Na Carta Apostólica “Uma fidelidade que gera futuro”,
publicada nesta segunda-feira, 22/12, por ocasião dos 60 anos dos Decretos
conciliares Optatam totius e Presbyterorum Ordinis, o Papa Leão XIV reflete
sobre a identidade, a missão e o futuro do ministério presbiteral. Formação
permanente, fraternidade, sinodalidade e discernimento no uso das mídias estão
no centro do texto, que convida os sacerdotes a uma fidelidade vivida como dom,
conversão e serviço à evangelização.
Thulio Fonseca - Vatican News
A fidelidade sacerdotal como caminho que gera futuro para a
Igreja está no centro da Carta Apostólica “Uma fidelidade que gera futuro”,
publicada pelo Papa Leão XIV nesta segunda-feira, 22 de dezembro, no contexto
do 60º aniversário dos Decretos conciliares Optatam totius e Presbyterorum
Ordinis. No Documento, assinado na Solenidade da Imaculada Conceição (08/12), o
Pontífice propõe uma releitura atualizada da identidade e da missão dos
presbíteros, à luz das transformações culturais, sociais e tecnológicas do
nosso tempo.
O Papa recorda que não se trata de uma simples comemoração
histórica, mas de uma oportunidade para “revigorar sempre e todos os dias o
ministério presbiteral”, conscientes de que “a desejada renovação de toda a
Igreja depende, em grande parte, do ministério sacerdotal, animado do espírito
de Cristo”.
LEIA A CARTA APOSTÓLICA NA ÍNTEGRA
Fidelidade que nasce do encontro com Cristo
No início da Carta, Leão XIV sublinha que toda vocação nasce
do encontro pessoal com Jesus, “que dá à vida um novo horizonte e, desta forma,
o rumo decisivo”. Antes de qualquer atividade pastoral ou compromisso
ministerial, está o chamado do Senhor: “Vem e segue-me” (Mc 1,17) A fidelidade
à vocação, observa o Papa, fortalece-se quando o sacerdote não perde a memória
daquele primeiro chamado e permanece unido a Cristo:
“Ao longo de toda a vida somos
sempre ‘discípulos’, com o constante anseio de nos configurarmos a Cristo.
Apenas esta relação de obediente seguimento e fiel discipulado pode manter a
mente e o coração na direção certa, apesar das perturbações que a vida reserva.”
Formação permanente: memória viva da vocação
A Carta dedica amplo espaço à formação permanente, definida
como condição indispensável para manter vivo o dom recebido na Ordenação. “A
fidelidade ao chamamento não é imobilismo ou fechamento, mas um caminho de
conversão quotidiana”, afirma o Papa, destacando que a formação não pode
limitar-se ao tempo do seminário.
Diante das feridas causadas pelos abusos e da dolorosa
realidade do abandono do ministério por parte de alguns sacerdotes, Leão XIV
insiste na necessidade de uma formação integral que assegure “o crescimento e a
maturidade humana”, juntamente com uma vida espiritual sólida. O seminário,
recorda, deve ser “uma escola de afetos”, onde se aprende a amar como Cristo,
para que o sacerdote seja sempre “ponte, não obstáculo ao encontro com Cristo”.
Fraternidade presbiteral: dom a ser vivido
Outro eixo fundamental do texto do Pontífice é a
fraternidade presbiteral. O Papa recorda que ela não é apenas um ideal ou um
esforço organizativo, mas “um dom inerente à graça da Ordenação”. Citando o
Concílio, afirma que os presbíteros “são irmãos entre os irmãos, membros de um
só e mesmo corpo de Cristo”. A fidelidade à comunhão exige superar o
individualismo e cuidar concretamente uns dos outros, sobretudo dos sacerdotes
mais sós, doentes ou idosos, e questiona:
“Como poderíamos nós,
ministros, ser construtores de comunidades vivas, se entre nós não houvesse
antes de tudo uma fraternidade efetiva e sincera?”
Sinodalidade e corresponsabilidade
Inserida no caminho sinodal da Igreja, a Carta exorta os
presbíteros a cultivarem relações marcadas pela escuta, pela colaboração e pelo
reconhecimento dos carismas dos leigos. “Devem descobrir com sentido de fé os
carismas, humildes ou excelentes, que sob múltiplas formas são concedidos aos
leigos”, recorda Leão XIV, citando o Presbyterorum Ordinis.
O ministério sacerdotal, afirma o Papa, não perde força numa
Igreja mais sinodal; ao contrário, encontra novas possibilidades de fecundidade
quando supera modelos de liderança isolada e se abre a uma condução mais
colegial e missionária.
Missão, sobriedade e discernimento no uso das mídias
Ao tratar da missão, o Pontífice alerta para duas tentações
opostas: a lógica da eficiência e do ativismo, que mede o valor do sacerdote
pela quantidade de atividades realizadas, e o fechamento defensivo que paralisa
o impulso evangelizador. A resposta está na caridade pastoral, definida como “o
princípio que unifica a vida do presbítero”. É neste contexto que se insere uma
importante reflexão dedicada ao discernimento sobre a visibilidade pública do
sacerdote e o uso dos meios de comunicação:
“Educado pelo mistério que
celebra na santa liturgia, cada sacerdote deve ‘desaparecer para que Cristo
permaneça, fazer-se pequeno para que Ele seja conhecido e glorificado (cf. Jo
3, 30), gastar-se até ao limite para que a ninguém falte a oportunidade de O
conhecer e amar’. Por isso, a exposição mediática, o uso das redes sociais e de
todos os instrumentos hoje à disposição devem ser sempre avaliados com
sabedoria, tendo como paradigma de discernimento o serviço à evangelização.
‘Tudo me é lícito! Sim, mas nem tudo convém’ (1 Cor 6, 12).”
Fidelidade que gera futuro
Na conclusão, Leão XIV expressa o desejo de que este
aniversário conciliar suscite um renovado impulso vocacional na Igreja. “Não há
futuro sem cuidar de todas as vocações”, afirma, convidando a uma pastoral
juvenil e familiar mais corajosa e explicitamente vocacional:
“A escassez de vocações sacerdotais exige que todos
reflitam sobre a fecundidade das práticas pastorais da Igreja. É verdade que os
motivos desta crise podem, frequentemente, ser variados e múltiplos,
dependendo, em particular, do contexto sociocultural; porém, ao mesmo tempo, é
necessário que tenhamos a coragem de fazer propostas fortes e libertadoras aos
jovens, disponibilizando cada vez mais nas Igrejas particulares os ambientes e
as formas de pastoral juvenil impregnadas de Evangelho, onde as vocações ao dom
total de si possam manifestar-se e amadurecer.”
Por fim, ao confiar os seminaristas, diáconos e presbíteros
à intercessão da Virgem Maria e de São João Maria Vianney, o Papa recorda que
“o sacerdócio é o amor do coração de Jesus. Um amor tão forte que dissipa as
nuvens da rotina, do desânimo e da solidão; um amor total que nos é dado em
plenitude na Eucaristia. Amor eucarístico, amor sacerdotal”.

Nenhum comentário:
Postar um comentário