Em sua homilia na missa de Natal, Leão XIV recordou que
"a paz de Deus nasce de um choro de criança acolhido, de um pranto ouvido:
nasce entre ruínas que invocam solidariedades renovadas". O Pontífice
disse que "fragilizada se encontra a carne das populações indefesas,
provadas por tantas guerras em curso ou concluídas, deixando escombros e
feridas abertas. Fragilizadas estão as mentes e as vidas dos jovens obrigados a
pegar em armas".
Mariangela Jaguraba - Vatican News
O Papa Leão XIV presidiu a missa de Natal, na Basílica de
São Pedro, na manhã desta quinta-feira, 25 de dezembro.
O Pontífice iniciou sua homilia com um trecho do Livro do
Profeta Isaías: «Irrompei em cânticos de alegria». É o que diz "o
mensageiro da paz a todos aqueles que se encontram entre as ruínas de uma
cidade inteiramente por reconstruir".
"A paz existe e já está no meio de nós", disse o
Papa Leão, recordando "a surpresa que a liturgia do Natal coloca diante de
nós: o Verbo de Deus aparece e não sabe falar, vem até nós como um
recém-nascido que apenas chora e dá vagidos. «Fez-se carne» e, embora crescerá
e um dia aprenderá a língua do seu povo, agora fala apenas a sua presença
simples e frágil.
“«Carne» é a nudez radical à
qual, em Belém e no Calvário, falta até a palavra; como a não têm muitos irmãos
e irmãs despojados da sua dignidade e reduzidos ao silêncio. A carne humana
pede cuidados, invoca acolhimento e reconhecimento, procura mãos capazes de
ternura e mentes dispostas à atenção, deseja palavras bonitas.”
"Eis a forma paradoxal segundo a qual a paz já está
entre nós: o dom de Deus envolve-nos, procura acolhimento e mobiliza a
dedicação. Surpreende-nos porque se expõe à rejeição, encanta-nos porque nos
arranca da indiferença", disse ainda Leão XIV.
“É um verdadeiro poder o de
nos tornarmos filhos de Deus: um poder que permanece enterrado enquanto
estivermos distantes do choro das crianças e da fragilidade dos idosos, do
silêncio impotente das vítimas e da melancolia resignada de quem faz o mal que não
quer.”
A seguir, o Pontífice recordou as palavras do Papa Francisco
na Evangelii gaudium: «Às vezes sentimos a tentação de ser cristãos, mantendo
uma prudente distância das chagas do Senhor. Mas Jesus quer que toquemos a
miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos outros. Espera que
renunciemos a procurar aqueles abrigos pessoais ou comunitários que permitem
manter-nos à distância do nó do drama humano, a fim de aceitarmos
verdadeiramente entrar em contato com a vida concreta dos outros e conhecermos
a força da ternura».
"Queridos irmãos e irmãs, uma vez que o Verbo se fez
carne, agora a carne fala, brada o desejo divino de nos encontrar. O Verbo
ergueu no meio de nós a sua frágil tenda", disse ainda Leão XIV,
acrescentando:
“E como não pensar nas tendas
de Gaza, expostas durante semanas à chuva, ao vento e ao frio, e nas tendas de
tantos outros deslocados e refugiados em todos os continentes; ou nos refúgios
improvisados de milhares de pessoas sem-abrigo dentro das nossas cidades?
Fragilizada se encontra a carne das populações indefesas, provadas por tantas
guerras em curso ou concluídas, deixando escombros e feridas abertas.
Fragilizadas estão as mentes e as vidas dos jovens obrigados a pegar em armas,
que precisamente na frente de batalha percebem a insensatez do que lhes é
exigido e a mentira de que estão embebidos os discursos inflamados daqueles que
os enviam para a morte.”
"A paz de Deus nasce de um choro de criança acolhido,
de um pranto ouvido: nasce entre ruínas que invocam solidariedades renovadas,
nasce de sonhos e visões que, como profecias, invertem o curso da história.
Sim, tudo isso existe, porque Jesus é o Logos, o sentido a partir do qual tudo
tomou forma", sublinhou o Papa Leão, recordando que por Jesus «é que tudo
começou a existir; e sem Ele nada veio à existência». "Este mistério
interpela-nos a partir dos presépios que construímos, abre-nos os olhos para um
mundo em que a Palavra ainda ressoa, «muitas vezes e de variados modos», e
continua a chamar-nos à conversão", sublinhou.
De acordo com o Papa, "o Evangelho não esconde a
resistência das trevas à luz, descreve o caminho da Palavra de Deus como uma
estrada intransitável, repleta de obstáculos. Até hoje, os autênticos
mensageiros da paz seguem o Verbo neste caminho, que finalmente alcança os
corações: corações inquietos, que muitas vezes desejam justamente aquilo a que
resistem".
“Assim, o Natal motiva
novamente uma Igreja missionária, impelindo-a pelos caminhos que a Palavra de
Deus traçou para ela. Não estamos ao serviço de uma palavra prepotente – já
ressoam por toda parte –, mas de uma presença que suscita o bem, conhece a sua
eficácia e não reivindica o seu monopólio.”
"Eis o caminho da missão: um caminho em direção ao
outro", sublinhou Leão XIV, ressaltando que "em Deus, cada palavra é
uma palavra dirigida, é um convite à conversação, uma palavra que nunca é igual
a si mesma". "É a renovação que o Concílio Vaticano II promoveu e que
veremos florescer apenas caminhando juntos com toda a humanidade, sem nunca nos
separarmos dela", disse ainda o Papa Leão, recordando que "o
contrário é mundano: ter-se a si mesmo como centro".
Segundo o Pontífice, "o movimento da Encarnação é um
dinamismo de conversação" e, de acordo com ele, "haverá paz quando os
nossos monólogos se interromperem e, fecundados pela escuta, cairmos de joelhos
diante da carne despojada do outro". "Precisamente nisto, a Virgem
Maria é a Mãe da Igreja, a Estrela da evangelização, a Rainha da paz. Nela
compreendemos que nada nasce da exibição da força e tudo renasce a partir do
poder silencioso da vida acolhida".

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