A NOIVA DO CÂNTICO E MARIA MADALENA
23/07/2025
Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
Na noite silenciosa da alma, quando o mundo dorme e os céus
se cerram em silêncio, ela se levanta.
“Em meu leito, durante a noite, busquei aquele que ama o meu
coração. Busquei-o, mas não o encontrei.”
O jardim ainda estava envolto em sombras. Era o primeiro dia
da semana, e tudo parecia recomeçar, mas ainda sem luz. A pedra fora removida,
mas o corpo não estava mais lá. A ausência cortava como lâmina. O silêncio
gritava. O túmulo vazio não era resposta: era pergunta.
“Levantar-me-ei, e percorrerei a cidade. Pelas ruas e pelas
praças, buscarei aquele que ama o meu coração”.
E ela foi. Correndo, buscando, como mulher ferida de amor.
Não com ilusões, mas com lágrimas. Não com argumentos, mas com fidelidade. Como
a amada do Cântico, que nada explica, mas tudo sente. Ela se move com a força
de quem perdeu tudo, exceto a esperança. Porque quem ama, busca.
“Encontraram-me os guardas que rondam a cidade. ‘Vistes
aquele que ama o meu coração?’”
Aos guardas, aos discípulos, aos anjos — ela pergunta. Mas
nenhum responde com a voz que ela anseia. Nenhum tem o nome. Nenhum a toca no
mais profundo. Ela chora, mas as lágrimas não a impedem de
continuar.
“Mal os havia deixado, encontrei aquele que ama o meu
coração. Agarrei-o, e não o deixei mais.”
No jardim, Ele aparece. Mas ela não O reconhece. Pensa
tratar-se de um jardineiro, e no fundo, não se engana: é o Jardineiro da nova
criação, o Segundo Adão, que transforma sepulcro em sementeira.
E então, Ele diz uma única palavra: Maria.
Nada mais foi necessário. Porque somente quem conhece chama
pelo nome. E somente o verdadeiro Amado chama com ternura, com autoridade, com
eternidade.
Ela responde: “Rabunni!”.
Não é o reconhecimento de um título. É a alma que se
ajoelha. É o coração que se dobra. É o mundo que se reconstrói a partir daquele
instante.
Na esposa do Cântico, vemos o anseio. Em Maria Madalena,
vemos o cumprimento. A esposa busca entre sombras, Maria busca entre anjos. A
esposa encontra pelas praças, Maria encontra no jardim. A esposa segura o
Amado, Maria é enviada por Ele.
Maria Madalena não apenas encontra o Senhor, ela é enviada
por Ele. E o amor que em Cânticos permanece no quarto, agora se torna missão no
mundo. O noivado da antiga aliança se consuma na Aliança Nova, onde a mulher é
voz da Páscoa, evangelho para os apóstolos, primeira anunciadora da
Ressurreição.
No Cântico, a amada diz: “agarrei-o, e não o deixei
mais.”
No jardim, Jesus lhe diz: “não me retenhas”. Porque
o amor já não é posse, é anúncio. Não é mais segredo, é missão.
E é por isso que Maria Madalena, unindo em si o desejo da
discípula e o envio do Ressuscitado, é maior que a mulher do Cântico. Pois se
aquela procurou no escuro o amor de sua juventude, Maria encontrou no escuro da
morte o Amor eterno na Ressurreição. E foi por Ele conhecida, chamada,
enviada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário