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domingo, 23 de abril de 2023

III Domingo da Páscoa (Ano A)

Jesus e os Díscípulos de Emaús | Presbíteros

Introdução ao espírito da Celebração

A liturgia deste Domingo apresenta-nos Jesus Cristo ressuscitado como companheiro de viajem, alentando a esperança, aquecendo o coração dos discípulos de Emaús. Como os primeiros discípulos, é na Eucaristia que nós reconhecemos hoje a presença viva de Jesus Ressuscitado: caminha conosco, fala-nos através da Escritura, alimenta-nos com o seu Corpo.

LITURGIA DA PALAVRA

Primeira Leitura

Atos, 2, 14.22–33

A leitura corresponde a uma seleção de versículos do discurso de S. Pedro no dia do Pentecostes. «Pedro» aparece aqui, como noutras vezes, na sua função de Chefe dos Apóstolos, falando em nome de todos e à frente de todos (cf. At 2, 37-38; 5, 2-3.29; 1, 15).

22 «Jesus de Nazaré» Pedro, para anunciar Jesus como o Messias, parte da Sua humanidade, no aspecto mais humilde, um homem de Nazaré, terra desprezada (Jo 1 48); nos vv. seguintes estabelece a sua perfeita identidade com o Cristo da fé, o Senhor ressuscitado.

23 «Segundo o desígnio imutável e previsão de Deus». A morte na cruz, o grande «escândalo para os Judeus», não era mais do que o cumprimento do desígnio salvador de Deus, anunciado pelos Profetas.

24 «Deus ressuscitou-O. O grande sinal de que aquele homem de Nazaré já antes credenciado com «milagres, prodígios e sinais» (v. 22), era o Messias, Deus vindo à terra, é sem dúvida a Ressurreição. Esta apresenta-se como anunciada no Salmo 15 (16).

27 «Nem deixareis o vosso Santo sofrer a corrupção». Citação do Salmo 15 (16), segundo a tradução dos LXX, que alguns chegam a considerar inspirada. O texto hebraico massorético não é tão expressivo, pois diz: «conhecer a cova», isto é, a morte; Pedro e depois Paulo (cf. At 13, 35) dão-nos o sentido mais profundo, o cristológico do Salmo, ao explicitar que designa a ressurreição do Messias, sentido este que, em geral, os exegetas classificam de sentido plenário (intentado só por Deus), ou sentido típico (o salmista como tipo do Messias).

São Pedro 1, 17–21

Esta leitura adapta-se maravilhosamente ao tempo pascal, falando-nos da nossa libertação através do Sangue do novo Cordeiro Pascal e da Ressurreição de Jesus. Há mesmo exegetas que vêem nesta carta um fundo de homilia pascal ou baptismal. O trecho de hoje é tirado de uma secção inicial da Carta (1, 13 – 2, 10), uma série de exortações que têm como pano de fundo a libertação dos hebreus a caminho da terra prometida, símbolo do Baptismo e da vida cristã, o que faz pensar que formariam parte duma catequese ou homilia pascal-baptismal. Vejamos: «de ânimo preparado para servir» (v. 13; cf. Lc 12, 35) é dito no original com uma imagem («cingida a cintura da vossa mente»), que evoca a forma de celebrar a Páscoa (cf. Ex 12, 11, símbolo do Baptismo (cf. 1 Cor 10, 1-2.6); «sede santos» (v. 14-16) é uma exigência da aliança (cf. Lv 11, 44; 19, 2; 20, 7) e do Baptismo (cf. Rom 6, 4.11.19; 12, 2; Gal 3, 27); o santo temor de Deus (cf. 2 Cor 2, 11; Rom 2, 11) «no tempo da peregrinação» (cf. 1, 1.17; 2, 11; 4, 2, é a alusão à peregrinação pelo deserto no Êxodo) está na sequência de invocar a Deus como Pai (referência ao Pai-nosso, Mt 6, 9, recitado no rito do Baptismo e certamente matéria da instrução preparatória); o resgate pelo sangue de Cristo é mais do que uma referência ao custo da nossa redenção (1 Cor 6, 20; 7, 23; cf. Ef 1, 7; Hb 9, 14; Ap 1, 5), pois alude a Jesus como cordeiro pascal (Ex 12, 3-14; cf. Jo 1, 29.36; 19, 36; 1 Cor 5, 7; At 8, 32-35); o amor fraterno (v. 22-25) é proposto como consequência de se ter purificado (cf. Ex 19, 10-11) e ter nascido de novo e por meio da palavra de Deus (cf. Tg 1, 18; 1 Jo 3, 9; Is 40, 8); esta mesma palavra é o «leite puro» (cf. Ex 3, 8; 1 Cor 3, 2) que os batizados têm de desejar avidamente (2, 1-2; cf. Sl 34, 9); assim todos entram ativamente na construção do edifício que é o novo Povo de Deus, figurado no antigo (2, 4-10).

17 «Pai… que… julga». Pode-se ver aqui uma alusão à recitação do Pai Nosso. Deus, que é o melhor dos pais, também é um Juiz imparcial; o sentido correto da nossa filiação divina traz consigo o santo temor de Deus, o temor de desagradar a um Pai que nos julga e que calibra perfeitamente o valor de todos os nossos atos.

«Exílio neste mundo». Cf. 1 Pd 1, 1; 2, 11; 4, 2; Hb 11, 13. Nestes textos inspirados fica patente a nossa condição não apenas de peregrinos da Pátria celeste, mas também a ideia de pena que envolve a nossa situação de «degredados filhos de Eva» neste «desterro» (cf. Salve Rainha).

18-19 «Libertados… com o Sangue precioso de Cristo». A obra salvadora de Jesus não consistiu numa mera libertação, como, por exemplo, a libertação do Egipto, pois foi um verdadeiro resgate, pagando Jesus o preço dessa libertação com o Seu Sangue, daí que esta obra libertadora se chama mais propriamente Redenção (cf. Ef 1, 7; Ap 1, 5).

«Cordeiro sem defeito e sem mancha». Cf. Ex 12, 5; 1 Cor 5, 7; Jo 1, 29.36; 19, 36. Cf. também: Is 53, 7; At 8, 32-35. Os primeiros textos falam de Jesus, Cordeiro imolado na nova Páscoa; os segundos, de Jesus manso «Cordeiro de Deus».

Evangelho

São Lucas 24, 13–35

Temos aqui uma das mais belas páginas do Evangelho: um relato cheio de vivacidade, de finura e de psicologia, em que acompanhamos o erguer daquelas almas desde a mais amarga frustração até às alturas da fé e da descoberta de Jesus ressuscitado. A crítica bíblica procura distinguir neste relato os elementos de tradição e os elementos redacionais; podem identificar-se muitos elementos de tradição neste relato, mas não dispomos de meios para classificar como meramente redacionais todos os restantes, pois não são do nosso conhecimento todas as fontes de que Lucas dispôs; a própria crítica admite «fontes especiais» para a redacção de Lucas. Um facto indiscutível é que Lucas é um teólogo e um catequista, não é um jornalista e não se limita a contar a seco umas aparições, mas não temos elementos suficientes para definir em que medida reelaborou as suas fontes.

13 «Emaús»: uma povoação a 60 estádios, traduzidos por duas léguas, que se traduzem nuns 11 quilómetros e meio de Jerusalém. Há duas leituras variantes nos manuscritos gregos do Evangelho de Lucas: a imensa maioria deles regista 60 estádios. Alguns poucos têm 160 (o que equivale a uns 30 Km). Também não existe completo acordo sobre a sua localização, sendo indicados vários locais na tradição cristã; El-Qubeibe é o de maior aceitação, a uns 12 Km a Noroeste da Cidade Santa (Abugoxe corresponde aos 160 estádios).

16 «Mas os seus olhos estavam impedidos de O reconhecerem». Não é que não vissem a Jesus, ou que Jesus se quisesse ocultar, mas eles é que estavam obcecados pelo seu extremo desalento. E fica-nos a lição: para que se possa reconhecer a Jesus ressuscitado é indispensável o olhar da fé.

18 «Cléofas» parece ser diferente do marido de Maria, mãe de Tiago e José (Jo 19, 25); embora alguns o identifiquem, a grafia é diferente: Kleopâs.

22-24 «É verdade que algumas mulheres… Alguns dos nossos…»: aqui se resume o que foi relatado antes com mais pormenor (Lc 23, 56b – 24, 9) e correspondente à tradição sinóptica e joanina. Certamente que os nossos são Pedro e João (cf. v. 12 e Jo 20, 1-10). «Mas a Ele não O viram»: se não se trata de um pormenor meramente redacional, temos que admitir que ainda não lhes constava da aparição de Jesus a Pedro referida adiante, no v. 34 (cf. 1 Cor 15, 5).

28-30 «Jesus fez menção de seguir para diante». Lucas volta a aludir ao «caminho de Jesus» (no v. 15 já tinha usado o mesmo verbo grego que significa caminhar). R. J. Dillon (From eye-witnesses to ministers of the word) pensa que este pormenor lucano insinua que a presença de Jesus no meio dos seus através da Eucaristia (a fracção do pão do v. 30) constitui o momento cume do seu caminhar pelo caminho da salvação. Enternece o leitor ver como Jesus ressuscitado se torna o companheiro de caminho (recorde-se como Lucas gosta de focar a vida cristã como um caminho e um seguimento de Jesus): depois de se fazer encontrado, agora faz-se rogado. Isto sucede-nos muitas vezes na vida cristã: Ele vem ao nosso encontro sem O procurarmos e, outras vezes, quer dar-nos o ensejo de O convidarmos a ficar conosco e de praticarmos a caridade com os outros, que são Ele (cf. Mt 25, 40). Mas aqui o convite feito a Jesus não é um simples ato de caridade e de cortesia; com efeito, parece que a narrativa nos leva a pensar que quem faz este pedido é toda a comunidade cristã, que se reúne para celebrar a Eucaristia e anseia estabelecer uma comunhão íntima com Jesus ressuscitado (ibid.). Todos estão de acordo em ver a estreita relação da refeição descrita com a multiplicação dos pães e a instituição da Eucaristia.

31 «Abriram-se-lhes os olhos e reconheceram-no, mas Ele desapareceu da sua presença»: É na Eucaristia que se abrem os olhos para a fé, para captar o que é invisível, mas real. Impressiona muito o relato ao unir o aparecimento com o desaparecimento, sem se dizer para onde é que Jesus se retirou. Desta maneira fica sugerida uma nova presença, a de Jesus glorioso e ressuscitado: uma ausência que é presença. Comenta João Paulo II: «É significativo que os dois discípulos de Emaús, devidamente preparados pelas palavras do Senhor, O tenham reconhecido, quando estavam à mesa, através do gesto simples da ‘fracção do pão’. Uma vez iluminadas as inteligências e rescaldados os corações, os sinais ‘falam’. A Eucaristia desenrola-se inteiramente no contexto dinâmico de sinais que encerram uma densa e luminosa mensagem; é através deles que o mistério, de certo modo, se desvenda aos olhos do crente. Como sublinhei na encíclica Ecclesia de Eucharistia, é importante que nenhuma dimensão deste Sacramento fique transcurada. Com efeito, subsiste sempre no homem a tentação de reduzir às suas próprias dimensões a Eucaristia, quando na realidade é ele que se deve abrir às dimensões do Mistério. ‘A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções’» (Carta Mane nobiscum Domine, 14).

32 «Não ardia cá dentro o nosso coração?». Quando lemos a Escritura guiados por Jesus, presente na Igreja, inflama-se o nosso coração e sentimo-nos urgidos a mostrar aos que nos rodeiam, com as nossas vidas, pela palavra e pelo exemplo, que Cristo vive, que a Ressurreição é uma realidade. O episódio constitui um apelo a fazermos o mesmo papel do Ressuscitado junto dos desiludidos da vida e sem esperança e a comunicar-lhes a nossa experiência de fé. No relato põe-se em evidência a união do pão e da palavra na vida da Igreja.

33 «Partiram imediatamente». «Os dois discípulos de Emaús, depois de terem reconhecido o Senhor, «partiram imediatamente» para comunicar o que tinham visto e ouvido. Quando se faz uma verdadeira experiência do Ressuscitado, alimentando-se do seu Corpo e do seu Sangue, não se pode reservar para si mesmo a alegria sentida. O encontro com Cristo, continuamente aprofundado na intimidade eucarística, suscita na Igreja e em cada cristão a urgência de testemunhar e evangelizar» (João Paulo II, Mane nobiscum Domine, 24).

Fonte: https://presbiteros.org.br/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF