Por que a mão dos seres humanos é especial — e o maior desafio para robôs 'perfeitos'
Autor: Claudia Baxter
De BBC Future
27 janeiro 2025
A mão humana é uma das partes do corpo mais
surpreendentemente sofisticadas e fisiologicamente intrincadas. Ela tem mais de
30 músculos, 27 articulações e uma rede de ligamentos e tendões que
proporcionam 27 eixos de movimento. Há mais de 17 mil receptores de toque e
terminações nervosas somente na palma da mão. Esses recursos permitem que
nossas mãos executem uma variedade impressionante de tarefas altamente
complexas por meio de uma ampla gama de movimentos diferentes.
Mas não é preciso dizer nada disso a Sarah de Lagarde.
Em agosto de 2022, ela estava no topo do mundo. Tinha
acabado de escalar o Monte Kilimanjaro com o marido, e estava em excelente
forma. Mas apenas um mês depois, ela se viu deitada em um leito de hospital,
com ferimentos terríveis.
Ao voltar para casa depois do trabalho, De Lagarde
escorregou e caiu entre um vagão do metrô e a plataforma na estação High
Barnet, em Londres. Esmagada pelo trem que partia e por outro que entrava na
estação, ela perdeu o braço direito abaixo do ombro, e parte da perna direita.
Após o longo processo de recuperação, o NHS, serviço público
de saúde britânico,
ofereceu a ela uma prótese de braço, mas ela proporcionava pouco em termos de
movimento normal da mão. Em vez disso, parecia priorizar a forma, em detrimento
da funcionalidade.
"Não se parece com um braço de verdade", diz ela.
"Meus filhos acharam assustador."
A prótese apresentava apenas uma única articulação no
cotovelo, enquanto a mão em si era uma massa estática na extremidade. Durante
nove meses, ela lutou para realizar as tarefas diárias, até que foi oferecido a
ela algo transformador: um braço biônico movido a bateria que utiliza inteligência
artificial (IA) para prever os movimentos que ela deseja, detectando
minúsculos sinais elétricos de seus músculos.
"Toda vez que faço um movimento, ela aprende",
explica De Lagarde.
"A máquina aprende a reconhecer os padrões e, por fim,
transforma em inteligência artificial generativa, quando começa a prever qual
será meu próximo movimento."
Até mesmo pegar algo tão simples como uma caneta, e movê-la
por nossos dedos até adotar uma posição para escrever envolve uma integração
perfeita entre o corpo e o cérebro. As tarefas manuais que realizamos sem
pensar exigem uma combinação refinada de controle motor e feedback sensorial —
desde abrir uma porta até tocar piano.
Com esse nível de complexidade, não é de se admirar que as
tentativas de igualar a versatilidade e a destreza das mãos humanas tenham sido
evitadas por profissionais médicos e engenheiros durante séculos. Desde a
rudimentar mão de ferro com mola de um cavaleiro alemão do século 16 até a
primeira mão robótica do mundo com feedback sensorial criada na Iugoslávia na
década de 1960, nada chegou perto de se equiparar às habilidades naturais da
mão humana. Até agora.
Os avanços na inteligência artificial estão dando início a
uma geração de máquinas que estão chegando perto de corresponder à destreza
humana. Próteses inteligentes, como a que De Lagarde recebeu, podem antecipar e
refinar os movimentos.
Os robôs de colheita de frutas macias são capazes de colher
um morango em um campo e colocá-lo delicadamente em uma caixinha com outras
frutas sem amassá-las. Os robôs guiados por visão conseguem até mesmo extrair
cuidadosamente resíduos nucleares de reatores. Mas será que eles podem
realmente competir com as incríveis capacidades da mão humana?
Inteligência artificial integrada
Recentemente, dei à luz minha primeira filha. Poucos
instantes após chegar ao mundo, sua pequena mão envolveu suavemente o dedo
indicador do meu companheiro. Incapaz de focar o olhar em algo que esteja a
mais do que alguns centímetros à sua frente, seus movimentos de mão e braço são
limitados, em geral, a reflexos involuntários que permitem que ela segure um
objeto quando ele é colocado na sua palma da mão. Essa é uma ilustração
adorável da sensibilidade da nossa destreza, mesmo em nossos primeiros momentos
de vida — e sugere o quanto ela melhora à medida que crescemos.
Nos próximos meses, a visão da minha filha vai avançar o
suficiente para dar a ela percepção de profundidade, enquanto o córtex motor de
seu cérebro vai se desenvolver, oferecendo maior controle sobre seus membros.
Suas pegadas involuntárias vão dar lugar a ações de agarrar mais deliberadas,
com suas mãos enviando sinais de volta ao cérebro, permitindo que ela faça
ajustes finos no movimento à medida que sente e explora o mundo ao seu redor.
Serão necessários vários anos de esforço determinado, tentativas, erros e
brincadeiras para que minha filha atinja o nível de destreza manual que os
adultos possuem.
E, assim como um bebê que aprende a usar as mãos, os robôs
habilidosos que utilizam inteligência artificial integrada seguem um roteiro
semelhante. Esses robôs devem coexistir com seres humanos em um ambiente e
aprender a realizar tarefas físicas com base na experiência anterior. Eles
reagem ao ambiente e ajustam seus movimentos em resposta a essas interações. A
tentativa e o erro desempenham um papel importante nesse processo.
"A IA tradicional lida com informações, enquanto a IA
integrada percebe, entende e reage ao mundo físico", diz Eric Jing Du,
professor de engenharia civil da Universidade da Flórida, nos EUA.
"Essencialmente, ela oferece aos robôs a capacidade de
'ver' e 'sentir' o ambiente ao seu redor, permitindo que eles realizem ações de
maneira semelhante à humana."
Mas essa tecnologia ainda
está engatinhando. Os sistemas sensoriais humanos são tão complexos, e nossas
habilidades perceptivas tão hábeis, que reproduzir a destreza no mesmo nível da
mão humana continua sendo um grande desafio.
"Os sistemas sensoriais humanos podem detectar pequenas
mudanças e se adaptar rapidamente às mudanças nas tarefas e nos
ambientes", acrescenta Du.
"Eles integram vários inputs sensoriais, como visão,
tato e temperatura. Atualmente, os robôs não têm esse nível de percepção
sensorial integrada."
Mas o nível de sofisticação está aumentando rapidamente.
Veja o robô DEX-EE. Desenvolvido pela Shadow Robot Company em colaboração com o
Google DeepMind, é uma mão robótica com
três dedos que usa drivers do tipo tendão para obter 12 eixos de movimento. A
equipe por trás do DEX-EE, projetado para "pesquisa de manipulação
hábil", espera demonstrar como as interações físicas contribuem para o
aprendizado e o desenvolvimento da inteligência generalizada.
Cada um de seus três dedos contém sensores na ponta do dedo,
que fornecem dados tridimensionais em tempo real sobre o ambiente, além de
informações sobre sua posição, força e inércia. O dispositivo pode manusear e
manipular objetos delicados, incluindo ovos e balões inflados, sem
danificá-los. Ele aprendeu até mesmo a apertar as mãos — algo que exige que
reaja à interferência de forças externas e situações imprevisíveis. No momento,
o DEX-EE é apenas uma ferramenta de pesquisa, e não para ser usado em situações
reais de trabalho em que poderia interagir com seres humanos.
Mas entender como realizar essas funções vai ser essencial à
medida que os robôs se tornarem cada vez mais presentes ao lado das pessoas,
tanto no trabalho quanto em casa. Com que força, por exemplo, um robô deve
segurar um paciente idoso ao colocá-lo em uma cama?
Um projeto de pesquisa do Instituto Fraunhofer IFF em
Magdeburg, na Alemanha, configurou um robô simples para "socar"
repetidamente voluntários humanos no braço, num total de 19 mil vezes, para
ajudar seus algoritmos a aprender a diferença entre uma força potencialmente
dolorosa e uma confortável. Mas alguns robôs habilidosos já estão começando a
aparecer no mundo real.
Leia a íntegra
desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.
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