SOLIDÃO E TECNOLOGIA
29/05/2025
Dom Pedro Carlos Cipollini
Bispo de Santo André (SP)
Falar em amizade hoje pode parecer antiquado, em um momento
da trajetória da humanidade onde o indivíduo ocupa o lugar central. Porém,
falar em solidão, é comum e até linguagem corrente. Tanto com palavras como
gestos, as pessoas hoje nos falam de solidão. Portanto, conclui-se que falar de
amizade hoje não só não é antiquado, mas necessário e até urgente, pois a
amizade é uma das maneiras mais sublimes de amar. E somente o amor pode anular
a solidão do coração do homem.
Muito já se escreveu sobre o desamparo e a solidão do homem
moderno. O psicólogo e pedagogo Ignace Lepp chega a caracterizá-la de
“trágica”, principalmente ao analisar o isolamento vivido nas grandes cidades.
Devido a esse fenômeno, cada vez mais nos convencemos da necessidade de
melhorar o relacionamento humano. Logo após a Segunda Guerra Mundial,
incrementou-se o investimento de milhões e milhões em pesquisas dedicadas às
ciências físicas. Por meio de todo tipo de “máquinas”, o homem conseguiu
expandir as potencialidades de sua inteligência como nunca visto
antes.
Contudo, o resultado positivo e inegável desse
desenvolvimento técnico, tem seu lado amargo: a incapacidade de solucionar com
igual eficiência os mais elementares problemas humanos, como a simples
convivência entre as pessoas, cada vez mais “alienadas”.
O ser humano não pode viver sem relacionamentos profundos,
sem laços afetivos duradouros, sem desenvolver suas potencialidades de amar, em
níveis pessoal e social. Intui-se que a ciência tem que se voltar, com todas as
suas capacidades, para explorar o campo das relações humanas. São as atitudes
que deveriam tornar-se a maior preocupação científica.
O computador, o milagre da eletrônica, é necessário
certamente, porque somente com sua precisão se pode ter segurança em muitas
tarefas imprescindíveis hoje. Mas a sede de relacionamento profundo, a
inquietação por criar laços, que transcendam as leis da eficiência, permanecem.
Porque o coração do homem permanece, e o coração tem razões que a razão
desconhece, como escreve Pascal, e acrescenta: “A certas pessoas falta coração;
não faríamos delas nossos amigos” (Pensamentos, capítulo 1),
Os valores, os sonhos da Humanidade na era da tecnologia se
realizam considerando os homens não como fins, mas como meios. Assim se
transformam as virtudes em prestação de serviços. Chegamos a ter robôs, sempre
amáveis, atenciosos, pacientes e gentis, porém o robô não sente solidão, aliás,
não sente nada. Nem mesmo pode relacionar-se nos graus mais primitivos da
amizade: ser “conhecido”, “companheiro”, “colega”. O amigo verdadeiro é o que
espontaneamente deseja fazer feliz a outro e vê seus sentimentos correspondidos
de maneira saudável.
Avaliando a situação atual, onde as pessoas estão ao
desamparo por falta de lideranças que se coloquem a serviço do povo, podemos
concluir pela falta de amizade no tecido das relações sociais.
Por isso, adquire relevância a encíclica “Fratelli
Tutti” do Papa Francisco, um chamado a vivermos a fraternidade
universal.
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