«Guardamos um tesouro precioso e extraordinário»
Entrevista com Antonio Mattiazzo, bispo de Pádua
Entrevista com Antonio Mattiazzo por Stefania Falasca
«Gostaríamos que não nos acontecesse o que aconteceu aos Magos quando chegaram a Jerusalém vindos do Oriente e perguntaram: “Onde está aquele que nasceu Rei dos Judeus?” ( Mt 2, 2). Os habitantes de Jerusalém não perceberam isso. Assim aconteceu que os cristãos ortodoxos orientais, monges do Monte Athos e o Metropolita de Tebas, vieram a Pádua para venerar São Lucas, enquanto muitos paduanos desconheciam a tradição da sua presença em Pádua. Se os resultados das análises científicas convergirem para estabelecer a consistência da tradição, nós, em Pádua, devemos perceber o tesouro precioso e extraordinário que guardamos." Isto foi afirmado pelo bispo de Pádua, Antonio Mattiazzo, por ocasião da festa anual de São Lucas, no dia 18 de outubro. De facto, nos dias 17 e 18 de Outubro passado, as relíquias do evangelista Lucas foram expostas à veneração dos fiéis na Basílica de Santa Giustina, em Pádua.
Excelência, no dia 17 de setembro foi aberta na Basílica de Santa Giustina a urna contendo as relíquias atribuídas a São Lucas Evangelista para a realização de um levantamento científico. Qual foi o motivo que o levou a tomar essa importante decisão? ANTONIO MATTIAZZO: A razão que me levou a tomar esta decisão foi um pedido completamente inesperado que me veio do Arcebispo de Tebas, Sua Eminência o Metropolita Hieronimus. Numa carta, escrita em grego e datada de 18 de Outubro de 1992, o Metropolita de Tebas, que tinha vindo a Pádua para venerar São Lucas, pediu-me que doasse à Igreja de Tebas «um significativo fragmento das relíquias para ser colocado onde quer que se encontre e é venerado hoje o túmulo sagrado do evangelista”. Com efeito, o arcebispo de Tebas não tinha dúvidas de que as relíquias conservadas na igreja de Santa Giustina eram as do evangelista Lucas; que o corpo de São Lucas, originalmente enterrado em Tebas e de lá transferido para Constantinopla, foi posteriormente transportado para Pádua. Na sua carta propôs também organizar celebrações solenes em honra do evangelista e acrescentou: «Acreditamos que estas celebrações aproximarão os fiéis das duas dioceses, aprofundarão a fraternidade dos dois bispos, aumentarão o caminho de ecumenismo, coisas hoje mais do que nunca necessárias nas atuais circunstâncias”.
Seguindo esse pedido, você criou uma comissão científica...
MATTIAZZO: Sim, comecei a constituir uma comissão com a tarefa de examinar a
questão da consistência histórica da tradição relativa à presença das relíquias
de São Lucas em Pádua, mas a necessidade de proceder, além da análise,
imediatamente tornou-se claro histórico, também para um reconhecimento
científico dos restos mortais. Nomeei, portanto, um pequeno comité
científico para esse fim. Quando tomamos então conhecimento da escritura
notarial do reconhecimento realizado às relíquias em 1463 e, a partir de um
estudo histórico do professor Prevedello, monge do mosteiro beneditino de Santa
Giustina, soubemos que o crânio do suposto corpo de Santa Lucas foi transferido
para Praga, na Catedral de São Vito, em 1354, e membros do comitê científico pediram
para poder examiná-lo. Escrevi então uma carta ao Arcebispo de Praga,
Cardeal Miloslav Vlk, pedindo-lhe que nos emprestasse a relíquia da caveira
para reconhecimento.
Porém, somente em setembro deste ano a comissão científica pôde examinar o
crânio atribuído a São Lucas preservado na Catedral de Praga...
MATTIAZZO: A resposta demorou um pouco. Na verdade, o meu pedido fazia
parte de uma disputa em curso entre o Estado e a Igreja na República Checa, uma
disputa relativa à propriedade da Catedral de São Vito, confiscada pelo regime
comunista e ainda não devolvida à diocese. Em julho finalmente recebi a
notícia de que a caveira nos seria emprestada por alguns dias. Esta foi
trazida a Pádua no dia 20 de setembro pelo reitor da Catedral de Praga,
monsenhor Jan Matejka, e por um paleontólogo especialista, professor Emanuel
Vlcek, que entretanto realizou um exame cuidadoso da relíquia. Pela minha
parte, informei a Santa Sé sobre a decisão de proceder ao reconhecimento,
solicitando autorização para doar um significativo fragmento das relíquias ao
Metropolita de Tebas, caso o estado do corpo o permitisse. A Congregação
para as Causas dos Santos, consultada também a Secretaria de Estado e o
Conselho Pontifício para a promoção da unidade dos cristãos, comunicou-me a
autorização.
Os estudiosos verificaram como o crânio que chegou de Praga se ajusta
perfeitamente ao esqueleto de Pádua que foi encontrado sem cabeça. Mas
para atestar a autenticidade das relíquias de São Lucas, são necessárias mais
investigações...
MATTIAZZO: Os especialistas agora têm a tarefa de estudar as relíquias, objetos
e documentos que os acompanham com todos os instrumentos científicos
modernos. Pela minha parte, limito-me a salientar a importância
excepcional deste inquérito. Não se trata de estudar a autenticidade das
relíquias de uma figura recente e local, mas de um dos quatro evangelistas,
portanto de valor universal. A nossa fé certamente não se baseia na
autenticidade ou não das relíquias que uma antiga tradição atribui a São Lucas. Mas
se os resultados do reconhecimento convergirem para estabelecer com certeza a
consistência desta tradição, nós, em Pádua, devemos perceber o precioso e
extraordinário tesouro que guardamos. Por isso a Diocese de Pádua,
juntamente com a comunidade dos monges beneditinos de Santa Giustina, depois do
acontecimento do reconhecimento, pretendem valorizar a figura e a obra de São
Lucas também na perspectiva do Jubileu do ano 2000.
Fonte: https://www.30giorni.it/
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