Os três inimigos da alma
19 de março de 2025
Existe uma tradição da espiritualidade cristã, provavelmente
surgida com Santo Agostinho, de identificar três inimigos de
nossa alma: “Eis que os homens já foram batizados, e seus pecados já foram
perdoados… e, no entanto, resta a luta com a carne, resta a luta
com o mundo, e resta a luta com o diabo” (Sermo 158,4).
No monaquismo medieval, a figura dos inimigos da alma foi
assumindo até mesmo tons militares: “Pois existem três tiranos que lideram seus
exércitos em batalha contra nós. O diabo conduz suas tropas de sugestões
perversas à alma fiel. O mundo dispõe as circunstâncias favoráveis e adversas
para nos subjugar. E a carne levanta-se-nos em batalha, suscitando as hostes de
desejos carnais” (Hugo de São Vitor, In Ecclesiasten 16).
Por detrás dessa linguagem poética, no entanto, está a
verdade espiritual de que “a vida do homem sobre a terra é uma luta” (Jó 7,1)!
E não se trata, aqui, de uma luta meramente material, como quem busca melhores
condições de vida. Não! Esta luta é parte de uma batalha espiritual contra os
inimigos da alma.
Os grandes estrategistas militares insistem em que o
primeiro passo para a vitória é conhecer bem seu inimigo. Quais são, então,
esses nossos três inimigos?
Em primeiro lugar, a carne: ou seja,
nossas paixões desordenadas, nossos impulsos egoístas de prazer a
todo custo, que nos impelem tantas vezes a tratar o nosso corpo como uma
criança mimada. Quando o médico lhe aponta o remédio amargo capaz de curá-la, a
criança esperneia e prefere se empanturrar de guloseimas. Por isso mesmo,
precisamos de vez em quando dizer “não” ao nosso corpo, em um verdadeiro
exercício dos “músculos” da força de vontade. Como dizia São Paulo: “Todos os
atletas se impõem a si muitas privações; e o fazem para alcançar uma coroa
corruptível. Nós o fazemos por uma coroa incorruptível. Assim, (…) castigo o
meu corpo e o mantenho em servidão, de medo de vir eu mesmo a ser excluído
depois de ter pregado aos outros” (1Cor 9,25-27).
O nosso segundo inimigo é o mundo – não
aquele mundo que Deus criou e por cujo amor Ele entregou seu Filho único (cf.
Gn 3,31; Jo 3,16), mas o mundo que rejeita a Deus e às coisas de Deus, o mundo
que implicitamente nos diz para escolher entre sermos amigos dele ou amigos de
Deus (cf. Tg 4,4). Hoje em dia, este mundo se expressa frequentemente na
mentalidade materialista e aburguesada, que coloca sua segurança na conta
bancária gorda, no plano de saúde e de previdência, no carro da moda e no
celular do ano… Contra este mundo, Cristo nos adverte: “Guardai-vos
escrupulosamente de toda a avareza, porque a vida de um homem, ainda que ele
esteja na abundância, não depende de suas riquezas”, pois “louco” é aquele que
coloca a segurança de sua alma nos muitos bens, e não é rico para Deus (cf. Lc 12,13-21).
Pelo contrário, o Bom Mestre nos assegura: nosso Pai celeste sabe que
precisamos de comida, bebida e vestimentas – mas busquemos primeiro o Reino de
Deus, e o resto nos será acrescentado (cf. Mt 6,24-34)!
Por fim, o último inimigo da alma é o diabo. Ao
contrário da imagem que poderíamos formar com base nos filmes de exorcismos e
possessões, o diabo nunca vem nos tentar com aspecto medonho e terrível, com
chifres e um tridente vermelho. Pelo contrário: em geral, ele se apresenta
simpático, sedutor, não raro com elegância e finura.
A “estratégia de marketing” do diabo é sempre a mesma, desde
o Éden: com fala mansa e língua bifurcada, ele nos apresenta o pecado
como saboroso e agradável, e insinua que Deus é um
sujeito que quer limitar a nossa liberdade e impedir a alegria (cf. Gn
3,4-6).
Lutemos, então, contra os nossos três inimigos, e que nosso
grito de batalha seja a Oração de São Bento: A Cruz Sagrada seja a
minha luz, não seja o dragão o meu guia. Retira-te, satanás! Nunca me
aconselhes coisas vãs. É mau o que tu me ofereces. Bebe tu mesmo os teus
venenos!
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