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terça-feira, 15 de abril de 2025

Como o meu jejum pode ajudar a interromper uma guerra?

Shutterstock

Philip Kosloski - publicado em 27/10/23

Parece improvável que o jejum possa impedir uma guerra distante, mas existem algumas verdades teológicas profundas em jogo nesta prática.

A Igreja frequentemente incentiva o jejum, e o Papa designou dias específicos de jejum várias vezes como forma de penitência para pedir a paz no mundo. No entanto, quando este assunto surge, podemos nos questionar: "Como o meu jejum pode ajudar a interromper uma guerra?"

Embora isso possa parecer impossível, existem algumas verdades teológicas profundas em jogo aqui. E, de fato, sabemos que o jejum ajudou no passado, mesmo no passado recente.

Apelo do Papa

O jornalista e teólogo Giovanni Marcotullio afirma que o apelo do Papa Francisco à oração e ao jejum em 2013 ajudou a acalmar a guerra na Síria.

"O conflito esteve perto de fazer com que a fogueira local da guerra acendesse uma conflagração global, pressagiando terríveis cenários pós-atómicos. O Papa Francisco recorreu então ao jejum e à oração. ‘Esse tipo de demônio', disse Jesus, 'não pode ser expulso a não ser por meio de jejum e oração'. (Mateus 17,21)"

Embora a guerra na Síria não tenha terminado imediatamente naquela noite, o conflito não se transformou em algo muito mais terrível.

O poder espiritual do jejum

Marcotullio explica por que o jejum em particular pode ser benéfico.

Por que acompanhar a fé e a oração com o jejum? Existem vários motivos; aqui, tento listar alguns (sem pretender cobrir todas as bases):

O jejum faz o homem reconhecer seu orgulho, e toda guerra nasce do orgulho de alguém. Ao jejuar, reconhecemos que somos irmãos dos orgulhosos, e que somos orgulhosos como nossos irmãos belicistas, por isso pedimos a Deus que converta todos os nossos corações;

O jejum nos leva à oração humilde, para não nos colocarmos em um pedestal em relação aos outros: o fariseu que Jesus descreveu na parábola jejuava, sim, três vezes por semana, mas ao se gabar disso, ele o fazia em vão; esvaziou-o do seu significado sacrificial e – por assim dizer – renegou-o;

O jejum leva aqueles que o praticam a expressar compaixão pelas vítimas diretas da violência e da guerra: não temos mérito se estivermos “do lado certo” do mundo; não só isso, talvez seja o nosso próprio estar “do lado certo” que nos torna de alguma forma uma causa cooperante do sofrimento dos outros;

O jejum quebra a dinâmica do consumo, nos traz de volta ao essencial e nos mostra que podemos viver mesmo sem todas aquelas coisas que a opulência do nosso mundo nos induz a considerar “essenciais”. Então, nossos olhos se abrem para a perspectiva de um estilo de vida essencialmente sóbrio, aprendendo uma ecologia integral que restitui a expressão (muitas vezes exagerada) “justo e solidário” ao seu destino mais elevado, que é o Paraíso.

De uma forma espiritual, o jejum pode ajudar-nos pessoalmente, bem como à comunidade global, a compreender a necessidade da paz.

O jejum nos coloca numa disposição particular que clama a Deus, implorando-lhe que mude os corações e mentes daqueles envolvidos na guerra.

Acima de tudo, trata-se de confiança: confiar que Deus pode fazer milagres e que as nossas orações realmente têm um efeito no mundo.

Fonte: https://pt.aleteia.org/2023/10/27/como-o-meu-jejum-pode-ajudar-a-interromper-uma-guerra

Papa escreve meditações da Via-Sacra; presença no Tríduo Pascal permanece indefinida

O Papa, ao final da Missa de Domingo de Ramos, saudou os fiéis presentes na Praça São Pedro."  (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Francisco continua apresentando melhora em seu estado de saúde, especialmente nas funções motoras, respiratórias e vocais. Ainda não há confirmação sobre sua participação nas celebrações do Tríduo Pascal. As celebrações serão presididas por cardeais designados pelo próprio Pontífice.

Vatican News

Nesta terça-feira, 15 de abril, a Sala de Imprensa da Santa Sé deu informações sobre a convalescença do Papa Francisco durante um encontro com jornalistas:

O Papa continua melhorando do ponto de vista motor, respiratório e vocal. Quanto ao uso do oxigênio, ele consegue ficar mais tempo sem as cânulas nasais. Em relação ao de alto fluxo, é de uso residual para fins terapêuticos, sempre à noite e quando necessário. Os vários tratamentos continuam. Prosseguem também os breves encontros com os superiores da Cúria. O próximo briefing sobre a saúde do Pontífice está previsto para sexta-feira (18/04).

Celebrações do Tríduo Pascal

Ainda não há indicações sobre a presença do Santo Padre nos ritos do Tríduo Pascal. As meditações da Via-Sacra deste ano foram preparadas pelo Papa e serão publicadas às 12h (horário local) da Sexta-feira Santa.

Na manhã de quinta-feira (17/04), a Missa do Crisma será presidida pelo cardeal Domenico Calcagno, presidente emérito da Administração do Patrimônio da Sé Apostólica.

Hoje (15/04) será divulgado o calendário das celebrações na Basílica de São Pedro: na quinta-feira, a Missa da Ceia do Senhor será às 18h, mas não será organizada pela Capela Papal.

Na sexta-feira, a celebração da Paixão do Senhor será presidida pelo cardeal Gugerotti. A Via-Sacra no Coliseu será presidida pelo cardeal Baldassare Reina, vigário do Papa para a diocese de Roma.

É o Papa quem delega os cardeais que presidem às várias celebrações.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

HISTÓRIA: Cristãos do Oriente e do Ocidente celebrarão a Páscoa no mesmo dia

Concílio de Niceia - Foto: Vatican News)

Nos 1700 anos do Concílio de Niceia, cristãos do Oriente e do Ocidente celebrarão a Páscoa no mesmo dia.

14/04/2025

No ano em que a Igreja celebra os 1700 anos do Concílio de Niceia, o primeiro concílio ecumênico, a Páscoa dos cristãos do Ocidente e do Oriente será celebrada na mesma data, em 20 de abril. Esses dois marcos se relacionam no desejo contido naquela reunião do ano de 325 de que houvesse uma data comum para a Páscoa. Ainda hoje esse desejo está presente nas lideranças eclesiais e é motivado pelo Papa Francisco como “um apelo a todos os cristãos do Oriente e do Ocidente para darem resolutamente um passo rumo à unidade” dessa celebração conjunta.

