CADERNOS DO CONCÍLIO - VOLUME 5
Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
“A Sagrada Escritura na vida da Igreja”
Dando continuidade ao compêndio de livros
sobre o Concílio Ecumênico Vaticano II, em preparação ao jubileu que a Igreja
viverá no próximo ano e dos sessenta anos de encerramento do Concílio, hoje nos
debruçaremos sobre o volume 5 dessa coleção que tem como tema: “A
Sagrada Escritura na vida da Igreja”.
A Sagrada Escritura sempre foi uma preocupação
da Igreja, sobretudo ao longo do Concílio Ecumênico Vaticano II. Ao longo do
Concílio foi discutido como o anúncio da Palavra de Deus pode chegar a todas as
pessoas. “A Palavra se fez carne e habitou entre nós”, Jesus é
a Palavra encarnada do Pai, Ele veio para ensinar aos homens o caminho do amor,
da fraternidade e da paz.
Após a ressurreição, no dia de Pentecostes,
Jesus sopra sobre os discípulos o Espírito Santo e os envia em missão aos
quatro cantos da terra para que anunciassem a Palavra de Deus. Os discípulos
dariam continuidade a tudo aquilo que Jesus pregou, e dessa forma daria início
a Igreja primitiva. Jesus não estaria mais presente fisicamente, mas por meio
do anúncio da Palavra, Ele estaria presente espiritualmente. Depois dos
discípulos, os padres da Igreja continuaram o anúncio da Palavra, até os dias
de hoje.
A Palavra de Deus é parte integrante da
celebração Eucarística nos dias de hoje, ao longo da missa participamos de duas
grandes mesas: A da Palavra e a da Eucaristia, primeiro nos alimentamos da
Palavra para depois nos alimentarmos da mesa Eucarística. Podemos pegar como
exemplo os discípulos de Emaús, que compreenderam tudo aquilo que aconteceu com
Jesus após Ele lhes explicar as escrituras, e os olhos deles se abriram e
reconheceram Jesus ao partir o pão. Por isso, temos que entender bem a Palavra
que foi proclamada e explicada na homilia pelo sacerdote para que alimentados
pela Palavra possamos comungar do Corpo e Sangue de Cristo.
O Concílio Ecumênico Vaticano II discutiu
bastante sobre a importância da Palavra de Deus na vida da Igreja, inclusive
através da reforma litúrgica, considerando o anúncio da Palavra como parte
integrante da missa, como dissemos acima. Inclusive ao longo do Concílio
Ecumênico Vaticano II e como tratamos no volume 4 dessa coleção, os padres
conciliares publicaram um documento chamado “Dei Verbum”, que tratava sobre a
Palavra de Deus. Em 2010, quarenta e cinco anos depois, o Papa Bento XVI
publicou o documento chamado “Verbum Domini”, em comemoração aos quarenta e
cinco anos da publicação da “Dei Verbum”. Podemos dizer que a “Verbum Domini” é
uma continuação da “Dei Verbum”, e o Papa Bento XVI quis ressaltar a
importância da Palavra de Deus na vida da Igreja.
Ao longo da “Verbum Domini” o saudoso Papa
Bento XVI ressalta a importância da Palavra de Deus na liturgia e na vida da
Igreja, inclusive reiterando que a Palavra de Deus é parte integrante na
liturgia. O Papa diz que os fiéis devem escutar atentamente a Palavra
proclamada e que a homilia do sacerdote deve focar nas leituras que foram
proclamadas e deve ter um cunho catequético, para que os olhos de todos se
abram e possam comungar da Eucaristia.
O capítulo VI da “Dei Verbum” inspira o tema
do volume 5 da coleção cadernos do Concílio: “A Sagrada Escritura na
Vida Igreja”, o documento vai dizer que a Igreja venera as Sagradas
Escrituras do mesmo modo que venera o próprio Corpo do Senhor. Reforça ainda a
importância da Palavra de Deus na Sagrada Liturgia, conforme já dissemos, ao
longo da celebração da missa participamos de duas grandes mesas: Palavra e o
Corpo do Senhor, e temos que participar atentamente de cada uma.
O Espírito Santo fala em nós e ajuda a abrir
os olhos e o nosso coração para compreender aquilo que está dito nas Sagradas
Escrituras. Por isso, antes de ler e meditar a Palavra é preciso pedir a luz e
a sabedoria do Espírito Santo para o melhor entendimento dos textos Sagrados,
pois ao lermos a Sagrada Escritura não estamos lendo qualquer livro, mas a
Palavra de Deus revelada. Para anunciar a Palavra é preciso também pedir a luz
e a sabedoria do Espírito Santo, por isso, Jesus soprou primeiro sobre os discípulos
o Espírito Santo e depois os enviou em missão.
O Espírito Santo acompanha a vida da Igreja
até os dias de hoje, Ele abre os nossos olhos para reconhecer Jesus na
Eucaristia a partir da Palavra que foi anunciada. A Palavra de Deus é viva e
eficaz, e capaz de transformar a vida dos fiéis tornando-os mais santos. É
preciso que todos os fiéis tenham acesso à Palavra de Deus: há muitas traduções
da Bíblia que podem variar uma palavra ou outra, mas a Igreja nunca fugiu
daquilo que está no original, e que vem do Grego, chamada de tradução dos
Setenta.
O documento trata ainda sobre não usar a
Palavra de Deus de forma instrumental, ou seja, ela deve ser usada para o que
de fato ela é designada: conduzir pessoas a Deus. A palavra de Deus deve visar
a salvação do próximo e não a condenação. O Papa Francisco tem dito inúmeras
vezes que não devemos julgar o próximo e nem nos sentirmos juízes dos outros,
mas temos que, a partir da Palavra de Deus, anunciar a misericórdia e o perdão
aos outros. Não podemos fazer uma leitura fundamentalista da Palavra de Deus,
ou seja, interpretar de maneira equivocada o que ali está escrito, mas a partir
da Palavra anunciar o amor de Deus aos outros.
O documento reafirma ainda a importância de
ler e meditar a Sagrada Escritura, sobretudo por parte dos bispos, padres,
diáconos e religiosos. Além desses, os catequistas também devem meditar
diariamente a Palavra, pois esses grupos se dedicam legitimamente ao ministério
da Palavra e devem entregar-se assiduamente a leitura espiritual e ao estudo
aprofundado das Escrituras. Dessa forma, para que possamos falar da Palavra de
Deus para os outros, temos que ter o conhecimento daquilo que estamos falando.
Nessa linha de pensamento, o que o documento
quer dizer é que os bispos, sacerdotes e diáconos antes de proferirem a homilia
ou a partilha da Palavra é necessário se preparar antes, ter o contato com as
leituras que serão proclamadas, escrever se for preciso os pontos chaves, para
que possa transmitir os conhecimentos que adquiriu com aquelas leituras. Do
mesmo modo os catequistas, antes de passarem o conteúdo aos catequizandos, têm
de se preparar antes, ter o contato com o tema que será apresentado e com a
Palavra que será partilhada no dia, para que os catequizandos absorvam aquilo
que será transmitido.
A Palavra de Deus como um todo visa a Salvação
do gênero humano, como observamos ao longo do Antigo Testamento, a história da
salvação e aliança que Deus fez com o povo de Israel. Em Jesus, Deus sela uma
nova e eterna aliança com a humanidade. O documento “Dei Verbum” tem muito
ainda a ser estudado, e mesmo após cinquenta anos de sua publicação ele
continua atual. A Palavra de Deus deve ter o seu lugar de destaque na vida da
Igreja e na vida de cada batizado. Façamos diariamente a meditação da Palavra e
transmitamos aquilo que de fato está contido nela. Ao participarmos da missa
escutemos atentamente aquilo que a Palavra nos diz para podermos comungar da
Eucaristia.
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