DANTE NOS ESTADOS UNIDOS
Arquivo 30Dias nº 05 - 2006
E então saímos para ver as estrelas e as listas
O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma
docente da James Madison University da Virgínia.
de Giuliana Fazzion
Houve outras traduções melhores, como as de Cary e de
Wright, mas eram traduções britânicas. A tradução de Longfellow era um tributo
da América à genialidade do imortal florentino.
James Russell Lowell (1819-1891) herdou o lugar de
Longfellow em 1855. Não ficou famoso por ter traduzido a Divina Comédia,
mas é lembrado por ter escrito um ensaio muito importante sobre Dante. Em
Harvard, era popular por seu curso sobre o poeta florentino. Em 1877, tornou-se
ministro das Relações Exteriores e foi enviado à Espanha. Deixou o cargo de
professor a outro colega e amigo, Charles Norton.
Norton (1827-1908), editor, professor de história da arte e
grande amigo e admirador de Longfellow, tornou-se o novo professor de Dante em
Harvard.
Sua paixão por Alighieri levou-o a entender intimamente o grande poeta e seu mundo. Sua grande sensibilidade à beleza artística, seu entusiasmo, que conseguia comunicar aos outros, lhe conquistaram muitos amigos e admiradores, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Inglaterra e na Itália, e seu nome se tornou familiar aos estudiosos de Dante europeus.
Norton trabalhou muito na fundação da “Dante Society” em Cambridge. No mês de
fevereiro de 1881, houve uma reunião na casa de Longfellow, onde já se formara,
em 1865, o círculo para a tradução de Dante. Lá se decidiu formar a sociedade
da qual Longfellow foi eleito presidente. Mas, dois meses depois, em maio de
1882, Longfellow morreu e a presidência passou a Lowell. Em 1891, com a morte
de Lowell, a presidência da sociedade passou a Norton, que a manteve até sua
morte, em 1908.
Em 1887 a “Dante Society” de Cambridge instituiu o prêmio
que seria entregue todos os anos “a estudantes ou recém-formados de Harvard
para o melhor ensaio sobre temas dantescos”. Essa tradição existe até hoje.
As aspirações americanas a aprender tudo o que dizia
respeito à Itália, à sua arte, à sua literatura, como dissemos, derivavam da
Inglaterra. Mas, a partir de 1830, os americanos começaram a viajar e a
descobrir a Itália. Nos consulados americanos das maiores cidades italianas não
havia muito o que fazer, e por isso os cônsules passavam o tempo aprendendo a
língua, a literatura, a arte, a história, e todas essas experiências eram
reunidas em livros, diários, que depois o público americano lia com grande interesse.
Na Europa ocorria outro fenômeno, que contribuiu para o
enriquecimento do conhecimento da literatura italiana nos Estados Unidos. Na
época pós-napoleônica, o fracasso de diversos movimentos revolucionários
impeliu muitos italianos de uma certa cultura a buscarem asilo nos Estados
Unidos, onde sobreviviam ensinando a língua e a literatura italianas. Foi por
meio desses canais que o povo americano conheceu a Itália, apreciou suas
belezas naturais e artísticas e aprendeu sua grande história.
Florença e Roma eram cidades irresistíveis para os
americanos. Jovens artistas americanos chegavam a Florença e alguns passavam lá
o resto de suas vidas. O nome de Florença era inevitavelmente associado a
Dante, e aqueles que estudavam seriamente a Divina Comédia estavam
convencidos de que não poderiam entendê-la se não visitassem Florença.
Em todo o século XIX aparecem constantemente ensaios sobre
Dante em revistas literárias americanas. Não fazem, porém, nenhuma referência à
alegoria ou ao simbolismo, mas à história de sua cidade, ao itinerário
romântico de seu amor, a suas aventuras políticas, ao seu exílio.
O interesse por Dante recebeu um grande impulso no período
entre 1880 e 1890, que corresponde a um momento de grande avanço na cultura
geral dos Estados Unidos. Isso se nota pelo grande número de publicações sobre
Dante produzidas nesses dez anos. Mas duas coisas em particular são muito
importantes: uma é que essas publicações vêm de centros como Chicago, St.
Louis, St. Paul e Denver, e também do Sul e do Far West; a outra é
a contribuição das escritoras americanas, que sempre tiveram um lugar
importante na história cultural local, mas dessa vez colaboraram de modo
bastante relevante para a fortuna do poeta florentino. E isso porque, antes de
todos os outros estudiosos, elas encararam a filosofia de Dante. Merece ser
lembrada a escritora Susan E. Blow, cujos artigos foram reunidos e publicados
num livro intitulado A Study on Dante. Esse livro representa a primeira
tentativa feita por um estudioso de Dante americano de analisar a estrutura
da Divina Comédia com o propósito de descobrir detalhadamente
o significado filosófico e espiritual da sua alegoria.
Com a aproximação do final do século XIX e do Romantismo, e
com a vida americana influenciada pelas descobertas científicas, mudanças
ocorreram também na literatura e nas artes. A nova tendência era o Realismo, e
Dante, o herói do Romantismo, parecia fadado a perder inevitavelmente sua
grande força de atração entre o grande público. Em vez disso, o estudo de Dante
ganhou em intensidade e profundidade nos círculos intelectuais e nos institutos
universitários de todo o país. Novos livros, escritos não mais por diletantes,
mas por estudiosos de grande reputação, encontraram um público entusiasmado
entre as classes intelectuais. Portanto, apesar das mudanças nas idéias e no
gosto, Dante permaneceu em seu alto pedestal americano, no qual havia sido
posto pelos três grandes de Cambridge e por seus sucessores.
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