A realidade dos excessos digitais vividos pela atual geração
não pode ser ignorada. Crianças e adolescentes passam, em média, de 6 a 9 horas
por dia diante de telas, seja em jogos, redes sociais ou vídeos.
Prof. Robson Ribeiro – Teólogo, Filósofo e Historiador
Vivemos em uma era marcada por uma hiperconectividade sem
precedentes. As redes sociais, os dispositivos móveis e as telas digitais
tornaram-se extensões quase inseparáveis da vida cotidiana, especialmente para
crianças e adolescentes. No entanto, essa realidade tecnológica traz consigo
desafios profundos para a saúde mental e o desenvolvimento emocional das novas
gerações. Em seu livro A geração ansiosa: Como a infância hiperconectada está
causando uma epidemia de transtornos mentais, o psicólogo social Jonathan Haidt
expõe, com base em dados e estudos recentes, como o uso intensivo de telas e
redes sociais está correlacionado a um crescimento alarmante de casos de
ansiedade, depressão e outros transtornos psíquicos entre os jovens.
Haidt argumenta que, a partir da década de 2010, houve uma
ruptura no desenvolvimento saudável da infância e adolescência. A substituição
do brincar livre, das interações presenciais e das experiências concretas por
horas diante das telas levou a uma forma de socialização artificial, ansiosa e,
muitas vezes, tóxica. Plataformas como Instagram, TikTok e Snapchat incentivam
comparações constantes, idealizações irreais e busca por validação imediata, o
que afeta profundamente a autoestima dos jovens. A ansiedade, segundo Haidt,
não surge apenas pelo conteúdo consumido, mas pelo modo como essas redes moldam
o comportamento social e o valor que os jovens atribuem a si mesmos com base em
curtidas, visualizações e comentários.
Um dos principais problemas apontados por Haidt é o déficit
de controle parental e institucional sobre o tempo e o tipo de uso das redes
sociais. Muitas famílias enfrentam dificuldades em estabelecer limites claros,
seja por desconhecimento dos riscos, seja por pressão social ou conveniência.
Destarte essa realidade desponta uma das grandes fragilidades contemporâneas no
campo da educação familiar: a dificuldade em estabelecer limites diante do
avanço tecnológico.
Muitos pais e responsáveis, imersos na mesma cultura digital
que envolve seus filhos, sentem-se inseguros ou despreparados para impor
restrições ao uso das telas. Essa lacuna formativa é agravada pela pressão
social por conectividade constante e pelo uso da tecnologia como recurso de
distração, especialmente em contextos de cansaço, falta de tempo ou ausência de
apoio coletivo. O problema, nesse sentido, não é apenas técnico ou
comportamental, mas ético e cultural. Estabelecer limites hoje exige coragem
educativa, diálogo firme e afetivo, e uma consciência crítica que muitas vezes
ainda precisa ser construída dentro das próprias famílias.
A ausência dessa mediação abre espaço para o domínio das
plataformas digitais sobre a infância e adolescência, comprometendo a
autonomia, a saúde emocional e a construção de vínculos mais profundos com o
mundo real. Além disso, o design viciante dessas plataformas – planejadas para
prender a atenção por mais tempo possível – torna difícil para crianças e
adolescentes desligarem-se de forma voluntária. A chamada "economia da
atenção" transforma jovens em consumidores e produtos, vulneráveis a algoritmos
que reforçam vícios e distorcem a percepção da realidade.
Outro aspecto abordado por Haidt é a substituição das
experiências presenciais por interações digitais superficiais, o que compromete
o desenvolvimento de habilidades socioemocionais. A comunicação por meio de
mensagens curtas e emojis reduz a capacidade de empatia, escuta ativa e
resolução de conflitos, habilidades essenciais para uma vida adulta saudável e
ética. Além disso, o uso constante de telas compromete o sono, reduz a
capacidade de concentração e contribui para o isolamento emocional, fatores que
se somam ao aumento dos quadros de sofrimento mental entre os jovens.
A realidade dos excessos digitais vividos pela atual geração
não pode ser ignorada. Crianças e adolescentes passam, em média, de 6 a 9 horas
por dia diante de telas, seja em jogos, redes sociais ou vídeos. O que poderia
ser uma ferramenta de entretenimento, estudo ou conexão com o mundo, tornou-se
uma prisão invisível. O excesso não está apenas no tempo de exposição, mas na
intensidade emocional e psicológica com que os jovens se envolvem com esse
universo.
Os relatos de jovens que não conseguem ficar longe do
celular por mais de poucos minutos são cada vez mais frequentes. Isso configura
uma dependência comportamental, um tipo de vício que afeta a regulação
emocional, o autocontrole e o equilíbrio mental. A busca incessante por
notificações, curtidas e respostas rápidas cria um estado de alerta constante,
que leva à exaustão psíquica. Não por acaso, os índices de burnout, insônia e
irritabilidade aumentaram consideravelmente entre adolescentes nos últimos anos.
Jonathan Haidt alerta para a necessidade de restaurar os
limites saudáveis entre o digital e o humano. Em um mundo onde tudo é
instantâneo, a paciência, a espera e o silêncio tornaram-se experiências quase
intoleráveis. A realidade dos excessos digitais desorganiza o tempo interno,
fragmenta a atenção e compromete a capacidade de lidar com o tédio – elemento
essencial para a criatividade e o autoconhecimento.
Além disso, os excessos favorecem a cultura da
hiperexposição e da comparação constante, o que prejudica a construção da
identidade. Jovens que crescem em um ambiente onde tudo é postado, comentado e
julgado publicamente desenvolvem uma percepção distorcida de si mesmos e dos
outros. Isso gera sentimentos de inadequação, medo de exclusão e insegurança
crônica.
É necessário também destacar o impacto dos excessos nas
relações familiares e escolares. Muitos pais relatam dificuldades em manter
conversas profundas com seus filhos, que preferem o silêncio da tela ao diálogo
presencial. Nas escolas, professores enfrentam o desafio de competir com os
celulares por atenção em sala de aula. O que antes era uma distração ocasional,
agora tornou-se um obstáculo diário à aprendizagem significativa.
Frente a esse cenário, torna-se urgente promover uma cultura
de moderação e presença. Isso passa por educar para o uso consciente das
tecnologias, criando momentos de "dieta digital", espaços sem telas e
tempo de qualidade offline. Significa também recuperar o valor do corpo, da
convivência, do olho no olho, do tempo livre não preenchido por estímulos
artificiais.
Como lembra Haidt, o problema não é a tecnologia em si, mas
o modo como ela é usada sem mediação, sem limites e sem responsabilidade. É
preciso educar para o equilíbrio. Afinal, todo excesso, mesmo quando revestido
de modernidade, é sempre um afastamento da vida real e da saúde emocional.
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