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domingo, 22 de janeiro de 2023

História da Igreja: Os Primeiros Concílios – Parte 2

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História da Igreja: Os Primeiros Concílios – Parte 2

 POR PROF. FELIPE AQUINO

II. OS CÂNONES: Como em todo concílio esta é a parte disciplinar. São 20 cânones ou normas. A palavra cânon significava cana ou regra de medir. São normas com respeito às ordenações presbiterais e eleições dos bispos, os lapsi(caídos) nas perseguições, e jurisdição de patriarcas. Deles ressaltamos o cânon 3: Proíbe estritamente todo bispo, presbítero, diácono, ou qualquer do clero a ter uma subintroducta (mulher alheia) morando com ele, exceto mãe, ou irmã, ou tia, ou uma pessoa que esteja fora de qualquer suspeita. Cânon 6: Sobre jurisdição dos patriarcas à semelhança do Bispo de Roma, o de Alexandria terá certa jurisdição sobre os sucedâneos de Egito, Líbia e Pentápolis, de modo que não poderá ser ordenado bispo dentro de seu território sem o consenso do Metropolitano. O que serve também para o Metropolitano de Antioquia. Cânon 9: Somente um homem sem culpa pode ser ordenado presbítero. Cânon 15: Bispos, presbíteros e diáconos não devem passar de uma igreja a outra. Nada existe sobre a separação entre evangelhos canônicos e apócrifos como relata Roberto C. P. Júnior que a si mesmo se intitula escritor. Mas disto falaremos em próximo artigo.

ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE O CÂNON IV: Muitos comentaristas consideram este cânon como o mais importante dos vinte aprovados pelo Concílio. Ele diz: “Prevaleça o antigo costume no Egito, Líbia e Pentápolis de modo que o bispo de Alexandria tenha jurisdição em todos eles, posto que o mesmo é costumeiro para o Bispo de Roma também….E isto é entendido de modo geral de forma que, se qualquer um é feito bispo sem o consenso do Metropolitano, o grande Sínodo há declarado que tal pessoa não é bispo…” A primeira tradução latina deste cânon, a chamada Prisca(antiga), modifica o texto grego e diz: “É de antigo costume que o bispo da cidade de Roma tenha um Primado de modo que governe, com seus cuidados, os lugares suburbicários e toda sua própria Província”. Os comentaristas gregos do século XII disseram bastante explicitamente que este sexto cânon confirma os direitos do Bispo de Roma como Patriarca sobre todo o Ocidente. Em fins do século IV havia 120 metropolitas em 120 províncias. O Império Romano havia anteriormente instituído a diocese civil para agrupar as províncias. A diocese era dirigida por um vicarius; a Igreja adotou igual organização. No Oriente havia cinco dioceses. Teria portanto 5 dioceses religiosas. Em cada parte do Império Romano se reconhecia a autoridade superior de uma igreja- Antioquia para Síria e regiões vizinhas; Éfeso para a Ásia Menor; Alexandria para o Egito; Cesareia para a Pérsia.; Constantinopla para a Grécia; Esse sistema não foi adotado nem na Gália, nem na Espanha, nem na Itália onde o papel do Bispo de Roma era bem diferente. Daí as discussões geradas por este cânon. Posteriormente surgiram os Patriarcados e com eles certos antagonismos e certos particularismos foram introduzidos na Igreja. Segundo a versão árabe, ao parecer anterior ao Concílio de Constantinopla (381) nos tempos de Teodósio, “o Patriarca deve ter cuidado sobre os bispos e arcebispos de seu patriarcado. A primazia do Bispo de Roma cabe sobre todos… Embora o arcebispo seja entre os bispos o irmão mais velho, que cuida de seus irmãos e os mantenha em obediência porque tem autoridade sobre eles, o patriarca está acima de todos eles. Do mesmo modo o que ocupa a sede de Roma é a cabeça e o príncipe de todos os Patriarcas, pois que é o primeiro, como foi Pedro, a quem foi dado o poder sobre todos os príncipes cristãos, sobre todos os povos, sendo o Vigário de Cristo Nosso Senhor sobre todos os povos e sobre toda a Igreja Católica. Quem contradizer isto, seja excomungado pelo Sínodo”. Seguindo esta mesma versão, teremos um cânon 35 que diz: “Deve haver somente quatro Patriarcas em todo o mundo, como há quatro evangelhos e quatro rios.. E deve haver um príncipe e chefe deles, o Senhor da sede do sublime Pedro de Roma, como ordenaram os apóstolos. Após ele, o Senhor da grande Alexandria, que foi a sede de Marcos. O terceiro, o Senhor de Éfeso, que foi a sede do sublime João que disse coisas divinas. E o quarto e último é o meu Senhor de Antioquia, que é a outra sede de Pedro. Os bispos sejam divididos pelas mãos destes quatro patriarcas. Os bispos das pequenas cidades que estão sob a autoridade de grandes cidades fiquem sob autoridade dos respectivos metropolitas. Cada metropolita das grandes cidades designe os bispos das províncias, mas nenhum bispo os designe, pois que o metropolita é maior do que os bispos”. Vamos explicar alguns termos.

Metropolita: Significa cidade mãe em grego; é o bispo que na antiguidade tinha uma primazia (lugar preferente) e poder de jurisdição (mandato) sobre outras sedes episcopais em suas vizinhanças. A primazia tinha como símbolo o pálio, que era um dossel mantido como um pano sobre a cabeça do metropolita por 4 ou mais varas seguras por portadores. Hoje, no Ocidente a palavra metropolita designa o arcebispo de uma província eclesiástica que tem sobre os bispos das sedes sucedâneas unicamente uma preferência puramente honorífica. O pálio atual é uma faixa branca com cruzes pretas que o Papa e alguns metropolitas levam como estolas.

Patriarca: Título dos doze chefes das tribos de Israel. No NT título dado aos bispos que desciam diretamente de Pedro como Antioquia e Roma, sendo que Alexandria foi escolhida por ser fundada diretamente por Marcos, discípulo de Pedro. No Concílio de Niceia, Jerusalém teve também o título de Patriarca; e mais tarde Constantinopla porque era a nova Roma. Nos tempos modernos temos o patriarca de Veneza e o patriarca das índias ocidentais entre outros.

Província: Desde o século IV à semelhança da administração civil, a eclesiástica adotou o mesmo tipo de organização, tendo o bispo chamado metropolita, hoje arcebispo, um conjunto de dioceses sobre as quais presidia.

Primado: O bispo que pela antiguidade de sua igreja tem o lugar preferente numa determinada nação ou região, como é o arcebispo de Salvador no Brasil.

III PARTE CONCÍLIO DE NICEIA

O CONCÍLIO VISTO PELOS DISSIDENTES NÃO CATÓLICOS. (APOLOGÉTICA)

“Em 313 D.C. com o grande avanço da Religião do Carpinteiro o imperador Constantino Magno enfrenta problemas com o povo romano e necessitava de uma nova religião para controlar as massas. (1). Aproveitando-se da grande difusão do Cristianismo, apoderou-se dessa Religião e modificou-a, conforme seus interesses. (2) Alguns anos depois, em 325 D.C.,no Concílio de Niceia, é fundada, oficialmente, a Igreja Católica… (3) o Concílio de Niceia.., presidido por Constantino era composto pelos Bispos que eram nomeados pelo Imperador e por outros que eram nomeados por líderes Religiosos das diversas comunidades(4). Tal Concílio consagrou oficialmente a designação “Católica”, aplicada à Igreja organizada por Constantino: “Creio na igreja una, santa, católica e apostólica”. (5) Poderíamos dizer que Constantino foi seu primeiro Papa. Como se vê claramente, a Igreja católica não foi fundada por Pedro e está longe de ser a Igreja primitiva dos Apóstolos” (6)…

Esta citação é parte do artigo firmado por Roberto C.P. Junior em março de 1997, e que parece citado por Jefferson S.B., aparentemente um espírita. Que há de verdade em tudo isso?

