Arquivo 30Dias, número 05 - 2008
PROLIFERAÇÃO NUCLEAR. Breve crônica a partir da Guerra
Fria
Volta-se a falar de atômica
Controlar seriamente os armamentos atômicos, impedir a
proliferação; não ignorar os alarmistas que nos meios de comunicação falam da
ameaça dos arsenais ainda repletos de ogivas nucleares.
de Benedetto Cottone
No dia 17 de junho de 1945 Winston Churchill recebeu em sua casa a visita do conselheiro do presidente americano Truman, Henry Stimson, o qual lhe entregou uma folha na qual estava escrito: “Crianças nascidas de modo muito satisfatório” era a notícia codificada da positiva experiência do primeiro artefato atômico; Churchill conta que, no dia seguinte, o próprio Stimson explicou que a bomba tinha sido explodida, no deserto do Novo México, no alto de uma torre de trinta metros e que os cientistas, para observar o seu efeito, tinham-se acomodado à distância de quinze quilômetros, atrás de maciços escudos de cimento armado.
Durante a Segunda Guerra Mundial a mais poderosa arma utilizada tinha sido a americana arrasa-quarteirão (blockbuster), de dez toneladas de TNT, capaz de destruir uma quadra inteira. Depois da blockbuster os Estados Unidos realizaram a bomba atômica propriamente dita. Fortalecidos com a nova arma, eles pediram ao Japão a rendição incondicionada, mas o governo japonês recusou-se a aceitá-la, e assim no dia seis de agosto foi lançada a primeira bomba atômica sobre Hiroshima e, logo depois, a segunda sobre Nagasaki. Como consequência Japão rendeu-se imediatamente e a guerra teve seu fim.
Estas duas bombas, chamadas “quilotônicas”, tinham cada uma um potencial de 15 mil toneladas de TNT e os efeitos, como se sabe, foram terríveis.
O progresso tecnológico, depois de algum tempo, passou da bomba quilotônica à bomba tipo A (com um potencial de variava de 20 mil a 30 mil toneladas de TNT) e depois à monstruosa bomba “megatônica” de tipo H (ao Hidrogênio) que tinha um potencial mil vezes maior do que a A (de 2 milhões a 20 milhões de toneladas de TNT!).
Mas quais e quantos danos físicos poderia provocar um terrível conflito nuclear? Impossível avaliar! E este é o verdadeiro e angustioso temor universal.
A ciência, que também criou a energia nuclear – benéfica, de resto, quando aplicada a objetivos pacíficos – não dispõe, pelo menos até agora, de sistemas de análises e de previsões em condições de controlar a complexidade dos efeitos de uma bomba atômica. Alguns destes efeitos foram descobertos de modo casual. Mas quais e quantos outros restam ignorados?
Alguns exemplos: quando, em 1954, os Estados Unidos mandaram explodir um artefato nuclear com potência de 8 milhões de toneladas de TNT, na barreira coralina das Ilhas Marshall, foi previsto o fallout (a chuva radioativa) dentro de um limite de 18 mil quilômetros quadrados, mas na realidade, foi contaminada uma área muito mais vasta: um navio de pesca japonês, distante sessenta quilômetros do perímetro perigoso previsto, foi investido pela contaminação e a tripulação logo teve os terríveis sintomas das várias radiopatias. Na ocasião também foi atacado pelo fallout o atol de Rongelap, distante cento e cinquenta quilômetros, e embora a evacuação da população tivesse ocorrido apenas depois de dois dias, as crianças tiveram problemas de tireóide, com consequente atraso de crescimento, e alguns anos depois foi operado, por neoplasmas na tireóide, um jovem que durante o estouro estava no ventre de sua mãe. Em 1958 dois artefatos nucleares que explodiram na Ilha de Johnson, no Oceano Pacífico, provocaram, a mais de mil quilômetros de distância e por algumas horas, a interrupção, não prevista, das comunicações rádio, por causa da laceração da ionosfera (a região da atmosfera entre os sessenta e os mil quilômetros de altitude que reflete sobre a terra os sinais rádio). Um outro efeito da detonação nuclear, não previsto, foi acertado quando, por causa de impulsos eletromagnéticos desencadeados, foram destruídos os equipamentos eletrônicos dos computadores, com a consequente paralisação de qualquer atividade tecnológica.
Um número grande de explosões nucleares poderia provocar a destruição parcial ou total da camada atmosférica de ozônio que protege todos os seres vivos das radiações ultravioletas, e não se sabe qual poderia ser a intensidade de tal destruição e por quanto tempo esta poderia agir, o certo é que seria abalada a estrutura ecológica que consente a vida sobre o nosso planeta.
Hoje, infelizmente, há uma perigosa proliferação nuclear e várias nações já possuem a bomba atômica.
O fenômeno da chamada “globalização” surgido cerca de trinta anos atrás, até agora foi aplicado apenas na esfera econômica. A globalização ainda está bem longe de ter consentido a todas as nações do mundo a aceitação do princípio de pluralismo democrático, com o respeito das liberdades políticas e dos direitos humanos: diante de sociedades abertas e democráticas ainda há muitas fechadas e ideologizadas e ainda mais há o aparecimento do diabólico terrorismo internacional. Então é absolutamente necessário não apenas controlar seriamente os armamentos atômicos, mas também mostrar de maneira mais ampla possível quais seriam as apocalípticas consequências de um uso insano da arma nuclear.
Com o fim da guerra na Europa, já em junho de 1946, ou seja um ano depois do
fim do conflito, o Ocidente tinha desmobilizado: os Estados Unidos tinham
reduzido as próprias forças armadas de 8 milhões e 500 mil homens a 1 milhão e
730 mil, a Grã Bretanha de 5 milhões a 790 mil, e também os outros países
tinham reduzido seus próprios exércitos.
Apenas a URSS mantinha intacta e em pé de guerra o seu potencial de forças: a
URSS não se sentia segura depois da vitória, e desde aquele momento o temor de
ser agredida não os teria mais abandonado.
Não se pode esquecer que quando o secretário norte-americano George Catlett Marshall lançou da Harvard University o Plano para a Reconstrução Européia (ERP), mais conhecido como Plano Marshall, oferecia a ajuda americana tanto para a Europa ocidental quanto para a Europa oriental; mas em 4 de julho de 1947 o ministro soviético Molotov recusou a oferta americana para a Europa oriental: evidentemente a URSS temia o assédio e a agressão.
Em 1948 a ONU aprovou o plano do financista americano Bernard Baruch para o desarmamento (naquela época apenas os EUA possuíam a bomba atômica).
Entre 1970 e 1972 a URSS – que já tinha instalado três tipos de mísseis balísticos intercontinentais e que inaugurava todos os anos oito submarinos com dezesseis mísseis cada um – chegou finalmente à paridade nuclear com os EUA e desde então, e por muitos anos, as duas superpotências se confrontavam na base do “equilíbrio do terror”. Ambas as potências possuíam a “second strike capability”, ou seja o deterrente em base ao qual cada uma das potências tinha condições de absorver o primeiro golpe de surpresa e de responder com um segundo golpe.
Depois da queda do Muro de Berlim e do desmantelamento da URSS, a tensão entre as duas superpotências cessou, mas ainda hoje não se pode dizer que entre Rússia e Estados Unidos esta tenha desaparecido completamente.
Todavia se pode fazer uma afirmação na qual acredito que exista mais verdade do que paradoxo: se não tivesse existido a bomba atômica, a guerra entre Estados Unidos e URSS teria estourado há muito tempo.
Perguntamo-nos: durante a segunda guerra fria as duas superpotências tinham entendido que a guerra atômica teria sido um holocausto para todos? Na minha opinião os Estados Unidos tinham compreendido desde o primeiro momento, tanto que o presidente Truman respondeu com um não absoluto quando, na guerra coreana de 1950-1953, alguns generais americanos pediam o bombardeio atômico sobre a Coréia do Norte; mas acredito que também a URSS tivesse entendido, e se poderia até mesmo indicar precisamente quando isso aconteceu: no dia em que Kruchev, ameaçado por Kennedy, levou de volta seus mísseis que estavam em Cuba.
Considerando que um efeito nuclear tornaria pelo menos mínimas as perspectivas de sobrevivência de animais e plantas no nosso planeta, pode-se ter certeza de que não haverá mais guerras mundiais?
Devemos recordar sempre do célebre epifonema de Voltaire: “A única coisa que
pode dar uma pálida ideia do infinito é a estupidez humana”.
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