Como a proposta surgiu

Resumidamente, o Papa Francisco escreveu na Bula de Proclamação do Jubileu 2025 que o Concílio de Niceia teve a missão de preservar a unidade, “então seriamente ameaçada pela negação da plena divindade de Jesus Cristo e da sua igualdade com o Pai”. Com o Símbolo de fé reconhecido pelos padres conciliares como sinal da comunhão na mesma fé, o estabelecimento de uma data comum para a Páscoa foi a questão pastoral mais importante daquele encontro, segundo o prefeito do Dicastério para a Promoção da Unidade dos Cristãos, Kurt Koch.

Existiam datas diferentes de celebração da Páscoa, na Igreja Primitiva: na Ásia Menor, os cristãos celebravam a Páscoa em simultâneo com a Páscoa judaica, no dia 14 de Nisan, e eram por isso conhecidos como quartodecimanos. Em contrapartida, os cristãos chamados protopasquistas, sobretudo na Síria e na Mesopotâmia, celebravam a Páscoa no domingo seguinte à Páscoa judaica. Perante esta situação, o Concílio de Niceia encontrou uma regra uniforme, definindo a celebração da Páscoa de acordo com o que acontecia entre os romanos.

No século XVI, com a reforma do calendário pelo Papa Gregório XIII, quando foi introduzido o chamado calendário gregoriano, a celebração da Páscoa passou a ser no domingo a seguir à primeira lua cheia da primavera. Enquanto as Igrejas do Ocidente calculam desde então a data da Páscoa de acordo com este calendário, as Igrejas do Oriente continuam a utilizar maioritariamente o calendário juliano, que foi também a base do Concílio de Niceia.

“Apesar de, entretanto, terem sido discutidas várias propostas para uma data comum             da Páscoa, a questão ainda não foi resolvida. Já o Concílio Vaticano I se deteve neste         urgente desafio pastoral num apêndice à Constituição sobre a Sagrada Liturgia                “Sacrosanctum Concilium”, promulgada em 1963, declarando que pretendia ter «em         devida conta o desejo de muitos de que a festa da Páscoa seja atribuída a um domingo         específico e de adotar um calendário fixo». O Concílio declarou-se favorável «a que a         festa da Páscoa seja atribuída a um domingo específico do calendário gregoriano,            desde que haja o consentimento dos interessados, especialmente dos irmãos separados         da comunhão com a Sé Apostólica». O Papa Francisco manifestou várias vezes o                mesmo espírito de abertura”, contou o prefeito Koch.

Por uma data comum

“Infelizmente, ainda não existe um acordo unânime neste ponto. A divergência dos cristãos a respeito da mais importante festa de seu calendário cria danos pastorais nas comunidades, até ao ponto de dividir famílias, e causar escândalo entre os não cristãos, afetando o testemunho do Evangelho”, pontua a Comissão Teológica Internacional no documento “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador – 1700º aniversário do Concílio Ecumênico de Niceia 325-2025“.

É por isso que o Papa Francisco, o Patriarca Ecumênico Bartolomeu e outros líderes da Igreja têm apelado repetidamente pelo estabelecimento de uma data comum para a celebração da Páscoa.

Com a coincidência da data neste ano de 2025, os cristãos são motivados a refletir sobre a “oportunidade providencial para todas as comunidades cristãs continuarem a celebrar a Paixão e a Ressurreição de Cristo, a ‘festa das festas’ (Matinas Pascais bizantinas), em comunhão também cronológica”. A Comissão Teológica Internacional ressalta que Igreja Católica permanece aberta ao diálogo e a uma solução ecumênica sobre o tema.

“Seja isto um apelo a todos os cristãos do Oriente e do Ocidente para darem                         resolutamente um passo rumo à unidade em torno duma data comum para a Páscoa.             Vale a pena recordar que muitos desconhecem as diatribes do passado e não entendem          como possam subsistir divisões a tal propósito”, escreveu o Papa Francisco na Bula             de Proclamação do Jubileu Peregrinos de Esperança.

Papa Francisco e o Patriarca Bartolomeu I, no Vaticano | Foto: Vatican Media

Niceia e o ecumenismo

O prefeito do Dicastério para a promoção da unidade dos Cristãos afirma que o aniversário dos 1700 anos do Concílio Ecumênico de Niceia tem importantes dimensões ecumênicas, sendo uma delas ter dado à Igreja o fundamento do ecumenismo espiritual, com fé comum no Cristo Verdadeiro Deus e Verdadeiro homem.

Aqui no Brasil, reflexões e celebrações que a Comissão Episcopal para o Ecumenismo e o Diálogo Inter-religioso da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tem realizado nos últimos meses para comemorar essa marca “têm sido uma excelente oportunidade para o crescimento na busca da unidade entre, não apenas católicos e ortodoxos, mas também na caminhada ecumênica rumo à unidade, com outras igrejas e comunidades eclesiais, respondendo ao que nos pede Jesus: ‘Que todos sejam um’ (Jo 17,22)”, de acordo com o assessor da Comissão, padre Marcus Guimarães.

Ele recorda que durante a 62ª Assembleia Geral da CNBB, entre os dias 30 de abril e 9 de maio, haverá “mais um momento de oração, encontro, convivência e fraternidade ecumênica com irmãos de várias Igrejas ortodoxas e de outras comunidades cristãs”.

“Com certeza, será mais um gesto concreto, um momento especial de fortalecimento             rumo à Unidade dos Cristãos”, ressalta.

Luiz Lopes Jr.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

segunda-feira, 14 de abril de 2025

“Vai e faz tu o mesmo”: A lei de Deus e a misericórdia

A lei de Deus e a misericórdia (Crédito: Opus Dei)

“Vai e faz tu o mesmo”: A lei de Deus e a misericórdia

Quem é meu próximo? O Senhor responde a essa pergunta de um doutor da lei com a parábola do bom samaritano. Dessa forma abre para ele – e para nós –, o horizonte das bem-aventuranças, que mostram a profundidade da lei de Deus. Novo editorial sobre a misericórdia.

01/08/2016

Em certa ocasião, um doutor da lei se aproximou de Jesus para perguntar o que devia fazer para conseguir a vida eterna. Na realidade, ele queria testar a ortodoxia do rabi de Nazaré, de quem, ao que parece, não sabia o que pensar[1]. Mas Jesus não se incomodou. Aceitou o diálogo e lhe devolveu a pergunta «O que está escrito na lei? Como é que lês?»[2]. O doutor respondeu com umas palavras do Shemá Israel, Escuta Israel[3], que todo israelita aprendia desde pequeno: «Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu pensamento»[4] e acrescentou com o livro do Levítico: «e a teu próximo como a ti mesmo»[5].

Nessas duas fórmulas estão sintetizadas toda a lei e os profetas[6], de modo que o Senhor diz: «Respondeste bem. Faz isto e viverás»[7]. O doutor não esperava que sua pergunta se solucionasse com essa simplicidade desconcertante. «Querendo justificar-se»[8] insiste com uma nova questão: «E quem é o meu próximo?»[9]. Jesus não se rende, pois quer ganhar a confiança de seu interlocutor. Fala-lhe então ao coração e, com ele, a todos os homens e mulheres de todos os tempos, com sua linguagem, ao mesmo tempo simples e solene: é a parábola do bom samaritano.

“Fazer-se próximo”

     No pobre homem assaltado no caminho de Jerusalém a Jericó,         os Padres da Igreja viam Adão, e com ele – porque seu nome         significa precisamente “homem” – viam a humanidade                     maltratada pelo seu próprio pecado, pelo nosso próprio pecado.

No pobre homem assaltado no caminho de Jerusalém a Jericó, os Padres da Igreja viam Adão, e com ele – porque seu nome significa precisamente “homem” – viam a humanidade maltratada pelo seu próprio pecado, pelo nosso próprio pecado. No bom samaritano reconheciam Jesus, que vem com paciência para nos curar, depois de que aqueles que não eram capazes de trazer a salvação ao mundo passassem longe. Ele, por outro lado, pode e quer. Uma antiga e venerável homilia imagina assim o encontro de Cristo com Adão – que é também o encontro com cada um de nós – ao descer para os infernos: «Eu sou o teu Deus, quem por tua causa fiz-me teu filho; por causa de ti, e por causa daqueles que nasceriam de ti, a todos aqueles que eram escravos, digo-o eu: “Saí”, e aos que se encontram nas trevas: “Iluminai-vos”, e aos que dormem: “Levantai-vos!”»[10].

Com Jesus, os cristãos, seus ungidos, são chamados a levar a sua salvação – a serem bons samaritanos. Como seu Senhor, também eles devem curar as feridas dos homens e derramar azeite e vinho sobre elas[11]: devem ser bons estalajadeiros até a volta do Samaritano. «Essa pousada, se notáreis bem, é a Igreja. Agora é pousada porque nossa vida é um estar de passagem. Será casa que nunca abandonaremos quando tenhamos chegado curados ao reino dos céus. Enquanto isso, aceitamos com gosto o tratamento na pousada»[12]. Este é o horizonte que o Senhor quer abrir ao doutor da lei, e com ele, a todos os cristãos, e a todos os seres humanos. Não o repreende por sua estreiteza: faz-lhe pensar primeiro, e depois, sonhar: «Vai e faz tu o mesmo»[13]. Como acontece com frequência nos Evangelhos, é bom não passar muito depressa por cima da concisão do relato. A resposta à pergunta de Jesus: - «quem foi seu próximo?» – é certamente óbvia: «Aquele que usou de misericórdia para com ele.»[14]. O que não é evidente, porém, é por que o Senhor faz essa pergunta que vira do avesso a colocação do doutor da lei: «Jesus inverte a perspectiva: não se trata de reconhecer o outro como meu semelhante, mas de ser capaz de fazer-me semelhante ao outro»[15]. Diante de uma atitude estreita, que delimita o campo de ação para fazer o bem – considerando, por exemplo, se os outros pertencem ao meu grupo, se depois me devolverão o favor –, o Senhor responde convidando a levantar a vista, a ser ele mesmo próximo.

A lei de Deus e a misericórdia (Crédito: Opus Dei)

A palavra próximo converte-se assim, da qualificação de um tipo de pessoas que mereceriam minha atenção, a uma qualidade do coração. É a pedagogia de Deus, que dá uma virada à pergunta “a quem fazer o bem” e a transfigura: o que era matéria de discussão e casuística nas escolas rabínicas – onde estava o limite? Até onde tenho que compadecer-me dos outros? – converte-se em um desafio audaz. O cristão, dizia São João Paulo II, «não se pergunta a quem deve amar, porque perguntar-se “quem é meu próximo?” já implica colocar limites e condições (...). A pergunta legítima não é “quem é meu próximo?”, mas sim “de quem devo fazer-me próximo?”. E a resposta é: qualquer um que sofre necessidade, ainda que me seja um desconhecido, converte-se para mim em próximo, ao que eu devo ajudar”[16]. É a proximidade[17], neologismo do Papa Francisco que nos lembra nossa vocação de ser próximos do nosso próximo, a ser «ilhas de misericórdia no meio do mar da indiferença»[18].

O caminho até a plenitude da Lei

     Com Jesus, os cristãos, seus ungidos, são chamados a levar a         sua salvação – a serem bons samaritanos. Como seu Senhor,         também eles devem curar as feridas dos homens e                             derramar azeite e vinho.

Poderíamos dizer que este diálogo com o doutor da lei resume o caminho que vai desde os ensinamentos morais do Antigo Testamento até a plenitude da vida moral em Cristo. E que, como nos lembra São Paulo, a lei do povo escolhido é boa e santa[19], mas não definitiva. Ordenava-se, principalmente, a preparar os corações para a chegada de Jesus. A pergunta do fariseu – «qual é o principal mandamento da Lei?»[20] – parece refletir certa angústia diante dos inúmeros preceitos que, com uma visão legalista, foram se introduzindo na vida religiosa israelita. Em outro momento, Jesus Cristo se queixa dos doutores da lei «que carregais os homens com pesos que não podem levar, mas vós mesmos nem sequer com um dedo vosso tocais os fardos»[21].

E mais ainda: em algumas ocasiões, as tradições humanas terminaram por tornar-se uma desculpa para não se sujeitar a um mandato divino, assim, Jesus denuncia a atitude de quem se escudava com as ofertas do Templo para não ajudar a seus pais[22].

Por isso, Jesus Cristo aponta para o fundamental: o Amor a Deus e ao próximo. Deste modo, se cumpre o que Ele diz de si mesmo: que não veio «abolir a lei ou os profetas (...), mas sim para levá-los à perfeição»[23].

A Aliança que Deus celebrou com seu povo incluía umas prescrições que não tinham o sentido original de impor-lhes cargas, mas sim, muito ao contrário, o de levar-lhes por caminhos de liberdade: «Olha que hoje ponho diante de ti a vida com o bem, e a morte com o mal. Mando-te hoje que ames o Senhor (...) para que vivas e te multipliques, e que o Senhor, teu Deus, te abençoe na terra em que vais entrar para possuí-la»[24].

A terra prometida aos hebreus simboliza um lugar os homens e as mulheres de todos os tempos podem entrar, se vivem os mandamentos de Deus em seu autêntico sentido. É uma porta para chegar à comunhão com Deus, porque, fora dela, qualquer outra terra parece inóspita: «O que é preciso para conseguir a felicidade não é uma vida cômoda, mas um coração enamorado»[25].

A lei de Deus e a misericórdia (Crédito: Opus Dei)

Se, por um lado, os preceitos rituais e legais do povo de Israel terminaram com a vinda de Jesus Cristo, por outro, os Dez Mandamentos, conhecidos também como o Decálogo, são perenes: recolhem os princípios fundamentais para poder amar a Deus – colocando-o por cima de tudo, respeitando seu santo nome, dedicando-lhe os dias de festa, como os cristãos fazemos no domingo – e aos outros – alimentando o carinho e reverência aos pais, protegendo a vida, a pureza de coração, etc. Quantas gerações de israelitas meditaram a verdade e a solicitude do Pai que estão nessas dez palavras! «Minha herança eterna são as vossas prescrições, porque fazem a alegria de meu coração»[26], uma amostra da misericórdia divina, que não quer que nos extraviemos, que deseja que tenhamos uma vida plena. O mundo pode se rebelar às vezes contra os Mandamentos, como se fossem imposições ultrapassadas, próprias de um estágio infantil da humanidade. Mas não faltam exemplos de como as sociedades e as pessoas se desmoronam quando creem que podem ignorá-los. As dez palavras do Senhor são as constantes do universo interior do ser humano. Se são alteradas, seu coração se desfigura.

Para que sejais filhos do vosso Pai

O Decálogo se engloba na nova lei que Jesus Cristo instaurou ao salvar-nos dando sua vida na Cruz. Essa nova lei é a graça do Espírito Santo concedida mediante a fé em Cristo[27]. Agora, portanto, não temos somente um horizonte moral a que aspirar: trata-se de viver em Jesus, de parecer-nos cada vez mais com Ele, deixando que o Espírito Santo nos transforme, para cumprir assim seus mandamentos.

Como ser mais parecidos com Jesus Cristo? Onde podemos ver seu modo de ser? O Catecismo diz que «As bem-aventuranças desenham o rosto de Jesus Cristo e descrevem sua caridade»[28]. Nesses ensinamentos recolhidos pelos evangelhos, vemos o retrato de Nosso Senhor, seu rosto que revela o amor compassivo do Pai a todos os homens. Elas recolhem as promessas feitas ao Povo Eleito, mas as aperfeiçoam ordenando-as não somente à posse da terra, mas ao Reino dos Céus[29].

No evangelho de Mateus, as primeiras quatro bem-aventuranças se referem a uma atitude ou forma de ser que tem seu centro nas palavras de Jesus[30]: «Bem-aventurados os pobres de espírito», «os que choram», «os mansos», «os que têm fome e sede de justiça». Convidam a confiar totalmente em Deus e não nos nossos recursos humanos, a enfrentar com sentido cristão os sofrimentos, a ser pacientes dia a dia. A estas bem-aventuranças se acrescentam outras que põem o acento na ação: «Bem-aventurados os misericordiosos», «os limpos de coração», «os pacíficos», e outras mais que nos advertem que, para seguir Jesus, temos que sofrer algumas contradições [31], sempre com alegria, pois «a felicidade do Céu é para os que sabem ser felizes na terra»[32].

As bem-aventuranças certamente manifestam a misericórdia de Deus, que se empenha em dar um júbilo sem limites àqueles que O seguem: «Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós.»[33] Elas não são, no entanto, uma coleção de aforismos para imaginar um utópico mundo melhor que alguém se ocupará de fazer possível, ou para consolar-se falsamente diante das dificuldades do momento. Por isso, as bem-aventuranças são também chamadas exigentes de Deus ao coração de cada ser humano. Elas nos empurram a comprometer-se a trabalhar pelo bem e a justiça já nesta terra.

Considerar com frequência as bem-aventuranças, talvez na oração pessoal, ajuda a saber como aplicá-las na vida diária. Por exemplo, a mansidão se concretiza tantas vezes no «sorriso amável para quem te incomoda, aquele silêncio ante a acusação injusta, a tua conversa afável com os maçantes e os inoportunos, o não dar importância cada dia a um pormenor ou outro, aborrecido e impertinente, das pessoas que convivem contigo...»[34].

Ao mesmo tempo, quem procura viver segundo o espírito das bem-aventuranças, vai incorporando à sua personalidade umas atitudes e modos de julgar as coisas que lhe dão maior facilidade para cumprir os mandamentos. A limpeza de coração lhe permite ver a imagem de Deus em cada pessoa, considerando-a como alguém digna de respeito e não como objeto para satisfazer uns desejos retorcidos. Ser pacíficos leva-nos a viver como filhos de Deus e a reconhecer os outros como seus filhos, seguindo esse «caminho mais excelente»[35] da caridade, que «tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta»[36], transformando os agravos em uma ocasião de amar e rezar por aqueles que prejudicam[37]. Em resumo, ser pacíficos nos leva a modelar o nosso coração segundo os contornos que traçam as bem-aventuranças, torna realidade o ideal que Jesus Cristo nos propõe de ser misericordiosos como o «Pai celestial é misericordioso»[38]. Transformamo-nos em portadores do amor de Deus, aprendemos a ver nos outros esse próximo que necessita nossa ajuda. Somos, em Cristo, esse bom samaritano que sabe se conduzir pela misericórdia, para cumprir em plenitude a lei da caridade. Então, nosso coração se expande, como aconteceu com o coração de Nossa Senhora.

Carlos Ayxelá – Rodolfo Valdés


[1] Cfr. Lc 10, 25.

[2] Lc 10, 26.

[3] O Shema‘ Israel é o nome que os israelitas usam para se referir ao texto bíblico do livro do Deuteronômio, que recitam diariamente nas suas orações: “Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6,4-5).

[4] Deut 6,5

[5] Lev 19,18

[6] Mt 22, 40

[7] Lc 10, 28

[8] Lc 10, 29

[9] Lc 10, 29

[10] Homilia sobre o grande e santo Sábado (PG 43, 462).

[11] Lc 10, 34.

[12] Santo Agostinho, Sermão 131, 6

[13] Lc 10,37

[14] Lc 10, 37

[15] Francisco, Mensagem, 24-I-2014.

[16] São João Paulo II, Discurso, 2-II-1999.

[17] Francisco, Ex.Ap. Evangelii Gaudium (24-XI-2013), nº 169.

[18] Francisco, Mensagem, 4-X-2014.

[19] Cfr. Rom 7, 12.

[20] Mt 22,36

[21] Lc 11,46

[22] Mt 15, 3-6

[23] Mt 5, 17

[24] Deut 30, 15-18

[25] São Josemaria, Sulco, nº 795

[26] Salmo 119 (118), 111.

[27] Cfr. São Tomás de Aquino, Summa Theologica I-II, q. 106, a.1, c. e ad 2, cit. Em São João Paulo II, Enc. Veritatis Splendor, 6-VIII-1993, nº 24.

[28] Catecismo da Igreja Católica, nº 1717.

[29] Idem, nº 1718.

[30] Cfr. Mt 5,3-12.

[31] Cfr. Mt 5, 10-12

[32] São Josemaria, Forja, nº 1005.

[33] Mt 5,12.

[34] São Josemaria, Caminho nº 173.

[35] 1 Cor 12,31.

[36] 1 Cor 13, 7.

[37] Cfr Mt 5, 44-45.

[38] Lc 6, 36.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/vai-e-faz-tu-o-mesmo-a-lei-de-deus-e-a-misericordia/

30 perguntas para a confissão

O Sacramento da Penitência (Schoenstatt)

Paulo Teixeira - publicado em 14/04/25

Uma espécie de teste para definir o estado de nossa relação com Deus.

Em 2015, após o Angelus no primeiro domingo da Quaresma, o Papa Francisco presenteou todos os presentes na Praça São Pedro com um pequeno livro. Em suas 28 páginas o opúsculo contém um resumo dos principais ensinamentos de Jesus  e conteúdos essenciais para a fé, como os sacramentos e os dons do Espírito Santo.

O livreto que pretende ser um auxílio para o caminho de conversão da Quaresma traz também uma série de perguntas para um exame de consciência minucioso para uma boa preparação para a confissão.

Na ocasião, o Pontífice disse: “Cada um pegue um livrinho e leve consigo, como ajuda para a conversão e o crescimento espiritual, que parte sempre do coração: alí onde se joga a partida das escolhas cotidianas entre o bem e o mal, entre mundanidade e Evangelho, entre indiferença e partilha”.

Questionamentos

Seguem aqui as perguntas que estão no livrinho e que podem nos ajudar em um check list espiritual e podem ajudar na preparação para a confissão.

Relação com Deus

Dirijo-me a Deus somente em caso de necessidade?

Participo na Missa dominical e nos dias de preceito?

Começo e termino o meu dia com a oração?

Invoquei em vão o nome de Deus, de Maria e dos Santos?

Envergonho-me de me apresentar como cristão?

O que faço para crescer espiritualmente, como e quando o faço?

Revolto-me diante dos desígnios de Deus?

Pretendo que seja Ele a cumprir a minha vontade?

Relação com o próximo

Sei perdoar, partilhar, ajudar o próximo?

Julgo sem piedade, tanto em pensamento quando com palavras?

Caluniei, roubei, desprezei os pequenos e indefesos?

Sou invejoso, colérico, parcial?

Tomo conta dos pobres e dos doentes?

Envergonho-me da carne do meu irmão ou da minha irmã?

Sou honesto e justo com todos ou alimento a “cultura do descartável”?

Instiguei os outros a fazer o mal?

Observo a moral conjugal e familiar que o Evangelho ensina?

Como vivo as responsabilidades educativas para com os meus filhos?

Honro e respeito os meus pais?

Rejeitei a vida após a concepção?

Desperdicei o dom da vida? Ajudei a fazê-lo?

Respeito o ambiente?

Relação com si mesmo

Sou um pouco mundano e pouco crente?

Exagero em comer, beber, fumar e divertir-me?

Preocupo-me em excesso com a saúde física, com os meus bens?

Como uso o meu tempo?

Sou preguiçoso? Procuro ser servido?

Amo e cultivo a pureza de coração, de pensamentos e de ações?

Nutro vinganças, alimento rancores?

Sou manso, humilde, construtor de paz?

Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/04/14/30-perguntas-para-a-confissao

O que é o jejum e por que é importante na Semana Santa

Imagem ilustrativa | domínio público

Por Redação central

14 de abril de 2025

O que é o jejum e por que é importante para os cristãos, especialmente durante o tempo da Quaresma e da Semana Santa? Padre Donato Jiménez, membro da Ordem dos Agostinianos Recoletos, falou sobre para que serve esta prática de penitência e qual é o seu propósito.

O jejum, disse padre Donato Jimenez ao Grupo ACI, “é uma forma de abster-se de alimentos corporais, e é uma forma de penitência e de oração. Jesus praticou o jejum em momentos importantes, antes de rezar, antes de escolher os apóstolos e em muitas ocasiões”.

“E a Igreja faz o jejum desde o século IV de forma regular”, disse.

“É uma maneira de ajudar a oração, de purificar o nosso corpo e, assim, nos dispormos melhor para a escuta de nossa oração por Deus”.

A Igreja, continuou o padre Jiménez, nos recorda “o jejum no tempo da Quaresma e do Advento, especialmente na terça e na sexta-feira, como faziam tradicionalmente em muitas comunidades”.

Atualmente, disse, a obrigação do jejum se mantém “na Quarta-feira de Cinzas e na Sexta-feira Santa”.

O sacerdote disse que “o jejum é fazer apenas uma refeição por dia, ou se comemos duas ou três vezes por dia deve ser uma alimentação frugal. Isso seria o jejum que a Igreja quer”.

Quem deve jejuar?

Segundo indica o Código de Direito Canônico, no número 1252, à lei do jejum “estão sujeitos todos os maiores de idade até terem começado os sessenta anos. Todavia os pastores de almas e os pais procurem que, mesmo aqueles que, por motivo de idade menor não estão obrigados à lei da abstinência e do jejum, sejam formados no sentido genuíno da penitência”.

Quem não jejua?

Além das pessoas que não jejuam devido à sua idade, pessoas com problemas mentais, doentes, mulheres grávidas ou lactantes, trabalhadores de acordo com as suas necessidades, convidados a refeições que não podem ser justificadas sem ofender gravemente ou outras situações morais ou impossibilidade física de manter o jejum.

A Agência Católica de Informação - ACI Digital, faz parte das agências de notícias do Grupo ACI, um dos maiores geradores de conteúdo noticioso católico em cinco idiomas e que, desde junho de 2014, pertence à família EWTN Global Catholic Network, a maior rede de televisão católica do mundo, fundada em 1981 por Madre Angélica em Irondale, Alabama (EUA), e que atinge mais de 85 milhões de lares em 110 países e 16 territórios.

Fonte: https://www.acidigital.com/noticia/51734/o-que-e-o-jejum-e-por-que-e-importante-na-semana-santa?

A Esperança como tema central da fé cristã

Missa do Domingo de Ramos na Praça de São Pedro, no Vaticano. (Foto: Yara Nardi)

"Na existência cristã, a fé ocupa o primeiro lugar, mas o primado pertence à esperança. Sem o conhecimento de Cristo que se possui graças à fé, a esperança se converteria em utopia suspensa no ar. No entanto, sem a esperança, a fé esmorece e torna-se tíbia e morta. Por meio da fé, o homem encontra o caminho da vida autêntica, mas somente a esperança pode mantê-lo em tal caminho."

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

“A esperança é a virtude teologal pela qual desejamos o Reino dos céus e a vida eterna como nossa felicidade, pondo toda a nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos não nas nossas forças, mas no socorro da graça do Espírito Santo» (Catecismo da Igreja Católica, n. 1817)”

A fé é a base da esperança. No seu sentido próprio, "ter esperança" significa olhar para frente. A expressão "fé" significa ter uma confiança forte. Quando minha esperança é baseada nas promessas de Deus, então minha esperança e a minha certeza baseiam-se na Pessoa que me deu essas promessas.

No início desta Semana Santa, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe a reflexão "A Esperança como tema central da fé cristã":

"O tema da esperança ocupa, na reflexão teológica atual, lugar de grande transcendência em virtude da revalorização da dimensão escatológica da mensagem cristã que ocorreu nos últimos anos. O Concílio Vaticano II deu um sentido novo ao tema da Escatologia, não simplesmente como realidade transcendente, mas que tem implicações e mudanças no modo de viver de cada um de nós. Diz assim a Constituição sobre a Igreja, a Lumen Gentium, quando aponta a Índole Escatológica da Igreja Peregrina e sua união com a Igreja Celeste: “A prometida restauração que esperamos, já começou, pois, em Cristo, progride com a missão do Espírito Santo e, por Ele, continua na Igreja; nesta, a fé ensina-nos o sentido da nossa vida temporal, enquanto, na esperança dos bens futuros, levamos a cabo a missão que o Pai nos confiou no mundo e trabalhamos na nossa salvação (cfr. Fil. 2,12).” (LG, 48). A fé nos ensina “o sentido da nossa vida temporal” para levar “a cabo a missão que o Pai nos confiou no mundo e trabalhamos para a nossa salvação”.

O interesse da pesquisa teológica pela temática da Esperança orienta-se primeiramente para a interpretação do futuro do homem e da história. A elaboração de uma “Teologia da Esperança” ou uma “espiritualidade da Esperança” volte a encontrar o lugar que lhe compete pressupõe o correto discernimento sobre o modo como hoje o homem se compreende a si mesmo. Trata-se, pois, de perguntar-se que relação existe entre a condição humana e a esperança, a fim de saber se ela é elemento marginal para o homem ou se, pelo contrário, está profundamente enraizada em sua experiência existencial e histórica.

O teólogo Jürgen Moltmann é autor de mais de 40 livros, incluindo sua famosa trilogia Teologia da Esperança (1964), O Deus Crucificado (1972) e A Igreja no Poder do Espírito (1975) e uma série posterior de “contribuições sistemáticas”. Na Teologia da Esperança, Moltmann começou a expor sua escatologia do “Reino de Deus”, baseada na esperança na ressurreição, mas mais focada no aqui e agora do que em qualquer julgamento final ou individual. Ele também rejeitou qualquer noção de que o Cristianismo pudesse ser reduzido à busca pessoal de um indivíduo para alcançar a salvação. “Se a esperança cristã for reduzida à salvação da alma num céu para além da morte, ela perde o seu poder de renovar a vida e mudar o mundo, e a sua chama é apagada”. Moltmann é o teólogo da esperança, entendida de forma receptiva e ativa, como expressão de uma Palavra de Deus (que é promessa de futuro) e como princípio impulsionador de uma palavra humana, que deve se expressar como protesto contra o que existe e como impulso de perdão e reconciliação futura. Moltmann escrevia, no seu livro Teologia da Esperança, assim: “Em sua integridade, e não como que em apêndice, o Cristianismo é escatologia; é esperança, olhar e orientação voltados para frente, e é também, por isso mesmo, abertura e transformação do presente. O escatológico não é algo situado ao lado do cristianismo, mas constitui, simplesmente, o centro da fé cristã, o tom com que harmoniza tudo nela, a cor de aurora de um novo dia esperado, cor com que, aqui embaixo, tudo se acha banhado... Uma teologia autêntica deveria ser concebida, portanto, a partir de sua meta no futuro. A escatologia deveria ser não o ponto final da teologia, mas seu começo”[1].

Na existência cristã, a fé ocupa o primeiro lugar, mas o primado pertence à esperança. Sem o conhecimento de Cristo que se possui graças à fé, a esperança se converteria em utopia suspensa no ar. No entanto, sem a esperança, a fé esmorece e torna-se tíbia e morta. Por meio da fé, o homem encontra o caminho da vida autêntica, mas somente a esperança pode mantê-lo em tal caminho. Por isso, a fé em Cristo – e em Cristo Ressuscitado - faz que a esperança se transforme em certeza e a esperança confere amplo horizonte à fé, levando à vida. A esperança é, portanto, a verdadeira dimensão da fé; é o caminhar da fé para o seu objeto, ou seja, Deus Senhor do Futuro, O nome bíblico “Iahweh” vem interpretado por Martim Buber com as seguintes palavras: “Eu estarei presente como aquele que estará presente”[2].

Por isso, a fé e a esperança não podem justapor-se como se a fé se referisse ao que já aconteceu, ao passo que a esperança olhasse exclusivamente para o futuro. Tanto o presente quanto o futuro de Cristo o fundamentam a fé e a esperança na imanência recíproca de ambos. A fé lembra a verdade da Ressurreição de Cristo como acontecimento criador de futuro, mas que redimensiona o presente. A esperança, por sua vez, alimenta a tendência para o futuro, baseando-se na realidade do que já aconteceu. “Pelo fato de abrir o futuro, a esperança prevalece sobre todas as outras manifestações vitais do homem. Influi em seu modo de pensar, de conhecer e de viver. O ainda-não ser subjetivo e objetivo, isto é, o possível se converte em fundamento último da realidade que impele o homem para o novum últimum, que não é outra coisa senão o futuro do homem escondido e do mundo escondido”[3].

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
_______________

[1] MOLTMANN, J. Teologia da esperança, Herber, São Paulo, 1971.
[2] BUBER, M. Moses, Oxford, 1947, 51s.
[3] PIANA, G. Dicionário de Espiritualidade, Vocabulário “ESPERANÇA”, Paulinas, SP, 1989, p.334-335.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

domingo, 13 de abril de 2025

Esperando a Ressurreição: o mosaico de São João de Latrão

Stefano_Valeri | Shutterstock

Marinella Bandini - publicado em 07/04/21 - atualizado em 11/04/25

Reviva a antiga tradição quaresmal dos cristãos romanos descobrindo as "igrejas estacionais”.

A abóbada do mosaico da Basílica de São João de Latrão é uma grande meditação sobre o valor salvífico do Batismo. Uma mensagem adequada ao sábado santo, o dia da expectativa da Ressurreição e, para os catecúmenos, da nova vida em Cristo no Batismo da Vigília Pascal. 

O que vemos hoje é uma restauração do final do século XIX e que manteve a iconografia do mosaico do século XIII, encomendado por Nicolau IV, que aparece aos pés da Virgem.

No topo da bacia absidal, o Cristo Salvador é representado entre nuvens multicoloridas. Diz-se que o rosto é inspirado pela milagrosa imagem de aqueropita que apareceu na primitiva Basílica Lateranense. 

O centro do mosaico é ocupado pela Cruz cravejada, da qual emergem os quatro rios do Paraíso. Deles nasce o Jordão, cujas águas dão vida a homens e animais. Um convite para receber o batismo a exemplo do Salvador que foi batizado no Jordão, retratado no medalhão no centro da Cruz.

A criação se realiza no sacrifício pascal: a Cruz se torna a árvore da vida e o sinal da vitória, o Espírito que pairava sobre as águas é agora o Espírito dado pelo sacrifício de Cristo, a água dos rios da vida é a água do Batismo da qual nasce a nova vida.

Em verdes prados ele me faz repousar. 

Conduz-me junto às águas refrescantes, 

restaura as forças de minha alma. 

Pelos caminhos retos ele me leva, por amor do seu nome.

Salmos 22, 2-3

Stefano_Valeri | Shutterstock

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* Em colaboração com o Escritório de Comunicação Social do Vicariato de Roma

Fonte: https://pt.aleteia.org/2021/04/07/esperando-a-ressurreicao-o-mosaico-de-sao-joao-de-latrao

Cardeal Gantin: "Eles estavam todos muito felizes" (III)

Cardeal Gantin em audiência com João Paulo I, 28 de setembro de 1978 |30Giorni

Arquivo 30Dias n. 05 - 2008

"Eles estavam todos muito felizes"

O Cardeal Bernardin Gantin, Decano Emérito do Sagrado Colégio, recorda a alegria dos cardeais após a eleição do Papa Luciani.

Entrevista concedida a 30Giorni em agosto/setembro de 2003 por Gianni Cardinale

«Já o disse muitas vezes e nunca o direi o suficiente: Paulo VI enche a minha memória e o meu coração de bispo e de africano. Com muito respeito e carinho o chamamos de “Papa Paulo VI, o Africano”: foi o primeiro sucessor de Pedro a pisar em nosso continente. Ele fez isso no verão de 1969, nos dando uma grande mensagem: chegou a hora em que vocês podem e devem fazer um cristianismo africano, a responsabilidade é de vocês. Portanto, para nós, africanos, sua morte foi uma imensa ferida." O Cardeal Bernardin Gantin, 81, sempre se comove ao lembrar da figura de Paulo VI. E também ao lembrar da de João Paulo I. Em 1978, ele havia sido cardeal por um ano e ocupado cargos na Cúria Romana por sete, depois de ter sido auxiliar desde 1956 e arcebispo de Cotonou, em seu Benim natal, desde 1960.

 Posteriormente, de 1984 a 1998, ele seria prefeito da Congregação para os Bispos. De 1993 a novembro de 2002, foi decano do Sacro Colégio. Atualmente [agosto de 2003] é decano emérito e voltou a viver em sua África. Para lembrar aquele verão de 1978, 30Giorni o contatou por telefone em Paris, onde ele está para um breve período de convalescença.

O que você lembra de 6 de agosto de 1978, quando o Papa Montini faleceu?

BERNARDIN GANTIN: Eu estava viajando para a Nova Caledônia, onde deveria celebrar a solenidade da Assunção, em 15 de agosto. Eu estava em Wellington, Nova Zelândia, quando pela manhã o Núncio Angelo Acerbi me deu a terrível notícia. Não consigo descrever o quão chocado meu coração ficou.

 Sabia-se que ele estava cansado, mas não a esse ponto… Cancelei imediatamente o resto da viagem. Junto com o núncio e o então cardeal Reginald J. Delargey, fui ao primeiro-ministro para informá-lo oficialmente sobre a morte do Papa. Nunca, nunca esquecerei as palavras deste homem, um não católico, que havia sido recebido em audiência por Montini pouco antes: "Paulo VI morreu, mas nunca esquecerei minha última visita ao Vaticano. Ainda posso sentir o calor do coração do Papa em minhas mãos". Que lindo!

Então ele voltou para Roma?

GANTIN: Imediatamente. Lembro-me de que no aeroporto de Fiumicino uma multidão de jornalistas recepcionava todos os cardeais que chegavam do mundo inteiro. Um deles pegou minha mala e começou a me bombardear com perguntas, até mesmo perguntando em quem eu votaria no conclave! Obviamente respondi que não sabia e que mesmo se soubesse certamente não lhes teria dito...

Em Roma, ele assistiu ao funeral de Montini...

GANTIN: Foi para mim um momento de trepidação, de grande oração, de emoção, de comunhão com o meu povo africano: em 1971, Paulo VI me deu a honra de me chamar para colaborar com ele no governo da Igreja universal.

O que você pode dizer sobre aquele primeiro conclave em 1978?

GANTIN: Estava muito quente. Especialmente nos aposentos do Palácio Apostólico. Naquela época, não havia uma bela Domus Sanctae Marthae especificamente equipada para essa eventualidade. Nós nos reunimos com medo e tremor. Mas o Espírito Santo não quis demorar-se em dar-nos um sucessor para Paulo VI, em dar-nos este santo Pontífice que veio de Veneza, que teria dito ao seu motorista antes de entrar no conclave: “O nosso carro não funciona, leve-o para consertar, para que, assim que estiver pronto, possamos ir direto para casa”. Em vez disso, ele nunca mais voltaria. Ele ainda dorme na Basílica de São Pedro.

Ele já conhecia Luciani como patriarca de Veneza?

GANTIN: Não intimamente. Eu o conheci em Veneza para um encontro ecumênico. Ele era um homem muito afável, simples e humilde. Lembro-me de que ele queria receber todos os participantes para o almoço, embora fôssemos muitos e ficássemos bastante apertados à mesa... Naquela ocasião, soube que ele tinha visitado a África, o Burundi.

Você trocou alguma palavra com ele imediatamente após a eleição?

GANTIN: Houve um jantar com todos os cardeais e ele foi nos cumprimentando mesa por mesa. Não me lembro quem eram meus três ou quatro companheiros, mas lembro que todos eram muito felizes.

Ele foi o único a receber uma nomeação curial de João Paulo I em seu breve pontificado. De fato, em 4 de setembro, o Papa Luciani a nomeou pró-presidente do Pontifício Conselho "Cor Unum". Além disso, João Paulo I a recebeu em audiência no último dia de seu pontificado, 28 de setembro. 

GANTIN: Sim, foi a última audiência concedida a um chefe de departamento. Éramos quatro: o Papa, eu, o secretário de "Iustitia et Pax", o jesuíta Roger Heckel, e o secretário de "Cor unum", o dominicano Henri de Riedmatten. Os outros três desapareceram, apenas o abaixo assinado sobreviveu à audiência. Lembro-me que naquela ocasião Luciani me disse que antes de vir a Roma para o conclave havia prometido ir a Piombino Dese, cidade da diocese de Treviso, para visitar a paróquia liderada por Dom Aldo Roma. Incapaz de cumprir a promessa, ele me pediu para ir em seu lugar. Fiz isso e daí nasceu um forte vínculo entre mim e Piombino Dese, da qual sou cidadão honorário. Um vínculo em memória deste Papa que nos uniu. 

Como você soube da morte de João Paulo I? 

GANTIN: Descobri isso de uma forma um tanto paradoxal. Embora eu seja um clérigo do Vaticano, aprendi sobre isso fora da Itália. Eram cerca de seis e meia da manhã do dia 29 de setembro. Eu estava me preparando para ir celebrar a missa quando um amigo me ligou da Suíça para me contar que o Papa havia falecido. Fiquei sem palavras. Mas como é que o Papa que me recebeu ontem de manhã morreu… 

Como é que o encontraram naquela audiência? 

GANTIN: Muito bom. Foi ele quem moveu as cadeiras para que pudéssemos tirar uma foto na qual todos os presentes pudessem ser vistos. Ainda guardo essa foto como uma das coisas mais preciosas. Ninguém poderia imaginar que poucas horas depois ele iria para a Eternidade, para o Senhor. 

Depois, ela participou do segundo conclave de 1978. Os livros que falam sobre isso relatam uma frase que ela teria pronunciado naquela ocasião: «Os cardeais estão chocados e procuram o que fazer no escuro»… e porque eu era membro desta venerada Congregação. O processo nesses casos é muito lento e cauteloso. Mas se eu tivesse que expressar meus pensamentos, lembraria que Luciani foi um homem que merece ser proposto como modelo e exemplo de adesão total à vontade de Deus. Mesmo que no coração essa obediência ao Senhor produza dor, e um sentimento de pequenez e fraqueza diante das grandes responsabilidades às quais se pode ser chamado. 

Qual pode ser o significado de um pontificado curto como o de João Paulo I?

GANTIN: É o Senhor quem organiza tudo. Os homens propõem e a Providência dispõe. Certamente não deixou de ter significado para o presente e o futuro. A brevidade não impede a fecundidade. Esta é uma grande lição para mim: deixar-nos guiar pelo Espírito Santo, não pelos nossos pensamentos e sentimentos pessoais.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Reflexão para o Domingo de Ramos (C)

Domingo de Ramos no Vaticano - Foto arquivo  (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Fazei isto em minha memória, tomai e comei, partilhar a vida! Celebremos a Paixão de Jesus, sua Páscoa, acolhendo o pecador, partilhando nossa fé na vitória da Vida, na certeza da vitória do perdão!

Padre Cesar Augusto, SJ – Vatican News

A Ceia, a última Ceia de Jesus, é a prefiguração de sua entrega a Deus por nós e a conclusão de sua missão. Nela ele promete a restauração da humanidade e nos associa ao seu destino. “Fazei isto em memória de mim” é um mandamento convite para nos identificarmos com ele, para repartirmos nossa vida com os outros. Quando celebramos a Eucaristia, o “partir o pão eucarístico” é porque já o fizemos com nosso pão diário e com toda a nossa vida e pretendemos continuar nesse partilhar nossa vida.

Também dentro do contexto eucarístico Lucas nos coloca a atitude cristã do serviço, do ser o último. Jesus diz: “Entre vós o maior seja como o mais novo, e o que manda, como quem está servindo”. “…estou no meio de vós como aquele que serve.” Servir, dentro da visão cristã, significa ocupar mesmo o último lugar, ser autoridade significa servir!

São Lucas, no relato da Paixão, destaca a bondade e a misericórdia do senhor.

Já no horto Jesus impede que Pedro pague mal com mal, e lhe diz para “guardar sua espada dentro da bainha”. A atitude dos cristãos para com seus adversários deverá ser a do perdão. Para Jesus, o seu discípulo não tem inimigo, aliás, o inimigo, aquele que deverá ser destruído, esmagado é o demônio. Os demais, os que fazem mal são vistos como adversários que deverão ser trabalhados para que se libertem do mal e se salvem.

Mais adiante, dentro do relato da paixão, ao ser negado por aquele a quem confiaria as suas ovelhas – Pedro -, olha-o com carinho e compreensão por sua fraqueza e a reação de Pedro foram as lágrimas de profundo arrependimento. Por isso, por essa experiência e por outras, Pedro escreveu em sua primeira: “ultrajado, não retribuía com idêntico ultraje; ele, maltratado não proferia ameaças” (1Pd2, 23).

Antes de dar o último suspiro Jesus disse: “Pai, perdoa-lhes este pecado, porque não sabem o que fazem!” (Lc 23,34)

Em seu relato São Lucas comenta a atitude de pessoas como Herodes e as mulheres que estavam pelo caminho do calvário. Herodes vê Jesus como um proporcionador de benefícios. Mas Jesus não é um mercador, mas sim alguém que age em nome do Pai. Diante das mulheres que choram pelo caminho ao ver suas dores, Jesus reconhece nelas e em seus filhos os frágeis que penam por causa do interesse dos poderosos.

Finalmente Lucas apresenta Jesus morrendo entre dois bandidos. Ele nasceu entre animais, em uma estrebaria e suas primeiras visitas foram os pastores, gente impura para os judeus. Mais tarde chegam os magos, pagãos! Também ao longo de sua vida Jesus se relaciona continuamente com os desprezados da sociedade de seu tempo, os considerados impuros, como os publicanos, as meretrizes, os pecadores. Agora, na hora da morte, seus companheiros são bandidos! Seus discípulos se mantêm à distância, mas ao lado estão os dois ladrões. Mas longe de ser demérito, isto é legitimação da vida do Redentor. Ele não veio para salvar os pecadores? Pois é! Ele volta para o pai com as mãos cheias! Leva consigo Dimas, o bandido que foi recuperado na última hora e que ele mesmo, Jesus, garantiu que estaria com ele no céu, “ainda hoje”. Leva também, só que mais tarde, o oficial romano que declaro; “De fato! Este homem era justo!” Leva tantos pecadores convertidos pelos seus gestos de acolhida, de perdão, de vida!

Fazei isto em minha memória, tomai e comei, partilhar a vida! Celebremos a Paixão de Jesus, sua Páscoa, acolhendo o pecador, partilhando nossa fé na vitória da Vida, na certeza da vitória do perdão! O que recebemos de graça, de graça devemos dar. Recebemos o perdão de Deus mediante a redenção de Jesus Cristo!

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF