebida e sim a quantidade de álcool consumida.
"Uma cerveja de 350 ml tem aproximadamente a
mesma quantidade de álcool de uma taça de 150 ml de vinho ou uma dose de 45 ml
de licor", dizem as orientações vigentes nos Estados Unidos.
A legislação sobre a idade em que é permitido
comprar bebidas alcoólicas segue lógica similar à limitação dos danos. A lei
protege as crianças e permite aos jovens adultos fazer suas próprias escolhas.
Na maioria dos países europeus e no Brasil, a idade
mínima é de 18 anos, enquanto, nos Estados Unidos, é de 21 anos de idade.
Mas o álcool pode ser mais perigoso para os mais
jovens por diversos motivos, mesmo após a idade mínima estabelecida por lei. Um
deles é o tamanho e o formato do corpo.
Os adolescentes não atingem a altura que terão na
vida adulta antes dos 21 anos. E, mesmo depois que pararem de crescer, eles
podem não ter o volume corporal de uma pessoa na casa dos 30 ou 40 anos de
idade.
"Beber um copo de álcool, portanto, resulta em
teor de álcool no sangue mais alto nos jovens do que nos adultos", afirma
Ruud Roodbeen, pesquisador em pós-doutorado da Universidade de Maastricht, na
Holanda. Ele é o autor do livro Beyond Legislation ("Além da legislação", em tradução
livre), que examina o impacto do aumento da idade mínima para beber.
A estrutura reduzida do corpo dos adolescentes
também é caracterizada por maior relação entre a cabeça e o corpo.
Eu certamente tenho consciência de que me parecia
um pouco com um daqueles bonecos "cabeçudos" de brinquedo. E essas
proporções relativas também podem influenciar os efeitos do álcool nas pessoas.
Quando você bebe álcool, ele entra no seu fluxo
sanguíneo e se espalha pelo corpo. Em cinco minutos, o álcool atinge o seu
cérebro, cruzando facilmente a barreira hematoencefálica que costuma proteger o
cérebro contra substâncias prejudiciais.
"Uma parte relativamente grande do álcool
acaba no cérebro dos jovens e esta é mais uma razão que os leva a terem maior
propensão a ficar intoxicados pelo álcool", explica Roodbeen.
* David Robson é um escritor
de ciências premiado. Seu próximo livro (em inglês) chama-se As Leis da Conexão: A Ciência Transformadora de Ser Social, a ser publicado em junho
de 2024 pela editora Canongate (no Reino Unido) e pela Pegasus Books (nos
Estados Unidos e no Canadá). Sua conta no X (antigo Twitter) é @d_a_robson. Ele também pode ser
encontrado com o nome @davidarobson no Instagram e no Threads.
Leia a versão original desta reportagem (em inglês).
Fonte: https://www.bbc.com/portuguese
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