“Não temas, pequeno rebanho”. Evangelizar em uma época de
mudanças (1)
É hora de mudar o olhar, de passar da nostalgia à audácia, de uma fé em posição defensiva a uma fé que propõe com confiança uma visão do mundo e da vida.
23/10/2025
Um grupo de exploradores, com anos de experiência no
deserto, penetra em territórios nunca vistos. Avançam entre colinas e vales
exuberantes; encontram cachos de uvas que uma pessoa sozinha não consegue
carregar, e figos que fariam empalidecer quaisquer outros no mercado oriental
(cfr. Num 13, 17-24). O entusiasmo, quase a euforia, toma conta deles, vendo
por fim essa terra tão esperada: a esperança se torna concreta, tangível. Tocam
com a mão um mundo que parece oferecer-lhes tudo o que esperaram durante anos.
A essa promessa, porém, mistura-se a ansiedade: será preciso conquistar esta
terra. E paira no ar um não sei quê de hostilidade.
Exploradores num mundo de gigantes
Ao longe, divisam-se cidades fortificadas. Mais de perto, os
exploradores descobrem habitantes altos como carvalhos, autênticos gigantes!
Alguns esquecem a força de Deus, e semeiam a cizânia do pessimismo. De repente
o povo começa a sentir falta do maná do deserto.... Seu entusiasmo desvanece
como o orvalho ao primeiro raio de sol. O ambiente fica tenso, entre os que
querem deixar tudo e voltar ao Egito e os que ainda têm um brilho no olhar e o
espírito conquistador: alguns loucos, para dizer a verdade. A terra é mesmo
formosa, mas o empreendimento parece titânico, em todos os sentidos. Cresce a
consciência de não estarem à altura; a segurança que pensavam ter cambaleia
(cfr. Num. 13, 27 - 14, 4). O coração fica dividido entre a confiança e a
tentação de fugir, entre o desejo de aventurar-se e o medo de serem
aniquilados. A alternativa é nítida: ou entrar em contato ou entrincheirar-se
no deserto para sempre.
O povo permanecerá preso por esta escolha durante decênios.
No fundo, o que os bloqueia é a pouca confiança em Deus. Ressoa ainda em seus
ouvidos aquela parte do relato dos exploradores: “vimos até mesmo gigantes,
filhos de Enac, da raça dos gigantes; parecíamos gafanhotos comparados com
eles” (Num 13, 33). Paralisados pelo medo de novo desafio, quase todos acabarão
envelhecendo. Só a uns poucos “loucos” – Caleb, da tribo de Judá, e Josué da
tribo de Efraim – será concedido sobreviver com o passar do tempo. Não se trata
dos maiores nem dos mais audazes, mas sabem que a vitória não depende de suas
forças nem da resistência de suas armas, e sim do Deus vivo que caminha no meio
deles.
Quarenta anos mais tarde, depois de um longo período de
purificação dessa esperança vacilante, o povo se encontra de novo às portas da
terra prometida. Ainda estão com eles Caleb e Josué, o líder que havia confiado
em Deus e que guiará esse povo renovado para além do Jordão. São impelidos
pelas palavras que o Senhor pronunciou pela boca de Moisés: “Escolhe a vida”
(Dt. 30, 19). Deus lhes dizia e está dizendo a cada um de nós: “Olha, eu criei
você para viver, para ser feliz... Você vai me escolher, vai escolher a Vida?
Foi isso que os ‘pequeninos’ descobriram e escolheram: eles sabem que Deus é a
fonte e o destino do desejo infinito de viver que carregam dentro de si. E eles
não querem mais nada. Entenderam que triunfar na vida, alcançar a vida, é
deixar que o amor de Deus os inunde e depois compartilhar este amor
generosamente”[1].
Há, no entanto, um aspecto fundamental que os judeus à volta
de Josué ainda não podem compreender. Falta-lhes a chave para interpretar
corretamente esta entrada na terra prometida. Imersos em sua própria história
de exílio e de libertação, não conseguem captar seu significado mais profundo.
Ainda não compreendem seu papel dentro da grande história da salvação. No
momento, estão orientados para a conquista, para o enfrentamento: sonham com
uma vitória esmagadora, uma vitória que cantarão em todo o livro de Josué.
Trata-se de enfrentar-se e de ganhar, de opor a própria força – embora
comparativamente seja bem reduzida – e a própria cultura – que, na verdade, é
ainda muito escassa – contra a das nações que têm pela frente. Trata-se de
realizar uma conquista militar e cultural, empunhando as armas disponíveis.
Na verdade, o povo que entra com Josué na terra prometida só
conseguirá, com muita dificuldade, abrir passagem entre aquelas nações. Embora
se aferre a suas raízes, aprenderá a tecer relacionamentos com os outros povos.
E pouco a pouco começará a compreender que o seu papel entre eles não é de
domínio. A chave para interpretar isso é o Senhor que a vai dando por meio dos
profetas: “Vou fazer de ti a luz das nações, para propagar minha salvação até
os confins do mundo”. (Is 49, 6). Foram chamados a iluminar! E por isso, pouco
importava seu número, pouco importava sua distinção ou a bagagem cultural de
que dispunham. Não constituiria problema enfrentar terras desconhecidas ou
povos de gigantes. A luz que levariam seria a de Deus que desejou habitar entre
eles como “Príncipe da paz” (Is 9,5). Iluminariam as nações com a paz que o
mundo não pode dar (cfr. Lc 10, 5-6; Jo 14, 27), “a paz de Cristo ressuscitado,
uma paz desarmada e desarmante, humilde e perseverante”[2].
[1] “Combate,
proximidade, missão (1): Escolhe a vida”.
[2] Primeira
saudação do Santo Padre Leão XIV, 8/05/2025.

Nenhum comentário:
Postar um comentário