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quinta-feira, 6 de maio de 2021

ESTUDOS BÍBLICOS: SOLA SCRIPTURA (Parte 4/7)

Ecclesia

SOLA SCRIPTURA

Na vaidade de suas mentes

Uma análise ortodoxa deste ensinamento ortodoxo

Por John Whiteford

Tradução de Rafael Resende Daher

2º FALSA SUPOSIÇÃO: A BÍBLIA ERA A BASE DA IGREJA PRIMITIVA, E QUE A TRADIÇÃO É APENAS UMA "CORRUPÇÃO" HUMANA MUITO POSTERIOR.

É especialmente entre Evangélicos e Carismáticos que a palavra "tradição" é considerada um termo depreciativo, a tradição é rotulada como algo "carnal," "espiritualmente morta," "destrutiva," "legalista." Para o protestante que lê o Novo Testamento, a Bíblia condena a tradição como algo oposto à Bíblia. A imagem que eles têm dos cristãos primitivos é de que eles eram como os Evangélicos ou Carismáticos do século XX! Para eles é inconcebível que os cristãos primitivos possuíam uma louvação litúrgica, ou que eles tinham adquirido qualquer tradição — acreditam que isso ocorreu somente após a Igreja ter sido "corrompida," é assim que imaginam que tais coisas entraram na Igreja. É um sopro de vida para estes protestantes (assim como para mim) quando eles estudam a Igreja primitiva e os escritos dos primeiros Padres, e começam a sentir algo diferente do que sempre imaginaram ou foram conduzidos a sentir. Por exemplo, os cristãos primitivos não levavam suas Bíblias para a Igreja em cada domingo de estudo da Bíblia, devido ao longo tempo para se fazer uma cópia, e poucos possuíam suas próprias cópias da Bíblia. Ao invés disso, as cópias da Bíblia eram mantidas por pessoas designadas pela Igreja, que ficavam num local da Igreja destinado à louvação. Além de que, os cristãos não possuíam cópias do Velho Testamento, e muito menos do Novo Testamento (que não foi terminado antes do final do Primeiro Século, e não em sua forma canônica até o Quarto Século). Isto não é o mesmo que dizer que os cristãos primitivos não estudavam a Bíblia — eles estudavam, mas como um grupo, e não individualmente. E em grande parte do primeiro século, os cristãos estavam limitados em estudar apenas o Velho Testamento. Assim, como eles sabiam dos Evangelhos, dos ensinamentos de Cristo, de como louvar, em que acreditar sobre a natureza de Cristo etc? Eles possuíam apenas a Tradição Oral dos Apóstolos, ensinamentos dos Apóstolos, especialmente durante a virada do primeiro século. Depois as gerações futuras tiveram acesso às Escrituras dos Apóstolos pelo Novo Testamento, mas a Igreja primitiva foi totalmente dependente da Tradição Oral para ter conhecimento da Fé Cristã.

Esta dependência da Tradição é descrita em vários lugares do Novo Testamento. Por exemplo, quando São Paulo exorta os Tessalonicenses: "Assim, pois, irmãos, ficai firmes e conservai as tradições que de nós aprendestes, seja por palavras, seja por carta nossa" (II Tessalonicenses 2:15).
A palavra traduzida como "tradição" é a palavra grega "paradosis" — que é traduzida de maneira diferente em algumas Bíblias protestantes, mas é a mesma palavra que os Ortodoxos Gregos usam para falar da Tradição, e poucos estudantes competentes da Bíblia discutiram seu significado. A própria palavra significa literalmente "meio pelo qual algo é transmitido," e é a mesma palavra utilizada negativamente para os falsos ensinamentos dos Fariseus (Marcos 7:3-8), e referida também para a autoridade de um Cristão para ensinar (I Coríntios 11:2. II Tessalonicenses 2:15). Qual a diferença entre a tradição dos Fariseus e a Tradição aprovada pela Igreja? A Fonte! Cristo deixou bem claro qual era a fonte das tradições dos Fariseus, quando a chamou de "tradição dos homens" (Marcos 7:8). São Paulo faz outras referências às tradições: "Eu vos felicito, porque em tudo vos lembrais de mim, e guardais as minhas tradições (paradoseis), tais como eu vo-las transmiti" (I Coríntios 11:2), mas onde ele adquiriu estas tradições anteriores? "Eu recebi do Senhor o que vos transmiti (paredoka): que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão" (I Coríntios 11:23). Assim a Igreja Ortodoxa recorre ao falar da Tradição Apostólica: "entregue (paradotheise) de uma vez para sempre aos santos" (Judas 3). Sua fonte é o Cristo, que a entregou diretamente aos Apóstolos, com tudo aquilo que Ele disse e fez, como o que está escrito: "nem o mundo inteiro poderia conter os livros que se deveriam escrever" (João 21:25). Os Apóstolos entregaram este conhecimento para toda a Igreja, e a Igreja, tornou-se a "coluna e sustentáculo da verdade" (I Timóteo 3:15).

O testemunho do Novo Testamento é claro neste ponto: os cristãos primitivos receberam as Tradições escritas e orais pelos Apóstolos de Cristo. Da Tradição escrita eles possuíam apenas fragmentos — uma igreja local possuía uma Epístola, outra um Evangelho. Os escritos foram reunidos gradualmente, e colocados no livro que se tornou o Novo Testamento. E como os cristãos primitivos sabiam quais eram os livros autênticos e quais não eram — já que havia numerosas epístolas e evangelhos espúrios reivindicados por hereges como escritos dos Apóstolos? Foi a Tradição Apostólica oral que ajudou a Igreja nesta tarefa.

Os protestantes reagem violentamente contra a idéia da Santa Tradição, pois o que encontram geralmente é o conceito de Tradição do Catolicismo Romano, como a personificada no Papado, que desenvolveu novos e desconhecidos dogmas para a igreja (como a infalibilidade Papal, justamente o exemplo mais odioso) — o Ortodoxo não acredita no crescimento ou na mudança da Tradição. Quando a Igreja enfrenta uma heresia, ela é forçada a definir a diferença entre a verdade e o erro, mas a Verdade não muda. Pode-se dizer a Tradição se expande na medida dos movimentos da Igreja pela história, mas não se esquece de suas experiências neste caminho, pois santos surgiram durante este percurso, e preservá-los é declarar a fé com precisão; "entregue de uma vez para sempre aos santos" (Judas 3).

Mas como podemos saber que a Igreja preservou a Tradição Apostólica em toda sua pureza?

A resposta curta é de que Deus a preservou na Igreja pois Ele prometeu que faria isso. Cristo disse que Sua Igreja não seria vencida pelos portões do inferno (Mateus 16:18), e de que Cristo é a cabeça da Igreja (Efésios 4:16), e a Igreja é o Corpo de Cristo (Efésios 1:22-23). Se a Igreja perder a pura Tradição Apostólica, a Verdade deixa de ser a Verdade — pois a Igreja é a coluna e o sustentáculo da Verdade (I Timóteo 3:15). A crença protestante sobre a história da Igreja, de que a Igreja caiu em apostasia durante o período de Constantino até a Reforma, deixou estes e muitos outros trechos da Bíblia sem sentido. Se a Igreja deixa de existir, mesmo que por um dia, os portões do inferno a venceram naquele dia. Se o caso fosse este, Cristo teria descrito de maneira diferente a Igreja na parábola da semente de mostarda (Mateus 13:31-32), Ele deveria ter falado que no lugar da semente uma nova semente teria brotado mais tarde — mas ao invés disso, Ele usou a figura de uma semente de mostarda que começa pequena, mas cresce continuamente e se torna a maior planta do jardim.

Sobre esta posição, deveria ter existido algum grupo verdadeiro de fiéis protestantes, que sobreviveram durante mil anos nas cavernas, mas onde está a evidência deles? Os Waldensianos, que são apontados como seus precursores por todas as seitas dos Pentecostais às Testemunhas de Jeová, não existiam antes do século XII. Eles dizem que estes verdadeiros fiéis sofreram valentemente as ferozes perseguições dos romanos, e que se esconderam nas colinas até quando o Cristianismo tornou-se uma religião legal. E isso pode até parecer possível, quando comparada com a noção de que um grupo tenha sobrevivido por mil anos sem deixar nenhum rastro de evidência histórica sobre sua existência.

Até este ponto alguém pode dizer que houve pessoas na história da Igreja que foram contrários a seus ensinamentos, mas o que isso tem a ver com a Tradição Apostólica? Além do mais, caso surgisse uma prática corrupta, como ela poderia ser distinguida da Tradição Apostólica? Protestantes fazem estas perguntas porque na Igreja Católica Romana há "tradições" novas e corruptas, pois o Ocidente Latino corrompeu o entendimento da natureza da Tradição. O entendimento que prevaleceu no princípio da Igreja Latina foi preservado pela Igreja Ortodoxa, em sua essência e de maneira imutável, que conhecemos por sua universalidade ou catolicidade. A Verdadeira Tradição Apostólica é encontrada no consenso do ensinamento histórico da Igreja. Acreditamos no que a Igreja sempre acreditou ao longo da histórica, e em todos os lugares da Igreja você encontra a Verdade. Se qualquer crença não é encontrada na história da Igreja, ela é uma heresia. Porém, preste atenção: estamos falando da Igreja, e não de grupos cismáticos. Houve cismáticos e hereges que se afastaram da Igreja desde o período do Novo Testamento, e eles sempre aparecem, como diz o Apóstolo: "É necessário que entre vós haja hereges para que possam manifestar-se os que são realmente virtuosos" (I Coríntios 11:19).

NOTAS DE RODAPÉ

7. O Waldensianismo foi uma seita fundada no século XII por Pedro Valdo, e que antecipou a Reforma Protestante de alguma maneira. Devido às perseguições da Igreja Católica Romana, esta seita sobreviveu nas regiões montanhosas do noroeste da Itália. Com a chegada da Reforma Protestante, os Waldensianos viram suas influências no movimento da Reforma e juntaram suas forças com ele. Muitos historiadores protestantes reivindicam que os Waldensianos eram os "verdadeiros" Cristãos que existiam antes de Constantino. Embora nenhum historiador sério tenha feito tal reivindicação insubstanciada, muitos fundamentalistas como os Testemunhas de Jeová continuam reivindicando a uma descendência da Igreja primitiva pelos Waldensianos — apesar do fato de que os Waldensianos ainda nem existirem nesta época, e eles certamente não se apresentavam como Testemunhas de Jeová.

ECCLESIA

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF