Translate

domingo, 12 de novembro de 2023

Onde nascem o pão e o vinho (4/4)

Onde nascem o pão e o vinho (30Giorni)

Arquivo 30Dias – 11/2005

Onde nascem o pão e o vinho

Um ensaio do bispo emérito de Arezzo. A sociedade camponesa ainda mantém a sua originalidade e valor em comparação com o mundo das megacidades e da alta tecnologia?

por Giovanni D’Ascenzi

O risco de que o mundo rural fique reduzido à margem, ou quase submerso, foi denunciado diversas vezes com singular intuição por Pio XII há vinte e cinco ou trinta anos. Que o Papa nunca deixou de afirmar a necessidade de «preservar a sua fisionomia para a vida espiritual, social e económica do mundo rural, e garantir que tenha uma ação, se não preponderante, pelo menos igual a toda a sociedade humana» (ao participantes no Congresso Internacional sobre a vida rural, 2 de julho de 1951).

Pio XII viu profeticamente que tanto o capitalismo industrial como o marxismo negligenciaram o mundo rural, na verdade atacaram-no, pondo em perigo a sobrevivência da sua civilização. Não é de admirar, porque, em última análise, o capitalismo e o marxismo apostaram as suas cartas no desenvolvimento da indústria em detrimento da agricultura e nas concentrações urbanas, que oferecem massas de consumidores a um e massas de manobra ao outro.

O risco de que o mundo rural fique reduzido à margem, ou quase submerso, foi várias vezes denunciado com singular intuição por Pio XII. Que o Papa nunca deixou de afirmar a necessidade de «preservar a vida espiritual, social e económica do mundo rural a sua fisionomia, e garantir que ela tenha uma acção, se não predominante, pelo menos igual, em toda a sociedade humana»

Em comum perseguem o mito da produção e concebem o trabalho humano ao serviço da produção, pouco preocupados com o papel de responsabilidade e iniciativa que é garantido ao trabalhador. Daí o ambiente alienante das grandes fábricas (capitalistas ou socialistas), onde o trabalho é fragmentado e despersonalizado; daí a exploração imprudente dos recursos naturais; poluição do meio ambiente; finalmente, do ponto de vista socioeconómico, os desequilíbrios regionais, setoriais e sociais e o fenómeno da concentração urbana.

A preocupação com a economia e a concorrência ordena efetivamente as escolhas e os processos de produção, excluindo considerações éticas; o dever de trabalho, valor tradicional do mundo rural, dá lugar ao salário do trabalho; a colaboração interpessoal é substituída pelo conflito permanente entre classes. Neste ambiente, o espaço para a afirmação da pessoa e para os valores do espírito permanece modesto; em vez disso, o materialismo prático, o hedonismo e o ateísmo em massa florescem e prosperam ali.

O mundo rural moderno, embora reduzido a um “resto” de pequenas proporções e atacado pelas tensões e sugestões da civilização industrial, ainda apresenta condições socioambientais profundamente diferentes e vivencia uma forma diferente de viver e conviver. No mundo rural ainda prevalece o trabalho pessoal e responsável, onde quem o realiza se sente protagonista; as relações sociais são interpessoais, baseadas no conhecimento mútuo, abertas ao respeito, à amizade e à solidariedade. O homem rural sabe que na natureza existe uma ordem imanente, da qual ele próprio faz parte; esta ordem é complexa, delicada e o ser humano deve compreendê-la e preservá-la com respeito religioso. Em última análise, a concepção da vida e do cosmos dos povos rurais era uma concepção "sacral" ou melhor, ético-religiosa: esta, em última análise, ainda é a característica básica da sua civilização, o anúncio profético que proclama ao mundo urbano-industrial.

Deste caráter natural O intérprete religioso foi Paulo VI, falando aos agricultores italianos em 16 de novembro de 1969: «A agricultura tem um sentido de devoção e um sentido de comunhão: de devoção, antes de tudo, porque facilita o contato com Deus através do contato com a natureza viva, que carrega dentro de si a marca da onipotência criativa de Deus, e a manifesta em suas diversas formas animadas, nas quais pulsa a vida, tanto a dos seres vivos do mundo animal quanto a vida secreta de que secretamente fervilha a mãe terra, irrompendo em suas estupendas produções que são renovados todos os anos. O seu não é, portanto, um contacto com a natureza inerte e inanimada, com a matéria bruta, relutante e surda, que o homem deve dobrar para si com violência, com mecanicidade repetida e monótona, como acontece no mundo da indústria, que no entanto é digno do maior respeito. A agricultura tem então também o sentido da comunhão com os irmãos, porque está ao serviço e aproveitamento direto da vida corporal do homem, oferece à comunidade humana os elementos primordiais da sua subsistência física, as coisas boas que têm o antigo cheiro do pão e do vinho. , e que exigem também o suor do teu rosto e um cuidado assíduo e diligente, que também sabes dar com alegria e sabedoria. Estes valores sempre tiveram a sua eficácia, mas hoje mais do que nunca sentimos a necessidade deles, porque o mundo em que vivemos está dessacralizado, é árido, é egoísta, num coletivismo que é fruto de muitos isolamentos, mônadas e às vezes os inimigos uns dos outros; isto porque hoje o homem - como escreveu um digníssimo Pastor, escreveu o Cardeal Frings com uma análise penetrante - "já não se depara com a obra de Deus, mas com a dos homens que a ela se sobrepôs. É claro que isto tem repercussões decisivas em toda a sua atitude espiritual.

Na história da humanidade, o encontro com a natureza sempre foi uma das saídas mais vitais da experiência religiosa... Portanto, se o acesso à natureza for profundamente modificado ou completamente alterado, uma das fontes primordiais da realidade espiritual seca. O facto de o ateísmo dos tempos contemporâneos ter conseguido difundir-se, antes de mais, no ambiente técnico dos trabalhadores industriais, e aí se ter estabelecido da forma mais vigorosa, tem certamente várias explicações, a começar pelas injustiças cometidas pelo capitalismo inicial, mas uma das mais importante está aqui".

Poderá o mundo rural ter influência, mesmo do ponto de vista religioso, na civilização moderna? Não faltam condições favoráveis: a consciência generalizada de que o modelo de desenvolvimento económico seguido até agora não é o correto. As reservas de matérias-primas estão a diminuir e esgotar-se-iam em poucas décadas se todos os povos atingissem níveis médios de consumo semelhantes aos dos países industrializados do Ocidente. Da mesma forma, a poluição ambiental e as concentrações urbanas criam preocupações muito sérias e situações difíceis de governar; o campo, a serenidade do meio rural, o valor humano do trabalho agrícola são gradualmente redescobertos, através dos contatos multiplicados entre a cidade e o meio rural: o que pode favorecer um diálogo promissor; é necessário colocar o processo produtivo novamente ao serviço do homem e que o homem seja o protagonista; Há também a necessidade de recompor as relações entre classes em relações humanas, nas quais a justiça, a colaboração, a solidariedade dentro das empresas, entre os setores produtivos e entre os povos não sejam apenas palavras bonitas.

Propostas finais

Parece, portanto, que chegou o momento favorável para uma reavaliação do mundo rural, de modo a reconhecer o seu papel nos domínios económico, social e religioso da vida moderna e que agora parece estar colocado na sombra.

O primeiro pré-requisito para que esta função não permaneça apenas uma utopia estéril é a consciência deste papel por parte das próprias populações rurais, o que implica uma vasta ação educativa.
A consciência deve ser seguida do compromisso de viver em conformidade com a própria identidade: o que exige a mobilização das forças tradicionais e novas do mundo rural: a família, a Igreja, a escola, as organizações profissionais, económicas e políticas.

Terceiro momento: o mundo rural deve abrir-se ao diálogo com outras componentes sociais e à participação ativa na construção de uma sociedade diferente, aproveitando todas as oportunidades favoráveis ​​e utilizando todas as ferramentas possíveis. Isto é essencial, não só para salvar os valores civilizacionais de que o mundo rural é portador, mas também para evitar o achatamento de uma sociedade-civilização, caracterizada e dominada pelos processos de produção e pelas leis económicas da indústria.

São propostas que exigem análise e especificação aprofundadas: são confiadas ao debate esclarecido e apaixonado entre aqueles que têm experiência viva do mundo rural e dedicam a mente e o coração ao mundo rural.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Reflexão para o XXXII Domingo do Tempo Comum (A)

Evangelho do domingo (Vatican Media)

“A minh’alma tem sede de vós e vos deseja, ó Senhor” (Sl 62/63). A Palavra de Deus e a Eucaristia nos sustentam e nos dão forças ao longo da semana de trabalho e de estudo.

Cardeal Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

Irmãos e Irmãs, celebramos neste Domingo o trigésimo segundo deste Tempo Comum, dentro de duas semanas encerraremos o tempo comum e consequentemente o ano litúrgico. Os dias têm passado muito rápido, o tempo é curto, fazemos muitas coisas ao longo do dia e dentre essas tantas coisas que fazemos não podemos nos esquecer de Deus. Temos que reservar um tempo ao longo do dia para as nossas orações pessoais e, sobretudo, aos Domingos reservar um horário para participar, de modo completo e piedoso, da celebração da Santa Missa, a nossa Páscoa semanal.

A Palavra de Deus e a Eucaristia nos sustentam e nos dão forças ao longo da semana de trabalho e de estudo. A Igreja nos propõe o ano litúrgico ao longo do ano para acompanharmos os passos de Jesus desde o início de sua vida pública até a morte e ressurreição. Além disso, acompanhamos o projeto salvífico de Deus para toda a humanidade e para cada um de nós.

Meus irmãos, nos últimos Domingos do Tempo Comum a liturgia tem um caráter apocalíptico, ou seja, nos alertando sobre o fim do tempo. Nada que deve nos preocupar nesse exato momento, mas sim, a liturgia nesses domingos nos ensina a estarmos preparados para o dia do nosso encontro com o Senhor Ressuscitado. Jesus fala no Evangelho sobre o Reino dos Céus, que deve ser a meta de todos nós, vivenciar o reino de Deus aqui na terra para contemplá-lo de maneira plena no céu.

Aguardemos ansiosamente a segunda vinda do Senhor, conforme dizemos na liturgia, na parte do rito da comunhão: “enquanto vivendo a esperança, aguardemos a vinda do Cristo Salvador”. Estamos prestes de celebrar o Natal do Senhor, recordamos o nascimento de Jesus há mais de dois mil anos e aguardamos a sua segunda vinda e o seu novo nascimento no presépio de nosso coração.

A primeira leitura da missa desse Domingo é do livro da Sabedoria (Sb 6,12-16), esse trecho da leitura fala justamente sobre a Sabedoria e como podemos encontrá-la. A verdadeira sabedoria vem de Deus e é o próprio Deus, devemos ir em busca dessa sabedoria que vem de Deus e não de outras que existem por aí. A resposta para as nossas dúvidas devemos buscar em Deus na Palavra de Deus.  A Sabedoria que vem da Palavra de Deus nos dá respostas para as nossas dúvidas e nos ajuda a tomar a melhor decisão. Se buscarmos respostas em outras fontes não acharemos o caminho certo. Busquemos sempre a sabedoria de Deus.

O salmo responsorial é o 62 (63), que traz o seguinte refrão: “A minh’alma tem sede de vós e vos deseja, ó Senhor”, devemos desejar sempre estar perto de Deus e buscá-lo constantemente. A primeira coisa que devemos fazer ao acordar é agradecer a Deus por mais um dia de vida, e antes de deitar à noite rezar a Deus agradecendo aquele dia e pedindo a Deus uma noite tranquila. Sobretudo devemos rezar em família, pois família que reza unida permanece unida.

A segunda leitura desse Domingo é da carta de São Paulo aos Tessalonicenses (1Ts 4,13-18) Paulo faz um alerta à comunidade de Tessalônica e para cada um de nós, hoje sobre o dia da “Parusia”, ou seja, o dia do retorno de nosso Senhor Jesus Cristo, conforme rezamos em todas as missas aguardando a sua segunda vinda. No dia da ressurreição final aqueles que morreram aparecerão com seus corpos gloriosos junto com Cristo e em seguida aqueles que aqui ficaram serão arrebatados e serão julgados de acordo com a sua conduta aqui na terra. Aqueles que praticaram o bem irão para a glória eterna e aqueles que praticaram a injustiça ficarão de fora do paraíso. Aqueles que na vida terrena praticaram o bem estarão sempre com o Senhor. Por isso, devemos exortar uns aos outros a praticar sempre o bem.

São Paulo usa ainda essas palavras à comunidade de Tessalônica, pois, tanto ele como os membros da comunidade acreditavam que a segunda vinda de Cristo se daria de forma eminente, ou seja, seria logo, mas, não sabemos quando será o dia e a hora, temos que estar preparados.

O Evangelho desse Domingo é de Mateus (Mt 25, 1-13), conforme já dissemos acima, a liturgia nesses últimos domingos do tempo comum tem um caráter apocalíptico, escatológico, e retrata sobre o que irá acontecer no fim dos tempos, ou seja, na segunda vinda de Cristo Nosso Senhor.

Há alguns domingos Jesus vem falando sobre o Reino dos Céus e que cada um de nós deve fazer o esforço para buscá-lo. Somos convidados a viver a realidade do “já” e “ainda não”, ou seja, edificar o Reino de Deus aqui na terra para contemplá-lo de maneira plena no céu. O Reino de Deus é paz, amor, justiça, bondade e misericórdia, se buscarmos viver tudo isso na terra, viveremos essa justiça eterna no céu.

Jesus, nesse Evangelho, conta a parábola das virgens previdentes e das imprevidentes, cada um de nós tem que ser como as virgens previdentes, ou seja, estar preparados para o encontro com o Senhor. Estejamos com óleos suficientes em nossas lâmpadas para podermos estar de pé diante do Senhor.

Temos que ir acumulando óleo ao longo da nossa vida, ou seja, se formos justos, misericordiosos, se perdoarmos ou amarmos o nosso próximo teremos óleo suficiente para irmos ao encontro do Senhor. Agora, se não praticamos a justiça, a caridade, o amor ao próximo e não somos misericordiosos com quem nos ofende, não teremos óleo suficiente para irmos ao encontro com o Senhor.

Jesus nos faz o alerta orai e vigiai, procuremos praticar sempre o bem ao longo da nossa vida para que possamos ser merecedores da vida eterna. Celebremos com alegria e esperança esse trigésimo segundo Domingo do Tempo Comum, e tenhamos sempre as nossas lâmpadas acesas para irmos ao encontro do Senhor.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

sábado, 11 de novembro de 2023

Como explicar o mal às crianças?

Father and son</a> © izuboky / Shutterstock

Por Família Cristã - publicado em 16/04/15

Uma leitura importante para os pais.

Crimes, guerras, terrorismo e violência fazem parte do mundo que as crianças têm para descobrir. O confronto entre um mundo seguro e protetor e o mundo real pode traduzir-se em dúvidas e medos. E as questões começam a surgir em catadupa. Como podem os educadores responder às crianças? Como colocá-las perante o inevitável sem que isso as deixe paralisadas?

O Homem e o mundo são feitos de contrastes, entre bem e mal, certo e errado, paz e guerra, extremismo e tolerância, e, ainda que se tentasse, seria quase impossível tentar privar os mais novos desta dicotomia. Mas é isto o mesmo que dizer que os miúdos devem estar expostos a todas as violências?

Nos últimos meses, a História da humanidade tem-se construído também com atos particularmente difíceis de assimilar: pessoas assassinadas por uma opinião expressada, pessoas perseguidas pela religião que professam, meninas raptadas, maltratadas e mortas, cujo "crime" foi irem à escola, crianças, muitas crianças assassinadas e algumas utilizadas como bombas.

Nem sempre é fácil perceber onde fica a fronteira entre o contacto desejável com a realidade e a informação em excesso, entre o que é essencial e o que é "sensacionalista", entre o que é necessário e dispensável.

Essa gestão deve, em primeiro lugar, «ser feita pelos educadores», começa por dizer Bento Sério, psicólogo.
E há aspetos a ter em conta. A exposição à violência deve ter «alguns filtros». «Há coisas que nós podemos, se as crianças são muito pequeninas, ter cuidado… naquilo que se vai mostrar, naquilo que se vai dizer.»

O que não é o mesmo que dizer afastar a criança da realidade ou mantê-la numa «paz podre», continua o psicólogo. Até porque em algum momento a criança poderá ser confrontada com a violência, possivelmente sem o enquadramento desejável por parte de um adulto. «A paz que a ignorância traz pode ser rapidamente abalada quando a informação chega de forma inadequada», por exemplo, através de outras crianças e sem a devida contextualização.

A opinião é partilhada por Maria da Conceição Moita, educadora de infância que, numa entrevista por correio eletrónico, explicou que, consoante a fase de desenvolvimento da criança, poderá não fazer sentido expor as crianças a determinadas imagens. «Não faz sentido que vejam telejornais (e mesmo outros programas…) quando não têm capacidade de distanciamento crítico, quando ainda não têm possibilidade de entender o conteúdo da notícia e só veem imagens que lhes sugerem qualquer coisa que as perturba.»

A educadora entende também que, quando já conseguem compreender o que se lhes apresenta, os educadores devem acompanhar as crianças em matéria de violência. «Não só lhes dá segurança como pode ser uma ajuda fundamental no entendimento do que se está a ver/ouvir e na construção de um sentido crítico que não deixe as crianças "desamparadas" perante uma situação que pode ser para elas muito agressiva e chocante. Conheço famílias em que todos veem o telejornal em conjunto, o que propicia o comentário partilhado e emergência de perguntas. O abandono das crianças diante de um televisor é que me parece muito negativo», continua.

Nas explicações dadas pelos educadores, Bento Sério considera que há também outros fatores a que os adultos devem dar atenção, nomeadamente ao que a criança já sabe sobre o tema, «porque provavelmente ela já ouviu qualquer coisa e só quando nós perguntamos à criança o que é que ela sabe sobre isso é que nós ficamos a perceber qual o tipo de resposta que temos de lhes dar, sem ter de estar a dar demasiada informação e a contribuir para que ela se baralhe ainda mais quando se calhar ela apenas queria saber uma coisa simples».

Igualmente importante, em idades mais jovens, é simplificar a linguagem. «Se nós não simplificarmos, provavelmente a seguir a esta questão virá outra. Temos de saber responder de forma clara para garantir que a resposta que lhe damos a satisfaz por completo», afiança o psicólogo. Para além disso, «não vou deixar a criança a pensar sobre o assunto, pois ela não tem capacidade de abstração» para poder «refletir» sobre a questão.

De acordo com cada momento, a criança, à medida que se vai desenvolvendo, vai pedindo explicações mais elaboradas sobre os temas, e Maria da Conceição Moita recorre a um exemplo prático. «Ninguém janta uma vez por todas. As crianças vão aprendendo a História, vão aprendendo a contextualizar, vão vendo as relações humanas de forma mais complexa. É toda uma aprendizagem. Que também se faz ao longo da vida», conclui.

Bento Sério considera que, por vezes, pode acontecer que as crianças fiquem um pouco assustadas quando são confrontadas com o lado escuro da realidade, mas que «há sempre formas de desconstruir algo que não é bom. Não nos podemos esquecer de que estamos a trabalhar com crianças e às vezes demora a que elas consigam entender ou aceitar aquela explicação de uma forma mais leve, não tão assustadora.»

Ainda assim, é possível chegar a um meio-termo entre o medo e a segurança, entre uma vivência descontraída e alguns cuidados a ter. Ao explicar à criança episódios violentos, o adulto pode não só ajudar a criança a aperceber-se e proteger-se dos perigos, mas também a percecionar, para cada aspeto negativo, um positivo.

No fim da história, o que é importante é que a criança perceba que «não está sozinha», defendem os dois especialistas, e que tenha sempre presente que «o Amor nos acompanha», conclui Maria Conceição.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Contexto atual e seus impactos na sociedade e na fé cristã

Sociedade e fé cristã (jessemaia.webnode)

CONTEXTO ATUAL E SEUS IMPACTOS NA SOCIEDADE E NA FÉ CRISTÃ

Dom João Santos Cardoso 
Arcebispo de Natal (RN)

Vivemos em um contexto social, cultural e antropológico complexo, instável e ambivalente. Um olhar crítico sobre a realidade nos mostra que não caminhamos para o apocalipse, mas também não vivemos em tempos ideais. Temos a sensação de estar vivendo um momento de “interregno”, marcado pela incerteza e instabilidade, à semelhança do que Zigmunt Bauman chama de “modernidade líquida” para ilustrar a natureza fluida e em constante mudança da sociedade contemporânea, na qual as instituições e convenções, outrora estáveis e sólidas, tornam-se efêmeras e voláteis. Nesse vácuo, as ideologias de direita e de esquerda disputam as narrativas e geram confusão e dispersão, com noções reducionistas da sexualidade, do matrimônio, da família e da pessoa humana. 

O Documento de Aparecida (CELAM, 2007, n. 33-100), em seu diagnóstico da realidade atual, afirma que vivemos não apenas uma época de mudanças, mas uma mudança de época. Vivemos uma realidade marcada por grandes transformações de alcance global que afetam não somente o mundo inteiro, mas impactam profundamente nossas vidas e nosso modo de pensar. Tais mudanças alteram os critérios de compreensão e os valores mais profundos a partir dos quais identidades são afirmadas e ações e relações são estabelecidas. Essas mudanças engendram tendências desafiadoras, como o individualismo, o fundamentalismo, o relativismo, o laicismo militante, o secularismo e diversas formas de unilateralismo (CNBB, Doc. 102, n. 19). 

O fenômeno da secularização e o secularismo envolvem ideias relacionadas ao processo histórico que deu origem à modernidade, que levou a termo a dessacralização do mundo e a sua autonomia em relação à religião. Enquanto fenômeno complexo com muitas facetas, a secularização não pode ser confundida apenas como rejeição das formas religiosas tradicionais, uma vez que a sua versão mais radical inclui a recusa a qualquer princípio absoluto de caráter metafísico que possa justificar a realidade.  

Em sua narrativa, a modernidade tende a transformar os processos históricos em eventos secularistas, buscando eliminar da base constitutiva das sociedades ocidentais sua memória cristã e qualquer referência a valores religiosos apoiados na força do Sagrado e, em última instância, a recusa do fundamento, consequência última do niilismo, ou seja, da afirmação de Nietzsche da “morte de Deus”. Ao recusar os fundamentos, o secularismo conduz à superação da própria modernidade. 

O Papa Bento XVI abordou as consequências da secularização e do secularismo em seu discurso à Assembleia Plenária do Pontifício Conselho para a Cultura, em 2008. Ele destaca a complexidade das mudanças culturais e religiosas contemporâneas, nas quais a secularização leva ao secularismo e coloca à prova a vida cristã, tanto dos fiéis quanto de seus pastores. Também, descreve a secularização como um delineamento do mundo e da humanidade sem referência à transcendência, no qual Deus se tornou total ou parcialmente ausente da existência e da consciência do ser humano. 

Esses fenômenos não são apenas conceitos abstratos. Eles têm impacto no modo de vida das pessoas. A secularização conduz ao secularismo e agrava a crise antropológica ao negar a transcendência e reduzir a pessoa humana à realidade imanente, como a economia e a biologia. Isso leva à indiferença religiosa e ao crescimento do relativismo, que alimenta o niilismo contemporâneo que pode surgir na ausência de uma base espiritual sólida. Em reação, o fundamentalismo ganha adeptos e, por acreditar ser detentor da verdade absoluta, tende a ser intolerante, sectário, propenso a usar da violência contra seu opositor visto como inimigo. Esses fenômenos não se limitam apenas à sociedade em geral, mas também afetam a própria Igreja, desafiando a fé cristã e influenciando o estilo de vida e o comportamento dos fiéis. 

No contexto de ambivalência e acirramento das disputas ideológicas, o cristão é chamado a dar sempre de novo razão de sua esperança, bem como a apresentar, com renovado ardor, novos métodos e novas expressões, a novidade da pessoa de Cristo como resposta à busca de tantas pessoas pelo sentido da vida. E, no cotidiano, somos desafiados, sem perder nossa própria identidade, a desenvolver a capacidade de adaptabilidade e resiliência para lidar com as constantes mudanças.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Decifrando o número da besta do Apocalipse

MG Stock Studio | Shutterstock
São Miguel, auxiliai-nos nas batalhas espirituais!

Por Igor Precinoti - publicado em 10/11/23

Dentre todos os símbolos e enigmas presentes no Livro do Apocalipse, o que mais gera confusão e discussão entre os leigos e curiosos é o chamado “número da Besta”. Entenda:

O Novo Testamento consiste em um conjunto de 27 livros que contém as informações sobre a vida e os ensinamentos de Jesus Cristo. Estes livros são compostos por narrativas, cartas, relatos sobre a formação das primeiras Igrejas, as atividades apostólicas, ensinamentos e instruções a respeito de questões enfrentadas pelas comunidades da época e, principalmente, o relato da vida, ministério, morte e ressurreição de Jesus. 

Dentre os 27 livros, um chama a atenção por sua característica peculiar, o último livro do Novo Testamento se difere por não apresentar fatos acontecidos ou questões teológicas vivenciadas pelos primeiros cristãos, mas, sim, por descrever eventos futuros, experimentados por São João em visões proféticas. Conhecido como Apocalipse, este livro foi escrito por São João durante o seu exílio na ilha de Patmos, e é um gênero literário escrito em linguagem simbólica e enigmática, com visões proféticas de eventos futuros, incluindo a vinda de Jesus Cristo, o Juízo final etc. 

Dentre todos os símbolos e enigmas presentes no Livro do Apocalipse, o que mais gera confusão e discussão entre os leigos e curiosos é o chamado “número da Besta”. Eis:

… e que ninguém pudesse comprar ou vender, se não fosse marcado com o nome da Fera, ou o número do seu nome. Eis aqui a sabedoria! Quem tiver inteligência, calcule o número da Fera, porque é número de um homem, e esse número é seiscentos e sessenta e seis” (Ap 13,17-18).

Em uma breve pesquisa na internet é possível se deparar com inúmeras teorias conspiracionistas, mais ou menos malucas sobre o significado deste número, desde uma tatuagem obrigatória num futuro próximo, até a implantação de um chip no corpo das pessoas. Não há limites para a imaginação. Mas o que realmente significa este número?

Para o entendimento deste livro, algumas chaves interpretativas são imperativas e compreender alguns aspectos históricos e teológicos são necessários para que o leitor não se perca em interpretações malucas. Neste contexto, é necessário levar em consideração a grave perseguição que os cristãos estavam sofrendo na época do exílio de João. Neste período, o imperador Nero, no auge de sua irracionalidade, literalmente fazia os cristãos de alimento para leões e outras feras ou utilizava os mártires como combustível para tochas e fogueiras.

Outro aspecto necessário para a compreensão deste simbolismo é o fato de São João ser um hebreu, e uma prática comum entre este povo era a chamada Gematria, que consiste na atribuição de um número para cada letra do alfabeto. Por exemplo: a= 1, b= 2, c= 3 etc.), sendo que uma palavra poderia ser representada pela somatória dos números correspondentes às letras que formam a respectiva palavra (“Quem tiver inteligência, calcule o número”).

Então, o que representa este número? Que fera (ou besta) é esta que o número 666 traduz? Por qual motivo quem não tem esta marca em suas mãos não consegue participar do comércio? (“que ninguém pudesse comprar ou vender, se não fosse marcado com o nome da Fera, ou o número do seu nome”; Ap 13,17). Eis que a Gematria responde: Se avaliarmos o nome do Imperador César Nero, em grego Neron Caesar, e o transliterarmos para o hebraico (língua materna de São João) temos as letras hebraicas: Nun, Resh, Vav, Nun, Kuf, Samech, Resh, cujos números correspondentes são: 200+ 6+ 50+ 100+ 60+ 200, que somados dão 666. Ou seja, ao calcularmos o número, chegamos ao nome do Imperador Nero, a Besta perseguidora dos Cristãos.

Este fato pode ser comprovado quando avaliamos outras versões bíblicas, onde o número da besta está registrado como 616, ao invés do 666. Neste caso, a Gematria se refere à transliteração para o hebraico do nome latino de Nero César (e não do nome grego Neron). A retirada do “n” (equivalente a Nun= 50) na versão latina do nome, leva à soma 616. 

A partir desta chave hermenêutica, entendemos toda simbologia deste número. Na época, a figura de César era elevada à divindade sendo exigida a devoção por parte de toda a população; todos os contratos exigiam o selo do imperador, tal qual ainda hoje precisamos de selos cartoriais para a regulamentação de documentos, e a economia também era marcada pela imagem de César, com moedas contendo o seu rosto entalhado (cf. Mt 22,20-21). Curiosamente, as moedas atuais ainda ostentam um rosto em seu verso.

Considerando tudo o que foi escrito até agora, fujamos de qualquer leitura que associe o livro do Apocalipse a maluquices como complô de ordens secretas, implante de chips ou que associem algum político ou ator ao anticristo. Tenhamos sempre em mente que a Igreja Católica não adota uma interpretação fundamentalista ou literalista do Livro do Apocalipse. Em vez disso, enfatiza o significado espiritual e moral das passagens, não se concentrando na especulação sobre eventos futuros. 

Todo cristão deve buscar fontes sérias e confiáveis ao estudar a Bíblia, para não cair em armadilhas de interpretações malucas ou conspiracionistas. Por isso, é importante ressaltar o papel da Tradição da Igreja e a busca dos ensinamentos e interpretação destes textos à luz da Tradição e do magistério da Igreja Católica, que fornecem um rico substrato para a compreensão teológica do texto bíblico.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Onde nascem o pão e o vinho (3/4)

Onde nascem o pão e o vinho (30Giorni)

Arquivo 30Dias – 11/2005

Onde nascem o pão e o vinho

Um ensaio do bispo emérito de Arezzo. A sociedade camponesa ainda mantém a sua originalidade e valor em comparação com o mundo das megacidades e da alta tecnologia?

por Giovanni D’Ascenzi

A formulação das primeiras leis científicas no campo da natureza e a invenção dos meios técnicos mais básicos levaram milênios de história humana. Nos últimos séculos, e ainda mais nas nossas décadas, a ciência e a tecnologia fizeram progressos rápidos e prodigiosos. A estática foi substituída pelo dinamismo; à preocupação de preservar o património tradicional, de superá-lo, procurando o novo. A ciência e a tecnologia dominaram, ou estão dominando, até mesmo a agricultura (química, biologia, mecânica, etc.), demolindo opiniões, métodos de trabalho, certezas que permaneceram indiscutíveis durante séculos. Os processos vitais são principalmente conhecidos em suas circunstâncias, seguidos ou modificados por meios técnicos; doenças, pode-se dizer que os insetos nocivos estão sob controle; o conhecimento no campo da genética permite que intervenções produzam milagres. O agricultor sabe mais e pode fazer mais; ele começa a ter mais fé em suas habilidades e no progresso técnico do que nos ritos religiosos. 

O progresso técnico-científico e a religião da população rural 

A difusão do progresso técnico-científico é prejudicial à religiosidade da população rural? Falando em ciências, referimo-nos aqui às ciências empíricas. Há uma diferença notável entre o conhecimento empírico, típico da cultura tradicional, e as ciências empíricas. Os primeiros são adquiridos observando a repetição dos fenômenos sem compreender as causas imediatas que os produzem e as leis que os regulam; os segundos dão os fenómenos, as causas que os produzem, as circunstâncias em que ocorrem, o conhecimento sistemático, de modo a fazer previsões e permitir intervenções cujos resultados já são conhecidos desde o início. Porém, as ciências empíricas permanecem no âmbito do “empirismo”, ou seja, são ciências do “fenômeno”, não esgotam o conhecimento, deixam muitos sem solução porque não são capazes de nos contar o ser íntimo das coisas, sua origem, seu fim. A resposta às outras porque vem de outras ciências, em particular da ciência do “ser”. Porém, as ciências empíricas, permitindo ao ser humano conhecer as leis imanentes e racionais que regulam os fenômenos do mundo sensível e o seu devir, confirmam a sua contingência e abrem o caminho para a certeza motivada pela existência de um Ser invisível, inteligente, criador da ordem natural.

Onde nascem o pão e o vinho (30Giorni)

Isto é em teoria; na prática o caminho é mais difícil. A ciência e a tecnologia desenvolvem, com sentido crítico, a necessidade de verificação: a tradição religiosa não está isenta desta necessidade, que, quando apoiada quase exclusivamente no controle social e transmite crenças supersticiosas, ritos mágicos, normas opressivas, corre sério risco de repúdio ou é aceita apenas como folclore. Se então nesta fase de revisão crítica o rural se vê atacado pela proposta de um modelo de vida inspirado no hedonismo e no materialismo prático, como aquele hoje sistematicamente divulgado pelos meios de comunicação social e vivido também pelas grandes classes populares, a religião , que ele viu ligado à vida secular de privações e sacrifícios a que as classes camponesas foram condenadas, parece-lhe anacrónico, na verdade, um fardo do qual deve ser libertado o mais rapidamente possível.

A crise interior do homem rural face a estas sugestões e solicitações é agravada pelo sentimento de inferioridade que sente, sobretudo quando se encontra fora do seu meio, face à sociedade urbana, que além disso preserva e impõe uma atitude de superioridade face ao mundo rural.

Porém, quando o homem do campo superar a crise interna e transformar a fé tradicional numa fé pessoal, purificada de quaisquer resíduos e interiorizada, talvez recorra menos ao rito de propiciação e mais aos meios químicos quando se encontrar necessitado de ajuda. combater as doenças do gado, ou desinfestar o campo dos insetos, mas conhecerá os momentos intensos de oração, de contemplação e de louvor, para dar um testemunho singular, daquele que tem o privilégio de entrar em comunhão com Deus, de trabalhar a terra, de a validade perene da religião e de sua base racional.

Em resumo: o processo de revisão crítica é iniciado pelo progresso técnico-científico; o impulso para o repúdio da religião vem antes do modelo de vida urbano-industrial. 

Papel profético da religiosidade da população rural na sociedade moderna 

O mundo rural tem uma função ético-religiosa na civilização moderna? À primeira vista, a pergunta pode parecer ingénua, se não pretensiosa. Nas sociedades industrializadas, os trabalhadores agrícolas tendem a diminuir em número até serem reduzidos a apenas algumas unidades por cada cem empregados; o campo está despovoado; o modelo de vida urbano generaliza-se (ou pelo menos assim parece); quem fala de cidade e campo fala em termos de integração ou assimilação, naturalmente com quem está em posição dominante: o mundo rural tem futuro?

Fonte: https://www.30giorni.it/

EDITORIAL: A graça do batismo, a tradição e os costumes clericais

Batismo de uma criança na Capela Sistina (ANSA)

Uma reflexão sobre as respostas do Dicastério para a Doutrina da Fé com relação à celebração do batismo e às pessoas transexuais e homossexuais.

Andrea Tornielli

São Cipriano, bispo de Cartago, que foi martirizado em 258, participando de um sínodo de bispos africanos, observou: “A nenhum homem que venha a existir pode ser negada a misericórdia e a graça de Deus”. E Santo Agostinho escreveu: «As crianças são apresentadas para receber a graça espiritual, não tanto por aqueles que as carregam nos braços (embora também por eles, se forem bons fiéis), mas pela sociedade universal dos santos e dos fiéis... É toda a Igreja Mãe dos santos que age, pois ela como um todo gera cada um deles».

Essas são duas declarações dos Padres da Igreja que atestam a absoluta gratuidade do batismo, de alguma forma também relativizando o papel dos pais e padrinhos ("se forem bons fiéis") que pedem o sacramento e apresentam a criança. Essas são palavras que melhor do que outras iluminam a recente resposta do Dicastério para a Doutrina da Fé às perguntas de um bispo brasileiro sobre o batismo. A nota assinada pelo cardeal Victor Manuel Fernandéz e aprovada pelo Papa Francisco mostra uma clara harmonia com o recente magistério papal. De fato, Francisco tem insistido repetidamente que a porta dos sacramentos, e em particular a do batismo, não deve permanecer fechada, e que a Igreja nunca deve se transformar em uma alfândega, mas sim acolher e acompanhar todos em seus acidentados caminhos na vida.

Um documento do Dicastério para a Doutrina da Fé, assinado pelo Prefeito Fernandéz e aprovado pelo Papa na audiência de 31 de outubro, expressa uma opinião positiva se não se cria ...

As respostas do dicastério doutrinário, no contexto altamente polarizado que caracteriza a Igreja hoje, provocaram reações opostas, incluindo aquelas que temem que, ao admitir ao sacramento do batismo os filhos de casais homossexuais (adotados ou filhos de um dos dois parceiros, talvez gerados por gestação artificial), tanto o chamado "casamento gay" quanto a prática do chamado "útero de aluguel" se tornem moralmente lícitos. Também pode ser lida nesse sentido, novamente pelos críticos, a flexibilização da proibição de padrinhos e madrinhas de batismo, que o Dicastério apresenta de forma problemática. 

Em primeiro lugar, é interessante notar uma passagem da nota, onde se recorda que as respostas publicadas nestes dias "repropõem, em boa substância, os conteúdos fundamentais do que já foi afirmado no passado sobre este assunto por este Dicastério". A menção se refere a pronunciamentos anteriores que permaneceram em segredo (um dos quais também é citado na nota de rodapé) que remontam a este pontificado e aos de seus antecessores. Além disso, as citações iniciais dos dois Padres da Igreja propostas no início deste artigo estão contidas, juntamente com muitas outras, em um documento público da então Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, chefiada pelo cardeal croata Franjo Šeper e pelo arcebispo dominicano Jérôme Hamer. Essa foi uma instrução aprovada em outubro de 1980 por São João Paulo II, na qual ele respondeu a uma série de objeções contra a celebração do batismo infantil, reafirmando a importância de uma "prática imemorial" de origem apostólica que não deveria ser abandonada.

Para aqueles que hoje negariam o batismo aos filhos de casais homossexuais porque, ao batizá-los, a Igreja tornaria moralmente lícitas as uniões homossexuais ou a prática da barriga de aluguel, o documento de 1980 já havia, de fato, respondido indiretamente, afirmando que "a prática do batismo infantil é autenticamente evangélica, pois tem valor de testemunho; manifesta a iniciativa de Deus em relação a nós e a gratuidade de seu amor que envolve toda a nossa vida: 'Não fomos nós que amamos a Deus, mas foi Ele que nos amou... Nós o amamos, porque ele nos amou primeiro' (1 João 4: 10. 19.)". E também "no caso dos adultos, as exigências de receber o batismo não devem nos fazer esquecer que Deus 'não nos salvou por causa de obras de justiça que tivéssemos praticado, mas unicamente em virtude de sua misericórdia, median­te o batismo da regeneração e renovação, pelo Espírito Santo,' (Tito 3, 5.)".

A instrução aprovada pelo Papa Wojtyla há quarenta e três anos obviamente levou em conta a mudança do contexto social e a secularização: "Pode acontecer que pais incrédulos e que praticam apenas ocasionalmente, ou mesmo não cristãos, que por razões dignas de consideração pedem o batismo para seus filhos, solicitem aos párocos". Como se deve agir nesses casos? Permanecendo válido o critério - de ontem e de hoje - de que o batismo de crianças é celebrado se houver o compromisso de educá-las de maneira cristã, o documento de 1980 especificou a esse respeito: "Quanto às promessas, qualquer compromisso que ofereça uma esperança bem fundamentada para a educação cristã das crianças deve ser considerado suficiente". A prática atual nas paróquias atesta o fato de que, seguindo o exemplo do Nazareno, incansável em sua busca por cada ovelha perdida, é suficiente que um parente se comprometa perante a Igreja a não fechar a porta. 

Não seria necessário, hoje, acreditar mais na ação da graça que atua por meio dos sacramentos, que não são um prêmio para os perfeitos, mas um remédio para os pecadores? Não deveríamos olhar mais para as páginas do Evangelho, de onde emerge Jesus, que ama primeiro, perdoa primeiro, abraça primeiro com misericórdia, e é nesse abraço que o coração das pessoas é movido para a conversão?

E, novamente, que culpa têm as crianças? Seja como for que tenham vindo ao mundo, elas são sempre criaturas amadas e queridas de Deus. Não valeria a pena, então, concentrar-se mais no lado positivo, ou seja, no fato de que as pessoas pedem o batismo em um contexto pós-cristão, onde é cada vez mais raro que isso aconteça por mero costume?

É confortante reler as palavras que um grande bispo do século XX proferiu em uma entrevista em julho de 1978 sobre Luise Brown, a primeira criança nascida em um tubo de ensaio. Ele denunciou o risco de surgirem "fábricas de crianças" separadas do contexto familiar e explicou que compartilhava "apenas em parte" o entusiasmo pelo experimento. Mas, no final, ele ofereceu seus "mais calorosos votos à criança" e um pensamento afetuoso aos pais, dizendo: "Não tenho o direito de condená-los: subjetivamente, se eles agiram com intenção correta e de boa fé, podem até ter grande mérito diante de Deus pelo que decidiram e pediram aos médicos para realizar". Esse bispo se chamava Albino Luciani, era o Patriarca de Veneza, um mês depois se tornaria João Paulo I e hoje é beato.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Como São Martinho de Tours repreendeu o diabo no seu leito de morte

© By Fulcanelli | Shutterstock

Por Philip Kosloski - publicado em 11/11/22

Quando São Martinho de Tours estava prestes a morrer, o diabo lhe apareceu e tentou influenciá-lo.

São Martinho de Tours foi um bispo do século IV conhecido ainda em vida pela santidade. Muitas lendas foram escritas sobre a sua vida, incluindo um encontro com o diabo no seu leito de morte. O encontro está registrado em uma carta de Sulpício Severo apresentada no ofício de leituras da Igreja.

No início, São Martinho se dirige aos presentes e prepara a sua alma para a morte.

Alguns padres reunidos à sua cabeceira sugerem que ele dê um pouco de alívio ao seu pobre corpo virando-se de lado. Mas ele responde: “Permitam-me, irmãos, olhar para o céu em vez de olhar para a terra, para que o meu espírito se ponha no caminho certo quando chegar a hora da minha partida para o Senhor”.

Aparece-lhe então uma figura demoníaca para tentar influenciá-lo.

Quando vê o demônio ali perto, o santo brada: “Por que estás aí, sanguinário? Assassino! Não me terás como tua presa. Abraão está me acolhendo em seu abraço”.

São Martinho não se assustou nem se deixou influenciar pela presença do diabo. Em vez disso, enraizou-se firmemente em Cristo e continuou aguardando a sua passagem para o Céu.

Finalmente, entregou o espírito às mãos do Pai. Repleto de alegria, São Martinho de Tours foi recebido por Abraão, deixando esta vida como pobre e humilde e entrando no Céu como rico pelo favor de Deus.

Este encontro nos lembra que, se ficarmos enraizados em Cristo ao longo da nossa vida, nada poderá mudar o nosso caminho – nem mesmo se um demônio nos tentar em pleno leito de morte.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Inaugurada a primeira igreja construída na Turquia desde 1923

YASIN AKGUL / AFP
Igreja de Santo Efrém, em Istambul

Por Cécile Séveirac - publicado em 09/10/23

Primeira missa será celebrada no dia 15 de outubro.

Nos arredores de Istambul ergue-se agora uma imponente igreja branca, dedicada ao culto siríaco-ortodoxo. Inaugurada no domingo, 8 de outubro, pelo presidente Recep Tayyip Erdoğan, a igreja dedicada a Santo Efrém encarna um símbolo para a minoria cristã: é a primeira vez que a Turquia acolhe uma nova igreja no seu território, desde a fundação da República laica por Mustafa Kemal, em 1923. A primeira missa na igreja acontecerá no dia 15 de outubro.

A pedra fundamental do edifício foi lançada em 2019, mas a inauguração, incialmente prevista para 19 de fevereiro de 2023, teve de ser adiada após o devastador terremoto que atingiu a Turquia e a Síria, algumas semanas antes. 

O presidente turco discursou no dia 8 de outubro, saudando a “coabitação” das diferentes comunidades religiosas do seu país: “Judeus, cristãos, estamos felizes que todas as comunidades do nosso país vivam juntas”, declarou. “Existem muitos problemas em todo o mundo hoje. A Turquia é um país onde múltiplas comunidades viveram em paz durante séculos”, acrescentou o presidente antes de sublinhar que, sob o seu mandato, cerca de vinte igrejas foram reformadas em todo o país. 

A situação da minoria cristã

Na Turquia, a República é “um Estado democrático, laico e social de direito”, como proclama o artigo 2º da Constituição de 1982. No entanto, a Constituição não concebe o laicismo como uma separação rigorosa entre os poderes temporal e espiritual, mas como a submissão da religião a um controle muito apertado por parte do Estado.

Ao longo da história turca recente, o equilíbrio de forças entre o Estado e a religião sofreu profundas alterações: enquanto o Islã se tornou dominante na sociedade turca, as minorias foram marginalizadas e mesmo progressivamente apagadas da esfera pública.

Atualmente, o número de cristãos (principalmente das Igrejas Armênia, Síria, Caldeia e Ortodoxa Grega) na Turquia é estimado em 0,2%, em comparação com 20% no início do século XX.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Dos Sermões de São Leão Magno, papa

Somos um só corpo em Cristo (iCatólica)

Dos Sermões de São Leão Magno, papa

(Sermo4,1-2: PL 54,148-149)             (Séc. V)

O serviço especial do nosso ministério

Embora seja a Igreja de Deus toda ela ordenada em distintos graus, de forma a subsistir a integridade nos diversos membros do Corpo sagrado, todos, no entanto, no dizer do Apóstolo, em Cristo, somos um (cf. Gl 3,28). Ninguém está tão separado do outro pelo ofício, que até a mínima porção não pertença à conexão da cabeça. De fato, na unidade da fé e do batismo, nossa sociedade não conhece discriminações e é geral a dignidade, segundo a palavra do santo apóstolo Pedro: Quais pedras vivas deixai-vos edificar como casas espirituais, um sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais aceitos de Deus por Jesus Cristo (1Pd 2,5); e depois: Vós, porém, raça eleita e sacerdócio real, nação santa, povo adquirido (1Pd 2,9).

 

A todos os renascidos em Cristo o sinal da cruz torna reis, a unção do Espírito Santo consagra sacerdotes. Por isso, afora o especial serviço de nosso ministério, saibam todos os cristãos espirituais e racionais serem consortes da raça real e do ofício sacerdotal. Que de mais régio do que ser o espírito submisso a Deus, senhor de seu corpo? E que de mais sacerdotal do que entregar ao Senhor a consciência pura e oferecer as hóstias imaculadas da piedade no altar do coração? Sendo obra, pela graça de Deus, comum a todos, contudo, é piedoso e louvável de vossa parte alegrar-vos, como honra vossa, pelo dia de nossa elevação. Que se celebre no Corpo todo da Igreja o único sacramento do sacerdócio. Ao derramar-se o unguento da consagração, este sacramento derramou-se certamente com mais abundância nos membros superiores, mas não com menor liberalidade nos inferiores.

Havendo assim, diletíssimos, pela participação neste dom, grande motivo de alegria em comum, haverá mais verdadeira e mais excelente causa de júbilo, se não pararmos na consideração de nossa pequenez. Com efeito muito mais vantajoso e mais digno será erguermos a força do espírito para contemplar a glória do santíssimo apóstolo Pedro; e, de preferência, neste dia venerar aquele que foi abundantemente regado pela fonte mesma dos carismas, para que, tendo recebido sozinho, nada seja transmitido a alguém sem sua participação. O Verbo feito carne já habitava entre nós. Cristo já se tinha entregado totalmente para restaurar o gênero humano.

Fonte: https://liturgiadashoras.online/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF