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quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

A Criação - Parte 3

A Criação (Opus Dei)

A Criação

A doutrina da Criação constitui a primeira resposta às indagações fundamentais sobre nossa origem e nosso fim.

06/01/2015

2. A realidade criada

O efeito da ação criadora de Deus é a totalidade do mundo criado, “céus e terra” (Gn 1,1). Deus é “Criador de todas as coisas, das visíveis e das invisíveis, espirituais e corporais; que por sua virtude onipotente, desde o princípio dos tempos e simultaneamente, criou do nada a uma e outra criatura, a espiritual e a corporal, isto é, a angélica e a material, e depois a humana, como comum, composta de espírito e de corpo”[11].

O cristianismo supera tanto o monismo (que afirma que a matéria e o espírito se confundem, que a realidade de Deus e do mundo se identificam), como o dualismo (segundo o qual a matéria e o espírito são princípios originários opostos).

A ação criadora pertence à eternidade de Deus, mas o efeito de tal ação está marcado pela temporalidade. A Revelação afirma que o mundo foi criado como mundo com um início temporal[12], isto é, que o mundo foi criado com o tempo, o qual é indício muito coerente com a unidade do desígnio divino de revelar-se na história da salvação.

2.1. O mundo espiritual: os anjos

“A existência dos seres espirituais, não-corporais, que a Sagrada Escritura habitualmente chama anjos, é uma verdade de fé. O testemunho da Escritura é tão claro quanto a unanimidade da Tradição” (Catecismo, 328). Os dois testemunhos mostram os anjos em sua dupla função de amar a Deus e ser mensageiros de seu desígnio salvador. O Novo Testamento apresenta os anjos em relação a Cristo: criados por Ele e para Ele (Col 1,16), rodeiam a vida de Jesus desde o seu nascimento até a Ascensão, sendo os anunciadores de sua segunda vinda, gloriosa (cf. Catecismo, 333).

Da mesma forma, também estão presentes desde o início da vida da Igreja, que se beneficia de sua ajuda poderosa, e em sua liturgia se une a eles na adoração a Deus. A vida de cada homem está acompanhada desde seu nascimento por um anjo que o protege e conduz à Vida (cf. Catecismo, 334-336).

A teologia (especialmente São Tomás de Aquino, o Doutor Angélico) e o Magistério da Igreja aprofundaram no estudo da natureza desses seres puramente espirituais, dotados de inteligência e vontade, afirmando que são criaturas pessoais e imortais, que superam em perfeição a todas as criaturas visíveis (cf. Catecismo, 330).

Os anjos foram criados em estado de prova. Alguns se rebelaram irrevogavelmente contra Deus. Caídos no pecado, Satanás e os outros demônios – que haviam sido criados bons, mas por si mesmos se fizeram maus – instigaram nossos primeiros pais para que pecassem (cf. Catecismo, 391-395).

2.2. O mundo material

Deus “criou o mundo visível em toda a sua riqueza, diversidade e ordem. A Sagrada Escritura apresenta a obra do Criador, simbolicamente, como uma sequência de seis dias "de trabalho" divino, que terminam com o "descanso" do sétimo dia (Gn 1,1-2,4)” (Catecismo, 337). “Repetidas vezes a Igreja teve de defender a bondade da criação, inclusive do mundo material (cf. DS 286; 455-463; 800; 1333; 3002)” (Catecismo, 299).

“Pela própria condição da criação, todas as coisas estão dotadas de firmeza, verdade e bondade próprias e de uma ordem” (GS 36,2). A verdade e bondade da criação procedem do único Deus Criador, que é, ao mesmo tempo, Trino. Assim, o mundo criado é um certo reflexo da atuação das Pessoas divinas: “em todas as criaturas encontra-se uma representação da Trindade, na forma de um vestígio”[13].

O cosmos tem uma beleza e uma dignidade enquanto obra de Deus. Há uma solidariedade e uma hierarquia entre os seres, o que deve levar a uma atitude contemplativa de respeito para com a criação e as leis naturais que a regem (cf. Catecismo, 339, 340, 342, 354). Certamente, o cosmos foi criado para o homem, que recebeu de Deus a ordem de dominar a terra (cf. Gn 1,28). Tal ordem não é um convite à exploração despótica da natureza, mas um convite para participar no poder criador de Deus: mediante seu trabalho, o homem colabora no aperfeiçoamento da criação.

O cristão participa das justas exigências que a sensibilidade ecológica tem manifestado nas últimas décadas, sem cair em uma vaga divinização do mundo, e afirmando a superioridade do homem em relação aos outros seres, como “ponto culminante da obra da criação” (Catecismo, 343).

2.3. O homem

As pessoas humanas gozam de uma peculiar posição na obra criadora de Deus, ao participar, simultaneamente, da realidade material e da espiritual. Somente do homem a Escritura nos diz que Deus o criou “à sua imagem e semelhança” (Gn 1,26). Ele foi colocado por Deus como cabeça da realidade visível, e goza de uma dignidade especial, pois, “De todas as criaturas visíveis, só o homem é "capaz de conhecer e amar seu Criador" (216); ele é a "única criatura na terra que Deus quis por si mesma" (217); só ele é chamado a compartilhar, pelo conhecimento e pelo amor, a vida de Deus. Foi para este fim que o homem foi criado, e aí reside a razão fundamental da sua dignidade” (Catecismo, 356; cf. ibidem, 1701-1703).

Homem e mulher, em sua diversidade e complementaridade, queridas por Deus, gozam da mesma dignidade como pessoas (cf. Catecismo, 357, 369, 372). Em ambos, ocorre a união substancial do corpo e da alma, sendo esta a forma do corpo. Sendo espiritual, a alma humana é criada imediatamente por Deus (não é “produzida” pelos pais, nem é pré-existente), e é imortal (cf. Catecismo, 366). As duas características (espiritualidade e imortalidade) podem ser mostradas filosoficamente. Portanto, é um reducionismo afirmar que o homem procede exclusivamente da evolução biológica (evolucionismo absoluto). Na verdade, há saltos ontológicos que não podem ser explicados só pela evolução. A consciência moral e a liberdade do homem, por exemplo, manifestam sua superioridade sobre o mundo material, e são sinais de sua especial dignidade.

A verdade da criação ajuda a superar tanto a negação da liberdade (determinismo) como o extremo contrário da exaltação indevida da mesma: a liberdade humana é criada, não absoluta, e existe em mútua dependência da verdade e do bem. O sonho de uma liberdade como puro poder e arbitrariedade corresponde a uma imagem deformada, não só do homem, mas também de Deus.

Mediante sua atividade e seu trabalho, o homem participa do poder criador de Deus[14]. Além disso, sua inteligência e sua vontade são uma participação, uma faísca da sabedoria e do amor divinos. Enquanto o resto do mundo visível é mero vestígio da Trindade, o ser humano constitui uma autêntica imago Trinitatis.

Santiago Sanz

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Bibliografia básica

Catecismo da Igreja Católica, 279-374.

Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 51-72.

DH, nn. 125, 150, 800, 806, 1333, 3000-3007, 3021-3026, 4319, 4336, 4341.

Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, 10-18, 19-21, 36-39.

João Paulo II, Creo en Dios Padre. Catequesis sobre el Credo (I), Palabra, Madri 1996, 181-218.

Leituras recomendadas

Santo Agostinho, Confissões, livro XII.

São Tomás de Aquino, Summa Theologiae, I, qq. 44-46.

São Josemaria, Homilia “Amar o mundo apaixonadamente”, em Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, 113-123.

Joseph Ratzinger, Creación y pecado, Eunsa, Pamplona 1992.

João Paulo II, Memoria e identidade, Ed. Objetiva, 2005.

 

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[11] Concílio Lateranense IV (1215), DH 800.

[12] Assim o ensina o Concílio Lateranense IV e, referindo-se a ele, o Concílio Vaticano I (cf. respectivamente DH 800 e 3002). Trata-se de uma verdade revelada, que a razão não pode demonstrar, como ensinou São Tomás na famosa disputa medieval sobre a eternidade do mundo: cf. Contra Gentiles, lib. 2, cap. 31-38; e seu opúsculo filosófico De aeternitate mundi.

[13] São Tomás, Summa Theologiae, I, q. 45, a. 7, co.; cf. Catecismo, 237.

[14] Cf. São Josemaria, Amigos de Deus, 57.

 Fonte: https://opusdei.org/pt-br

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF