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quarta-feira, 16 de julho de 2025

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS: E então saímos para ver as estrelas e as listas (Parte 3/4)

Às portas da cidade de Dite | 30Giorni

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS

Arquivo 30Dias nº 05 - 2006

E então saímos para ver as estrelas e as listas

O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma docente da James Madison University da Virgínia.

de Giuliana Fazzion

Houve outras traduções melhores, como as de Cary e de Wright, mas eram traduções britânicas. A tradução de Longfellow era um tributo da América à genialidade do imortal florentino.

James Russell Lowell (1819-1891) herdou o lugar de Longfellow em 1855. Não ficou famoso por ter traduzido a Divina Comédia, mas é lembrado por ter escrito um ensaio muito importante sobre Dante. Em Harvard, era popular por seu curso sobre o poeta florentino. Em 1877, tornou-se ministro das Relações Exteriores e foi enviado à Espanha. Deixou o cargo de professor a outro colega e amigo, Charles Norton.

Norton (1827-1908), editor, professor de história da arte e grande amigo e admirador de Longfellow, tornou-se o novo professor de Dante em Harvard.

Sua paixão por Alighieri levou-o a entender intimamente o grande poeta e seu mundo. Sua grande sensibilidade à beleza artística, seu entusiasmo, que conseguia comunicar aos outros, lhe conquistaram muitos amigos e admiradores, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Inglaterra e na Itália, e seu nome se tornou familiar aos estudiosos de Dante europeus.

Norton trabalhou muito na fundação da “Dante Society” em Cambridge. No mês de fevereiro de 1881, houve uma reunião na casa de Longfellow, onde já se formara, em 1865, o círculo para a tradução de Dante. Lá se decidiu formar a sociedade da qual Longfellow foi eleito presidente. Mas, dois meses depois, em maio de 1882, Longfellow morreu e a presidência passou a Lowell. Em 1891, com a morte de Lowell, a presidência da sociedade passou a Norton, que a manteve até sua morte, em 1908.

Em 1887 a “Dante Society” de Cambridge instituiu o prêmio que seria entregue todos os anos “a estudantes ou recém-formados de Harvard para o me­lhor ensaio sobre temas dantescos”. Essa tradição existe até hoje.

As aspirações americanas a aprender tudo o que dizia respeito à Itália, à sua arte, à sua literatura, como dissemos, derivavam da Inglaterra. Mas, a partir de 1830, os americanos começaram a viajar e a descobrir a Itália. Nos consulados americanos das maiores cidades italianas não havia muito o que fazer, e por isso os cônsules passavam o tempo aprendendo a língua, a literatura, a arte, a história, e todas essas experiências eram reunidas em livros, diários, que depois o público americano lia com grande interesse.

Na Europa ocorria outro fenômeno, que contribuiu para o enriquecimento do conhecimento da literatura italiana nos Estados Unidos. Na época pós-napoleônica, o fracasso de diversos movimentos revolucionários impeliu muitos italianos de uma certa cultura a buscarem asilo nos Estados Unidos, onde sobreviviam ensinando a língua e a literatura italianas. Foi por meio desses canais que o povo americano conheceu a Itália, apreciou suas belezas naturais e artísticas e aprendeu sua grande história.

Florença e Roma eram cidades irresistíveis para os americanos. Jovens artistas americanos chegavam a Florença e alguns passavam lá o resto de suas vidas. O nome de Florença era inevitavelmente associado a Dante, e aqueles que estudavam seriamente a Divina Comédia estavam convencidos de que não poderiam entendê-la se não visitassem Florença.

Em todo o século XIX aparecem constantemente ensaios sobre Dante em revistas literárias americanas. Não fazem, porém, nenhuma referência à alegoria ou ao simbolismo, mas à história de sua cidade, ao itinerário romântico de seu amor, a suas aventuras políticas, ao seu exílio.

O interesse por Dante recebeu um grande impulso no período entre 1880 e 1890, que corresponde a um momento de grande avanço na cultura geral dos Estados Unidos. Isso se nota pelo grande número de publicações sobre Dante produzidas nesses dez anos. Mas duas coisas em particular são muito importantes: uma é que essas publicações vêm de centros como Chicago, St. Louis, St. Paul e Denver, e também do Sul e do Far West; a outra é a contribuição das escritoras americanas, que sempre tiveram um lugar importante na história cultural local, mas dessa vez colaboraram de modo bastante relevante para a fortuna do poeta florentino. E isso porque, antes de todos os outros estudiosos, elas encararam a filosofia de Dante. Merece ser lembrada a escritora Susan E. Blow, cujos artigos foram reunidos e publicados num livro intitulado A Study on Dante. Esse livro representa a primeira tentativa feita por um estudioso de Dante americano de analisar a estrutura da Divina Comédia com o propósito de descobrir detalhadamente o significado filosófico e espiritual da sua alegoria.

Com a aproximação do final do século XIX e do Romantismo, e com a vida americana influenciada pelas descobertas científicas, mudanças ocorreram também na literatura e nas artes. A nova tendência era o Realismo, e Dante, o herói do Romantismo, parecia fadado a perder inevitavelmente sua grande força de atração entre o grande público. Em vez disso, o estudo de Dante ganhou em intensidade e profundidade nos círculos intelectuais e nos institutos universitários de todo o país. Novos livros, escritos não mais por diletantes, mas por estudiosos de grande reputação, encontraram um público entusiasmado entre as classes intelectuais. Portanto, apesar das mudanças nas idéias e no gosto, Dante permaneceu em seu alto pedestal americano, no qual havia sido posto pelos três grandes de Cambridge e por seus sucessores.

Fonte: https://www.30giorni.it/

O exemplo de Santo Agostinho em relação à hospitalidade

Foto/Crédito: Vatican News.

"O bispo de Hipona dizia que seria um verdadeiro cristão quem reconhece o fato de ser estrangeiro também na sua casa e na sua pátria. A nossa pátria é lá no alto, porque lá não mais seremos hóspedes. O fato é que cada um de nós é hospede nesta terra também em sua própria casa. Sendo hóspede a pessoa irá embora algum dia deste mundo, de modo que vive a condição de hóspede. Se o deseja ou não, o fato é que a pessoa é um hóspede "

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá (PA)

Santo Agostinho viveu no Norte da África e atuou como Bispo de Hipona de 396 a 430. Foram mais de trinta anos na direção da Igreja de sua Diocese e também em toda a região, juntamente com outros bispos, sacerdotes e povo de Deus. Foi um dos grandes bispos na vida eclesial e social deixando para a Tradição uma série de obras muitos importantes, de muito valor seja para a Filosofia, seja para a Teologia. Vejamos a seguir o exemplo dele em relação à hospitalidade na qual acolheu com amor muitas pessoas em sua Diocese e casas de formação.

As pessoas que pedem alguma coisa

Santo Agostinho fez uma descrição das pessoas que pedem aos outros, coisas para melhor viver a sua vida. Quem são as pessoas que pedem? São seres humanos, pessoas frágeis, são pobres, iguais a nós. Eles são pessoas iguais daquelas que tem mais condições de vida que eles. Neles está presente o Senhor Jesus que se fez igual a nós em tudo, menos o pecado (cfr. Hb 4,15). As pessoas não levarão nada consigo de riquezas de modo que só a superação do orgulho contra o pobre e a caridade como dons, permanecem para sempre[1].

Estrangeiros neste mundo

Santo Agostinho afirmou que todas as pessoas neste mundo são estrangeiras as quais passam de uma forma rápida. É preciso reconhecer o valor da hospitalidade, graças a este caminho que leva as pessoas a alcançar a Deus. É fundamental acolher um hóspede do qual a pessoa é também companheiro de viagem ao longo do caminho pelo fato de que neste mundo todos são estrangeiros (cfr. 1 Pd 2,11)[2].

Verdadeiro cristão

 O bispo de Hipona dizia que seria um verdadeiro cristão quem reconhece o fato de ser estrangeiro também na sua casa e na sua pátria. A nossa pátria é lá no alto, porque lá não mais seremos hóspedes. O fato é que cada um de nós é hospede nesta terra também em sua própria casa. Sendo hóspede a pessoa irá embora algum dia deste mundo, de modo que vive a condição de hóspede. Se o deseja ou não, o fato é que a pessoa é um hóspede[3].

 A esperança de ver Cristo nas pessoas

 Santo Agostinho afirmou a importância de ver Cristo Jesus nas pessoas. Ele teve presente os dois discípulos de Emaús que tinham perdido a esperança em Cristo porque o tinham visto morto(cfr. Lc 24,13-24). Desta forma Ele teve que abrir para eles na suas mentes, o sentido das Escrituras para que Ele fosse reconhecido como o eterno vivente mas Ele deveria passar pela morte. Assim Ele teve que explicar desde Moisés, os profetas a afirmação que era necessário que Ele passasse na morte para Ele entrar na sua glória (cfr. Lc 24,26)[4].

Ao partir do pão

Jesus ressuscitado falou para os dois discípulos a respeito das Escrituras mas Ele ainda não tinha sido reconhecido no caminho, senão, no partir do pão. Desta forma é importante acolher os hóspedes, pois nestes acolhe-se Cristo Jesus. Será que não se acolhe Jesus nestas pessoas? É o próprio Senhor que diz: “Eu era estrangeiro e me acolheste” (Mt 25,35). Os justos dirão ao Senhor naquele momento quando é que eles o acolheram, o hospedaram? Ele, o Filho do Homem dirá: “Todas as vezes que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,38-40). O bispo de Hipona afirmou também que quando um cristão acolhe outro cristão, uma outra pessoa, acolhe-se a Cristo Jesus[5].

Nesta terra alimenta-se Jesus

Para Santo Agostinho o fato de alimentar alguma pessoa mais necessitada que a pessoa que tem mais condições, diz respeito a Jesus mesmo. A pessoa alimenta nesta terra Jesus. É também quando a pessoa dá de beber a Ele, o veste, quando está nu, o acolhe quando está estrangeiro, Ele é visitado quando está doente[6]. Desta forma percebemos nesta viagem Cristo Jesus na necessidade. Enquanto nós estivermos neste mundo, haverá os necessitados, e nestes, Ele chama a si todos os necessitados. Na outra vida não terá mais fome, sede, nudez, nem doença, nem migração, nem sofrimento[7].

O valor da misericórdia

Santo Agostinho falou do valor da misericórdia na vida do seguidor e da seguidora de Jesus Cristo e de sua Igreja. O que é a misericórdia? O bispo de Hipona disse que não é outra virtude senão que diz respeito à parte do coração tocada pela miséria. Ela é dita misericórdia por motivo do sofrimento provado diante de uma pessoa em estado de dificuldade, de miséria: ambos gritam a miséria e o coração. O fato é que quando a miséria dos outros toca o nosso coração, se fala de misericórdia[8].

 As boas obras

Santo Agostinho afirmava que todas as boas obras feitas neste mundo diziam respeito com a misericórdia. Quando por exemplo a pessoa ajuda com um pão ao faminto; ela ofereceu com amor aquele gesto, porque era um ser humano semelhante a pessoa. Quando a pessoa faz este gesto de oferecer o pão, a pessoa sofre com quem tem fome; se a pessoa der água, sofre com quem tem sede; se a pessoa ajuda com a roupa, vestido, sofre com quem é nu; se a pessoa acolhe um hóspede, sofre com o estrangeiro; se a pessoa visita o doente, sofre com ele; se a pessoa sepulta um morto, a pessoa chora sobre ele; se a pessoa reconduz à paz quem ama os conflitos, a pessoa sofre com quem é conflituoso. Estas obras se realizam pelo fato de que nós somos chamados a amar a Deus, ao próximo como a si mesmo. Estas boas obras tornam-nos bons cristãos, cristãs e um dia participantes do Reino dos céus[9].

Nós percebemos Santo Agostinho, bispo dos séculos IV e V, uma pessoa que seguiu a Jesus com fé, esperança e com caridade. Ele atuou em favor de todas as pessoas mas sobretudo com as pessoas mais necessitadas na família, na comunidade e na sociedade. Ele aludiu ao valor da hospitalidade, dom de Deus e responsabilidade humana para que a pessoa fosse acolhida neste mundo e um dia na eternidade.
____________

[1] Cfr. Discorsi 61,5-8 di Agostinho di Ippona. In: “Non dimenticate L´ospitalità”. Antologia dai Padri della Chiesa. Milano, Paoline, 2022, pgs. 181-183
[2] Cfr. Discorsi 111,4. In: Idem, pg. 184.
[3] Cfr. Idem, pg. 184.
[4] Cfr. Ibidem, pg. 184.
[5] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[6] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[7] Cfr. Ibidem, pg. 185.
[8] Cfr. Il bene della misericordia di Santo Agostino. In: Ibidem, pg. 188.
[9] Cfr. Idem, pg. 188.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

terça-feira, 15 de julho de 2025

Convento da Penha: Santuário mariano e ecológico

Fabiano Gobbi | Shutterstock
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Paulo Teixeira - publicado em 14/07/25

A padroeira do Estado do Espírito Santo é Nossa Senhora da Penha que tem uma linda coroa já demonstrando que é rainha.

A sua roupa da cor rosa representa sua humanidade e o véu azul represente sua maternidade divina. 

As mesmas cores da bandeira do estado do Espírito Santo. O menino Jesus em seu colo é para dizer que é mãe da humanidade e senhora. Jesus é seu Filho e também o salvador do mundo. O Menino Jesus carrega um cetro na mão direita afirmando que Ele é o rei e também usa uma coroa. O globo na mão esquerda do Menino Jesus significa que ele sustenta o mundo. A cruz sobre o globo terrestre nos fala que foi através dela que Jesus salvou toda a humanidade. 

Nossa Senhora da Penha tem como casa, há 460 anos, uma capela conhecida como Convento da Penha, que está localizado na ponta de um morro, a 500 metros de altura, onde é possível contemplar toda a cidade e a ilha onde está localizada a capital, Vitória - ES. 

O convento foi construído pelos escravos. A história mais conhecida é que o Frei Pedro Palacios decidiu construí-lo no alto do morro, pois, o quadro de Nossa Senhora das Alegrias que existia na gruta onde ele morava teria sumido e subido três vezes ao morro, e sempre encontrado entre duas palmeiras. Dessa forma ele entendeu que ali devia ser construído o convento. Ele pediu que fosse enviada de Portugal uma imagem e quando a mesma chego à cidade o povo colocou o nome de Nossa Senhora da Penha. 

Todos os anos após a Páscoa tem início o oitavário de Nossa Senhora da Penha. Todos os dias são de festa e com Missas e romarias. Romaria dos motoqueiros, dos deficientes, das mulheres e dos homens. 

Santuário ecológico

O Convento da Penha é mais do que a construção no alto do morro. Todo o morro faz parte do complexo cuidado pelos frades franciscanos. São 50 hectares de Mata Atlântica preservada que abriga animais e aves. No lugar crescem as espécies nativas da região e as árvores e plantas tem seu espaço assegurado.  

