Translate

terça-feira, 6 de junho de 2023

“A graça de Deus salvador: livre, suficiente, necessária para nós” (2/6)

Caravaggio, A conversão de Paulo, Capela Cesari, igreja de Santa Maria do Povo, Roma

Arquivo 30Dias – 06/07 – 2009

“A graça de Deus salvador: livre, suficiente, necessária para nós”

Com essas palavras, Giovanni Battista Montini, em suas notas sobre as Cartas de São Paulo, escritas quando ainda jovem sacerdote, sublinha a experiência e a mensagem do Apóstolo.

de padre Giacomo Tantardini

A conversão cristã, para Agostinho e para Paulo, é (permitam-me usar esta imagem de Dom Giussani, que, a meu ver, não tem equivalente) a passagem do entusiasmo da dedicação ao entusiasmo da beleza; do entusiasmo da nossa dedicação, que em si é bom, ao entusiasmo despertado por uma presença que atrai o coração, uma presença que se deixa encontrar gratuitamente e gratuitamente se deixa reconhecer. Paulo não fez nada para encontrá-Lo. O fato de Ele vir gratuitamente ao nosso encontro realiza a passagem da Poderíamos também dizer que, quando temos a graça de viver a mesma experiência que Paulo viveu, uma experiência idêntica à dele, mesmo infinitamente distante dele, é como se todas as palavras cristãs, a palavra fé, a palavra salvação, a palavra igreja, deixassem transparecer a iniciativa de Jesus Cristo. É Ele que desperta a fé. A fé é obra Sua. É Ele que salva. É Sua iniciativa doar a salvação. É Ele que constrói Sua igreja. “Aedificabo ecclesiam meam” (Mt 16, 18). Aedificabo é um futuro: “Edificarei minha Igreja” sobre a profissão de fé de Pedro, sobre a graça da fé doada a Pedro (cf. Mt 16, 18). É Ele que edifica pessoalmente, no presente, a Sua Igreja sobre um dom Seu.

Como é bonito dizer as palavras cristãs mais simples, a palavra fé, a palavra esperança, a palavra caridade, e perceber que essas palavras indicam uma iniciativa d’Ele, permitem vislumbrar um gesto Seu, a Sua ação. Como experimentou Santa Teresinha do Menino Jesus: “Quando sou caridosa, é só Jesus que age em mim”.

Nós, sacerdotes, na segunda semana depois da Páscoa, lemos no breviário as cartas que Jesus envia às sete igrejas, no livro do Apocalipse. Numa dessas cartas, Jesus diz: “Não renegaste a minha fé” (Ap 2, 13). A minha fé. É a fé de Jesus.

Gratia facit fidem”. Como é simples e bela essa expressão de Santo Tomás de Aquino! É a graça que cria a fé. É Ele que se deixa reconhecer. “Ninguém pode vir a mim se o Pai não o atrair” (Jo 6, 44 e 65), diz Jesus. E Santo Agostinho comenta: “Nemo venit nisi tractus / Ninguém vem [a Jesus], se não é atraído”. A fé é iniciativa Sua. A salvação é iniciativa Sua. É iniciativa Sua a Sua Igreja.

Permitam-me contar-lhes um de meus primeiros encontros com Dom Giussani. A oportunidade para esse encontro me foi dada pelo fato de ter conhecido Angelo Scola, o atual patriarca de Veneza, na época do seminário, em Venegono. Foi ele que me levou a encontrar Dom Giussani. Ainda me lembro daquele encontro em Milão. Giussani falava a um grupo de jovens. A certa altura, perguntou: “O que é que nos põe em relação com Jesus Cristo? O que é que, agora, nos põe em relação com Jesus Cristo?”. Alguns responderam: “A Igreja”, “a comunidade”, “a nossa amizade”, etc. Depois de todos esses depoimentos, Giussani repetiu a pergunta: “O que é que nos põe em relação com Jesus Cristo?”, e em seguida deu ele mesmo a resposta: “O fato de que Ele ressuscitou”. Isso não esquecerei jamais! “O fato que Ele ressuscitou”. Porque, se não tivesse ressuscitado, se não estivesse vivo, a Igreja seria uma instituição meramente humana, como tantas outras. Um peso a mais. Todas as coisas meramente humanas, no final, se transformam num peso.

“O que é que nos põe em relação com Jesus Cristo? O fato de que Ele ressuscitou”. A Igreja é a visibilidade d’Ele vivo. “A Igreja não goza de outra vida”, diz o Credo do povo de Deus, de Paulo VI, “senão a vida da sua graça”. Não tem outro início, a cada momento, senão a Sua atração, o fascínio da Sua graça. A igreja é o termo visível do gesto de Jesus vivo que encontra o coração e o atrai.

Ler Paulo, vivendo por graça o que Paulo compreendeu em sua conversão (como diz o Papa), faz Jesus Cristo transparecer em todas as palavras cristãs, dá a todas as palavras cristãs essa leveza. Do contrário, elas se tornam pesadas. Se a fé fosse uma iniciativa nossa, estaríamos acabados. Como é uma iniciativa d’Ele, é sempre possível a renovação do Seu dom. E, portanto, é sempre possível recomeçar. É uma iniciativa d’Ele, a cada instante. “Gratia facit fidem [...] quamdiu fides durat”.

Foi uma coisa muito bonita o fato de, em 1999, a Comissão Teológica de Estudos entre a Igreja Católica e os luteranos, valorizando justamente essa frase de Santo Tomás de Aquino, ter reconhecido que entre a teologia de Lutero sobre a justificação pela fé e os aspectos essenciais da doutrina dogmática do Concílio de Trento, no decreto De iustificatione, há uma surpreendente identidade.

Santo Tomás de Aquino, portanto, diz que “a graça cria a fé não apenas quando a fé começa, mas a cada instante em que dura”. E acrescenta esta observação belíssima: é necessária a mesma atração da graça, o mesmo tesouro de graça, quer para fazer que nós que cremos permaneçamos na fé, hoje, quer para fazer uma pessoa (caso haja aqui alguém que não crê) passar da não-fé para a fé.

Eu disse isso apenas para explicar que a conversão de Paulo, como de todo cristão, se realiza na passagem da iniciativa do homem para a iniciativa de Jesus, para a surpresa da iniciativa de Jesus, para a confessio supplex. Como era bonito, na missa em latim, quando, antes do Sanctus, dizíamos sempre: “Supplici confessione / Com reconhecimento que pede”. Pois não é possível reconhecer uma presença que ama você, a não ser pedindo que ela continue a amá-lo.
Agora, três sugestões.

Fonte: http://www.30giorni.it/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF