Valdemar
De Vaux - publicado em 22/08/25
Para quem lê a Bíblia, dormir em uma tenda não é trivial:
o habitat do povo hebreu em movimento também simboliza a presença de um Deus
que, em Jesus, vem armar sua tenda no meio da humanidade.
"Um dia a tropa acampou...", diz a canção, que não
especifica o que parece óbvio: os escoteiros dormiram naquele dia, apesar da
chuva, na tenda. Uma prática comum do escotismo. O que pode parecer trivial,
cochilar sob uma lona, hoje tão avançado, ainda assim tem um forte poder
evocativo para o leitor da Bíblia. Aqui está um breve guia para não mais armar
ou desmontar a barraca da mesma maneira. Se este habitat precário, a tenda,
está tão presente nas Escrituras, é claro que é porque faz parte da cultura do povo
hebreu e de seus vizinhos. Nestas terras quentes, a tenda oferece proteção
contra o sol quando não se está em casa. De forma muito prosaica, Abraão está,
portanto, "sentado à entrada da tenda [na] hora mais quente do dia"
quando vê "três homens" parados perto dele e diante dos quais se
prostra. Este episódio (cf. Gn 18),
conhecida como "hospitalidade de Abraão" e retratada no famoso ícone
de Rublev, foi lida pela tradição cristã como uma prefiguração: a
Trindade vem visitar seu povo.
Deus entre seu povo
O mesmo se aplica à famosa "tenda da reunião" que
protege a Arca da Aliança durante todo o Êxodo: Deus habita ali, Deus e o homem
vivem lado a lado. Este santuário móvel, ordenado com muita precisão pelo
Senhor (cf. Ex 26) acompanha o
povo hebreu em seu caminho e o Criador, em sua delicadeza, aceita viver entre
as criaturas que não abandona em suas peregrinações (cf. Ex 33). Esta morada de Deus
torna-se então o Templo, apesar da relutância da primeira pessoa interessada
(cf.2 de 7), "o Senhor, que
anuncia que ele mesmo fará uma casa" para o seu povo. Este é, de fato, o
risco: que a criatura imponha as mãos ao Criador, fixando-o em um lugar, que se
esqueça de que nada vem dele, mas que ela recebe tudo. E a tenda tem a vantagem
de ser leve e instável, forçando aquele que dorme sob sua proteção a abandonar
sua pretensão de onipotência.
O mesmo ensinamento é dado no Novo Testamento na época da
Transfiguração (cf. Mt 17, 1-13;Mc 9, 2-13;Lc 9, 28-36). Pedro, que percebe que
é “bom estar aqui”, na presença do Ressuscitado prefigurado na sua brancura,
gostaria de parar o tempo armando três tendas para Jesus, Moisés e Elias,
o primeiro dos apóstolos ainda não compreendeu que o próprio Filho de Deus
cumpre em seu corpo as profecias da Antiga Aliança. Como João diz em seu
prólogo, se traduzirmos literalmente, "o Verbo se fez carne e armou sua
tenda entre nós" (Jo 1,14).
Este é o mistério da Encarnação, de Deus que vem definitiva e plenamente
partilhar a condição cambaleante, como a lona, de todos os homens.
Onde queremos armar nossa barraca para sempre?
Além disso, Cristo, por meio da Ressurreição, armou uma
tenda perto do Pai, no Céu, para todos aqueles que o seguiriam. Como morada, a
tenda de Deus nada mais é do que o próprio Paraíso. Assim, o movimento
escoteiro fala de grande acampamento em falas de espiritualidade sobre a morte.
Mas "quem ficará em sua tenda", pergunta o salmista? Aquele que se
comporta perfeitamente, que age com justiça e fala a verdade segundo o seu
coração" (Sl 14, 1-2). Mas
onde queremos armar para sempre a tenda da nossa existência?
Nenhum comentário:
Postar um comentário