Nem sempre foi assim, o desmatamento havia chegado também ao Santuário, mas na década de 1970 começou um intenso processo de preservação que consiste em zelar pelo espaço e protegê-lo, e reflorestar para que as espécies nativas mantenham o terreno.  Um exemplo para nossos tempos de crise climática e em que somos chamados a cuidar da casa comum.  

Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/07/14/convento-da-penha-santuario-mariano-e-ecologico/

Relíquia de São Sebastião trazida de Roma é exposta para fiéis no litoral norte de SP

Relíquia de São Sebastião está na Diocese de Caraguatatuba
Foto: Reprodução/Instagram/@diocesecaraguatatuba / Estadão

Relíquia de São Sebastião trazida de Roma é exposta para fiéis no litoral norte de SP

Fragmento do osso ficará na diocese da cidade; santo é considerado o padroeiro da agricultura e da pecuária e conhecido como protetor das epidemias, pestes, guerras e tempestades.

14 julho 2025

Um fragmento de osso de São Sebastião, mártir e padroeiro de Caraguatatuba, foi trazido diretamente da Basílica de São Sebastião, em Roma, e será exposto na diocese da cidade, no litoral norte paulista.

A chegada da relíquia de primeiro grau foi celebrada com uma missa, no último domingo, 13, que também foi uma homenagem aos 1721 anos do martírio de São Sebastião.

Na ocasião, os fiéis realizaram uma carreata a partir da divisa de Caraguá e São Sebastião até a Igreja Matriz, onde foi celebrada uma missa presidida por dom José Carlos Chacorowski, bispo diocesano de Caraguatatuba.

Além da cidade de mesmo nome, São Sebastião é padroeiro de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, do Rio de Janeiro, José Boiteux, em Santa Catarina, e Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais.

São Sebastião é considerado o padroeiro da agricultura e da pecuária e é conhecido como santo protetor das epidemias, pestes, guerras e tempestades.

De acordo com o Vaticano, o santo foi um oficial do exército do império romano. Ele era natural de Milão, na Itália. Foi condenado pelo então imperador Diocleciano (244-313), que "o estimava pelas suas qualidades, mas não suspeitava que fosse cristão", e sobreviveu a flechadas.

Preso, ajudou cristãos em cárcere e converteu militares e nobres para o cristianismo. Depois, foi açoitado até a morte a mando do imperador.

Fonte: https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/reliquia-de-sao-sebastiao-trazida-de-roma-e-exposta-para-fieis-no-litoral-norte-de-sp,2a5e5f12ae0912433bbdb43baabd61ebj06pj6ig.html?utm_source=clipboard

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS: E então saímos para ver as estrelas e as listas (Parte 2/4)

Paolo e Francesca | 30Giorni

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS

Arquivo 30Dias nº 05 - 2006

E então saímos para ver as estrelas e as listas

O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma docente da James Madison University da Virgínia.

de Giuliana Fazzion

Em 1843, Thomas W. Parsons publicou em Boston a primeira tradução americana de uma boa parte da Divina Comédia (os primeiros 10 cantos do Inferno). Devemos dizer que naquele tempo, quando escreviam sobre Dante, os críticos e os escritores se baseavam no modelo inglês. Mas nos círculos intelectuais americanos havia um desejo de independência da influência inglesa tão grande, que deu uma nova vitalidade à cultura nacional. Esses intelectuais americanos puseram sua rebelião em prática importando novas correntes de arte e de pensamento das literaturas do continente europeu. E entre essas correntes, despontando sobre todas as outras, estava a representada por Dante, ao qual todos os intelectuais se dirigiram para encontrar a beleza de novos mundos e novos horizontes de pensamento e de arte. Ergueram para o poeta um monumento próximo aos de Shakespeare e Milton, e Dante se tornou para eles quase o símbolo de uma cultura cosmopolita a ser seguida como ideal de um futuro iminente. Esse movimento levou muitos estudantes e estudiosos americanos a viajarem para a Europa, sobretudo para Florença, Roma, Veneza e Paris. Graças a um contato crescente, chegou-se a considerar a literatura italiana superior à francesa. Num artigo publicado em 1817 na revista literária North American Review, dizia-se que a língua italiana, muito mais que a francesa, se adaptava amplamente a todo tipo de composição; tinha mais dignidade e força, uma ampla facilidade de expressão, uma imensa doçura e harmonia. As revistas literárias North American Review, entre 1815 e 1850, ano de seu encerramento, e American Quarterly Review, em seus dez anos de vida, publicaram mais ensaios, artigos e notas sobre a literatura, a arte e a história italianas do que os que dedicaram à cultura de outros países europeus, como a França e a Alemanha. Já em 1822, traduções inglesas britânicas de Dante, Petrarca, Ariosto e Tasso haviam sido reimpressas na América. E, em 1850, 103 textos italianos (algumas reimpressões de traduções já publicadas na Inglaterra e novas versões feitas nos Estados Unidos) chegaram às tipografias americanas. Esse período corresponde ao Romantismo, quando a América encontrou pela primeira vez a Idade Média. E o melhor guia para conhecer o verdadeiro mundo medieval foi a Divina Comédia, que deu aos americanos o quadro completo desse período histórico, a chave para entrar na poesia e na arte, na filosofia e na teologia, no pensamento religioso e político medievais. Mas Dante e seu mundo não se oferecem facilmente às mentes despreparadas. No canto I do Inferno, Dante diz que “longo estudo” e “grande amor” são o preço a pagar se se quer “penetrar” o segredo de sua arte e a essência do espírito medieval, do qual a Divina Comédia é a mais alta expressão. Deveriam se passar muitos anos de duro trabalho e perseverança antes que Dante e a Idade Média conquistassem o lugar que ocupam hoje na cultura americana.

Como mencionado anteriormente, a primeira tradução americana de um trecho de Dante (o episódio do conde Ugolino) foi publicada em 1791.

Uma das primeiras traduções que chegaram aos EUA foi a do autor inglês Henry Cary, que traduziu o Inferno em 1805 e toda a Divina Comédia em 1814.

Mas mesmo boas traduções como a de Cary não são capazes de oferecer um conhecimento profundo da arte do grande poeta, quando não se é capaz de compreender a língua em que sua Comédia foi escrita.

O primeiro professor oficial de italiano nos Estados Unidos de que temos conhecimento foi Carlo Bellini, a quem, em 1779, graças à ajuda de seu amigo Filippo Mazzei e com a recomendação do presidente Thomas Jefferson, foi conferida a cátedra da faculdade de Línguas da Universidade “William & Mary”. Bellini aproveitou essa oportunidade para iniciar cursos sobre Dante. Deixou a cátedra em 1803.

Numa ainda pequena Nova York viria a estabelecer-se, em 1805, Lorenzo Da Ponte (1749-1838), o aventuroso literato vêneto que, banido de Veneza, mudou-se primeiramente para Dresdem e depois para Viena, a corte do imperador José II, onde preparou, para Mozart, os libretos das Bodas de Fígaro, de Assim fazem todas e do Don Giovanni. Entre amores e intrigas, deixou Viena e foi para Londres. Desposou uma inglesa e depois se estabeleceu nos Estados Unidos. Lá foi o primeiro a abrir uma escola particular, na qual o italiano finalmente era ensinado por um professor competente. Da Ponte, em 1807, fundou a Academia de Manhattan, onde ele e sua esposa ensinavam latim, francês e italiano aos jovens. Naquele mesmo ano publicou em Nova York uma pequena autobiografia em italiano à qual acrescentou em apêndice as traduções do episódio do conde Ugolino e de algumas partes do Inferno. Esse livro, que Da Ponte montara para suas aulas, é importante porque foi o primeiro texto em italiano a ser impresso na América. Da Ponte adorava Dante, e assim que seus alunos começavam a saber usar os verbos, os adjetivos e os substantivos, ele os fazia ler a Divina Comédia e os estimulava a aprenderem versos de cor. Foi chamado a lecionar italiano no Columbia College, e também ali encontrou uma maneira de introduzir temas dantescos. Enquanto Da Ponte lecionava em Nova York, em Boston se estabelecia um jovem siciliano, Pietro D’Alessandro, poeta romântico em exílio político, que ganhava a vida dando aulas de italiano; mais tarde uniu-se a ele outro siciliano, Pietro Bachi, com uma preparação cultural excelente, que o levaria a lecionar italiano em Harvard, onde seria o primeiro professor dessa língua, tornando-se depois assistente de George Ticknor. Este último, professor de Línguas e Literaturas Estrangeiras, em 1831 dedicou a Dante um primeiro curso específico. Ticknor deixaria Harvard em 1835 e seu sucessor na cátedra de Línguas e Literaturas Estrangeiras seria Henry Wadsworth Longfellow. Longfellow, a partir de então, começaria a ensinar Dante intensamente e continuaria a ensiná-lo durante vinte anos, ou seja, durante todo o período em que lecionou em Harvard. No inverno de 1838, Longfellow leu o Purgatório a sua classe de Harvard e o comentou. Foi para esse curso, justamente, que começou a traduzir versos do Purgatório para o inglês. Longfellow iniciou a tradução sistemática do Purgatório em 1843, mas esse foi um lento processo, mesmo porque, nos dez anos que se seguiram, dedicou-se a trabalhos originais. Terminou-a em 1853. Depois de uma outra longa pausa, devida à trágica morte da esposa, voltou à tradução da Divina Comédia em 1861. Desta vez trabalhou com tenacidade e em 1863 completou o Inferno. A Divina Comédia estaria completamente traduzida em 1867.

Fonte: https://www.30giorni.it/

As férias: um período essencial para a saúde psicológica dos padres

Sacerdote em oração (Vatican News)

Eles raramente demonstram, mas os padres também acumulam fadiga. Seu ministério os leva a estar frequentemente em viagem, a responder inúmeras solicitações, a uma disponibilidade total que acaba por pesar, por vezes, sobre sua saúde. Eles precisam ser ouvidos, escutados e não renunciar a um tempo de descanso necessário.

Jean Charles Putzolu – Vatican News

Esses meses de verão na Europa são propícios ao descanso para a maioria das pessoas que podem tirar férias. Isso é verdade para todos e também para os padres, cuja vocação é frequentemente, e erroneamente, associada a uma disponibilidade 24 horas por dia, 365 dias por ano. O descanso, o distanciamento, o relaxamento são momentos necessários para recarregar as energias, para quebrar também um ritmo às vezes pesado para muitos padres, especialmente aqueles que são responsáveis por várias paróquias, às vezes muito distantes umas das outras. Eles não estão imunes a episódios de fadiga ou depressão. Embora a esmagadora maioria viva bem o seu ministério sacerdotal, cerca de 2% dos 6300 padres ativos na França não estão imunes ao esgotamento, e 67% consideram que enfrentam uma sobrecarga de atividades, de acordo com um estudo realizado em 2020 pela Igreja da França.

Então, como ajudar aqueles que normalmente apoiam seus fiéis, neste período de férias? Esse é o tema da nossa entrevista com dom Benoit Bertrand, bispo de Pontoise, da região de Île-de-France, na França, que conduziu um estudo sobre a saúde dos padres.

Dom Benoît Bertrand, infelizmente, esse é um assunto que vem surgindo com frequência nos últimos anos. Os padres são seres frágeis e podem ser vítimas de depressão, solidão e isolamento. Felizmente, o verão também é para eles um período de férias para recarregar as energias. Podemos falar de uma certa forma de sofrimento dos padres?

É verdade que alguns deles apresentam cansaço, fragilidades, expressões de lassidão e também sofrimento, em um contexto que pode ser angustiante. Passamos por uma grave crise sanitária que gerou muita preocupação. Há também todo o contexto internacional, as provações que afetam a vida da Igreja e, às vezes, os escândalos que deixam evidentes a tristeza e o desconforto. Há toda uma série de causas que podem levar a uma forma de mal-estar no corpo dos padres. Na Itália, recentemente, um jovem padre decidiu pôr fim à sua vida. Quero expressar aqui minha proximidade com os padres e bispos, com o povo de Deus, com a diocese italiana de Novara, de onde era originário esse jovem jesuíta.

São João Paulo II enfatizava o caráter exigente do ministério sacerdotal; Francisco pediu aos padres que fossem felizes; Leão XIV recentemente evocou as alegrias e as fadigas dos padres. Em suma, um padre em sofrimento psicológico pode transmitir a alegria do Evangelho?

Sabemos bem que se um padre não está bem em sua vida pessoal, espiritual, física ou psicológica, ele provavelmente não será muito feliz em seu ministério e isso terá consequências para as comunidades cristãs. É por isso que os bispos da França, em 2020, solicitaram uma pesquisa objetiva sobre a saúde física, moral e psicológica dos padres. Precisávamos fazer um balanço dos 6.300 padres diocesanos em atividade na França para destacar os principais fatores determinantes desse estado de saúde. O objetivo era propor ações preventivas e fornecer alguns meios nas dioceses para que os bispos e todo o povo de Deus prestassem mais atenção à saúde física e psicológica dos padres.

Cinco anos após esse estudo, é possível medir a eficácia das medidas recomendadas?

Antes de analisar as medidas, avaliamos os fatores determinantes: excesso de peso, obesidade, riscos de dependência de álcool ou tabaco. Em seguida, traçamos linhas de prevenção e detecção. Globalmente, a grande maioria dos padres em atividade, mais de 90%, reconheceu estar em boa saúde física. O que nos alertou foi que quase dois em cada dez padres apresentam sintomas depressivos e que 2% dos padres diocesanos estão em situação de esgotamento. Em seguida, o estudo revelou que 40% dos padres apresentam um índice bastante baixo de realização pessoal. Tudo isso alertou os bispos. A primeira linha de ação proposta foi comunicar essa pesquisa, apresentá-la aos padres, aos bispos e a todo o povo de Deus. Em seguida, por meio de um trabalho com os conselhos presbiteral e episcopal, enfatizamos a importância do tempo de descanso e do acompanhamento médico regular por um médico assistente, que nem todos os padres têm hoje. Organizamos momentos de sensibilização e informação sobre estresse, depressão, esgotamento, sua detecção e diagnóstico. Mas o que é muito importante é simplesmente estar à escuta dos padres. Que o bispo, o vigário geral, a autoridade local reserve tempo para ir ao encontro deles, em suas casas, em seus presbitérios, e passar tempo com eles. Reiteramos a importância do acompanhamento espiritual, das fraternidades entre padres. Também destacamos a necessidade de sensibilizar o povo de Deus para os padres que lhes são confiados.

“O acompanhamento dos padres é, na minha opinião, uma tarefa prioritária para os bispos.”

Os leigos também têm uma responsabilidade para com os padres? Os sacerdotes cuidam das almas do rebanho de Deus. Mas, em troca, esse rebanho de Deus cuida deles?

Os padres são extremamente disponíveis, dedicados, admiráveis na escuta de muitas pessoas, jovens e adultos, e quem os escuta? Eles têm muito pudor, muitas vezes. São homens discretos, que às vezes têm dificuldade em expressar fragilidades, sofrimentos ou dificuldades. Nas paróquias, nas capelanias, os leigos podem, evidentemente, ser atenciosos, vigilantes, fraternos com seus padres, convidando-os de vez em quando para um jantar frugal, permitindo-lhes relaxar, colocando-se também à disposição para ouvi-los. Muitos cristãos, católicos e famílias prestam atenção à sua paróquia, mas ainda é necessário que o padre se deixe acolher e aceite compartilhar quando encontra dificuldades. 

Os bispos também enfrentam essas situações, com risco de depressão, por exemplo?

Claro! Não somos heróis. Pode haver fenômenos de fadiga entre os bispos, em qualquer idade. Pode haver desgaste após muitos anos de ministério, às vezes até mesmo de ministério muito difícil ou muito intenso. Também pode haver momentos na vida de uma diocese em que é preciso enfrentar uma grande dificuldade, uma grande tensão, um drama a ser gerenciado, uma provação a ser superada. O bispo pode precisar de acompanhamento. A conferência episcopal propôs visitas de bispos feitas por outro bispo e leigos que vêm por algum tempo para ouvir, encontrar o bispo, visitá-lo, encontrar seus colaboradores para ajudá-lo em sua missão episcopal.

Muitas vezes pensamos que o padre tem total disponibilidade, todos os dias do ano, devido à sua vocação. Isso é uma pressão sentida?

Sim, é verdade. Nossa vida é dedicada a Deus, é dedicada ao povo de Deus. Mas a patologia da dedicação é a fadiga, o esgotamento ou a depressão. Precisamos aprender a dizer não. E dizer não é difícil. Isso transmite uma imagem negativa de nós mesmos. Ora, queremos transmitir uma imagem agradável e positiva. No entanto, às vezes, é preciso ter a coragem de dizer: “Ouça, sinto muito, mas agora não é possível. Veremos isso daqui a quinze dias, um mês, dois meses”. É preciso também que as pessoas aceitem essa resposta negativa. Na maioria das vezes, os padres e bispos querem responder favoravelmente aos pedidos e, às vezes, de forma muito rápida, sem discernimento. Quando nos fazem um pedido importante, é preciso ter a simplicidade de celebrar uma missa e não responder muito rapidamente à pergunta feita.

As férias geralmente fazem muito bem. Francisco não costumava tirar muitas. João Paulo II e Bento XVI recarregavam as energias nas montanhas do norte da Itália, e Leão XIV está se retirando por duas semanas em Castel Gandolfo. É importante para um padre, um bispo, ter precisamente esses momentos de férias, de distanciamento?

Não saberia responder por todos. De qualquer forma, para mim, é muito importante. 

“Quando eu era superior do seminário, dizia aos seminaristas, com um toque de humor, que quem não descansa cansa os outros. Portanto, acho que descanso, relaxamento e recarga de energias são absolutamente essenciais para qualquer pessoa que tenha a possibilidade de tirar férias. Um padre que sabe descansar e relaxar é um padre que se dedicará melhor à sua comunidade e ao povo de Deus.”

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Um canto de louvor e amor: o Trium puerorum (Parte 2/2)

Fotografía: Ravi Pinisetti (Unplash)

Um canto de louvor e amor: o Trium puerorum

O Trium Puerorum é um canto de louvor a Deus, que a Igreja aconselha rezar depois da Santa Missa. A natureza inteira, com o sol, as estrelas, os raios, as nuvens e os mares, se une a esse canto iniciado por três jovens judeus do Antigo Testamento.

05/04/2021

Com toda a Igreja

Com este modo de proceder, São Josemaria distinguia dois momentos na ação de graças depois da Missa, para os centros da Obra. O primeiro tem a ver com o diálogo silencioso de cada um com Deus Pai, Filho e Espírito Santo: “o amor a Cristo, que se oferece por nós, incita-nos a saber encontrar, uma vez terminada a Missa, alguns minutos para uma ação de graças pessoal e íntima, que prolongue no silêncio do coração essa outra ação de graças que é a Eucaristia”[5].

Além disso, o segundo momento quer realçar a dimensão eclesial da ação de graças, que não se reduz somente a uma experiência individual de intimidade de Jesus. O dom de Deus na Eucaristia é tão grande que nenhuma criatura por si só pode expressar o agradecimento devido. Esta oração nos permite agradecer-Lhe juntos por ter vindo à nossa casa. Por isso, quando rezamos o Trium puerorum, não somente estamos agradecendo a Jesus a nossa Comunhão, mas também a dos que estão à nossa volta. É como se disséssemos: “Obrigado por ter vindo a cada um, por ter-se feito presente por nós, por todos os cristãos”.

Precisamente para que as nossas vozes possam unir-se mais facilmente ao canto de louvor e amor com o que a Igreja vive cada encontro eucarístico, São Josemaria pensou que se recitasse o Trium puerorum. Dedicar um tempo da ação de graças a este cântico nos ajuda, portanto, a crescer na comunhão com todos os cristãos por meio da Eucaristia. Pois é nela que a Igreja “renasce e se renova continuamente como a communio que Cristo trouxe ao mundo, realizando assim o desígnio eterno do Pai (cf. Ef 1, 3-10). De modo especial na Eucaristia e pela Eucaristia, a Igreja encerra em si o germe da união definitiva em Cristo de tudo o que existe nos céus e de tudo o que existe na terra, tal como disse Paulo (cf. Ef 1,10): uma comunhão realmente universal e eterna”[6].

Um laboratório de louvor

Trium puerorum é um convite constante a glorificar e louvar ao Senhor. Recorda-nos que a vocação mais íntima de todas as criaturas é dar glória a Deus, Uno e Trino. A Comunhão é inseparável do desejo afetivo e efetivo de louvá-lo, de reconhecer a sua grandeza e sua onipotência.

Este movimento da alma é coerente com a celebração eucarística, pois a Missa, principalmente a oração eucarística, é uma grande oração de ação de graças, que começa com um canto de louvor – o Santo, santo, santo – e termina com uma solene glorificação de Deus Pai por Cristo, com Ele e n’Ele. O Trium puerorum prolonga esta oração. É um momento que poderíamos ver como um laboratório em que aprendemos a transformar as nossas relações com o cosmos – a natureza – e com os outros em um canto de louvor à Trindade. Desta forma, rezar o Trium puerorum antes de começar os nossos afazeres cotidianos nos lembra a atitude com que devemos encarar cada dia: “Dá ‘toda’ a glória a Deus. – ‘Espreme’ com a tua vontade, ajudado pela graça, cada uma de tuas ações, para que nelas não fique nada que cheire a humana soberba, a complacência do teu ‘eu’”.[7]

Neste laboratório se reúnem todas as criaturas espirituais e materiais. Recapitulam-se todos os elementos do cosmos e do povo de Israel, começando pelos mais materiais e terminando pelos que têm mais capacidade vital. O auge deste crescendo é ocupado pelos “humildes de coração” (Dan 3, 87), entre os quais se contam Ananias, Azarias e Misael. Para que todos possamos unir-nos a eles e assim se cumpra o projeto original da criação – “tudo o que respira louve ao Senhor” (Sal 150, 6) – a Igreja conclui o Trium puerorum com uma petição articulada em um pai-nosso, alguns versículos dos salmos e três orações. Neles ressoam os mesmos desejos antes expressados, mas, desta vez, convertidos em uma intensa súplica para que nós, que também nos encontramos em meio ao fogo das provas interiores e exteriores, experimentemos o alívio da ajuda divina e assim possamos converter toda a nossa jornada em um Magnificat à misericórdia divina.

Juan Rego

Tradução: Mônica Diez

Fotografía: Ravi Pinisetti (Unplash)


[5] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 92.

[6] São João Paulo II, Audiência geral, 15/01/1992.

[7] São Josemaria, Caminho, n. 784.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/trium-puerorum-louvor-da-natureza-a-deus/

DENTRO DO VATICANO: A Biblioteca Apostólica e o Arquivo Apostólico

A Biblioteca Apostólica do Vaticano, fundada pelo Papa Sisto IV no século XV (© 2024 Biblioteca Apostolica Vaticana)  (© 2024 Biblioteca Apostolica Vaticana)

São instituições que conjugam tradição e inovação. A Biblioteca Apostólica tem a missão de coletar e preservar um patrimônio riquíssimo e colocá-lo à disposição dos estudiosos. O Arquivo Apostólico exerce sua atividade específica de custódia dos atos e documentos que dizem respeito ao governo da Igreja.

Amedeo Lomonaco – Cidade do Vaticano

Um silêncio que é memória, um tesouro de conhecimento, um anseio pelo infinito. É o que se respira na Biblioteca Apostólica Vaticana e no Arquivo Apostólico Vaticano, instituições que hoje olham para o futuro, abertas à tecnologia, cultivando uma tradição humanística e preservando e respeitando os antigos testemunhos da tradição da Igreja.

Remonta a 1.600, sob o Pontificado de Paulo Vi, a distinção institucional entre a Biblioteca - "instituto de conservação e pesquisa" -, e o Arquivo, que desenvolve uma atividade de "caridade intelectual" porque compartilha seu patrimônio com estudiosos de todo o mundo. O arquivista e bibliotecário da Santa Igreja Romana é monsenhor Giovanni Cesare Pagazzi. 

Biblioteca Apostólica Vaticana

A Biblioteca Apostólica Vaticana é uma instituição nascida no coração do Renascimento que enfrenta os desafios da atualidade. No século XV, Nicolau V decidiu que os códices latinos, gregos e hebraicos deveriam ser abertos à consulta e à leitura por estudiosos.

Em 15 de junho de 1475, durante o Pontificado de Sisto IV, é proclamada a Bula Ad decorem militantis Ecclesiae (Para o decoro da Igreja militante e para a difusão da fé).

Os traços distintivos e as finalidades da Biblioteca Apostólica Vaticana estão, desde o início, ligadas a um patrimônio inestimável – como havia recordado Paulo VI em 1975 – a ser colocado à disposição "dos estudiosos, nas diversas fases de consulta, da leitura, da verificação e da síntese conclusiva". Não se trata apenas de uma abertura material de salas ou textos, mas sobretudo, como sublinhou o Papa Montini, de uma "abertura cultural" que pode ser favorecida se o conhecimento for preservado e transmitido.

Biblioteca Apostólica, instituição fundada no século XV (© 2024 Biblioteca Apostólica do Vaticano).   (© 2024 Biblioteca Apostolica Vaticana)

Acesso à Biblioteca

A Biblioteca Apostólica do Vaticano é especializada em disciplinas filológicas e históricas e, retrospectivamente, em teológicas, jurídicas e científicas. "Instrumento excepcional da Igreja para o desenvolvimento e a difusão da cultura, em apoio à atividade da Sé Apostólica", a Biblioteca tem a missão de "colecionar e preservar um riquíssimo patrimônio científico e artístico, e colocá-lo à disposição dos estudiosos que buscam a verdade".

Por decreto papal, a Biblioteca está aberta a pesquisadores e estudiosos qualificados, sem distinção de religião, origem e cultura, em particular professores e pesquisadores universitários ou de institutos de ensino superior, e outras pessoas eruditas. Atualmente são aproximadamente 6.000 os estudiosos e pesquisadores recebidos pela Biblioteca.

Arquivo Apostólico do Vaticano

Mais de 1.000 anos de história em 85 quilômetros de estantes. O Arquivo Apostólico do Vaticano, a serviço da Santa Sé há 40 anos, é um dos centros de pesquisa histórica mais importantes e famosos do mundo. E é um baú de tesouros incomparáveis: milhões de documentos e pergaminhos estão disponíveis a estudiosos de todas as nacionalidades, sem distinção de fé religiosa.

A atual denominação "Arquivo Apostólico do Vaticano" remonta à época da fundação desta instituição por iniciativa de Paulo V. A partir de meados do século XVII, porém, consolidou-se o título "Arquivo Secreto do Vaticano" (às vezes também atestado sob a forma "Arquivo Secreto Apostólico do Vaticano"), o que sublinhou a natureza particular deste complexo documental, que consiste na concentração num único local de diferentes arquivos produzidos por tantos ofícios curiais: o adjetivo latino "secretum" (do italiano "secernere" = separar, distinguir, reservar) qualificava de fato o arquivo fundado por Paulo V como separado dos demais e reservado ao uso do Pontífice e dos funcionários por ele nomeados.

Tal denominação constituiu o título oficial desta instituição até 22 de outubro de 2019, quando Francisco, com a Carta Apostólica em forma de motu proprio "L'esperienza storica", restaurou o antigo nome "Archivio Apostolico Vaticano".

Atividades do Arquivo Apostólico

O patrimônio documental preservado em seus vastos depósitos abrange um período cronológico de cerca de doze séculos (séculos VIII a XX), consiste em mais de 600 fundos arquivísticos e se estende por 85 km lineares de estantes, localizadas, entre outros lugares, no Bunker, uma sala de dois andares, criado no porão do Pátio da Pigna dos Museus Vaticanos.

Desde que o Papa Leão XIII, em 1881, abriu suas portas aos estudiosos, o Arquivo Apostólico do Vaticano se tornou um dos mais importantes e famosos centros de pesquisa histórica do mundo.

Segundo uma prática estabelecida desde 1924, o Papa concede livre acesso aos documentos "por pontificados": atualmente, o limite cronológico de consulta é fixado no final do Pontificado de Pio XII (outubro de 1958).

A atividade do Arquivo Apostólico do Vaticano desenvolve-se em duas direções principais: a proteção do patrimônio documental, promovendo as condições de conservação que salvaguardam a sua integridade, e a sua valorização como memória histórica da atividade milenar da Igreja.

Algumas prateleiras do Arquivo Apostólico do Vaticano (© Arquivo Apostólico do Vaticano)   (© Archivio Apostolico Vaticano)

O amor da Santa Sé pela cultura

Acompanhar os tempos, salvaguardando um patrimônio secular. Estar a serviço da Igreja. Estes são alguns dos principais desafios que a Biblioteca Apostólica e o Arquivo Apostólico enfrentam com novos caminhos, mas na esteira da tradição. Estas instituições são também a expressão do amor da Santa Sé pela cultura. Não se trata apenas de salvaguardar o conhecimento, mas de torná-lo fecundo, isto é, capaz de se transformar em instrumento de desenvolvimento humano e de paz, vivendo como protagonistas da "mudança de época" e promovendo uma sinergia virtuosa, para o desenvolvimento humano integral, entre o conhecimento humanístico e as novas tecnologias.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

segunda-feira, 14 de julho de 2025

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS: E então saímos para ver as estrelas e as listas (Parte 1/4)

As imagens são de Sandow Birk, extraídas de Dante, Inferno, San Francisco, Chronicle Books. Imagem do inferno dantesco, detalhe | 30Giorni

DANTE NOS ESTADOS UNIDOS

Arquivo 30Dias nº 05 - 2006

E então saímos para ver as estrelas e as listas

O interesse por Dante nos Estados Unidos, explicado por uma docente da James Madison University da Virgínia.

de Giuliana Fazzion

A presença de Dante na cultura americana remonta a 1867, quando o poeta Henry Wadsworth Longfellow concluiu a primeira tradução americana da Divina Comédia. O poeta Longfellow, em 1865, fundou um círculo para a tradução de Dante em sua casa em Cambridge, Massachussetts. O poeta James Russell Lowell, o médico Oliver Wendell Holmes, o estudioso de história George Washington Greene, o editor James Fields e Charles Norton, professor de história da arte, colaboraram com Longfellow na primeira tradução integral da Divina Comédia. Seu grupo se chamou “Dante Club” e, em 1881, tornou-se oficialmente “The Dante Society of America”, cujos três primeiros presidentes foram Longfellow, Lowell e Charles Elliot Norton. Antes da tradução de Longfellow, Dante era pouco conhecido nos EUA (na cultura popular), onde não se falava italiano, não se ensinava frequentemente a língua italiana, não se viajava para a Europa com assiduidade, e os poucos italianos presentes no País estavam espalhados um pouco por toda a parte.

Como Dante chegou à América? Via Inglaterra, onde, na época do Renascimento, havia um grandíssimo interesse pela língua e pela literatura italianas. Depois, esse interesse diminuiu com o fim da era elisabetana. Mas foi retomado nos últimos anos do século XVIII e nos primeiros dez anos do XIX, e se concentrou muitíssimo no estudo da poesia de Dante. Assim, foi em inglês britânico que a Divina Comédia foi traduzida inteiramente pela primeira vez. E foi assim que atravessou o oceano e encontrou seus primeiros leitores americanos.

Não foi, porém, um caso de “vim, vi, venci”: Dante, como todos os imigrantes do Velho Continente, teve de esperar muitos anos, pacientemente, antes de conquistar seu lugar na nova terra.

Por muitos aspectos, poderia parecer singular o fato de o interesse por Dante ter encontrado nos Estados Unidos da América um fertilíssimo terreno de desenvolvimento, desde o início e das mais diversas formas. A imagem da América expansiva e um pouco barulhenta, difundida pelo cinema e por parte da literatura, não corresponde totalmente à verdade. Pois, na realidade, a América oculta componentes complexos, tortuosos, e continua a ser atravessada, como escreveu Perry Miller (autor de estudos sobre a ideologia puritana), pela “corrente subterrânea” das tensões ético-religiosas ligadas às suas origens, ao seu nascimento. Essa sensibilidade perante o aspecto ético-religioso é um dado fundamental para entender a América, que “nasceu como mito religioso e se configurou inicialmente como sonho de uma nova polis do outro lado do oceano, de uma nova Jerusalém desejada com intensidade quase agostiniana e ao mesmo tempo com vigor dinâmico e ativista. Essa vasta e intacta paisagem, esse espaço americano era um campo de aventura e terreno cheio de misteriosas simbologias”. Apesar de todas as enormes mudanças que ocorreram e do fato de milhões de imigrantes terem depois, de todas as partes, se transferido para o Novo Mundo, a base de tudo continuou a ser a aventura dos grupos puritanos, os quais, perseguidos na Inglaterra, atravessaram o Atlântico a bordo da “Mayflower” no final do outono de 1620 e fundaram nas vizinhanças de Cape Cod a colônia de Plymouth.

Os puritanos eram zelosos, rigorosos, exasperavam até o mais lúgubre fanatismo o princípio protestante da consciência livre, da relação direta e dramática entre o homem e Deus. E, sobretudo, tinham uma sensibilidade pronta a inflamar-se pelos símbolos e pelas alegorias, enquadravam eventos, pessoas e natureza numa espécie de código de sinais e figuras, quase tardo-medieval. Além disso, como diz um escritor ao falar da filosofia americana, o caráter da religiosidade puritana se desenvolveu desde as origens numa direção rigorosamente lógico-intelectualista, graças à qual não era possível chegar, ou tentar chegar, a entender o próprio Deus sem desenvolver “uma história de disciplina da mente humana”.

Para uma cultura como a puritana, caracterizada por um trabalho de escavação tenaz, muitas vezes obsessivo (basta lembrar os diários dos puritanos), e pela recorrente análise dos temas do pecado e da salvação, boa parte da literatura italiana veio a parecer “cheia de um caráter profano”, impregnada de espírito “papista” e “paganizante”. Aos puritanos mais obstinados, poderia chegar a parecer que na literatura italiana se concentrasse tudo aquilo de que o homem puritano e “virtuoso” deveria fugir.

Enquanto isso, Dante parecia ser o único, ou quase o único, passível de ser “recuperado”, pelas qualidades de energia ética e firmeza de caráter. A própria mídia protestante já havia lançado mão, para as suas polêmicas antipapistas, de posturas e trechos de Dante. Um exemplo significativo nos é oferecido, nos Estados Unidos, pelo eminente teólogo e pregador John Cotton, que incluiu Dante numa série de figuras que considera chamadas por Deus a testemunhar em favor de um “primeiro renascimento”, ao qual se seguiria, por obra do protestantismo, uma completa “ressurreição” do cristianismo baseado no “ministério do Evangelho”.

Entre o Iluminismo e o Pré-Romantismo

Mas no século XVIII e no período pré-romântico, o puritanismo ia já absorvendo outros filões culturais e, com as influências exercidas pela nova física newtoniana, por Locke e pelo movimento iluminista em geral, ia-se cada vez mais estreitando “a relação entre Deus e a razão”. Durante todo o século XVIII, o intelectualismo teológico e o ativismo puritano iam-se fundindo com posições de iluminismo moderado e com conceitos como liberdade e salvação cada vez mais empregados em sentido político-constitucional. A respeito da literatura e da própria imagem da Itália continuava, porém, a prevalecer a postura de desconfiança-deferência. Associava-se à imagem da Itália a evocação de paixões exageradas, de fascinantes e ao mesmo tempo desastrosas seduções expressas numa “língua elegante”. No entanto, Dante parecia situar-se numa espécie de zona de grandeza severa e solitária, o que foi ainda mais sublinhado com a difusão das primeiras tensões e inquietações pré-românticas, do gosto pelo excelso e pelo sublime. Não deve admirar que a primeira tradução de um trecho de Dante que surgiu nos Estados Unidos tenha sido a do famosíssimo episódio, horrível e patético, do conde Ugolino, publicado na revista New York Magazine em 1791. O autor era William Dunlap, escritor, pintor, ativíssimo e aventureiro empreendedor teatral, diretor e operador cultural.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Um canto de louvor e amor: o Trium puerorum (Parte 1/2)

Fotografía: Ravi Pinisetti (Unplash)

Um canto de louvor e amor: o Trium puerorum

O Trium Puerorum é um canto de louvor a Deus, que a Igreja aconselha rezar depois da Santa Missa. A natureza inteira, com o sol, as estrelas, os raios, as nuvens e os mares, se une a esse canto iniciado por três jovens judeus do Antigo Testamento.

05/04/2021

O rei Nabucodonosor mandou construir uma estátua de ouro de vinte e sete metros de altura (cf. Dan 3). Todos os seus súditos, provenientes de diferentes povos e nações, reuniram-se em torno dela e começaram a adorá-la. O castigo para quem se negasse era claro: “Quem não se prostrar para adorá-la será imediatamente jogado na fornalha com o fogo aceso!” A situação pareceu propícia para denunciar os judeus, uns homens caldeus se puseram de acordo e foram rapidamente a Nabucodonosor: “Viva o rei para sempre! (…), alguns judeus, que tu, ó rei, nomeaste governadores das províncias da Babilônia, (Ananias, Azarias e Misael) não respeitaram a tua ordem, ó rei, não prestaram culto ao teu deus, não adoraram a imagem de ouro erguida por ti, ó rei”. Então o rei, encolerizado e furioso, mandou trazer esses jovens. E diante deles quis se assegurar que aquilo que havia ouvido era verdade:

- “Foi de propósito que não prestastes culto ao meu deus e recusastes adorar a estátua de ouro que eu ergui? (…). Se não adorardes, na mesma hora sereis atirados na fornalha acesa. E qual é o Deus que vos há de livrar da minha mão?”

Os três jovens, a uma só voz, responderam sem qualquer sinal de dúvida:

 “Existe o nosso Deus a quem cultuamos ele nos pode livrar da fornalha acesa (...). Mas mesmo que isso não aconteça, fica sabendo, ó rei, que não vamos prestar culto ao seu deus, nem vamos adorar a estátua de ouro construída por ti, ó rei”.

A reação de Nabucodonosor não se fez esperar. Mandou acender na fornalha um fogo sete vezes maior que o de costume e colocou nele Ananias, Azarias e Misael. O fogo era tão intenso que, inclusive, queimou os homens que o tinham acendido, parte do séquito do rei. No entanto, não conseguiu fazer qualquer dano a nenhum dos três jovens, pois um anjo do Senhor havia descido com eles e impelido a chama para fora da fornalha. “Os três, então, cantavam hinos, glorificavam e louvavam a Deus a uma só voz, dentro da fornalha (...). Bendito és tu, Senhor, Deus dos nossos pais, sejas louvado e exaltado para sempre! Bendito seja o teu nome santo e glorioso! Sejas louvado e exaltado para sempre!”

Das catacumbas ao missal

Esta passagem do livro de Daniel foi recolhida no século II a.C. como exemplo pelos hebreus que, sob o domínio de Antíoco IV Epífanes, preferiram a morte a ser infiéis à Aliança. Nós, cristãos, vemos na libertação dos três jovens um anúncio da Páscoa de Jesus, o mártir por excelência e o primeiro a experimentar a renovação do cosmos que a Ressurreição leva consigo. Este relato era muito estimado nos primeiros séculos do cristianismo, e por isso, com frequência era representado artisticamente nas catacumbas, sepulcros e relicários. Mas o que sem dúvida contribuiu a lhe dar maior relevância foi a sua introdução na grande vigília pascal e em outras ações litúrgicas, tanto no oriente como no ocidente. E já a partir do século VIII, a sua popularidade foi tão grande que se encontram versões em diversas línguas nacionais.

A presença do hino dos três jovens ou cântico do Benedicite no Ordinário da Missa, se remonta ao século IX, mas é no Missal Romano de 1570 que será acrescentado de maneira oficial aos ritos conclusivos da Missa. Até então as fontes falam de diversas formas de rezar uma série de orações que, com o passar do tempo, acabaram se chamando Trium puerorum – o cântico dos três jovens. Este conjunto estava formado pelo cântico do Benedicite do livro de Daniel, mais uma série de salmos, versículos e orações. Algumas fontes precisam que este conjunto de orações era cantado por todos os que participavam na procissão até a sacristia. Outras, por outro lado, o atribuem ao celebrante, no momento em que retirava as vestes sacerdotais. Mas o que sabemos com certeza é que no Missal do início do século XX aparecia como última oração prevista para o sacerdote ao concluir a celebração eucarística. O então chamado Canon Missae terminava com o sacerdote que, descendo do altar, dizia como ação de graças o Trium puerorum[1]. Assim foi até 1962 quando foi excluído do ordinário da Missa e ficou situado entre as orações recomendadas pro opportunitate – como sugestões. Nas edições recentes do Missal Romano, não aparece na proposta de orações de ação de graças após a Missa. Por isso, não é de surpreender que hoje em dia seja menos nítida a relação entre a ação de graças e este cântico.

Novidade de um costume

Conhecendo já a sua presença no missal no princípio do século XX, contextualizamos a anotação que São Josemaria fez em 1932: “Seria muito bonito concluir, todos os dias, a ação de graças com a antífona “Trium puerorum”, os dois salmos e as orações seguintes (cinco minutos) que o breviário põe na ação de graças post Missam”[2]. No entanto, apenas oito anos depois é que encontraremos a primeira referência à prática deste costume, quando o autor do diário de Diego de León escreve: “O Padre celebra no oratório. Depois da Missa diz que, a partir de agora será costume na Obra terminar a ação de graças depois da Comunhão com a oração En Ego e o Cântico dos três jovens”[3].

Como em outras ocasiões, este costume da Obra foi se perfilando com a experiência e o tempo. Não estranha, portanto, que, em 1947, São Josemaria volte a se perguntar sobre o melhor modo de viver a ação de graças depois da Missa. Numa carta ao Conselho Geral, que ainda se encontrava em Madri, pede que vejam “se não seria demasiado longo – creio que não – depois dos dez minutos de ação de graças pessoal ao terminar a Santa Missa, fazer coletivamente e de modo litúrgico a ação de graças com a Antífona e o Cântico dos três jovens, o salmo 150, etc. e as três pequenas orações com uma única conclusão. Depois a jaculatória e se acabou. Tem cinco anos de indulgências cada vez, e uma plenária no mês. Se está bem, que o façam em todas as casas”[4]. Com o tempo, a prática se instalou e ficou incorporada ao ritmo habitual dos centros da Obra desde 1950.

Convém dizer que esta oração não era algo exclusivo da Obra, mas, como já vimos, estava presente no ordinário da Missa da época. Além disso, é bom lembrar que o Cântico de Daniel 3 se encontrava – como ainda hoje – nas laudes da Liturgia das Horas, principalmente nos domingos. No entanto, a novidade que São Josemaria introduziu foi a de estender a oração aos leigos, incentivando assim a sua participação ativa na liturgia. Por outro lado, este costume nos ajuda a viver a ação de graças com toda a Igreja, ao mesmo tempo em que recordamos qual é o nosso fim último: dar glória a Deus, Uno e Trino.

Juan Rego

Tradução: Mônica Diez

Fotografía: Ravi Pinisetti (Unplash)


[1] “Finito Evangelio sancti Johannis, discedens ab Altari, pro gratiarum actione dicit Antiphonam Trium puerorum, cum reliquis, ut habetur in principio Missalis(N.T. Terminado o Evangelho de São João, ao descer o sacerdote do altar, recita o Hino dos Três jovens, em ação de graças, com os outros, como está estabelecido no início do Missal Romano) Missale romanum (1920), Canon Missae, p. 302.

[2] São Josemaria, Anotações íntimas, n. 833 (entre 20/11 e 2/10/1932).

[3] Diário do centro de Diego de León, 17/12/1940. A oração En Ego é também conhecida como Oração diante de Jesus Crucificado.

[4] São Josemaria, Carta, 7/03/1947.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/trium-puerorum-louvor-da-natureza-a-deus/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF