"A tarefa que temos pela frente já não é defender e
justificar a esperança filosófica e teologicamente, mas simplesmente
anunciá-la, mostrá-la, oferecê-la a um mundo que perdeu o sentido da esperança
e por isso enfraquece espiritualmente”, como diz Cantalamessa[2]. Nesse
contexto, a esperança não é um tratado teórico, mas um testemunho profético de
vida que brota da fé pascal".
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
A esperança, em sua essência, é como um perfume suave que
não se explica, mas se sente e se compartilha. Diante de um mundo marcado pela
incerteza, pelo medo e pelo cansaço espiritual, a missão de cada cristão já não
se limita a defender ou justificar racionalmente esse dom, mas a torná-lo
visível e acessível a todos. Mais do que conceitos filosóficos ou argumentos
teológicos, a esperança precisa ser testemunhada na vida concreta, como um
sinal que ilumina os que caminham na escuridão e fortalece aqueles que,
fragilizados, buscam razões para continuar. Proclamar a esperança, portanto, é
oferecer ao mundo um sopro de renovação capaz de despertar corações adormecidos
e devolver sentido às jornadas humanas.
No contexto deste Ano Jubilar, Pe. Gerson
Schmidt* nos propõe hoje a reflexão "Proclamar ao mundo o perfume
suave e agradável da esperança":
"O tratado da Esperança, fé e caridade de Zenão de
Verona, um antigo padre, diz assim: “Tire a Esperança, e toda a humanidade se
entorpece. Tire a Esperança e todas as artes e virtudes desaparecerão. Tire a
esperança e tudo perece”.
Há um gesto na Vigília Pascal significativo que destacamos
em nossa reflexão sobre a Esperança. Do fogo Novo abençoado no Sábado de
Aleluia, se acende a chama do Círio Pascal, devidamente incensado e preparado
para a noite das noites. As brasas acesas do fogo Novo simbolizam as pedras do
túmulo de Cristo que se rompem para que a luz do ressuscitado brilhe. Da chama
do Círio Pascal aceso nessa noite Santa de Vigília, se acendem as velas do
povo. Os fiéis acendem a própria vela por meio de outra vela e assim a
esperança da luz se alastra. Nessa analogia, vemos que a esperança é
transmitida por contágio. Não é transmitida porque alguém a estuda, discute ou
explica, mas porque a possui e passa adiante. Assim, os cristãos devem passar
de pai para filho, de mão em mão, de geração em geração, numa tradição vivida e
testemunhada, uma divina transmissão salutar, a grande virtude da esperança.
Se há meios para se contagiar com a esperança é a alegria e
a paz interior. São Paulo, na Carta aos Romanos, expressa esse desejo: “Que o
Deus da esperança os encha de toda a alegria na fé” (Rm 15,13). A alegria
revela a presença da esperança assim como o perfume revela a presença de uma
flor. O perfume da esperança precisa ser exalado ao mundo inodoro. A fragrância
da esperança precisa preencher nossos espaços e ambientes.
Reza assim também o salmista: “Sobre nós venha, Senhor, a
vossa graça, da mesma forma que em vós nós esperamos!” (Sl 32). A
ressurreição de Cristo nos faz “renascer para uma esperança viva”, como vemos
na primeira Carta de Pedro (1Pdr 1,3). Hoje, mais do que nunca no mundo,
precisamos de um “renascimento da Esperança, se quisermos iniciar uma nova
evangelização. Nada se faz sem esperança. As pessoas vão onde se respiram o ar
de esperança e fogem onde não a sentem presente. A esperança é o que dá coragem
aos jovens para formarem uma família ou seguir em uma vocação religiosa; é o
que os mantém afastado das drogas e de semelhantes deslizes ao desespero. De
certo modo em comparação com algumas décadas atrás, estamos hoje numa situação
mais vantajosa em relação à esperança. Já não precisamos passar a maior parte
de nosso tempo defendendo a esperança Cristã dos ataques externos; podemos
fazer a coisa mais útil e frutífera que é proclamá-la, oferecê-la e
disseminá-la no mundo, não tanto com um discurso apologético, mas assim
querigmático”[1].
Precisamos proclamar alto e em bom tom a esperança que não
decepciona jamais. Jesus Ressuscitou, razão de nossa esperança, de nossa fé e
nosso combate diário. O mundo de hoje precisa desse anúncio da Esperança. Há
tantas pessoas desanimadas, desencorajadas, esmorecidas na fé, caídas no
pessimismo e baixa estima e questão caídas à beira do caminho. Não peregrinam,
não caminham, não progridem. É preciso querigmatizar a esperança, fazer dela um
anúncio corajoso e constante. Em cada anúncio, em cada mensagem, em cada
homilia, em cada pregação, precisamos proclamar de viva voz a esperança.
A esperança das pessoas foi afetada pelas ideologias e pelos
falsos profetas: Feuerbach, Marx, Nietzsche, Hegel, Freud e outros. A vida
eterna para muitos desses filósofos foi vista como uma esperança ilusória, como
o ópio dos povos. A esperança foi vista com maus olhos, como um descompromisso
com o tempo presente e como fuga da atuação do cristão na sociedade. Pois
depois de destruir com a esperança cristã, a cultura ateia marxista, não tardou
em perceber que não se podia deixar as pessoas sem esperança. Por isso,
inventou o “princípio da esperança”. A esperança, nessa teoria filosófica,
seria apenas um princípio, e não uma virtude teologal, como a Igreja proclama.
Nesse princípio, a manifestação de Jesus Cristo é substituída pela manifestação
do homem, a “parusia” é substituída pela “utopia”. A esperança passaria não
simplesmente para uma virtude da graça, mas uma conquista de esforço humano no
desejo de superação. A pátria celeste torna-se aqui uma pátria de identidade,
não onde o homem vê Deus face a face, mas onde o homem vê simplesmente como ele
é. “A tarefa que temos pela frente já não é defender e justificar a esperança
filosófica e teologicamente, mas simplesmente anunciá-la, mostrá-la, oferecê-la
a um mundo que perdeu o sentido da esperança e por isso enfraquece
espiritualmente”, como diz Cantalamessa[2].
Nesse contexto, a esperança não é um tratado teórico, mas um testemunho
profético de vida que brota da fé pascal".
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro
de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em
Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
_____________
[1] CANTALAMESSA,
RANIERO. “Fé, esperança e caridade – as três graças do Cristianismo”, Ed.
Paulus, 2024, p. 111.
[2] Idem,
113.
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