O convite do Papa Leão: superar a tentação de considerar a
paz distante e impossível, superar a "lógica agressiva e conflituosa"
segundo a qual a paz é buscada através de uma corrida armamentista
Andrea Tornielli
"Nada tem a capacidade de mudar-nos mais do que um
filho. E talvez seja justamente o pensamento nos nossos filhos, nas crianças e
também naqueles que são frágeis como elas, que nos traspassa o coração".
Estas são as palavras que o Papa Leão usou em sua Mensagem para o Dia Mundial
da Paz. Deus, o Todo-Poderoso, fazendo-se Homem, aceita tornar-se criança,
totalmente dependente dos cuidados de uma mãe e de um pai, segundo a lógica da
pequenez, e escolhe vir ao mundo na pobreza de um estábulo e no isolamento de
uma periferia do Império Romano. Ele é "um Deus indefeso, pelo qual a
humanidade só pode descobrir-se amada cuidando d’Ele." Contemplando aquela
Criança, protagonista dos nossos presépios, não podemos ficar indiferentes ao
drama de tantas crianças vítimas da guerra, mortas pelas bombas na Ucrânia;
mortas em Gaza, primeiro pela chuva de mísseis e agora pelo frio devido à
dificuldade de acesso à ajuda humanitária; mortas nos muitos conflitos
esquecidos em outras partes do mundo.
Na mensagem para o Dia Mundial da Paz 2026, o Papa recorda
que a paz do Cristo ressuscitado é uma paz desarmada "porque desarmada foi
a sua luta dentro de precisas circunstâncias ...
O convite que o Sucessor de Pedro estende a crentes e não
crentes é para acolher e reconhecer a paz, superando a tentação de a considerar
distante e impossível. A paz e a não violência para os cristãos têm raízes
profundamente evangélicas nas palavras e na atitude de Jesus, que ordenou a
Pedro, que queria defendê-lo, que guardasse a sua espada. A paz que o Cristo
ressuscitado proclama ao mundo é desarmada e desarmante, uma realidade a ser
salvaguardada e cultivada nos nossos corações, nas nossas relações, nas nossas
famílias, nas nossas comunidades, nos nossos países. A história ensina-nos com
que frequência, mesmo como cristãos, nos esquecemos disto, tornando-nos
cúmplices de guerras e violência trágicas.
Hoje, Leão XIV nos lembra que também nós corremos o risco de
considerar a paz um ideal distante, chegando ao ponto de justificar a guerra
para alcançá-la. No debate público e na mídia, parece prevalecer uma lógica
agressiva e conflituosa, segundo a qual se torna uma culpa "não se
preparar suficientemente para a guerra". Essa é uma lógica
desestabilizadora e extremamente perigosa que vai muito além do princípio da
legítima defesa e nos conduz ao abismo de um novo conflito mundial com
consequências imprevisíveis e devastadoras.
"Hoje, mais do que nunca - escreve o Papa -, é preciso
mostrar que a paz não é uma utopia, através de uma criatividade pastoral atenta
e generativa". Em vez de continuarmos a trilhar o caminho do aumento
constante dos gastos com armamentos, que já atingiram 2,5% do PIB mundial, em
vez de investirmos trilhões em instrumentos de morte e destruição destinados —
como vimos — a arrasar escolas e hospitais, em vez de fazermos as pessoas
acreditarem que nossa segurança consiste em rearmar e dissuadir, precisamos ter
a coragem da paz. Precisamos reativar o caminho da diplomacia, da negociação,
da mediação e do direito internacional, inclusive fortalecendo as instituições
internacionais. Não permitamos que a voz do Papa Leão seja uma voz que clama no
deserto; não deixemos sozinho o Bispo de Roma. Dêmos crédito às suas palavras e
olhemos para a história para compreender o saudável realismo em suas
intervenções, assim como o foi nas de seus predecessores, que muitas vezes
foram ignorados. Somos chamados a "motivar e apoiar todas as iniciativas
espirituais, culturais e políticas que mantenham viva a esperança, combatendo a
difusão de atitudes fatalistas, como se as dinâmicas em ato fossem produzidas
por forças impessoais anônimas e por estruturas independentes da vontade
humana". A paz é possível, e uma corrida armamentista insensata não é o
caminho para defendê-la. Para os cristãos, a paz tem o rosto indefeso do Menino
Deus, frágil como toda criança: deixemos que nossos corações sejam traspassados
por esse rosto e pela proclamação da paz que ressoou na noite do primeiro
Natal.

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