Temos numerado os parágrafos para poder mais facilmente refutá-los sem necessidade de citá-los por extenso. Vejamos o 1o ponto: (Constantino) apoderou-se dessa religião e modificou-a conforme seus interesses. A religião cristã em tempos de Constantino era majoritária unicamente no Oriente. No Ocidente era ainda minoritária, especialmente entre os pagos, vilas rústicas. Daí o nome de pagãos para os gentios. Uma exceção era a região de Cartago ou Túnez. Não era o povo romano, mas o Oriente que, com as ideias de Ario que negava a divindade de Jesus, estava dividido. Constantino viu nessa divisão um perigo para a sociedade majoritariamente cristã no Oriente onde ele morava. Pensava podia se repetir o caso dos donatistas como veremos mais adiante. De fato só 5 bispos ocidentais, e dois presbíteros, pertencentes ao Metropolita de Roma, o Papa, estiveram presentes entre os quase 300 bispos do Concílio. A heresia de Ario era praticamente desconhecida no Ocidente. Desde 313 até 324, doze anos, Constantino não influiu na religião cristã do Oriente. Mais: Licínio, que era o imperador do Oriente perseguiu os cristãos, apesar do decreto de Milano em 313 e que ele próprio promulgou pouco mais tarde em Nicomedia, a capital de seu império. Um decênio durou esta perseguição, de modo que no ano 321 todo o Oriente ardia em perseguição. Foi por isso que Constantino, de coração cristão, embora só se batizasse na hora da morte, querendo conservar a paz religiosa, lutou contra ele e o derrotou na batalha de Andrianópolis em 323. Em 324 decapitou Licínio, seu cunhado, como réu de alta traição e ficou dono de todo o império. Como fosse recebido em Roma após dez anos de ausência de modo hostil, e, visto o entusiasmo com que era aclamado no Oriente praticamente cristão, Constantino levantou uma nova Roma em Constantinopla que inaugurou em 330, dividindo o império em 4 prefeituras (Oriente, Ilírico, Itália, e Gália) com 14 dioceses e 116 províncias, base das divisões eclesiásticas. A experiência do donatismo no norte da África, cujo extremismo e violências chegaram a perturbar a província e até todo o norte do continente na época (313) sobre o domínio de Constantino, foi decisiva para posteriores atuações do imperador. Foi para aplacar os ânimos e a violência suscitada pelos donatistas, que pela primeira vez ele interveio em problemas eclesiásticos. Reuniu em Roma um sínodo, tendo como presidente o Papa Milciades, 15 bispos italianos, 3 galos, e 10 de cada facção(donatistas e contrários). O sínodo de Roma foi contrário aos donatistas que apelaram de novo; e em Arlés, um outro sínodo de caráter mais universal, de novo condenou as bases donatistas. Por fim Constantino decidiu-se a atuar com energia. Mas não deu certo. Os donatistas formaram sus exércitos de agonistici (lutadores) e que foram chamados vulgarmente de circumcelliones (merodeadores). Imperadores posteriores intentaram acalmar os ânimos e a luta chegou até os tempos de S. Agostinho que tentou solucionar a licitude da supressão violenta da heresia por parte da autoridade em seus escritos. As palavras de Agostinho serviram de base para a instituição da Inquisição contra os albigenses, que alteravam a ordem social do modo que o faziam os donatistas. A entrada dos vândalos na África, oprimindo juntamente hereges e católicos, acabou com o donatismo.

O 2° ponto que vamos estudar diz: “Alguns anos depois, em 325 D.C. no Concílio de Niceia, é fundada, oficialmente, a Igreja Católica”. Vamos estudar o que há de verdade nesta afirmação. Tomaremos como referência histórica a Britannica, a Catholic Encyclopedia, a História da Igreja, Volume I da BAC e a Patrística de Johannes Quasten. Katholikos, do grego, significa universal, palavra que, segundo os autores eclesiásticos da 2a centúria, distinguia a Igreja cristã em geral, das comunidades locais; e também servia para distingui-la de seitas heréticas ou cismáticas. No primeiro sentido o adjetivo foi usado por Aristóteles e Políbio entre outros clássicos. Justino, mártir (+165) fala da católica ressurreição, Tertuliano (+220) escreve sobre a católica bondade divina e S. Ireneu (+202) sobre os quatro ventos católicos. São palavras que hoje traduziríamos por ressurreição universal, absoluta bondade divina e quatro ventos principais. Mas a combinação de Igreja Católica é encontrada pela primeira vez em S. Ignácio de Antioquia (+107) na sua carta aos de Esmirna(8): “Onde o bispo está, esteja também o povo, como onde está Jesus, aí está a Igreja CATÓLICA”. Segundo alguns autores a palavra deve interpretar-se como a única e só Igreja. A Britannica interpreta católica como universal, única e a mesma, onde quer que haja uma congregação cristã. O cânon de Muratori (c180) fala que certos escritos heréticos não podem ser recebidos na Igreja Católica. Clemente de Alexandria(+220) declara: “Nós dizemos que tanto em substância como em aparência, tanto em origem como em desenvolvimento, a primitiva e Igreja Católica é a única, em concordância, como ela faz, com a unidade da única fé” (Stromata 7,17).

Destes escritos se deduz logicamente que o termo católico era usado tecnicamente no início da terceira centúria (um século antes de Niceia) para designar uma doutrina sã como oposta à HERESIA, e uma unidade de organização como oposta ao ESQUISMA ou divisão das seitas. Terminamos com S. Cipriano (c252). Sua obra mais extensa é Sobre a unicidade da Igreja Católica e frequentemente encontramos em suas obras frases como fé católica, unidade católica, regra católica, referidas a uma ortodoxia como oposta à heresia. Kattenbusch, professor evangélico de Giessen (Alemanha central), não duvida em admitir que, para Cipriano, Católico e Romano são termos intercambiáveis. Mais: a palavra católica algumas vezes foi usada como substantivo para substituir seu equivalente Igreja Católica, como no fragmento Muratoriano e em Tertuliano. Terminamos com palavras de S Cirilo de Jerusalém (c. 347): “Se por acaso tens que pernoitar numa cidade, pergunta não só onde está a casa do Senhor, – porque as seitas também chamam seus tugúrios casa do Senhor- não só onde está a igreja, mas onde está a Igreja Católica. Porque este é o nome peculiar do santo corpo, mãe de todos nós”. Para terminar em suas catequeses: “A Igreja é chamada católica na base de sua extensão universal, sua completa doutrina, sua adaptação a todas as necessidades dos homens de toda classe, e de sua perfeição moral e espiritual”.

Igreja Católica em Niceia: O Credo, atribuído ao Concílio, rejeita os erros arianos sobre a temporalidade do Filho e a diferença de essência do Pai, e termina com estas palavras: “a todos eles a Católica e Apostólica igreja anatematiza”. Se estas palavras podem ser consideradas uma adição posterior, não podemos dizer o mesmo do cânon 8, em que referindo-se àqueles que a si mesmos se consideram Cataros (limpos), quando retornarem à Católica e Apostólica Igreja…deverão professar por escrito que observarão e seguirão os dogmas da Católica e Apostólica Igreja. E fala não só dos dogmas da Igreja Católica, mas também dos bispos ou presbíteros da Igreja Católica. Com estes exemplos basta para que o leitor tenha uma ideia clara do assunto.

3° Ponto: “O Concílio de Niceia… presidido por Constantino era composto pelos bispos, que eram nomeados pelo Imperador e por outros que eram nomeados por líderes religiosos das diversas comunidades”. Que existe de verdade nesta afirmação? Já temos visto como Constantino só foi dono do Oriente no ano 324, ano anterior ao Concílio. O Oriente, do qual procediam a maioria dos bispos, acabava de sofrer uma perseguição sob Licínio, originada em 320, sendo esta uma das causas da guerra entre os dois cunhados, que terminou com a batalha de Andrianópolis e no ano seguinte com a morte de Licínio e seu filho em Tessalônica. Do Ocidente, em que reinava Constantino na época, só 5 bispos estiveram presentes. Tudo isso é completamente contrário à afirmação que tentamos refutar.

Presidido por Constantino: É verdade que foi Constantino quem chamou os bispos para um concílio por medo que surgisse uma “contenda não nascida de algum mandato importante da lei”. Por isso chamou em carta Ario e Alexandro(seu bispo em Alexandria) a ter o mesmo sentimento, e uma mesma comunhão, pois é indecoroso e contra lei que um povo tão numeroso, povo de Deus, seja governado por seu bel prazer, comportando-se ambos como êmulos que disputam por picuinhas e minúcias. Constantino tinha uma experiência desagradável com os donatistas do norte da África, e daí seu interesse em ter a paz e a concórdia. Também é verdade que esteve presente na aula inaugural; que ele dirigiu um apelo aos bispos para encontrar a unidade. Mas os debates e as conclusões do concílio foram feitos pelos bispos de maneira livre, pois Constantino não votou nem usou qualquer força para dirigir os votos dos padres consulares. Dos 300 bispos em números redondos reunidos, 17 não estavam conformes em aceitar o credo. Mas finalmente só três se negaram. A razão foi a palavra Homoousios, apresentada por Constantino, devido à sua novidade e à interpretação dada por Paulo de Samosata, tão materialista que tornava o Filho em essência igual ao Pai, com parte da natureza comum, como um filho se assemelha ao seu pai terreno. A natureza divina estaria dividida em duas: parte era do pai e parte era do Filho. Vencidas as duas dificuldades, a maioria aprovou o credo. É verdade que Constantino desterrou dois bispos à Ilíria(Iugoslávia) junto com Ario e que os livros deste último foram proibidos e mandados queimar por ordem do Imperador. Alguns anos após o Concílio, Ario descobriu uma nova forma de interpretar o Homoousios e apelou ao imperador. Pediu para ser readmitido na comunhão da Igreja, mas esta última recusou. Seu apelo chegou ao imperador a quem sua irmã Constância, moribunda no leito de morte, pediu por Ario e por isso Constantino quis impor à Igreja uma readmissão de Ario, marcando uma data. Enquanto esperava por essa reconciliação, forçada pelo imperador, Ario sofreu uma indisposição e no reservado morreu por uma ruptura dos intestinos. Grande parte desta História foi narrada por Eusébio, filo-ariano.

Mas vejamos o que diz Atanásio na História dos Monges em 358: “Quando uma decisão da Igreja recebeu sua autoridade do Imperador?” e “nunca os padres buscaram o consenso do Imperador, nem o Imperador esteve ocupado com a Igreja”. Foram os heréticos os que se apoiaram no Imperador. Podemos dizer, como conclusão, que a igreja estava desejosa de aceitar a ajuda do Imperador, de ouvir o que ele tinha a dizer, porém não podia aceitar o rol do imperador em matéria de fé. Devemos lembrar que o critério sobre o credo que foi chamado de católico, não foi o pensamento do Imperador, mas o que a maioria pensava que era tradicional, a fé dos apóstolos transmitida e pela qual muitos deles tinham dado seu sangue (eram “confessores” das perseguições anteriores) e estavam dispostos a dar a sua vida pela sua fé.

Com os artigos anteriores temos visto que a Igreja não foi chamada pela primeira vez de católica, nem fundada por Constantino, nem seus bispos eram nomeados diretamente pelo imperador. Mas vejamos outras peregrinas afirmações para saber a verdade. “O concílio reconhece a deidade (sic) do homem da Galileia, embora essa conclusão não tenha sido unânime. Os bispos que discordaram, foram simplesmente perseguidos pelo Imperador Constantino”. Como temos visto, dos 300 bispos(números redondos) só dois não concordaram. A afirmação “os bispos que discordaram, foram simplesmente perseguidos pelo imperador Constantino” é uma meia-verdade. Pela frase parece serem muitos os discordantes e que a perseguição foi uma constante. Na realidade só dois bispos foram punidos. A perseguição foi um exílio que na morte de Constança (irmã de Constantino), poucos anos após o Concílio e vista uma nova interpretação de Ario (Ario morre em 336), Constantino quer readmitir o heresiarca. Outra afirmação é: “poderíamos dizer que Constantino foi seu primeiro Papa. Como se vê claramente a Igreja Católica não foi fundada por Pedro e está longe de ser a Igreja primitiva dos Apóstolos”. Porém sabemos que os papas sempre foram bispos de Roma e Constantino era, na época de Niceia, o Imperador residente no Oriente e cuja capital foi transferida de Niceia para Constantinopla. no ano de 330… Por outra parte temos os nomes dos bispos de Roma desde Pedro até Milciades, papa no tempo do Concílio de Niceia. São no total 35 papas divididos por séculos em 4+ 9+ 15+4, dos quais dois mártires e um antipapa (Hipólito).

Eis uma outra afirmação que pretendemos rebater. Cito textualmente: “Os quatro evangelhos canônicos, que se acredita terem sido inspirados pelo espírito Santo, não eram aceitos como tais no início da igreja. O bispo de Lyon, Irineu, explica os pitorescos critérios utilizados na escolha dos quatro evangelhos (reparem na fragilidade dos argumentos…): O evangelho é a coluna da Igreja, a Igreja está espalhada por todo o mundo, o mundo tem quatro regiões, e convém, portanto, que haja também quatro evangelhos. O evangelho é o sopro do vento divino da vida para os homens, e pois, como há quatro ventos cardeais, daí a necessidade de quatro evangelhos. (…) O Verbo criador do Universo reina e brilha sobre os querubins, os querubins têm quatro formas, eis porque o Verbo nos obsequiou com quatro evangelhos”. A cita é textual, com os erros de gramática correspondentes.

Ainda temos mais uma outra versão pitoresca, mas do lado espírita: “As versões sobre como se deu a separação entre os evangelhos canônicos e apócrifos, durante o Concílio de Niceia no ano 325 D.C, são também singulares. Uma das versões diz que estando os bispos em oração, os evangelhos inspirados foram depositar-se no altar por si só!!!…Uma outra versão informa que todos os evangelhos foram colocados por sobre o altar, e os apócrifos caíram no chão… Uma terceira versão afirma que o Espírito santo entrou no recinto do Concílio em forma de pomba, através de uma vidraça (sem quebrá-la), e foi pousando no ombro direito de cada bispo, cochichando nos ouvidos deles os evangelhos inspirados…” Vamos refutar estas afirmações estudando a formação do cânon tanto do AT como do NT.

LIVROS INSPIRADOS. O CANON

O CANON: Como se formou a lista dos livros sagrados? A palavra cânon significava em grego junco ou caniço. As varas desse material eram usadas como réguas para medir e portanto a palavra veio significar régua ou fixação de uma determinada matéria. Como se formou o cânon ou se fixou os números dos escritos do Velho e Novo Testamento?. Não entraremos com os livros do AT por eles não serem enumerados no artigo que estamos refutando. Quem quiser ver a matéria pode clicar em newadvent.org/ na enciclopédia católica no artigo cânon. Vamos intentar averiguar a fonte de semelhantes afirmações. Parece seja Voltaire no seu Dictionnaire Philosophique na seção Conciles. Era o mesmo homem que afirmou: mente que algo fica. Mas vejamos os fatos verdadeiros.

Tendo, pois, a palavra cânon o significado de lista dos livros sagrados, escritos sob a inspiração do Espírito Santo, vamos, através dos documentos históricos, ver quais e quantos são esses livros, especialmente os do NT.

LIVROS INSPIRADOS:

O primeiro a reconhecer a inspiração é o próprio Jesus segundo o que lemos em Mateus 4,4. Jesus usa o termo técnico judaico da época: Gegraptai (está escrito) Não só de pão vive o homem… de Dt 8,3. Na mesma passagem vemos outras citações: Salmos e de novo Deuteronômio. Seguindo esta tradição estudaremos os primeiros escritos dos padres apostólicos.

A DIDAQUÉ (90-120) -Da crença nos livros que podemos chamar de Sagrados, está a frase da Didaque em XVI 7, (os errethe) como “foi dito”: O Senhor virá e todos os santos com Ele de Zac 14,5 para imediatamente seguir com uma alusão a Mt 26, 64: Então o mundo virá o Senhor vindo sobre as nuvens do céu.

S. IGNÁCIO DE ANTIOQUIA (+ 107) – Fala de “Os gegraptai” como está escrito; e cita uma frase dos Pr 18,17: O justo é acusador de si mesmo. Tem também uma citação de Mt 10, 16 quando recomenda ser prudente como a serpente e sem falsidade(simples) como a pomba.

CLEMENTE (+ 120) -Também Clemente Romano com Gregaptai(está escrito) ou Legei gar e grafé (diz pois a Escritura), afirma a crença na inspiração. Um exemplo: Miríades e miríades estão junto dele; milhares e milhares estão ao seu serviço. E eles gritam: Santo, santo, santo é o Senhor dos Exércitos! Toda a criação está cheia de sua glória. (Is 6,3). Clemente fala de Escrituras Sagradas da verdade, as do Espírito Santo e de Ta lógia tou Theou (as palavras de Deus).

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF